Quem quer entender as decisões sobre a Selic tomadas pelo Comitê de Política Monetária (Copom)
pode se deparar com uma barreira: a linguagem. As atas e comunicados
muitas vezes são cheias de termos técnicos e difíceis de entender.
“Sou
crítico da forma como a ata é feita. Ela deveria ter linguagem
acessível para a população, para que as pessoas entendam”, diz o
professor Arnóbio Durães, da FIA Business School. Por isso, o Bora
Investir reuniu alguns dos termos que mais causam dúvidas na ata do
Copom e traz explicações.
Confira as principais expressões do Copom
Horizonte relevante
Para
entender o que é horizonte relevante, é preciso saber que o nível atual
de taxa de juros demora a ter um total efeito na economia, na prática.
Ou seja, se o Copom eleva a Selic, o impacto dessa alta só será sentido
mais à frente. Horizonte relevante é esse período futuro em que as
decisões terão efeito significativo na economia e na inflação, explica
Durães.
Desancoragem das expectativas
Um dos elementos que
o comitê observa para projetar a inflação à frente é como estão as
expectativas de qual será a inflação no futuro. Esse “termômetro” é
sentido, em especial, pelo boletim Focus, que coleta as projeções do
mercado sobre a inflação no futuro. Quando alguém diz que as
expectativas estão desancoradas, significa que as expectativas para a
inflação no horizonte relevante estão acima da meta estabelecida.
Um
dos problemas dessa desancoragem é que quando as expectativas apontam
para uma aceleração da inflação à frente, isso pode se refletir em uma
aceleração da inflação hoje, num círculo vicioso. “No cenário atual do
Brasil, temos uma desancoragem das expectativas da inflação, que estão
subindo e se afastando da meta determinada, o que impacta as decisões de
reajuste de preços e pode resultar no aumento da inflação corrente”,
explica Maria Giulia, analista de research da Rico.
Convergência das expectativas
Quando
o Banco Central fala sobre a convergência das expectativas, se refere a
uma aproximação da expectativa de inflação com a meta de inflação. Se
as expectativas estão convergindo para a meta, isso significa que o
cenário está se encaminhando para a ancoragem das expectativas – um dos
objetivos do BC para entregar a inflação mais próxima da meta.
Hiato do produto
“Esse
conceito se refere à diferença entre o Produto Interno Bruto (PIB) real
– aquilo que é efetivamente produzido pela economia – e o produto
potencial, que é o nível máximo de produção que a economia pode
sustentar sem gerar pressões inflacionárias”, diz Durães.
Se o
hiato é positivo, significa que a economia “está operando acima de sua
capacidade máxima, representando uma economia aquecida e indicando
pressão inflacionária adiante”, explica Giulia. Por isso que o BC fica
de olho nessa medida.
“Por
outro lado, quando o hiato do produto é negativo, quer dizer que nem
todo o potencial da economia está sendo utilizado, por exemplo, em um
cenário em que há um alto desemprego e a demanda por produtos é baixa”.
Também
vale dizer que, enquanto o PIB é uma variável que pode ser medida (e é
calculada trimestralmente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística), o PIB potencial não é uma variável observável, mas é fruto
de uma estimativa.
IPCA cheio/índice cheio
É comum ler
esse termo em análises sobre a inflação, ou, mais especificamente, do
Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que é a medida
oficial de inflação do Brasil. Quando alguém fala em “IPCA cheio”, está
se referindo ao número total do IPCA, ou seja, o resultado geral do
indicador. É o número que aparece quando as manchetes dizem: IPCA em
novembro sobe 0,39%.
Fala-se em “IPCA cheio” porque o próprio
índice é composto por algumas divisões em grupos, como Alimentação e
Bebidas, Habitação, Transportes, Vestuário, Educação, Comunicação. Há
também a possibilidade de fazer outros recortes no índice geral, como
estimar a inflação de serviços, por exemplo.
Inflação subjacente/núcleo de inflação
A
inflação subjacente, ou núcleo de inflação, é uma medida que busca
excluir do índice cheio os preços de produtos que são muito voláteis por
alterações sazonais ou eventos climáticos, como alimentos in natural.
Isso
é feito para entender a tendência dos preços que são mais afetados pela
política monetária. “Dessa forma, ao olhar para o núcleo de inflação, o
Banco Central consegue ter uma visão mais clara sobre as alterações dos
preços mais relacionadas ao ciclo econômico, tendo clareza quanto às
tendências de inflação da economia, possibilitando tomar melhores
decisões de política monetária em busca do equilíbrio dos preços e da
inflação”, explica Giulia.
Ela lembra, entretanto, que o Banco Central não utiliza o núcleo de inflação para apuração da meta, e sim a inflação cheia.
Curva de juros futura
A
Selic, que é determinada pelo Copom, é uma taxa de juros de curto
prazo. Para determinar as taxas cobradas em empréstimos mais longos, no
entanto, as instituições financeiras olham para a expectativa do mercado
com relação à taxa de juros no futuro. Essas expectativas formam um
gráfico – chamado de curva de juros, ou curva DI – e representa a taxa
média em que os agentes estão dispostos a emprestar seu dinheiro em
diferentes prazos.
Assim, quando o Copom altera a Selic, ele está
mexendo no “ponto de partida” dessa curva de juros. As expectativas nos
prazos mais longos, então, são ajustadas de acordo com essa mudança.
Além da Selic atual, a estrutura da curva de juros depende de fatores
como expectativas de inflação, expectativas quanto às próximas decisões
do Copom, fatores macroeconômicos, e a confiança do mercado nos membros
do próprio Copom.
“É muito importante acompanhar a curva de juros,
pois ela permite que os investidores tenham uma noção do rendimento que
eles podem esperar em determinadas aplicações no futuro”, completa.
Cenário de referência
O
cenário de referência é o cenário utilizado por economistas para fazer
projeções futuras, considerando as situações que pensam ser mais
prováveis de acontecer. Para hipóteses de um cenário mais otimista ou
pessimista, utiliza-se o termo “cenário alternativo”.
Assimetria altista/baixista no balanço de riscos
Quando
o Copom vai tomar sua decisão sobre qual será a taxa de juros, seus
membros fazem um balanço de riscos. Ou seja, elencam quais são os riscos
que podem fazer a inflação subir ou cair no horizonte relevante.
Quando
os comunicados falam em assimetria, isso quer dizer que um desses dois
lados (de alta ou de baixa da inflação) está “pesando mais”.
“Por
exemplo, quando temos um cenário de inflação com assimetria altista,
isso quer dizer que as chances de a inflação ficar mais pressionada são
maiores do que ela se manter no patamar atual. No cenário oposto, a
assimetria baixista indica que há mais riscos de baixa para a inflação”,
diz Giulia.
Política monetária contracionista/expansionista e taxa neutra
“Política
monetária é o nome dado ao conjunto de ações determinadas e
implementadas pelo Banco Central para gerenciar a ‘quantidade de
dinheiro’ em circulação na economia e o custo do dinheiro (taxa de
juros)”, explica a analista da Rico. No Brasil, o principal instrumento
de política monetária que o Banco Central utiliza é a taxa Selic.
Quando
alguém diz que a política monetária está expansionista, quer dizer que o
nível de juros está baixo, com o objetivo de estimular a economia. Por
outro lado, quando a política monetária é contracionista, seu objetivo é
desaquecer a economia e reduzir o ritmo de alta de preços.
Além
disso, há a possibilidade de uma política monetária neutra, “quando se
busca manter a estabilidade dos preços, sem aquecer ou desaquecer a
economia”, diz Giulia.
A taxa de juros neutra pode ser estimada de
acordo com algumas características de cada economia. Assim como o PIB
potencial, no entanto, é uma medida estimada.