terça-feira, 21 de setembro de 2021

Brasil sobe cinco posições no ranking mundial de inovação


País ainda está onze posições atrás de sua melhor colocação 
 
Produtividade no trabalho e gastos com software impulsionaram alta

Em ranking divulgado pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI), o Brasil ocupa a 57ª posição no Índice Global de Inovação (IGI) entre 132 países. O país subiu cinco posições em relação ao ano passado, mas está onze posições atrás de sua melhor colocação, 47º, alcançada em 2011. A classificação começou a ser publicada anualmente em 2007.

As principais fraquezas do país apontadas no ranking são formação bruta de capital, facilidade para abrir uma empresa, facilidade para obtenção de crédito e taxa tarifária aplicada. Os maiores avanços do Brasil em relação aos dados de 2020 se deram nos indicadores de crescimento da produtividade no trabalho e de gastos totais com software.

Na avaliação da Confederação Nacional da Indústria (CNI), a colocação brasileira é incompatível com o fato de o país ser a 12ª maior economia do planeta, em 2020, e com a realidade de ter um setor empresarial sofisticado.

Para o presidente da entidade, Robson Andrade, os investimentos em ciência, tecnologia e inovação são fundamentais para a competitividade do país no cenário internacional.

"Uma estratégia nacional ambiciosa, que priorize o desenvolvimento científico, tecnológico e a inovação para o fortalecimento da indústria, tornará a economia mais dinâmica, promovendo maior equidade e bem-estar social", afirmou.

O IGI é um dos principais instrumentos de referência para dirigentes empresariais, formuladores de políticas públicas e aos que buscam conhecimentos sobre a inovação no mundo. As diferentes métricas do ranking podem ser usadas para monitorar o desempenho de um país, comparando-o com economias da mesma região ou mesmo grupo de renda.

 

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Renda habitual do trabalhador teve queda de 6,6% no segundo trimestre

 

Os trabalhadores por conta própria tiveram o maior impacto 
 
O afastamento da ocupação atinge 16,2% dos trabalhadores, afetando mais de 13,5 milhões

Estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) revela que houve queda de 6,6% na renda habitual e aumento de 0,9% na renda efetiva do trabalhador brasileiro no segundo trimestre de 2021, na comparação com o mesmo trimestre do ano passado, o pior momento do mercado de trabalho durante a pandemia.

O levantamento Retrato dos Rendimentos e Horas Trabalhadas durante a Pandemia tomou como base os resultados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad Contínua) e da Pnad Covid, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Segundo a análise do Ipea, os trabalhadores por conta própria tiveram o maior impacto em suas rendas, com crescimento de 19,5% na renda efetiva no segundo trimestre de 2021, na comparação com o mesmo trimestre de 2020.

No segundo trimestre deste ano, eles receberam 76% do habitual. Os trabalhadores com carteira do setor privado tiveram aumento de 2% na renda efetiva, enquanto para os trabalhadores sem carteira, a alta foi de 6,9%.

"A análise mostra que, apesar da melhora nos rendimentos no segundo trimestre deste ano, a recuperação ainda é lenta. O afastamento da ocupação atinge 16,2% dos trabalhadores, afetando mais de 13,5 milhões", disse, em nota, o pesquisador do Ipea e autor do estudo, Sandro Sacchet.

A Região Nordeste foi a que teve a renda mais afetada pela segunda onda da pandemia, com queda de 2,6% na renda efetiva no segundo trimestre de 2021. Na análise por gênero, o crescimento da renda efetiva das mulheres (1,4%) foi superior ao dos homens (0,48%), no mesmo período.

De acordo com o estudo, apesar do grande número de domicílios sem renda do trabalho, no segundo trimestre de 2021 houve pequena redução nesse percentual, em relação ao primeiro trimestre deste ano, de 29,3% para 28,5%, o que demonstra lenta recuperação no nível de ocupação aos patamares anteriores à pandemia para as famílias de renda mais baixa.

A renda dos jovens adultos (entre 25 e 39 anos de idade) foi a mais afetada pela pandemia, com queda de 3,2% nos rendimentos efetivos reais médios no segundo trimestre deste ano. Em contrapartida, os rendimentos dos ocupados com mais de 60 anos de idade cresceram 1,3% no período, influenciados pela alta proporção de trabalhadores por conta própria nessa faixa etária.

 

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quarta-feira, 25 de agosto de 2021

Em queda na bolsa, Westwing arruma a casa com novos serviços e expansão de lojas físicas


Para ir além do mundo online, a plataforma de móveis e decoração vai ampliar sua rede de lojas físicas e sua malha logística, e prepara o lançamento de um serviço de design de interiores

A loja da Westwing no bairro da Vila Madalena, em São Paulo

Plataforma online de móveis e decoração, a Westwing abriu o capital em fevereiro deste ano na B3. Com a janela favorável, a empresa viu suas ações precificadas em R$ 13, perto do topo da faixa indicativa, e levantou R$ 1,16 bilhão, dos quais R$ 430,2 milhões foram diretamente para o seu caixa.

Mas os primeiros meses como empresa listada não têm sido fáceis. A companhia é um dos ativos cujas ações vêm se desvalorizando diante de um cenário com investidores menos propensos ao risco. A Westwing já tem, no entanto, uma estratégia arquitetada para começar a se sentir em casa no mercado de capitais.

O plano passa pelas ampliações do portfólio, da malha própria de logística e da sua rede de lojas físicas. “Estamos crescendo trimestre a trimestre e nunca tivemos tanto caixa como agora”, diz Andres Mutschler, CEO da Westwing, ao NeoFeed. “Vamos acelerar o core e pilares como o nosso mercado endereçável.”

Nessa última frente, a próxima novidade é um serviço de design de interiores, que será lançado em até quatro semanas. Inicialmente, ele estará restrito a poucos clientes. A Westwing quer testar e afinar o formato antes de estendê-lo a todo o mercado.

O serviço será acessado por meio de uma plataforma batizada de WestwingDesign. Nela, o cliente irá escolher o ambiente que deseja transformar e vai preencher um formulário com informações como estilo, principais referências e o que imagina para o projeto em questão.

Com uma base de profissionais de decoração parceiros, o modelo a ser validado envolverá, a princípio, três planos de comercialização: Mini, Max ou Max Plus. Todos eles, com pagamentos por projeto, a partir de R$ 100.

A compra dos itens envolvidos nos projetos contratados não estará ligada obrigatoriamente às plataformas e ofertas da Westwing. “Vamos abranger desde projetos mais simples, como reorganizar as prateleiras da casa, até aqueles mais completos, como a renovação de toda a decoração de um ambiente”, explica Mutschler.

Ainda sob a ótica do portfólio, a Westwing vai testar ofertas no segmento de automação residencial, a começar por itens como fechaduras eletrônicas. Na ampliação do sortimento, a prioridade segue sendo a categoria de lifestyle, com destaque para alimentos, chocolates e vinhos.

Hubs e lojas físicas

Os novos aportes também buscam colocar a Westwing, de fato, no mapa de todos os consumidores do País. Um dos movimentos está centrado na malha logística própria da empresa, batizada de Westlog e composta por um centro de distribuição e um hub em São Paulo.

Depois de abrir outro hub no Rio de Janeiro, em julho, a empresa vai colocar em operação mais um centro até o fim de 2021, em Brasília. Para 2022, estão previstos um quarto hub, em Belo Horizonte, no início do ano, e mais três estruturas, cujos locais estão em fase de definição.

A companhia quer começar a replicar os níveis alcançados na Grande São Paulo. No segundo trimestre, essa malha foi responsável por 89% das entregas na região, contra 8%, um ano antes. “Hoje, 75% desse mix já têm entregas no dia seguinte”, diz Mutschler.

Uma segunda via de ganho de capilaridade dará mais peso ao “tijolo e concreto”, um formato restrito atualmente à loja própria inaugurada em 2014, no bairro da Vila Madalena, zona oeste de São Paulo.

Até o fim de 2022, o plano é adicionar 15 novos pontos ao mapa de operações, com lojas, em média, de 500 metros quadrados. Duas estão prestes a ser inauguradas, em Ipanema e na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. O plano inclui uma terceira unidade na capital fluminense.

Nesse ano, outras duas lojas serão abertas em Brasília e em Campinas (SP). O plano para 2022 deve incluir a entrada nas regiões Nordeste, começando por Salvador (BA), e também nos estados do Sul do País, além de mais uma unidade na capital paulista, no bairro de Moema.

Andres Mutschler, CEO da Westwing

“Mesmo com a força do digital, na nossa categoria, quase 90% das vendas ainda estão no offline”, afirma Mutschler. “Além de impulsionar a própria plataforma e o conhecimento da marca, nas lojas físicas, os móveis têm 60% de participação nas vendas, contra 20% no online.”

A Westwing não é a única nativa digital do setor que está dando mais ênfase ao offline. A Mobly, por exemplo, anunciou recentemente o plano de acelerar sua expansão nessa área. Sob essa orientação, em julho, a empresa inaugurou uma megastore em Jundiaí (SP).

Até o fim do ano, a companhia prevê novidades nesse formato e também nos modelos de outlets e de franquias. A estratégia inclui, por exemplo, um outlet em Carapicuíba (SP) e mais três megastores, também na capital paulista.

Turbinada por um aporte captado em janeiro, de US$ 190 milhões, liderado pelo Softbank, quem também tem um plano agressivo é a MadeiraMadeira. A empresa planeja fechar 2021 com 120 Guide Shops, como são batizadas as suas lojas físicas.

“Todos esses players estão começando a perceber que o modelo de vender móveis e decoração, puramente online, ainda é difícil, complexo e pouco escalável”, diz Alberto Serrentino, sócio da consultoria Varese. “Nessa categoria, poder tocar e ver a ambientação do produto é essencial.”

Ações e rumores

O olhar mais atento para as lojas físicas não é o único traço que une a Westwing e a Mobly. Novatas na B3 – as empresas abriram capital com uma diferença de cinco dias, as duas operações vêm assistindo ao preço de suas ações despencar no mercado.

No caso da Westwing, o recuo desde o IPO foi de 41,3%. Avaliada em R$ 1,55 bilhão em sua oferta pública, hoje a empresa tem um valor de mercado de R$ 851 milhões. Nem mesmo os indicadores registrados no segundo trimestre foram capazes de impulsionar uma reação.

No período, a Westwing reportou um crescimento de 14,1% em seu GMV, para R$ 115,8 milhões, e um salto de 50,5% em sua receita líquida, para R$ 79,6 milhões. Já o número de compradores ativos teve alta de 55,7%, para 331,5 mil usuários.

No segundo trimestre, o GMV da Westwing cresceu 14,1%, para R$ 115,8 milhões

“Em geral, a bolsa como um todo está sendo impactada. Entretanto, as small caps de tecnologia estão, de fato, sofrendo mais”, diz Mutschler. “Mas esse fenômeno, em particular, está sendo puxado pelos investidores pessoa física, que ainda não estão acostumados com esse tipo de ativo.”

Além desse desempenho, outra questão recente colocou a Westwing sob os holofotes. Em reportagem publicada há duas semanas, o jornal Valor Econômico diz ter apurado a informação de que a companhia estaria buscando sócios para a sua operação. Entre os nomes que teriam sido procurados estão a Renner, dona da Camicado, e a Riachuelo.

Procurada pelo NeoFeed, a Renner afirmou por meio de sua assessoria de imprensa que não comenta rumores de mercado. Já a Riachuelo não se manifestou até o fechamento desta reportagem. Mutschler, por sua vez, ressalta:

“Como dissemos em um comunicado, estamos sempre monitorando oportunidades que podem envolver uma operação societária”, diz. “Mas não há nada de concreto. Nosso plano A é investir e executar aquilo que prometemos aos investidores no nosso IPO.”

 

Sic semper tyrannis - Quem defende golpe são "traidores da Constituição e da Pátria", diz Celso de Mello


Em editorial, o jornal O Estado de S. Paulo fez um alerta sobre os atos bolsonaristas convocados para o dia 7 de setembro. Segundo os próprios organizadores, o objetivo não é manifestar apoio ao presidente Jair Bolsonaro, nem sequer defender alguma posição política. Trata-se, isso sim, de invadir o Supremo Tribunal Federal e o Congresso.

U.DettmarCelso de Mello

"Vamos entregá-los (STF e Congresso) às Forças Armadas, para que adotem as providências cabíveis", disse um dos organizadores, que se apresenta como coronel Azim, em vídeo que circula nas redes sociais. 

"Ninguém pode ir a Brasília simplesmente para passear, balançar bandeirinhas, tampouco ficar somente acampado", advertiu o coronel Azim. No vídeo, menciona-se que a ação do dia 7 de setembro está sendo coordenada por alguns militares da reserva, com experiência em formar grupamentos de pessoas. "Vamos juntos adentrarmos no STF e no Congresso", disse, segundo reproduz em editorial o jornal O Estado de S.Paulo, nesta terça-feira (24/8).

Para o ex-presidente do Supremo Celso de Mello, "se tal intenção se confirmar, esse será, ainda que frustrado, um curioso atentado ao Estado democrático de Direito, com dia, hora e local previamente marcados e divulgados, fugindo à ortodoxia dos "pronunciamientos" clássicos da América Latina".

Segundo o ministro aposentado, "a repulsa do povo brasileiro a essa alegada (e irracional) tentativa de golpear as instituições da República e de instaurar um regime ditatorial entre nós deve servir de alerta e advertência a quem pretender praticar tão grave ilícito constitucional, considerado o que prescreve o artigo 5º, inciso XLIV , da Constituição".

Para Celso, "déspotas, seus epígonos e todos aqueles que pretendem instituir um projeto ditatorial de poder, não importando de quem se trate, merecem exemplar punição criminal, além do desprezo do Povo, pois são 'traidores da Constituição e da Pátria' e profanadores dos valores consagrados pela República erigida sob a égide do princípio democrático".

Leia abaixo a íntegra da manifestação de Celso:

"Os jornais noticiam que manifestantes, em gesto atrevido de sumo e insultuoso desrespeito à Constituição da República, pretenderiam promover, no "Dia da Pátria", convocação para um golpe de Estado, com data marcada, devendo esse ato com tal finalidade inconstitucional realizar-se no dia 07/09/2021, às 10h, na praça dos 3 Poderes, em Brasília (v. "O Estado de S.Paulo", editorial, p. 03, edição de 24/08/2021, v.g.)! Se tal intenção se confirmar, esse será, ainda que frustrado, um curioso atentado ao Estado democrático de Direito, com dia, hora e local previamente marcados e divulgados, fugindo à ortodoxia dos "pronunciamientos" clássicos da América Latina!!!! Tem-se notícia , porém, de que a importantíssima Revolução Mexicana de 1910 foi previamente anunciada no Plano de San Luis Potosí, redigido por Francisco Ignacio Madero, que conclamou o povo mexicano a insurgir-se contra a ditadura de Porfirio Diaz (denominada "Porfiriato") no dia 20 de novembro de 1910 , às 18h. A repulsa do povo brasileiro a essa alegada (e irracional) tentativa de golpear as instituições da República e de instaurar um regime ditatorial entre nós deve servir de alerta e advertência a quem pretender praticar tão grave ilícito constitucional, considerado o que prescreve o artigo 5º, inciso XLIV , da Constituição, que assim dispõe:
"XLIV — constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático"!
Essa — enfatize-se — uma das gravíssimas respostas penais aplicáveis aos insurgentes como consequência do ato ominoso cometido por quem ousar romper a integridade da ordem democrática e ferir a intangibilidade da Constituição da República! Déspotas, seus epígonos e todos aqueles que pretendem instituir um projeto ditatorial de poder, não importando de quem se trate, merecem exemplar punição criminal, além do desprezo do Povo , pois são "traidores da Constituição e da Pátria" e profanadores dos valores consagrados pela República erigida sob a égide do princípio democrático!!!
"Sic semper tyrannis"!!!"

 

 

 https://www.conjur.com.br/2021-ago-24/quem-defende-golpe-sao-traidores-constituicao-patria

Negócio de mais de R$ 3 bi dá nova musculatura à Uniasselvi


Com a compra da Unicesumar, a companhia passa a ter 635 mil alunos no EAD 
 
A universidade maringaense era cobiçada, pois possui cursos de ensino a distância de qualidade e graduação de medicina

A Uniasselvi, do grupo Vitru Educação, comprou a Unicesumar, instituição de ensino superior de Maringá, por um valor de até R$ 3,5 bilhões. De acordo com a companhia, a Unicesumar tem valor de mercado de R$ 3,2 bilhões, incluindo um valor de R$ 78 milhões de dívida líquida a ser ajustada na data de fechamento. A transação está sujeita às condições habituais de fechamento, como a aprovação pelo Cade.

A nova companhia passa a ter 635 mil alunos no ensino a distância e encosta na Kroton, líder do setor que, no período, tinha 695 mil estudantes nessa modalidade de aprendizado. A Cesumar era cobiçada, pois possui cursos de ensino a distância de qualidade (com nota máxima no MEC) e graduação de medicina. Os dois segmentos são os que mais crescem e ganharam ainda mais relevância na pandemia.

Com o acordo, o reitor da Unicesumar, Wilson Matos, se tornará o chanceler e vice-presidente do conselho da Vitru, e Weslley Silva, atual diretor de Relações Institucionais da Unicesumar, se tornará um membro do conselho. Além disso, Willian Mattos, chefe de Ensino a Distância (EAD) da instituição maringaense, será nomeado Co-CEO da Vitru e vai liderar a empresa juntamente com o nosso CEO, Pedro Graça.

 

 https://amanha.com.br/categoria/negocios-do-sul1/uniasselvi-compra-unicesumar-por-mais-de-r-3-bilhoes?utm_campaign=NEWS+DI%C3%81RIA+PORTAL+AMANH%C3%83&utm_content=Neg%C3%B3cio+de+mais+de+R%24+3+bi+d%C3%A1+nova+musculatura+%C3%A0+Uniasselvi+-+Grupo+Amanh%C3%A3+%283%29&utm_medium=email&utm_source=EmailMarketing&utm_term=News+Amanh%C3%A3+24_08_2021

'Lavajatistas esquentaram a cama para os reacionários deitarem', diz Christian Lynch



Por 

 

 

O lavajatismo foi uma expressão do judiciarismo, uma doutrina própria do liberalismo brasileiro segundo a qual é preciso apostar no Poder Judiciário como uma terceira força imparcial e defensora dos valores constitucionais para romper o domínio oligárquico ou autoritário. Em nome de uma suposta cruzada contra a corrupção, os lavajatistas descumpriram leis e torceram a jurisprudência. Porém, por ingenuidade e desconhecimento da política, foram usados por grupos conservadores e ajudaram reacionários a assumir o poder com o presidente Jair Bolsonaro. É o que afirma o professor Christian Edward Cyrill Lynch, do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

Segundo Lynch, houve uma "revolução judiciarista" nos últimos anos no Brasil, que passou a ser freada após o impeachment da presidente Dilma Rousseff. A "lava jato", a seu ver, tenderá a ser vista na história brasileira como um período de exceção. 

"É como se a gente tivesse derrubado o sistema sem derrubar formalmente. Com a diferença de que, hoje em dia, não dá mais para derrubar de verdade como antigamente, com tanques na ruas e colocando abaixo a Constituição."

Para o professor, o Supremo Tribunal Federal é o órgão mais importante do Brasil hoje. A corte assumiu o papel de defesa da democracia. Tanto que, a partir do próximo presidente, diz Lynch, o Judiciário deverá ser incorporado ao modelo de governabilidade. 

Com a derrocada da "lava jato", começou a recuperar força em estratos da classe média e do meio jurídico a ideia de que Direito não é fazer justiça com as próprias mãos.

"Os fins não justificam os meios, porque, no fim das contas, a luta pela liberdade republicana no Brasil colocou o poder nas mãos de um sujeito que vive ameaçando acabar com as liberdades democráticas do país. E aí passa a haver um processo de revalorização da política, especialmente do Legislativo", avalia Christian Lynch.

Leia a entrevista: 

ConJur — O que é a revolução judiciarista?
Christian Lynch —
Eu chamo de revolução judiciarista o movimento que começa na década de 1990. Há um movimento dentro do Direito, das faculdades de Direito, das pós-graduações em Direito, um movimento muito forte da virada do regime militar, da abertura para a Nova República, de reabilitação do Direito Constitucional como disciplina, de revalorização da disciplina. Há juristas como Paulo Bonavides, Luís Roberto Barroso, como Clèmerson Clève, Marcelo Cerqueira… Todos de alguma forma inspirados pelo Raymundo Faoro, autor de Os donos do poder, de que o Brasil tem uma história de desrespeito ao Estado Democrático de Direito e que os atores jurídicos têm um papel central nessa história de desrespeito, de inefetividade da Constituição e dos valores republicanos, democráticos e liberais.

No começo da Nova República, há uma organização em torno da nova Constituição para romper com esse cenário. A disciplina de Direito Constitucional tinha muito pouco prestígio na época, porque o regime militar se baseava nos atos institucionais, ignorando a Constituição. Nas faculdades de Direito, no primeiro dia de aula já se dizia: “Bom, temos um problema, porque o Direito Constitucional não existe no Brasil, então eu vou dar Direito Constitucional em tese, Teoria da Constituição”. E há tem uma reação forte a isso quando se tem a nova Constituição. Esse esforço para tentar impedir o retorno do autoritarismo aparece na Constituição. Há a introdução do controle concentrado de constitucionalidade, amplo acesso à Justiça, valorização enorme do Ministério Público e do Judiciário. Isso dá início a um movimento que começa na academia e isso vai mudando a mentalidade dos operadores jurídicos através dessa doutrina que passou a ser conhecida como a “doutrina da efetividade”. Ela valoriza o papel da jurisdição constitucional que a gente chama de neoconstitucionalismo ou de pós-positivismo, que empodera os juízes e promotores. Ou seja, empodera os operadores jurídicos responsáveis pela guarda da Constituição, dos valores constitucionais. Porque eles são responsáveis pela implementação dos valores constitucionais, dos princípios constitucionais. Assim, é preciso acabar com a distinção entre princípios e regras, é preciso acabar com a ideia de que existem regras que não são aplicáveis na Constituição. Passa-se a dizer que tudo é autoaplicável.

O inimigo dessa mentalidade é o político. Por dois motivos: porque o político é associado ao tipo de atividade descomprometida com os princípios da Constituição e sujeito a ser corrupto. E pelo seu “baixo nível” intelectual.

Com a ampliação do acesso à Justiça, o aumento de concursos, a valorização das carreiras públicas, vai sendo criada a ideia de que existe uma nova classe política no Judiciário e no Ministério Público. E isso era bem-visto, porque era progressista. E havia essa crítica em relação ao mundo da política. Porque as pessoas que saem da academia e se tornam professores de Direito, se tornam procuradores, promotores, juízes se consideram superiores intelectualmente aos políticos. Eles se veem como uma espécie de classe média alta esclarecida, que chegou ao poder pelo seu mérito próprio. Daí a centralidade dessa ideia do concurso.

Ao mesmo tempo, também no governo Fernando Henrique Cardoso, houve a difusão dos programas de pós-graduação. Teve uma reforma na Capes que gerou uma multiplicação de faculdades de Direito. Aí começou a se ter essa ideia também, que no Direito é muito forte: fazer mestrado, doutorado, é quase que uma insígnia que se coloca, uma comenda: “Fulano é doutor em Direito”. Aí também houve a ampliação dos quadros de Direito das universidades. Surge essa ideia do judiciarismo, de que cabe ao Judiciário salvaguardar os valores de democracia, liberdade e república. Só que o Judiciário nunca conseguiu efetivar isso pelo conjunto de diversos fatores entre a década de 1990 e a década de 2000.

ConJur — O que ocorreu com a classe política nesse período?
Lynch —
Primeiro ocorre o desaparecimento do Exército como uma espécie de moderador concorrente. Ao mesmo tempo, há a democratização e massificação da política no Brasil. Assim, o perfil do deputado médio vai se tornando cada vez mais parecido com o do eleitorado. Então, aquele perfil do político de elite, da UDN, grande orador, grande jurista vai desaparecer. E vão entrando os evangélicos, os comerciantes… Vão aparecer os políticos profissionais mesmo, que vivem só daquilo, que têm interesses paroquiais. Parece que existe em determinado momento uma disparidade entre essas duas classes.

E, ao mesmo tempo, se tem a ideia de que os partidos políticos estão entrando em crise. Isso é uma crise de representação. Com essa crise de representação, a participação suplementar do Judiciário e do Ministério Público é bem-vista por todo mundo na época. No Ministério Público, em particular, há a visão de que o órgão atua em nome da sociedade civil, o que lhe dá legitimidade política. Já os juízes têm legitimidade política para cumprir os valores da Constituição.

O sistema político era o presidencialismo de coalizão. Só que ele foi se esgarçando com o tempo. Ocorreu o episódio do mensalão. Mas a crise de legitimidade desse modelo foi adiada por causa do boom de commodities e por causa da habilidade política do presidente Lula. Mas quando o Lula deixou o poder, já havia uma sensação de que o Congresso estava cooptado, já havia essa história de centrão, de pemedebismo, esse negócio de que o sistema não representava ninguém, de que quem era eleito, era eleito através de um esquema que deixava o deputado ou senador cooptado ao interesse do governo.

ConJur — Com essa crise política, o que aconteceu com o Judiciário?
Lynch —
Aí aconteceu uma coisa curiosa, porque o Judiciário nunca teve tanta força como nessa época, mas, ao mesmo tempo, ele não fazia parte do modelo de governabilidade. Na verdade, ele nunca fez. Nunca precisou fazer, porque o Judiciário não tinha importância. O Judiciária ia a reboque dos golpes, do Exército, do presidente da República, da área governista. Ele não tinha autonomia. É bom lembrar que o Judiciário era composto de parentes ou afilhados de políticos. O Judiciário e o Ministério Público foram sendo empoderados cada vez mais, sem que se procurasse incorporá-los ao regime de governabilidade. Tem até aspectos positivos nisso, porque, por exemplo, os ministros de tribunais superiores foram indicados sem muita preocupação partidária.

Aí nasceu uma espécie de ideologia judiciarista, que é liberal/republicana. Liberal, no sentido de liberal democrática, em defesa da liberdade civil, da liberdade de mercado. Que se opõe tanto ao conservadorismo clássico quanto ao socialismo, representado pelo PT. Há cada vez mais um afastamento em relação ao sistema político.

O Brasil tem, por muito tempo, um de governo de esquerda. Já havia a experiência do mensalão e a sensação de apodrecimento do sistema político do começo da década de 2010. E aí, em 2013, ocorre um detonador, que é uma certa crise generalizada de representação. O efeito colateral é a ideia de que todo mundo que foi à rua, quaisquer que fossem as suas razões e seus motivos, tinham uma insatisfação com relação à política e ao caráter supostamente não representativo da política. É como se os representantes políticos estivessem descolados da vontade dos representados. E aí há uma crise de legitimidade do sistema político. Quer dizer: o modelo de governabilidade começa a ser percebido de forma difusa como disfuncional. E aí todo mundo vai para a rua dizendo que fulano de tal não me representa, esse país não me representa.

E o que acontece? Há uma desmoralização do Poder Legislativo, que passa a ser visto como sinônimo de classe política, gente corrupta, vendida. Outro problema era o esgotamento do ciclo de esquerda e das ideologias que chamam de socialistas, mas que são social-democratas. Isso por várias razões. Uma delas foi a ressaca da globalização, que desfavoreceu ideologias liberais e cosmopolitas e impulsionou o retorno de ideologias nacionalistas autoritárias. Nesse momento, reaparece no Brasil o conservadorismo, que tinha desaparecido em 1985. Inclusive uma modalidade americana, massificada, radicalizada e que flerta com o fascismo.

Surge uma aliança dos conservadores com os liberais contra uma classe política que está identificada com o período da esquerda no poder. Que é PMDB, PT. Dilma Rousseff é reeleita em 2014, por muito pouco. E ela se deslegitimizou muito rapidamente quando não admitiu que mentiu quando disse que não tinha crise econômica. No dia que ganhou, ela disse que tinha mentido e que ia chamar o Joaquim Levy para ser ministro da Fazenda e que ela ia fazer uma política econômica completamente contrária a tudo que ela tinha dito durante a campanha. Ao mesmo tempo, a "lava jato" já tinha começado a funcionar. É bom lembrar que a “lava jato” começou lá em 2013, 2014. Isso vai formando uma tempestade perfeita, que vai levar ao colapso da legitimidade também do Poder Executivo e vai deixar o Poder Judiciário sozinho em cena, como o único Poder legítimo do Brasil. E aí a “lava jato” se torna um catalisador dessas esperanças difusas dos liberais/republicanos de um lado e dos conservadores do outro, que querem se livrar do governo do PT. E é claro que ainda tem o pessoal do establishment, comandado pelo PMDB, que se vira contra a presidente Dilma para tirá-la do poder e tentar depois resistir à "lava jato". Mas então, de 2013 para frente, há um estouro dessa revolução judicialista.

ConJur — Quais era os objetivos da revolução judiciarista?
Lynch —
Há um grande alinhamento no Judiciário e no Ministério Público para varrer a corrupção da política brasileira. Isso não necessariamente era algo conservador, mas certamente era anti-socialista. Era algo liberal, liberal tipo o ministro Barroso, da vanguarda iluminista. Mas que entendia que cabia ao Judiciário combater o patrimonialismo. O discurso judiciarista (que é mais amplo do que o lavajatista, que é um tipo de judiciarismo) retoma as ideias de Os donos do poder. Ou seja, de que o Brasil é um país patrimonialista, autoritário, um país de corrupção, que o problema é a colonização ibérica, que era colônia. Já que os políticos não conseguem se regenerar, cabe ao Judiciário servir de aríete para promover essa limpeza e criar uma república de verdade. Isso é a revolução judiciarista.

Houve uma coalização entre juízes e promotores que eram liberais/republicanos e conservadores, que o tom foi desse discurso liberal/republicano. Os dois, naturalmente, antipetistas. Mas não só antipetistas, porque também foram atrás de outras pessoas do PMDB, do PSDB. Era uma espécie de derrocada do establishment. Aquilo que foi feito no passado com o AI-5 precisava ser feito de novo, de outro jeito.

ConJur — Os magistrados e integrantes do MPF que atuavam na operação "lava jato" planejaram a derrubada do establishment?
Lynch —
Eu nem sei até que ponto a força-tarefa de Curitiba, aí incluindo o ex-juiz Sergio Moro, tinha noção do que estava fazendo. Na verdade, eles foram o instrumento de um movimento político muito maior, voltado para derrubar o establishment PT-PMDB do poder.

ConJur — Nas mensagens entre obtidas por hackers, os integrantes da "lava jato" discutem alguns objetivos políticos. No julgamento da suspeição de Sergio Moro para julgar o ex-presidente Lula, o ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes falou que as mensagens demonstravam claramente que os operadores da "lava jato" tinham um projeto de poder.
Lynch —
Isso é certo. Agora, eles achavam que estavam usando os outros, mas, na verdade, eles estavam mais é sendo usados. O projeto de poder deles não era articulado. O projeto de poder deles era uma coisa heroica sebastianista, messiânica. Eles achavam que iam salvar o Brasil. É uma coisa inclusive meio tola, ingênua, de quem não entende muito a política. Por isso que eu chamei isso de tenentismo togado. Só que em vez de fazer aquilo com baionetas ou tiros, iam fazer com sentenças. Para isso, eles tinham de colocar abaixo o establishment político. Eles usaram a operação Mãos Limpas como modelo. É engraçado que as pessoas pegam como modelo coisas que dão errado no final para elas. Isso é coisa de quem não entende de política.

Outro aspecto é que, no meio jurídico, há uma certa promiscuidade na relação entre operadores. É uma coisa de corporação, todos são meio aparentados, meio amigos ou fizeram faculdade juntos. E como eles sabiam que estavam mexendo em coisa grossa, que estavam enfrentando poderes muito fortes, eles fazem essa coisa da Mãos Limpas, de contar com a ajuda da imprensa. Ora, a grande imprensa no Brasil é toda liberal. Então, ela estava super interessada em apoiar e dar visibilidade à “lava jato”. E os conservadores que apareceram depois também. E na cabeça dos membros da “lava jato”, eles tinham, para sobreviverem, que derrubar sucessivamente todos os obstáculos com a ajuda da imprensa, tinham que derrubar todos os obstáculos dos grandes poderes, que eram os responsáveis por essa corrupção da República. Que eram Eduardo Cunha, ministros, senadores, deputados, vice-presidente da República e presidente da República. Sendo que o último, óbvio, era Lula.

ConJur — Qual foi o papel do STF na revolução judiciarista?
Lynch —
Tudo isso foi endossado pelo Supremo Tribunal Federal. O Supremo começou a mudar sua jurisprudência para permitir a "lava jato" mais ou menos na época do julgamento do mensalão (que começou em 2012). Agora há a sensação de que o Supremo está voltando ao normal. Essa mudança ocorreu porque houve uma convicção generalizada dos ministros e de boa parte da magistratura brasileira de que o “sistema” não permitia o combate eficiente à corrupção. Então era preciso alterar a jurisprudência, mudar a doutrina, endurecer. Ter a prisão em segunda instância. Porque existe uma percepção de que, no Brasil, o Código Penal só existe para o pobre, não para o rico.

Quando o ministro Barroso defende a prisão depois do julgamento em segunda instância, não é porque ele é punitivista. O argumento dele é que, depois da segunda instância, nenhum pobre consegue subir, são só os ricos. O argumento é antipatrimonial, é republicano. Tem essa ideia de indignação com a corrupção. O perfil dos magistrados, com valores de classe média, é muito sensível ao assunto de corrupção. E era preciso mudar a jurisprudência, a forma de julgar os casos para se conseguir fazer justiça.

Esse movimento começou no mensalão e se difundiu depois com a “lava jato”. Porque esse movimento vem de cima para baixo e de baixo para cima ao mesmo tempo. Então, o Moro começa a julgar de uma outra maneira, começa a ter a importação de outras teorias, que dispensam atos de ofício para comprovar a corrupção. Há a decisão monocrática de impedir o Lula de virar ministro da Casa Civil, de impedir a filha do Roberto Jefferson de virar ministra do Trabalho. Começa a haver uma interferência constante do Judiciário no funcionamento dos outros Poderes, que estavam muito enfraquecidos. Ao mesmo tempo, há uma exacerbação da atuação do Poder Judiciário, que se sentiu empoderado o suficiente para regenerar o sistema político.

ConJur — Quando começa o refluxo da revolução judiciarista?Lynch — Havia uma coalizão díspar que apoiava esse movimento. Quando certos setores já se sentem contemplados com resultados parciais da “lava jato”, começam as deserções. Quando tiram o PT do poder, com o impeachment da Dilma, parte do pessoal deixa de apoiar a “lava jato”. Porque, para eles, ela já cumpriu o seu papel. Estou falando dos liberais conservadores, que apoiavam o governo Temer, a Ponte para o Futuro.

Gilmar Mendes desembarca ali. Ele impediu Lula de virar ministro com uma canetada. Mas depois ele diz “outro impeachment, outra derrubada? Aí não”. Aí ele vai presidir o julgamento do Tribunal Superior Eleitora que absolve a chapa Dilma-Temer por “excesso de provas”. Ele desembarca porque a finalidade política já tinha sido atendida.

E Temer não respeita a lista tríplice para a Procuradoria-Geral da República, ele não nomeia o primeiro colocado e escolhe Raquel Dodge. Era preciso mudar o procurador-geral da República, arrumar aliados dentro do Supremo Tribunal Federal, como Gilmar Mendes. Ao mesmo tempo, há o ministro Ricardo Lewandowski, sempre ligado à esquerda. Os dois formam essa coalizão, que se diz garantista e começa a acusar a “lava jato” de ser punitivista. Tem um grande interesse também de advogados criminalistas por causa das mudanças que vêm sendo implementadas. O fato é que Temer consegue ir desmontando a “lava jato”.

E aí o então procurador-geral da República Rodrigo Janot tira a última carta, que é a delação da JBS. Temer diz que não vai renunciar, e o mandato de Janot acaba. Aí começa o declínio da revolução judiciarista. Na mesma época, o ministro Marco Aurélio manda afastar Renan Calheiros da Presidência do Senado. E o Senado se nega a cumprir a decisão. Aí o Plenário do Supremo volta atrás e cassa a liminar de Marco Aurélio. A sensação é que acabou ali.

ConJur — Por que começam a aumentar as críticas ao Judiciário?Lynch — Existe tem uma desmoralização grande do Poder Judiciário causado por essas brigas internas, bate-bocas entre Barroso e Gilmar Mendes... Os conservadores redivivos estavam satisfeitos também quando caiu a Dilma, quando caiu o PT. E grande parte deles era antijudiciarista por razões morais. Eles acusavam o Supremo por ter avançado uma pauta contrária aos costumes do povo brasileiro. O jurista que mais personifica essa visão é o Ives Gandra da Silva Martins. Esse pessoal dizia que tinha que trancar o Supremo, porque o Supremo ia ficar como uma corte progressista em um mundo conservador.

Quando chega 2018, o sistema está tão deteriorado, tão desgastado, tão esgarçado, que se criam as condições de possibilidade para que um candidato autocrata, populista apareça com chances de ser eleito presidente. O populismo sempre aparece em momentos de crise aguda do sistema representativo. E surge uma retórica anti-sistema, de que tem que demolir tudo. Aí o sujeito tem que ser visto como se fosse um outsider. Isso já estava dado em 2017. Eu só não sabia quem ia ser: se ia ser Ciro Gomes, Joaquim Barbosa ou Bolsonaro. Eu achava que era alguém com o discurso de autoridade, de "isso aqui já foi longe demais".

É bom lembrar que os generais da reserva do Exército já estavam soltando manifestos antijudiciaristas.

ConJur — O tweet do general Eduardo Villas Bôas às vésperas do julgamento do HC que determinaria se Lula seria preso foi uma manifestação nesse sentido?
Lynch —
Foi. Com o retorno desse conservadorismo mais reacionário, mais radical, há o retorno do militarismo. Assim como o judiciarismo no Brasil é filhote do liberalismo, o militarismo é filhote do conservadorismo. Do conservadorismo não liberal. O militarismo diz que a instituição central responsável pela salvaguarda dos interesses nacionais da República do Brasil são as Forças Armadas, e não o Judiciário. Foi a prevalência desse militarismo do século 20 que impediu o judiciarismo de se firmar na década de 50, por exemplo. Desde o começo da República, sempre em momentos de crises há a ideia de que a classe política e os partidos não funcionam mais. E alguém tem que assumir a direção do país. Assim como o Judiciário assumiu a direção do país na revolução judiciarista, o Exército tinha assumido em outros momentos. Ambos reivindicaram a herança do poder moderador do Império. Há essa ideia de que, em tempos excepcionais, é preciso apostar em alguma dessas duas instituições. Nesse sentido elas são concorrentes. É por isso que se tem um antijudiciarismo muito forte nos militares.

Para os conservadores, o problema do Brasil é a falta de respeito às hierarquias. E elas são mantidas pelo Estado, pelo Exército, pelas famílias, pela igreja. Então há esse renascimento do militarismo, que com essa interpretação escalafobética do artigo 142 da Constituição.

Só que agora tem uma coisa meio doida, porque eles tentaram alicerçar a ideia de que o poder moderador é o presidente da República, porque ele é o comandante em chefe das Forças Armadas. Isso é inédito. Porque essa doutrina militarista era invocada para o Exército derrubar o presidente. Era o contrário.

ConJur — Que outros impactos teve o antijudiciarismo?
Lynch —
Então, o antijudiciarismo passa a crescer. Ao mesmo tempo, os setores conservadores já são antijudiciaristas. Sejam os militares, sejam os culturalistas, sejam os evangélicos, sejam os conservadores de costumes. A esquerda, por causa da queda do PT, também tem o discurso antijudiciarista, “garantista”. Os próprios juristas que eram progressistas, que apostavam no ativismo, começam a recuar e a sustentar a necessidade de autocontenção do Poder Judiciário. Nesse contexto que o Supremo começa a recuar. E vai usar maneiras de sobreviver e tentar defender a democracia. Uma das medidas é evitar decisões monocráticas sobre temas muito polêmicos ou tratar de confirmá-las quase imediatamente no Plenário, e quase sempre por unanimidade.

Julga-se que é possível controlar o Congresso, mas não o Supremo Tribunal Federal. Aí tem esses movimentos que pedem o fechamento da Corte, tem o inquérito dos atos antidemocráticos. O Supremo está se segurando, ganhando tempo, esperando que Bolsonaro enrole a corda em volta do próprio pescoço e se enforque. O fato é que, hoje, o Supremo está enfrentando uma tentativa de revolução antijudiciarista.

ConJur — O que diferencia a “lava jato” e o lavajatismo do judiciarismo?
Lynch —
O lavajatismo foi uma expressão contemporânea do judiciarismo. O judiciarismo foi uma doutrina própria do liberalismo brasileiro, segundo a qual, no ambiente tradicionalmente oligárquico ou autoritário, é preciso apostar no Poder Judiciário como uma terceira força imparcial, defensora da Constituição e dos valores da Constituição, que são liberdade, república e democracia, para romper o domínio oligárquico ou autoritário. O principal inventor desse discurso é o Rui Barbosa. Então, ele usou o Judiciário contra a ditadura do marechal Floriano Peixoto, depois, contra as veleidades autocráticas do presidente Hermes da Fonseca. E aí se cria uma escola. Por exemplo, a banda de música da UDN era toda judiciarista. Quando Café Filho é impedido de voltar à Presidência da República pelo Exército, o judiciarismo vai impetrar um mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal. O Ulysses Guimarães era um avatar do Rui Barbosa. Sobral Pinto, embora fosse de direita, era um avatar do Rui Barbosa. Sempre que há um jurista falando em liberdade, erguendo a Constituição contra o arbítrio, ele está seguindo a tradição do Rui Barbosa.

O lavajatismo foi uma expressão contemporânea dessa linha, só que em contexto diferente. O Brasil já se democratizou. Naquele tempo, realmente tinha ameaças oligárquicas e autoritárias, do Exército, a toda hora. Agora, o que a “lava jato” fez foi relançar esse discurso em um contexto que já era democrático, embora existisse crise no sistema representativo. Na crise do sistema representativo, tem gente que fala em populismo judiciário. Então o populismo judiciário aparece e depois se sucede o populismo reacionário do Bolsonaro.

A “lava jato” é uma manifestação contemporânea desse discurso mais amplo do judiciarismo, que faz parte do liberalismo brasileiro. É aquela coisa de classe média contra a corrupção, que o Judiciário vai transformar o país em uma república de verdade. Só que, como sabemos, tudo isso deu com os burros n’água. Esse pessoal fez uma jornada de otários. Eles esquentaram a cama para os reacionários deitarem. Acabaram ficando sem nada e criaram uma situação de extremo perigo para a república e a democracia brasileiras.

O Supremo percebeu que tinha que recuar, que tinha que começar a normalizar de novo as suas relações com o Congresso depois da eleição do Bolsonaro, até para poder enfrentar as veleidades autocráticas do Executivo. Mas como se faz isso? O próprio Bolsonaro tenta explorar esse sentimento antilavajatista depois da queda de Moro, ele está assegurando impunidade para todos. O lema do autoritarismo é impunidade. E de alguma maneira o Supremo é obrigado também a negociar. Não digo negociar impunidades, mas a Corte precisa fazer negociações com políticos porque eles podem ser aliados na preservação da democracia. Essa é uma operação muito delicada. Eles têm que recuar do lavajatismo.

E qual é a maneira de se reduzir a pressão antilavajatista e ao mesmo tempo tentar minar Bolsonaro e renormalizar a política brasileira? É anulando as ações que tiraram Lula do jogo político. Porque a retirada do Lula do jogo político foi feita para evitar o retorno dos “corruptos”. Quando se olha para tudo o que aconteceu de 2013 a 2018, fica a impressão de que foi um grande período de exceção, que eu chamo de revolucionário por causa disso. Porque revolução não é necessariamente marxista ou boa. É um período de caos, é um período de transição para outro regime, em que as coisas saíram do lugar. Então, a eleição parece ilegítima porque retirou o candidato que estava em primeiro lugar nas pesquisas. E agora está sendo feito um movimento de tentar fechar esse ciclo e restabelecer o equilíbrio político natural do país, que não pode ser restabelecido se o Lula não voltar ao tabuleiro.

Os ministros atuais do Supremo são muito inteligentes. Eles são a nata da elite da república.

ConJur — A "lava jato" surgiu com a proposta de supostamente combater a corrupção. Mas, nesse suposto combate à corrupção, praticaram diversas ilegalidades. Como avalia isso?
Lynch —
Houve uma coisa de que os fins justificam os meios. Eles achavam que valia a pena passar por cima das leis. Na verdade, eles não acreditavam no sistema penal brasileiro. Eles achavam que havia uma espécie de descolamento entre o ideal de fazer justiça e o ideal de aplicar a lei. Então, para se conseguir justiça, era preciso torcer a lei ou a jurisprudência ou mudar a doutrina. Era preciso fazer algumas traquinagens. Mas tudo isso era sempre compensado com a necessidade de você atingir fins maiores.

Eu não acho que, no começo da "lava jato", eles achavam que iam ter que prender Lula ou coisa do gênero. Mas conforme a coisa foi andando, foram vendo que tinham que ir piorando a situação porque o inimigo é mais poderoso, então foram cometendo ilegalidades que achavam que eram menores ou que podiam ser vendidas como legais, porque no Judiciário é assim. É tudo uma questão de forma. Então eles foram forçando a barra diversas vezes para você atingir fins maiores. E nem importa se no fim das contas Lula é condenado sem provas, porque se sabe que no fundo ele é culpado. Eles não precisam de provas para saber se ele é culpado. E Lula é uma força que pode desfazer tudo que a “lava jato” fez e eventualmente colocar Moro e Dallagnol na cadeia. Então é preciso eliminá-lo.

E repito que eles eram ingênuos. Moro embarcou no governo Bolsonaro, que veio para aparelhar todas as instituições do Brasil. Ele leva mais de um ano para perceber que o programa do Bolsonaro é liquidar com o mundo que tornou Moro possível, que é o mundo da autonomia da Polícia Federal, da autonomia do Judiciário, da autonomia do Ministério Público, do discurso liberal/republicano. Isso mostra que Moro é um sujeito muito pouco traquejado em política. E há outras coisas. Na “vaza jato”, mostra que Dallagnol tinha bolado um monumento para a “lava jato”. Tipo o monumento aos heróis do Forte de Copacabana, que tem na Avenida Atlântica. Isso é um grau muito alto de ingenuidade, de tolice, de falta total de compreensão do seu lugar político.

Teve uma mistura de voluntarismo, de ingenuidade, de tolice, de falta de cálculo, de falta de conhecimento político. Por isso que chamo esse movimento de tenentismo togado. Porque os tenentes também eram assim, achavam que iam se levantar, dar uns tiros, bombardear o palácio do governo e regenerar o país. Aí teve a Revolução de 1930 e três, quatro anos depois os tenentes acabaram. Uns ficaram a favor do Getúlio, outros ficaram contra, mas acabou o movimento tenentista. E o que venceu foi o Estado Novo.

ConJur — Jair Bolsonaro foi eleito em 2018 com uma grande ajuda da “lava jato”. Sergio Moro foi para o governo e, quase um ano e meio depois, saiu completamente em descrédito com os bolsonaristas. Qual foi o impacto da ida de Sergio Moro para o governo para o lavajatismo?
Lynch —
Foi um golpe mortal. Ali os liberais desembarcaram. Os “liberais republicanos”, “liberais democratas”, que não são os neoliberais. Esses da imprensa, como Pedro Dória, Miriam Leitão. Esse pessoal que representa um pouco esse ideal de liberal democrata republicano de classe média, classe média alta, leitor de jornal, da Veja, da Exame. Esse pessoal todo desembarcou quando Sergio Moro foi para o governo Bolsonaro. E Moro virou ídolo dos reacionários.

Moro queria ser ministro do Supremo, ele se dava bem com alguns ministros. Pessoalmente, acho que Moro não tem nenhum interesse em ser presidente. Nunca teve. Ele é dessa geração judiciarista, que sabe muito bem que um ministro do Supremo tem uma vida muito mais mansa, muito mais rica e muito mais poderosa do que qualquer presidente da República. Mas no meio do caminho teve a “vaza jato”. Aí o problema começou a ser como que o Supremo ia lidar com isso, como ia conseguir desfazer o que fez sem parecer que estava desfazendo. Porque ficou parecendo que o judiciarismo e o lavajatismo eram para desembocar no Bolsonaro. E Bolsonaro capitalizou o sentimento de uma classe média que não era reacionária quando ele levou Moro para o governo. Isso ajudou a vitória dele também, porque a vitória dele é a desse esse conservadorismo junto com o neoliberalismo do mercado de um lado e o lavajatismo da classe média antipetista do outro. E Moro vai ficando isolado.

ConJur — Sergio Moro era mais popular do que Bolsonaro em 2018, certo?
Lynch —
Sim. Só que ele foi sendo usado pelo Bolsonaro e se desgastando. E foi jogado fora. Moro deixou alguns viúvos, com essa coisa doida de que não há nada mais importante na política do que a ausência de corrupção. Como se fosse uma coisa religiosa, o primeiro pecado do mundo. E como se o combate à corrupção fosse mais importante do que igualdade social, liberdade, democracia.

 

 https://www.conjur.com.br/2021-jun-27/entrevista-christian-edward-cyrill-lynch-professor-uerj2

 

Os 500 mil mortos por Covid e os estudos de Direito Financeiro



 

 

Sábado passado atingimos a lastimável cifra de 500 mil mortos pela pandemia de covid-19, em conjunto com a de 18 milhões de infectados. Transmito meus pêsames a cada família enlutada e um fraterno abraço de solidariedade aos sobreviventes, vários dos quais ainda apresentando sequelas em sua saúde por longo tempo.

O intuito desta coluna é didático, e vinculado ao Direito Financeiro. O que se pode aprender, nesse âmbito do Direito, em razão dessa pandemia? Cedo ou tarde ela passará - infelizmente, no Brasil, está ocorrendo de forma tardia, à custa de muitas vidas e muita saúde.

Um primeiro aspecto interessante de análise diz respeito à reserva do possível em contraposição às escolhas trágicas, âmbito próprio da análise jusfinanceira. Tratei disso nesta ConJur muito antes da pandemia (aqui). Como se sabe, existe a reserva do tecnicamente possível e a reserva do financeiramente possível. No âmbito técnico, identifica-se que, nos primeiros meses da pandemia, não havia vacina que combatesse o vírus — logo, naquele período havia reserva do tecnicamente possível.

Porém, quando as primeiras pesquisas apontaram para a produção de vacinas cientificamente adequadas, e elas passaram a ser oferecidas ao mundo, o problema financeiro despontou. Alguns países fecharam contratos com diversos laboratórios adquirindo antecipadamente, a bom preço, número superior ao de sua população. Outros países não conseguiram sequer comprá-las, limitados em suas finanças. Outros, mesmo tendo dinheiro para esse gasto, decidiram não fechar estes contratos — para estes, não cabe alegar a questão da reserva do financeiramente possível — é o caso do Brasil.

Aqui desponta o outro conceito correlato, o das escolhas trágicas, desenvolvido por Calabresi e Bobbit1, na década de 70 do século passado. Diz respeito às opções políticas necessárias ao bom governo de um país. Um exemplo desses autores: porque o serviço militar é realizado aos 18 anos e não aos 17 ou aos 19? Isso implicava em modificações relevantes na vida de um contingente de pessoas que, pouco antes, eram convocadas pelo governo norte-americano para lutar no Vietnã.

No caso brasileiro, especificamente nesse período pandêmico, vê-se que a opção não foi pela compra antecipada de vacinas, mas por medicamentos de eficácia não comprovada cientificamente, como a cloroquina. Havia dinheiro, o que afasta o argumento da reserva do financeiramente possível, mas a escolha trágica foi pela aquisição cientificamente errada. Mais poderia ser dito, referente a outras compras governamentais ou renúncias fiscais, como para a aquisição de armamento — aspectos financeiros do problema —, mas a ideia entre os dois conceitos, para fins didáticos, considero suficientemente exposta.

Outro aspecto que pode ser estudado diz respeito às transferência obrigatórias, tema próprio do federalismo financeiro. É inegável que a União transferiu recursos aos Estados e Municípios, bem como adiou o recebimento de seus créditos, decorrentes da dívida pública que estes possuem com aquele, o que foi formalizado pela Lei Complementar 173/20. Fica a questão jusfinanceira: tratava-se de uma transferência obrigatória ou voluntária? Não se trata de um aspecto de menor importância, pois esse conceito faz toda a diferença. Se for considerada como obrigatória, a União apenas cumpriu a lei, sem nenhum voluntarismo ou facultatividade. O TCU entendeu que esses recursos são obrigação incondicional da União para concretizar os objetivos da Emenda Constitucional 106/20, logo, são transferências obrigatórias (aqui), sem caráter de voluntarismo. Ou seja, foi apenas cumprida a lei. Recordo que teci críticas aos critérios de repartição desses recursos, quando ainda estavam sendo discutidos, mas a decisão política tomou outros rumos (aqui).

Um terceiro aspecto interessante diz respeito aos limites da CPI da covid-19, que mescla direito financeiro e constitucional. Poderia uma CPI constituída no âmbito federal fiscalizar estas transferências a Estados e Municípios, para analisar se foram cumpridas as regras de aplicação dos recursos? No Mandado de Segurança 24.312, que foi relatora a Ministra Ellen Gracie, no já remoto ano de 2003, impetrado originalmente no STF pelo TCE-RJ contra o TCU, ficou decidido que, por ser verba do Estado, ele seria competente para exercer essa atividade fiscalizatória. Logo, somente uma CPI estadual poderia analisar eventuais desvios de recursos dessas verbas que obrigatoriamente são estaduais, pois foram transferidas pela União em caráter obrigatório. No 40º encontro semanal realizado no âmbito da Mesa de Debates do IBDF isso foi bastante discutido e ficou patente essa assertiva (aqui).

Muitos outros aspectos poderiam ser explorados, e não me furto a retornar ao tema, mas, para não alongar este texto, menciono apenas um quarto. Caso sejam identificados culpados pelo atraso na aquisição de vacinas, que é um dos objetivos da CPI em curso, será possível responsabilizá-los financeiramente? Afasto desde logo a questão da responsabilidade política, que possui outra dimensão; tratarei apenas da responsabilidade jurídica, na fronteira entre o direito constitucional, administrativo e financeiro.

A matéria é regulada pelo art. 37, §6º, da Constituição, que estabelece os parâmetros atuais da responsabilidade pública, ao dizer que as pessoas jurídicas de direito público responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros. Ou seja, quem responde pelo dano é o Tesouro Público (federal, estadual ou municipal), e não o patrimônio das pessoas individualmente consideradas.

Todavia, consta ainda da norma que é assegurado o "direito de regresso" contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. Isso aponta para a possibilidade, escassamente utilizada, de que, uma vez condenado o Tesouro Público, este promova uma ação contra o agente público responsável pelo dano causado e já indenizado, caso tenha agido de modo doloso ou culposo para a realização daquele evento. O intuito da norma é o de proteger o credor, que, sob regras anteriores, via-se diante de um devedor insolvente, e o Tesouro não é insolvente, por definição.

No vetusto ano de 1988, quando defendi minha Tese de Doutorado (aqui), já criticava teoricamente esta solução normativa, entendendo que os recursos do agente causador do dano, em caso de dolo ou culpa, deveriam ser utilizados para pagamento da indenização, até seu limite, devendo o Tesouro ser chamado a indenizar o saldo, e não como consta da norma, que obriga a indenização prévia pelo Tesouro, e só após o exercício do direito de regresso. Mas, é o que consta da norma, gostemos ou não.

Enfim, muita coisa há para aprender com esse período pandêmico, e as interseções do Direito Financeiro não se esgotam com o Direito Tributário, objeto de obra específica, lançada semana passada (aqui), que tive a honra de coordenar com Sergio André Rocha e Gustavo Lanna Murici. Existe um mundo a ser pesquisado e muito a ser debatido e aperfeiçoado em nosso ordenamento jurídico.

Renovo meus sentimos às famílias dos vitimados pela covid-19, no inaceitável número de 500 mil, o qual, infelizmente, tende a crescer, e aos cerca de 18 milhões de infectados, cujas sequelas na saúde espero que sejam leves e transitórias.


1 Calabresi, Guido; Bobbitt, Philip. Tragic Choices. The conflicts society confronts in the allocation of tragic scarce resources. New York: Norton & Company, 1978.

 

https://www.conjur.com.br/2021-jun-22/contas-vista-500-mil-mortos-covid-estudos-direito-financeiro