Ministro afirma que problemas na BR-163 fazem com que
soja fique ‘micada’ no País; produtores estimam prejuízos em R$ 350
milhões.
Bastou chover um pouco mais que o esperado e parte da
supersafra brasileira de soja corre o risco de “micar” no País sem
conseguir chegar aos portos. Ela está encalhada nos 100 km não
asfaltados da BR-163, a rodovia que é hoje a principal ligação entre uma
grande zona produtora do grão, no Mato Grosso, e os portos do Norte do
País.
“Dinheiro que estava na mesa, de uma grande colheita, está indo
para o ralo, nos buracos das estradas”, lamentou o ministro da
Agricultura, Blairo Maggi. “Dá pena de ver.”
Ele informou que 11
navios que estavam no Porto de Belém esperando carga de soja já foram
desviados para portos do Sul do País. Os produtores tiveram prejuízo de
US$ 6 milhões só com a “demurrage”, a taxa paga pela permanência das
embarcações. A carga desviada, por sua vez, poderá sobrecarregar portos
como Santos (SP) e Paranaguá (PR).
No total, o setor estima que o
prejuízo nessa safra será de R$ 350 milhões, segundo informou o
presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais
(Abiove), Carlo Lovatelli.
“Estamos queimando notas de cem dólares, uma
atrás da outra”, afirmou o executivo.
Segundo Maggi, o produtor que
vende a soja precisa entregá-la no prazo, no local definido pelo
comprador.
Diante do atraso no escoamento da produção local, a
alternativa é, muitas vezes, adquirir soja de outros países produtores,
como Estados Unidos e Argentina, para honrar o contrato.
“E aquela
soja brasileira que iria para esse comprador fica ‘micada’ aqui”,
explicou o ministro, um dos maiores produtores de soja do País.
Maggi
e o ministro dos Transportes, Maurício Quintella, se reuniram ontem com
representantes dos produtores para discutir a situação na BR-163. Eles
acertaram um esquema pelo qual será reduzido o envio de caminhões para a
rodovia, de forma que será possível manter as condições de tráfego.
A
estrada será aberta para a passagem de caminhões por períodos. Depois, o
trânsito será interrompido para que as máquinas do Departamento
Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) possam aplainar
novamente a pista. E assim sucessivamente, num esquema “stop and go”.
Fila
Nesta
quinta-feira, 2, 1,2 mil caminhões, numa fila de 40 km, no Pará,
aguardavam autorização para seguir viagem pela rodovia no sentido norte.
A pista já havia sido aberta para automóveis de passeio e caminhões com
carga perecível. A expectativa era permitir o trânsito de caminhões
pesados na quinta-feira mesmo.
Com isso, a fila poderá acabar em cerca
de dois dias, se o clima colaborar.
A pista no sentido sul já está
aberta e não há mais filas. Mas, para chegar a essa situação, foi
necessário buscar ajuda do Exército para desfazer a aglomeração de
veículos na via e permitir a passagem das máquinas do Dnit. Até o
carnaval, a via estava bloqueada, com uma fila gigantesca.
Para
socorrer os caminhoneiros e famílias que estão há dias parados nas
estradas, e também as comunidades isoladas, o Exército vai distribuir 3
mil cestas básicas e água. O primeiro carregamento chegou ontem ao
local.
“A prioridade do governo é garantir o escoamento pelo Arco
Norte”, disse Quintella, referindo-se aos portos no Norte do País. Ele
lamentou o “gargalo” na BR-163 e informou que o asfaltamento dos 100 km
que estão faltando já está contratado. A expectativa é que sejam
asfaltados 60 km este ano e outros 40 km no ano que vem.
Ferrovia deve ser saída para atoleiros
O
governo deverá anunciar, na próxima terça-feira, a data em que será
leiloada a concessão da Ferrogrão, uma ferrovia de 1.142 km que correrá
paralela à BR-163, no trecho entre Sinop, na região produtora de grãos
do Mato Grosso, e o porto fluvial de Miritituba (PA). É nesse percurso,
crítico para a exportação de soja e milho, que caminhões estão parados
há mais de uma semana por falta de condições de tráfego na pista, que
não é asfaltada.
“É a solução definitiva”, disse o presidente da
estruturadora Estação da Luz Participações (EDLP), Guilherme Quintella.
Ele foi responsável pelos estudos técnicos para a construção da linha
férrea que servirão de base para a elaboração do edital do leilão. “A
Ferrogrão consolida, de forma definitiva, a competitividade da produção
do Mato Grosso”, disse o consultor.
A ferrovia está na carteira do
Programa de Parcerias de Investimento (PPI), mas é uma iniciativa das
próprias tradings. Elas elaboraram o projeto e o apresentaram ao governo
em 2014, informando estarem dispostas a investir em sua construção. São
sócias nesse projeto: Amaggi, ADM, Bunge, Cargill, Dreyfus e a EDLP. A
estimativa é que a linha custará R$ 12,6 bilhões.
Embora tenham
elaborado o estudo e sejam as principais interessadas, não é certo que
elas serão as responsáveis pela ferrovia. Por ser uma concessão do
governo, o projeto será objeto de um leilão do qual poderão participar
outras empresas interessadas. Ganhará a que oferecer maior taxa de
outorga.
Quando estiver pronta, a Ferrogrão absorverá toda a carga
naquele eixo, apontam os estudos técnicos.
Ela deverá reduzir o custo do
frete de US$ 120,00 por tonelada para US$ 80,00 por tonelada. Mas a
construção da linha levará cinco anos.
Asfaltamento
Até lá, a
saída é concluir o asfaltamento da BR-163. Cálculos da Confederação
Nacional da Indústria (CNI) apontam que, com a conclusão da obra, a
economia chegará a R$ 1,4 bilhão / ano. Isso porque a rodovia
consolidará o uso dos portos do Norte para a exportação de grãos. Saindo
de lá, uma viagem de navio fica de três a cinco dias mais curta do que
as que se iniciam nos portos de Santos (SP) e Paranaguá (PR).
Pressionado
pelo congestionamento de caminhões na BR-163 e com a constatação de
que, por causa desse gargalo logístico, os produtores terão um prejuízo
de R$ 350 milhões nesta safra, o presidente Michel Temer criou ontem uma
força-tarefa para atuar na liberação do tráfego. O grupo é composto
pelas pastas da Casa Civil, Agricultura, Justiça, Defesa e Transportes,
Portos e Aviação Civil, segundo informou nota da presidência da
República.
A nota informa ainda que o tráfego no sentido norte, onde
estão parados os caminhões, deveria ser regularizado ainda ontem. As
Forças Armadas trabalham na distribuição de 3 mil cestas básicas e 46
toneladas de água para os caminhoneiros que ficaram retidos .
(O Estado de
S.Paulo, edições de 2 e 3/3/17)