O Supremo Tribunal Federal decidiu nesta quarta-feira (9/3), por maioria, que membro do Ministério Público não pode ocupar cargo político no âmbito do Executivo, como o de ministro de Estado e secretário. O Plenário acompanhou o voto do relator, ministro Gilmar Mendes, no julgamento da arguição de descumprimento de preceito fundamental com pedido cautelar proposta pelo Partido Popular Socialista (PPS).
A sigla questionava especificamente a nomeação do procurador do MP baiano Wellington César Lima e Silva para o cargo de ministro da Justiça, mas o julgamento foi transformado, após acordo entre os ministros, em definitivo e de mérito. Na prática, o recém-empossado ministro nomeado pela presidente Dilma Rousseff deverá deixar o cargo, a não ser que peça exoneração do MP. Até agora, Lima e Silva pediu só o afastamento do cargo de procurador.
Para o relator, a situação é inconstitucional mesmo nos casos em que não há contestação judicial. Gilmar Mendes afirmou também que resoluções do Conselho Nacional do Ministério Público que permitem essa situação contrariam a jurisprudência já firmada pelo tribunal, desde 2007, de que o texto constitucional proíbe promotores e procuradores de assumirem cadeiras de ministro, secretário ou chefe de missão diplomática.
Os membros do MP que exercem função no Executivo, seja federal, estadual ou municipal, têm 20 dias para pedir a exoneração do cargo. Segundo o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, há atualmente ao menos 17 membros do MP exercendo a função de secretário estadual, em pastas como a de Meio Ambiente e da Segurança Pública. O dado, segundo ele, é preliminar. O memorial da Advocacia-Geral da União fala em 22.
“O exercício de funções fora do âmbito do MP é vedado aos promotores e procuradores. Como não há cargo sem função, promotores e procuradores não podem exercer cargos na administração pública, fora da instituição. Os cargos de ministro de Estado e secretário não são exceções. A exceção única está expressamente enunciada e recai sobre funções de magistério”, disse Gilmar Mendes.
O ministro Luís Roberto Barroso afirmou que a função de ministro ou secretário do Executivo é de governo, que exige lealdade, diferente da de Estado, como a do membro do MP, que pressupõe distanciamento e independência. Lembrou que os membros do MP podem ajuizar ações civis públicas e que seria “péssima a suposição” de que essas possam estar ligadas a qualquer tipo de interesse político. “A simples dúvida de que possa haver motivação política para a proposição da ação é grave.”
O ministro Marco Aurélio foi voto vencido e não conheceu da ADPF, apesar de concordar com a vedação. Para os ministros, porém, a ação merecia ser conhecida, porque havia questão constitucional importante que precisava ser resolvida. Para o vice-decano, a ação tinha “endereço certo”, ou seja, “fulminar” um ato do Poder Executivo, não sendo cabível a propositura de uma ADPF.
No entendimento do ministro, o partido utilizou indevidamente “uma ação nobre que deveria ser reservada para situações de repercussão maior”. Esse argumento foi usado também pelo ministro José Eduardo Cardozo em sua estreia no STF como advogado-geral da União. “Não se trata apego à formalidade, mas sim aos cânones dos preceitos processuais. O legislador não queria que a ADPF virasse remédio genérico”, disse o ex-ministro da Justiça, que defendeu a legalidade da posse do nomeado para substituí-lo no cargo que exerceu até o último dia 2.
O ministro Marco Aurélio lembrou que foi ajuizada uma ação popular, a mais apropriada para a situação, diz, questionado a nomeação, recebida pela 1ª Vara Federal de Brasília, mas cassada em seguida pelo presidente do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, desembargador federal Cândido Ribeiro. A ação popular, com pedido liminar, foi apresentada pelo deputado federal Mendonça Filho (DEM-PE).
O advogado do PPS, Renato Campos Galuppo, reafirmou que a Constituição não permite aos membros do MP exercício de função estranha ao parquet, exceto uma de magistério. Disse que não concorda com argumento de que outro tipo de ação poderia ter sido proposta. “Trata-se de ato de poder público que viola preceito fundamental.”
O advogado lembrou que a Constituição de 1988 retirou o MP da influência de qualquer poder, inclusive do Judiciário, cabendo a um acusar, e ao outro, julgar. A nomeação de um membro do MP para ministro de Estado violaria, segundo ele, o princípio da independência funcional do parquet, além de ferir o princípio de que não pode haver subordinação entre os entes federados. No caso concreto, diz, haveria uma supremacia de um ente em relação ao outro porque a presidente “mandaria” em um procurador estadual.
Clique aqui para ler o voto, sem revisão, do ministro Gilmar Mendes.
ADPF 388