26 de novembro de 2013 | 2h 12
O Estado de S.Paulo
O Fórum Econômico Mundial entrevistou centenas de
especialistas de diversos países para traçar o panorama para 2014. No
que diz respeito à América Latina, esses analistas concluíram que os
principais desafios ainda são a persistente disparidade de renda, o
desemprego estrutural, o atraso na educação e a falta de confiança nas
políticas econômicas. Portanto, salvo alguma mudança drástica, cujos
sinais não estão no horizonte, o continente seguirá sua sina de ser uma
grande potência irrealizada, pois os entraves a seu crescimento são
estruturais e sua superação, dizem os analistas do Fórum, demanda
líderes com visão de futuro - algo que está em falta por aqui.
O relatório destaca que a América Latina, em razão de algumas
reformas econômicas, foi capaz de ampliar consideravelmente sua classe
média - fenômeno que ocorreu em grande medida graças ao comércio com a
China, que rendeu R$ 260 bilhões anuais. O Brasil tornou-se o segundo
maior mercado emergente, atrás apenas da China, e é o destino
preferencial de quem decide investir na região.
A pesquisa do Fórum cita os supostos esforços do Brasil para fazer a
economia deslanchar - com ênfase nos bilionários planos de investimento
em infraestrutura, aqueles que teimam em não sair do papel. No entanto, a
entidade comentou que nenhuma medida desse tipo resultará em
crescimento sustentado se não vier acompanhada de apostas concretas em
inovação e empreendedorismo. "Sim, as exportações cresceram e as
políticas macroeconômicas funcionaram para conter a hiperinflação e para
superar a década perdida", comentou o boliviano Enrique García,
presidente do conselho do Fórum para a América Latina. "Mas agora é a
hora dos grandes investimentos em educação, tecnologia e
infraestrutura."
Esses investimentos são essenciais para mitigar a desigualdade de
renda, uma das vergonhosas marcas latino-americanas, que "mancha nossa
reputação ao redor do mundo", na opinião de García. Conforme ele diz no
relatório, "se nossas crianças não tiverem a oportunidade de estudar,
será mais difícil acumular o capital humano necessário para transformar a
produção e realizar as mudanças estruturais de que precisamos".
É uma constatação óbvia. Em recente pesquisa do Fórum sobre formação
de capital humano, o Brasil aparece em situação pior do que a da
Venezuela e da Bolívia no que diz respeito à educação. Isso significa
que, enquanto não levar realmente a sério esse problema, o Brasil terá
muito mais dificuldade para superar a desigualdade que tanto atrasa a
América Latina e continuará a depender de políticas assistencialistas
para incluir grande parte dos brasileiros no mercado consumidor.
A educação precária aparece, na pesquisa do Fórum, como o terceiro
principal desafio da América Latina para 2014, depois da disparidade de
renda e do baixo crescimento econômico. A entidade salienta que qualquer
plano de melhoria educacional deve privilegiar o ensino de tecnologia,
já que é isso o que determinará a riqueza dos países no futuro.
O problema, diz García, é obter "um consenso entre governo e
sociedade para o desenvolvimento de uma agenda de longo prazo",
encorajando a diversificação da economia e a inovação tecnológica. Para
ele, é preciso que a América Latina copie o exemplo da Coreia do Sul,
que investiu pesadamente em educação. "Uma democracia tem de fazer
isso", disse o representante do Fórum.
Nada disso é possível, porém, se todas as ações de governo são
pautadas apenas pela eleição seguinte. Como a política em diversos
países latino-americanos parece reduzida a uma luta pela manutenção do
poder a qualquer custo, alimentada pelo fisiologismo e pela preservação
de privilégios imediatos, parece improvável que se alcance algum
concerto mínimo para formular tal agenda.
A esse propósito, é sintomático que um dos principais problemas da
América Latina destacados pelos analistas do Fórum tenha sido a "falta
de valores" de seus líderes.