Presidente
dos EUA constrangiu sua contraparte sul-africana, Cyril Ramaphosa,
durante visita à Casa Branca, apresentando provas falsas de que
fazendeiros brancos estão sendo assassinados e perseguidos no país.O
presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, humilhou publicamente o
presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, nesta quarta-feira
(21/05), na Casa Branca, ao fazer alegações enganosas sobre um
“genocídio branco” no país. A cena, acompanhada pela imprensa e
transmitida ao vivo, lembra a “emboscada” feita em fevereiro contra o
presidente ucraniano Volodimir Zelenski, acusado por Trump, na ocasião,
de incitar uma “terceira guerra mundial”.
Trump exigiu
“explicações” de Ramaphosa sobre o destino de fazendeiros brancos na
África do Sul, baseado no falso argumento de que houve apreensões de
terras e assassinatos em massa de africâneres – minoria étnica branca,
em grande parte descendente de colonos holandeses, alemães e franceses,
que governou o país durante a era do apartheid, o brutal regime de
segregação racial que vigorou de 1948 a 1994.
A
reunião começou de forma cordial, com Ramaphosa e Trump trocando
comentários sobre golfe. Os campeões sul-africanos Ernie Els e Retief
Goosen estavam presentes como parte da delegação.
Mas a reunião
logo tomou um rumo diferente. Trump diminuiu as luzes do Salão Oval para
mostrar um vídeo e artigos impressos com supostas evidências de que
fazendeiros brancos sul-africanos estão sendo perseguidos.
Uma
das imagens mostrava cruzes brancas na beira de uma estrada. “É uma
visão terrível. Nunca vi nada parecido.” Trump também mostrou uma série
de artigos impressos. É sobre “morte, morte, morte”, disse.
Em
outra imagem usada como prova por Trump, trabalhadores da Cruz Vermelha
com equipamentos de proteção seguram sacos de corpos. Segundo a agência
Reuters, trata-se, na verdade, de uma captura de tela de um vídeo do
YouTube, de fevereiro, do trabalho de equipes da organização de ajuda
humanitária após mulheres terem sido estupradas e queimadas vivas
durante uma fuga em massa da prisão na cidade congolesa de Goma.
“As
pessoas estão fugindo da África do Sul para sua própria segurança. Suas
terras estão sendo confiscadas e, em muitos casos, elas estão estão
sendo mortas”, disse Trump em uma das várias acusações.
Ramaphosa
manteve-se calmo e rebateu: “Disseram-lhe onde fica isso, senhor
presidente? Gostaria de saber onde fica, porque nunca vi”, e prometeu
investigar o caso.
O
presidente sul-africano insistiu que há crime na África do Sul, mas que
a maioria das vítimas são negras. Trump o interrompeu e disse: “Os
fazendeiros não são negros”.
Narrativa de círculos extremistas de direita
A
ideia de “genocídio branco” é impulsionada nos EUA principalmente por
grupos e indivíduos associados a movimentos de extrema-direita,
incluindo o bilionário Elon Musk, aliado de Trump nascido na África do
Sul, que também estava no Salão Oval nesta quarta.
A África do Sul
rejeita a alegação de que os brancos são alvo desproporcional de
crimes. As taxas de homicídio são altas no país, mas a maioria
esmagadora das vítimas é negra. De acordo com dados da polícia, cerca de
75 pessoas são assassinadas diariamente na África do Sul, a maioria
delas jovens negros em áreas urbanas.
Trump já havia acusado o
governo de Pretória de discriminar minorias brancas. Nos últimos meses, o
presidente americano focou suas críticas à nova lei de reforma agrária,
destinada a reparar as injustiças do apartheid.
O texto permite
expropriações sem indenização quando for de interesse público – por
exemplo, se a terra estiver improdutiva. A maioria das terras agrícolas
na África do Sul continua sendo propriedade de membros da pequena
minoria branca. Nenhuma expropriação foi realizada até o momento, e
qualquer ordem pode ser contestada na Justiça.
No início de
fevereiro, Trump congelou toda ajuda dos Estados Unidos à África do Sul e
abriu a possibilidade de asilo em território americano a africâneres —
embora tenha parado de aceitar refugiados de zonas de guerra e crise.
Em
março, os EUA também expulsaram o embaixador da África do Sul no país,
como resposta a uma suposta violação dos direitos humanos da população
branca sul-africana.
Há duas semanas, chegaram aos EUA os
primeiros sul-africanos brancos refugiados, um grupo de 49 pessoas
vindas em avião fretado pelo governo americano.
Desde o início da
crise bilateral, Ramaphosa tentou bajular Trump com ofertas políticas,
como acesso a matérias-primas. A visita aos EUA era mais uma tentativa
de suavizar a relação. Os EUA são o segundo maior parceiro comercial da
África do Sul, depois da China. O governo de Trump aplicou uma tarifa de
30% sobre as importações sul-africanas, atualmente suspensa. Ramaphosa
estava interessado em discutir um acordo comercial e oportunidades de
negócios na reunião desta quarta.
sf (Reuters, AFP, ots)