Vinício Carrilho artinez
No
último episódio de insana violência escolar, ontem, na periferia de São
Paulo - capital, muitos fatos ou fatores devem ser relacionados.
Porém,
um detalhe importante tem passado despercebido: o estudante que
disparou contra outros jovens, e já matou uma estudante, tinha ou
manifestou uma expectativa de direitos.
Especificamente,
o estudante (homicida) protocolou denúncia por bullying e ameaças. As
ameaças teriam as derivadas da homofobia.
Está claro que o jovem acreditou nas instituições, creditou sua própria integridade física e psicológica ao Estado.
E o que fez Estado?
Como sempre, ao olhar para baixo, na cadeia social alimentar, o Estado não fez nada.
Será que a escola não sabia das ocorrências anteriores e do próprio Boletim de ocorrências feito pelo estudante?
Será
que o Governo do Estado, com suas intermináveis políticas
antipopulares, contra a ciência e o bom senso, não se vê como
protagonista de mais um episódio nefasto de violência?
É
inegável que o jovem estudante procurou por amparo no Estado, é
inegável que acreditou na realização de sua expectativa de direitos – a
fim de se manter vivo e não agredido –, contudo, nada se fez, até que
explodisse a violência mais insana contra outros jovens.
Nesse
quadro social, penso que é preciso uma visão mais geral. Minha
explicação é política para esse aumento vertiginoso da violência escolar
(mas social, acima de tudo): 58% em dois anos .
De 2016 a 2022, o esgarçamento social foi enorme, multiforme.
Além
do discurso de ódio social praticado contra a educação, a cultura, o
próprio serviço público, a ciência, houve notável
crescimento/investimento nas políticas armamentistas visando a sociedade
civil.
As condições macroeconômicas diminuíram a expectativa de vida ou, no mínimo, de alguma realização pessoal digna.
Nesse
período (2016-2022), as políticas públicas não eram pensadas para as
populações mais pobres e desassistidas historicamente.
Os
interesses das elites ou frações de classe, como do agronegócio e do
sistema financeiro (selic de quase 14%), sempre foram privilegiados.
Nesse meio, a liberação de venda, porte e uso de armas foi significativa, mas não explica tudo.
Junto
a isso se destilou um sinal social de que "valia tudo", passou a não
haver um horizonte mediano em que o direito deveria agir como limitação
aos interesses pessoais: o sentimento de "homem, lobo do homem" não foi
retórico. No Brasil de 2016 a 2022, a licantropia política não foi
metafórica.
O
fim dessa chamada Expectativa de Direito foi exponencial,
principalmente depois da reforma trabalhista e da previdência social.
Se
o trabalhador não perdeu o emprego, propriamente falando, foi
redesignado como sinônimo de lumpemproletariado, com uma avassaladora
pejotização e uberização das condições de trabalho.
O mundo da vida ficou muito semelhante, em dignidade negativa, à realidade do Mundo do Trabalho.
A
concentração de renda e de capital cobraria seu preço, e seria contra a
classe trabalhadora e mais ainda contra o povo pobre, negro e oprimido.
Esse é um pequeno resumo do Fascismo Nacional, de 2016 a 2022, e não será fácil desmontar suas armadilhas de violência social.
Pensando
de ontem para hoje, sobre a violência escolar que não é gratuita, tive
consciência plena do que é a expectativa de direitos e como, na sua
ausência, a violencia se torna o imperativo categórico predominante:
quando a “justiça pelas próprias mãos” torna-se o último recurso, ao
menos na consciencia de alguns.
Portanto,
notadamente para os críticos de plantão contra o Estado de Direito, a
Democracia, a Constituição, os direitos humanos, recomenda-se abrir a
Janela, os olhos, para bem ver o nível de embrutecimento social das
ruas, nas casas, nas escolas, no trabalho.
Desde
ontem, ninguém mais poderá alegar ignorância de que, sem expectativa de
direitos, resta o desespero, o sentimento de fim de linha, o ato
voluntário de agredir o “Sistema” e esse Sistema, como sabemos, somos
todos nós.
A
violência social no Brasil ainda é, e será por um bom tempo, uma
garantia de sucesso diante da brutal ausência, negação, da expectativa
de direitos reais, efetivos, práticos, do tipo que se põe na carteira de
trabalho e na mesa, nas refeições, na sala de aula.
Para
nós, a violência é o fruto contaminado, a incerteza jurídica originada
com a negação da expectativa de direitos. A violência é o resultado da
quebra da “Certeza jurídica”, exatamente, como proposta pela expectativa
de direitos.
Tenho
escrito que o mundo todo, diante da guerra Israel X Gaza, precisará
renovar a promessa da Educação após Auschwitz, porque o antissemitismo
(na cola do antissionismo) crescerá violentamente. Já cresceu. E chamei
isso de Educação depois de Gaza, como um combate ao sionismo de Estado
(que transformou Gaza num gueto bombardeado) e ao antissemitismo:
neonazismo.
Nossa
Educação depois de Gaza, no Brasil, não pode retardar, como cultura de
pacificação social e de luta pelo direito, mormente, como garantia
constitucional da expectativa de direitos anunciada pelo "mínimo" Estado
Social.
Sem a efetivação mínima da dignidade do povo brasileiro, não haverá Educação depois de Gaza, não haverá segurança e nem paz.
Sem melhores condições no Mundo do Trabalho, que se reflitam no mundo da vida, a próxima vítima pode ser você, eu, qualquer um.
E a única certeza, atualmente, é que não irá demorar.