Renegociar
dívidas com instituições financeiras, decidindo sobre as medidas
jurídico-administrativas para um melhor resultado, é atividade exclusiva
da advocacia. Assim, a 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª
Região
reformou sentença
que julgou improcedente uma ação ajuizada pela seccional da Ordem dos
Advogados do Brasil em Santa Catarina contra um site que
promove revisões de contratos bancários na região de Blumenau.
O
colegiado baseou-se no Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/1994, artigo 1º,
inciso II), segundo o qual as atividades de consultoria, assessoria e
direção jurídica são privativas de advogado. Com a decisão, o site não
pode mais captar clientes para negociações com instituições financeiras
nem fazer propaganda que envolva qualquer atividade da advocacia. Por
fim, têm retirar a menção a tais atividades dos materiais publicitários e
do contrato de prestação de serviços.
Para o relator do recurso,
desembargador Cândido Alfredo Silva Leal Junior, o processo mostra que o
site presta um serviço de consultoria e assessoria jurídica, já que
aconselha e auxilia como proceder para alcançar a renegociação da dívida
e a quitação do contrato bancário. Para isso, o site lida com figuras
jurídicas como endividamento, quitação, juros excessivos, busca e
apreensão, ação revisional e reconvenção, por exemplo.
“O próprio
contrato de prestação de serviços prevê uma autorização que permite ao
negociador contratar advogado em nome do seu cliente, para adotar as
medidas judiciais cabíveis, mas quem faz essa análise quanto à
necessidade ou não de ajuizamento de ações e qual caminho será feito
para obter a renegociação é o próprio negociador, do que se depreende
que é prestada uma consultoria jurídica”, observou o relator.
O
mais grave, segundo o desembargador, é que os advogados vêm sofrendo
concorrência de empresas que não se submetem a nenhum tipo de
fiscalização profissional. “Pode qualquer pessoa renegociar sua dívida?
Pode. Pode qualquer pessoa oferecer serviços de renegociação, com
análise global da situação jurídica do contrato, ou seja das cláusulas,
dos encargos e da necessidade ou não de ingressar com ação judicial etc?
Não pode. Porque existe uma profissão devidamente regulamentada para
tanto, que é de advogado”, concluiu em seu voto. O acórdão foi lavrado
na sessão de 14 de dezembro.
Enxurrada de denúncias
A OAB-SC narra, na inicial, ter recebido inúmeras reclamações e pedidos
de providência contra o site. As denúncias dão conta de que a empresa
(que atua em vários municípios de Santa Catarina e Paraná) faz captação
de clientela de forma comercial, com publicidade agressiva, na
tentativa de persuadir o consumidor a aderir aos serviços oferecidos.
Nos
documentos apresentados no processo, a OAB-SC indicou que a empresa e
seus responsáveis promovem publicidade de alto teor emocional, pelos
mais diversos meios de comunicação de massa, dentre os quais outdoors, programas de rádio e telemarketing. Além de prometer vantagens nas negociações envolvendo dívidas, garante 100% de solução para os inadimplentes.
Agindo
desta forma, denuncia a OAB-SC, os demandados incorrem na prática da
advocacia extrajudicial. E pior: vinculam ilegalmente a prestação dos
serviços à contratação de advogados, mediante contrato imposto ao
cliente, que acaba acreditando na propaganda. Tais práticas transformam a
advocacia num “balcão de negócios”, afrontando dispositivos do Código
de Ética e Disciplina da OAB, que proíbe a divulgação de serviços
privativos de advogados por meios de panfletos publicitários e
comunicados, bem como em conjunto com outras atividades.
Outro lado
Ouvida em juízo, a empresa negou todas as acusações: não faz captação de
clientela, não exerce ilegalmente a advocacia, não garante 100% de
êxito na resolução de seus contratos, não obriga os clientes a contratar
advogados por ela indicados, não causa prejuízo aos consumidores de
seus serviços nem faz propaganda enganosa. É que os cartazes expostos em
suas lojas informam claramente que seus profissionais não são advogados
nem se identificam como tal.
Na contestação, o site ainda
esclareceu que é apenas um portal eletrônico, com servidor próprio, que
oferece serviços para a redução de dívidas de clientes que fizeram
contratos com bancos. A empresa foi idealizada para resolver litígios
bancários de forma extrajudicial, ciente de que não interessa às
instituições financeiras discutir seus créditos por longos anos na
Justiça. Ou seja, como o foco do trabalho é a negociação administrativa
para recuperação de créditos, não tem pretensão nem atua na área
judicial.
“A autora está perseguindo de forma desleal e implacável
uma empresa que gera empregos, paga impostos, dá satisfação aos seus
clientes, auxilia o Judiciário na resolução extrajudicial de conflitos
e, inclusive, propicia à classe de advogados trabalho, pois sempre que
necessita de intervenção judicial as requeridas contratam advogados
regularmente inscritos na OAB, pagando os honorários desses valorosos
profissionais”, defende-se na peça de contestação.
Simples intermediação
Em primeiro grau, a juíza Rosimar Terezinha Kolm, da 1ª Vara Federal de
Blumenau, julgou improcedente a Ação Ordinária ajuizada pela OAB
catarinense, por entender que as rés se valem da “intermediação
extrajudicial de financiamentos atrasados” para solucionar os conflitos
de seus clientes — atividade perfeitamente lícita. Ou seja, prestam
serviços, mas não jurídicos. Os materiais de propaganda, segundo apurou
no curso do processo, deixam claro que o objetivo é conseguir descontos
na quitação de contratos financeiros inadimplentes.
“É certo que,
por vezes, a fase extrajudicial não alcança o objetivo dos clientes dos
réus, ocasião em que os réus valem-se do ajuizamento de ações de revisão
contratual (...). No entanto, esse redirecionamento não configura
exercício ilegal da advocacia nem captação de clientela de serviços
judiciais como quer fazer crer a autora. Caso fosse assim, os mais
diversos segmentos também estariam usurpando a atividade privativa dos
advogados e também promovendo a captação de clientela”, justificou na
sentença.
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http://www.conjur.com.br/2017-jan-28/assessorar-endividado-junto-banco-atividade-privativa-advogado