A decisão do Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central (BC) de manter a taxa de juros em 15% ao ano
na quarta-feira, 9, veio, mais uma vez, acompanhada do comentário de
que o cenário uma política monetária “em patamar significativamente
contracionista por período bastante prolongado”.
Uma
parte do mercado apostava em um corte já na próxima reunião, no final
de janeiro do ano que vem, expectativa que foi reforçada após o
presidente do BC, Gabriel Galípolo, afirmar em um evento que a expressão não é “zerada” a cada nova reunião,
já que ela aparece nos últimos comunicados, dando margem ao
entendimento de que o ‘período bastante prolongado’ poderia estar
chegando ao fim.
Essa aposta em janeiro também ganhou reforço com
os dados mais recentes do IPCA (Índice de Preços ao Consumidor – Amplo),
índice que mede a inflação oficial do país. Na própria quarta-feira, o
IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgou que o IPCA acumulou nos 12 meses até novembro alta de 4,46%. A taxa em 12 meses foi abaixo do teto da meta pela primeira vez em pouco mais de um ano.
Na
medição anterior, o IPCA marcava 4,15% no ano e a 4,50% em 12 meses.
Além disso, a mais recente pesquisa Focus do BC apontava a expectativa
do mercado para a inflação diminuindo, com projeção de que o índice
encerre este ano com alta de 4,40%. A meta é de 3% ao ano, com margem de
1,5 ponto percentual para mais ou para menos.
A taxa de juros é a
principal ferramenta de política monetária para controle da inflação.
Em geral, patamar mais alto dos juros esfria a atividade econômica e
reduz a trajetória de alta dos preços.
Mas
o comunicado que acompanhou a decisão dessa quarta-feira reforça agora a
aposta daqueles que apostavam no início do afrouxamento nos juros só
partir da segunda reunião de 2026, em março. Em geral, analistas
consideraram que o tom do Copom foi mais duro (hawkish) do que se
esperava, já que a expectativa era de que o Copom deixasse já aberta a
possibilidade de corte de juros para os próximos meses.
“Mas ele
não fez isso. Pelo contrário. Esse tom duro joga para março a
possibilidade de corte. Isso faz com que aquela chance de cortar os
juros na próxima reunião de janeiro, fique descartada. Primeiro o Comitê
vai ter que, na reunião de janeiro, precisar ajustar o discurso, e vai
ter que justificar essa possibilidade de corte de juros para mais para
frente, para março”, afirma Marcelo Bolzan, planejador financeiro e
sócio da The Hill Capital.
Outro ponto está na
avaliação do Comitê sobre o cenário doméstico, principalmente a
inflação, que ainda segue resiliente no setor de serviços. Apesar de
reconhecer que a inflação cheia recuou, o grupo pontua que o IPCA,
índice oficial que mede a inflação do país, ainda segue acima do centro
da meta, que é de 3%, podendo atingir até 4,5% em 12 meses.
“A
meta não é a banda superior. A banda foi feita para que, dado que (a
inflação) oferece flutuações… criou-se um ‘buffer’ para amortecer
eventuais flutuações. Mas de maneira nenhuma a meta é de 4,5%”, afirmou Galípolo
durante audiência na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado no
final de novembro. “Tenho que perseguir uma meta de inflação de 3%”,
reforçou o chefe do BC.
“Por mais que exista o reconhecimento de
um avanço no arrefecimento da atividade, na queda da inflação, a
estratégia do Banco Central permanece a mesma. Existe um reconhecimento
de que as coisas estão acontecendo na direção necessária. A nossa
conclusão é de que a comunicação do BC vai na direção de que cortes de
juros somente a partir de março de 2026”, diz Rafael Cardoso,
economista-chefe do Daycoval.
Detalhes da comunicação
Os
analistas também apontaram para ‘ajustes marginais’ no texto do
comunicado em relação ao anterior, mas que, apesar de mudanças sutis,
passam informações importantes para a leitura sobre as considerações do
Comitê.
“Houve ajustes marginais na sinalização, com a introdução
da noção de ‘integral’ ao falar em ‘estratégia em curso’, e a troca de
‘suficiente’ por ‘adequada’, o que sugere maior confiança na estratégia
[de juros mais elevados]”, aponta Natalie Victal, economista-chefe da SulAmerica Investimentos.
“A substituição do termo ‘suficiente’ por ‘adequada’ não é trivial, reforça José Márcio Camargo, economista-chefe da Genial Investimentos.
“Na reunião anterior, o Comitê entendia que 15% era suficiente. Agora,
considera que este é o nível que deve ser mantido — o patamar adequado —
sem sugerir a necessidade de elevação adicional. O balanço de riscos
foi reiterado integralmente, sem qualquer alteração, mantendo a
avaliação que sustenta a taxa de juros em 15% ao ano”, afirma.
Para
Camargo, o tom geral do comunicado é firme e indica, “com clareza”, que
é muito pouco provável que o processo de redução da taxa de juros tenha
início em janeiro. “Como não houve qualquer indicação nesse sentido, o
cenário mais provável é de que o ciclo possa começar em março — desde
que, em janeiro, o Comitê dê sinais de que essa será a data adequada”.
O que diz quem pensa diferente
A economista-chefe do Inter, Rafaela Vitoria, diverge dos pares quando podem começar os cortes, assim como a economista do BTG Pactual, Iana Ferrão, e veem a possibilidade já na próxima reunião em janeiro.
“O
Comitê tem reiterado que a decisão de janeiro será orientada pelo
conjunto de dados a ser divulgado até lá. Nosso cenário prospectivo
contempla continuidade da desaceleração da atividade [econômica], já
evidente nos segmentos mais cíclicos, bem como moderação adicional do
mercado de trabalho e dos núcleos de inflação. Nesse contexto,
entendemos que as condições para o início da flexibilização estarão
dadas em janeiro de 2026”, diz Ferrão.
Rafaela Vitoria, do Inter,
também mantém a expectativa de início da flexibilização a partir de
janeiro de 2026, mas condicionada a uma evolução positiva do cenário,
que seria de nova queda da inflação nos próximos meses. “Com a atividade
desacelerando, deve resultar em novas revisões de baixa das
expectativas e abrir espaço para o início dos cortes no começo de 2026.”
Leia a íntegra do comunicado do Copom
O
ambiente externo ainda se mantém incerto em função da conjuntura e da
política econômica nos Estados Unidos, com reflexos nas condições
financeiras globais. Tal cenário exige cautela por parte de países
emergentes em ambiente marcado por tensão geopolítica.
Em
relação ao cenário doméstico, o conjunto dos indicadores segue
apresentando, conforme esperado, trajetória de moderação no crescimento
da atividade econômica, como observado na última divulgação do PIB,
enquanto o mercado de trabalho mostra resiliência. Nas divulgações mais
recentes, a inflação cheia e as medidas subjacentes seguiram
apresentando algum arrefecimento, mas mantiveram-se acima da meta para a
inflação.
As expectativas de inflação para 2025 e 2026
apuradas pela pesquisa Focus permanecem em valores acima da meta,
situando-se em 4,4% e 4,2%, respectivamente. A projeção de inflação do
Copom para o segundo trimestre de 2027, atual horizonte relevante de
política monetária, situa-se em 3,2% no cenário de referência (Tabela
1).
Os riscos para a inflação, tanto de alta quanto de
baixa, seguem mais elevados do que o usual. Entre os riscos de alta para
o cenário inflacionário e as expectativas de inflação, destacam-se (i)
uma desancoragem das expectativas de inflação por período mais
prolongado; (ii) uma maior resiliência na inflação de serviços do que a
projetada em função de um hiato do produto mais positivo; e (iii) uma
conjunção de políticas econômicas externa e interna que tenham impacto
inflacionário maior que o esperado, por exemplo, por meio de uma taxa de
câmbio persistentemente mais depreciada. Entre os riscos de baixa,
ressaltam-se (i) uma eventual desaceleração da atividade econômica
doméstica mais acentuada do que a projetada, tendo impactos sobre o
cenário de inflação; (ii) uma desaceleração global mais pronunciada
decorrente do choque de comércio e de um cenário de maior incerteza; e
(iii) uma redução nos preços das commodities com efeitos
desinflacionários.
O Comitê segue acompanhando os
anúncios referentes à imposição de tarifas comerciais pelos EUA ao
Brasil, e como os desenvolvimentos da política fiscal doméstica impactam
a política monetária e os ativos financeiros, reforçando a postura de
cautela em cenário de maior incerteza. O cenário segue sendo marcado por
expectativas desancoradas, projeções de inflação elevadas, resiliência
na atividade econômica e pressões no mercado de trabalho. Para assegurar
a convergência da inflação à meta em ambiente de expectativas
desancoradas, exige-se uma política monetária em patamar
significativamente contracionista por período bastante prolongado.
O
Copom decidiu manter a taxa básica de juros em 15,00% a.a., e entende
que essa decisão é compatível com a estratégia de convergência da
inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante. Sem
prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de
preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível
de atividade econômica e fomento do pleno emprego.
O
cenário atual, marcado por elevada incerteza, exige cautela na condução
da política monetária. O Comitê avalia que a estratégia em curso, de
manutenção do nível corrente da taxa de juros por período bastante
prolongado, é adequada para assegurar a convergência da inflação à meta.
O Comitê enfatiza que seguirá vigilante, que os passos futuros da
política monetária poderão ser ajustados e que, como usual, não hesitará
em retomar o ciclo de ajuste caso julgue apropriado.
Votaram
por essa decisão os seguintes membros do Comitê: Gabriel Muricca
Galípolo (presidente), Ailton de Aquino Santos, Diogo Abry Guillen,
Gilneu Francisco Astolfi Vivan, Izabela Moreira Correa, Nilton José
Schneider David, Paulo Picchetti, Renato Dias de Brito Gomes e Rodrigo
Alves Teixeira.
