Obra da empreiteira Odebrecht em Itaguaí, em 7 de abril de 2017 - AFP/Arquivos
O pedido de recuperação judicial feito pela Odebrecht SA
nesta segunda-feira, 17, na 1ª Vara de Falências e Recuperação Judicial,
marca o declínio um dos maiores conglomerados empresariais brasileiros,
com origem na construção pesada e negócios que foram dos segmentos de
petróleo e petroquímica a concessão de serviços públicos e etanol. Com
dívidas de R$ 98,5 bilhões, incluindo os empréstimos intercompanhias, a
empresa – que já foi símbolo da bonança da economia brasileira – agora é
responsável pela maior recuperação judicial da história do País.
Desde que virou um dos pivôs do maior escândalo de corrupção do
Brasil, a Operação Lava Jato, o conglomerado vem sofrendo um revés atrás
do outro. Nos últimos quatro anos, os contratos minguaram e a dívida
ficou grande demais para o novo tamanho do grupo baiano, que não teve
outra alternativa a não ser recorrer à Justiça para se proteger do
ataque de alguns credores.
O pedido feito na segunda inclui 21 companhias não operacionais, como
a Kieppe e a ODBinv – controladoras da Odebrecht -, que eram
garantidoras de dívidas de outras companhias do grupo. As empresas
operacionais, como Engenharia e Construção, Enseada, Transport e OR
(braço imobiliário do grupo), ficaram de fora da recuperação, segundo
comunicado da empresa. Desta forma, elas continuarão renegociando suas
dívidas separadamente.
Dos R$ 98,5 bilhões de dívidas, R$ 51 bilhões serão de fato
renegociados com os credores em assembleia; R$ 33 bilhões são de
empréstimos intercompanhias; e R$ 14,5 bilhões são alienação fiduciária –
boa parte referente a dívidas garantidas com ações da Braskem. Segundo
especialistas, embora esse montante esteja fora da recuperação judicial,
os credores poderão aderir ao processo posteriormente. Isso significa
que, no total, R$ 83,6 bilhões poderão ser renegociados no âmbito
judicial.
O pedido feito pela Odebrecht começou a ganhar mais força na semana
passada. A empresa tentava de todas as formas escapar de uma recuperação
judicial para evitar a destruição de valor da empresa. Mas, com a
pressão feita pela Caixa Econômica Federal nas últimas semanas, o grupo
sucumbiu à necessidade de recorrer à Justiça. Ontem, antes de seguir
para o Fórum, em São Paulo, advogados e executivos do grupo ficaram
reunidos durante boa parte do dia. O despacho com o juiz estava marcado
para as 16 horas. Quase 50 minutos depois, o pedido já havia sido
protocolado pelo escritório E. Munhoz.
Caixa. A gota d’água para o grupo foi o início do pedido de
execução de uma dívida do Itaquerão (estádio do Corinthians) pela Caixa.
Desde que a Atvos – empresa de açúcar e álcool da Odebrecht – entrou em
recuperação judicial no mês passado, o banco iniciou uma campanha para
executar as garantias das dívidas do grupo. O objetivo da Caixa era
conseguir ações da Braskem para reduzir sua exposição ao grupo. Dos
bancos credores, apenas Caixa e o Banco Votorantim não têm seus créditos
junto ao grupo cobertos por ações da petroquímica. A exposição da Caixa
na Odebrecht supera R$ 2 bilhões.
O problema é que, para dar ações da Braskem, a Odebrecht precisaria
do aval dos demais bancos detentores de papéis. Além disso, como as
ações caíram, o valor da Braskem é insuficiente para cobrir dívidas. Ou
seja, para a Caixa ter as ações, outro credor precisaria ceder parte de
suas garantias (ver ao lado).
Além de Caixa, Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
(BNDES), Banco do Brasil, Fundo de Investimento do FGTS (FI-FGTS),
Bradesco, Itaú e Santander são os maiores credores do grupo. Segundo
fontes próximas as negociações, quase todas as instituições estavam
dispostas a chegar a um acordo com a empresa, com exceção da Caixa.
O banco tem iniciado um processo para devolução de recursos para o
Tesouro Nacional. A expectativa da instituição é devolver cerca de R$ 20
bilhões até o fim do ano, o que tem feito o presidente da Caixa, Pedro
Guimarães, endurecer as negociações – o executivo tem sido irredutível e
quase atrapalhou a venda de ativos da Odebrecht.
Em nota, o grupo afirmou que tem adotado uma série de medidas para
cumprir seus compromissos, como redução de despesas e melhor governança.
Também vendeu vários ativos para faze caixa. No total, foram o grupo se
desfez de R$ 7,2 bilhões em três anos.
No auge, em 2015, a companhia chegou a faturar R$ 132 bilhões,
segundo o pedido de recuperação judicial. Mas, da mesma forma que as
receitas aumentaram, a dívida também cresceu. Entre 2008 e 2015, época
dos megaempreendimentos dos governo Lula e Dilma Rousseff, o
endividamento total do grupo saltou de R$ 18 bilhões para R$ 110
bilhões. O número de funcionários alcançou 193 mil trabalhadores.
“Hoje são 48 mil postos de trabalho em consequência da crise
econômica que frustrou muitos dos planos de investimentos feitos pela
Odebrecht e do impacto reputacional pelos erros cometidos”, disse o
presidente do grupo, Luciano Guidolin, em comunicado. No ano passado, o
grupo já havia passado por uma grande renegociação, que terminou com
aporte de R$ 2,6 bilhões no grupo.
Mas o fôlego durou pouco. No fim de 2018, a construtora Odebrecht
deixou de pagar uma dívida de R$ 11 milhões e passou a despertar a
desconfiança dos credores. Hoje, a construtora está em renegociação de
US$ 3 bilhões com detentores de títulos da empreiteira. No mês passado,
foi a vez da Atvos entrar em recuperação judicial depois que um credor
entrou na Justiça e conseguiu o arresto de parte da produção da empresa.
Para completar o conjunto de más notícias, a holandesa LyondellBasell
desistiu de comprar a Braskem, o que daria fôlego para a Odebrecht.
Agora com a recuperação judicial, o grupo tem 60 dias para apresentar o
plano para os credores.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.