O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou à revista The New Yorker
que a ausência de regulamentação tornou as redes sociais propícias à
disseminação de desinformação e discursos de ódio. “Se Goebbels
estivesse vivo e tivesse acesso ao X, estaríamos condenados”, disse
Moraes, referindo-se ao ministro da Propaganda da Alemanha nazista. “Os
nazis teriam conquistado o mundo.”
A The New Yorker é uma
das principais publicações da imprensa dos Estados Unidos. O perfil de
Moraes foi publicado no formato digital da revista nesta segunda-feira,
7, e integrará a edição impressa do dia 14 de abril.
À
revista, Moraes criticou o movimento político que denomina como “novo
populismo digital extremista”, termo cunhado pela tese que apresentou em
um concurso público no qual pleiteou uma vaga como professor titular da
Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). “É um
populismo altamente estruturado e inteligente. Infelizmente, no Brasil e
nos Estados Unidos, ainda não aprendemos a revidar”, disse o ministro.
Moraes
afirmou ainda que as redes sociais devem respeitar as leis dos países
em que estão disponíveis, comparando-as com as Companhias de Índias dos
séculos 17 e 18. As companhias foram empresas fundadas pelas principais
economias da Europa à época com o objetivo de garantir a exploração de
recursos em suas colônias.
Segundo o ministro do STF, sem
regulamentação, as plataformas lucram em detrimento dos países em que
atuam, assim como as Companhias de Índias europeias. “Não só influenciam
as pessoas, como geram a maior receita publicitária do mundo, o que
lhes dá a força financeira para influenciar as eleições”, afirmou
Moraes. “Não querem respeitar a jurisdição de nenhum país, porque, na
realidade, procuram ser imunes às nações.”
O magistrado relevou o
processo do qual é alvo na Justiça Federal da Flórida, nos Estados
Unidos. A ação civil é movida pela Rumble, plataforma de vídeos que se
negou a cumprir uma ordem judicial para suspender o perfil de Allan dos
Santos, e pela Trump Media, ligada ao presidente americano, Donald
Trump. Moraes descreveu o processo como “manobra política” e
“completamente infundado”. “Assim como eu não posso, aqui no Brasil,
emitir uma decisão que obrigue algo nos Estados Unidos, nenhum juiz lá
pode declarar que a minha ordem no Brasil é inválida”, disse o ministro.
Embora
uma empresa ligada a Trump esteja processando o ministro, Moraes
minimizou os efeitos de uma possível pressão do governo americano sob a
Justiça do Brasil. “Podem instaurar processos, podem pôr o Trump a
falar”, afirmou. “Se enviarem um porta-aviões, então veremos. Se o
porta-aviões não chegar ao Lago Paranoá, não vai influenciar a decisão
aqui no Brasil.”
Quanto à política nacional, Moraes defendeu a
tutela do STF em inquéritos como o das milícias digitais e o das fake
news, mas avaliou “não ser saudável para nenhuma democracia ter a
Suprema Corte como ator político o tempo todo”. “O desafio é como
garantir que o tribunal volte à normalidade”, afirmou.
O
magistrado considera remota a possibilidade de o ex-presidente Jair
Bolsonaro (PL) reverter suas penas de inelegibilidade impostas pela
Justiça Eleitoral no STF, mas reconhece que o ex-presidente pode apoiar a
candidatura presidencial de sua mulher, Michelle, ou de um de seus
filhos. Nenhum deles, segundo Moraes, “tem as mesmas relações com as
Forças Armadas” que Jair Bolsonaro tem.
Quanto ao processo contra o
ex-presidente por tentativa de golpe de Estado, do qual é relator,
absteve-se de comentar, pois julgará o tema na condição de ministro do
STF, mas afirmou que a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da
República (PGR) enfraquece o discurso de que se trata de uma perseguição
política, uma vez que, a partir do parecer do procurador-geral da
República, Paulo Gonet, o Ministério Público passa a encampar os fatos
apresentados pelo inquérito policial.
O perfil contextualiza a
trajetória profissional de Alexandre de Moraes, da autoria de um
best-seller de Direito Constitucional à nomeação para a Suprema Corte. O
texto destaca que, enquanto era secretário de Segurança Pública, Moraes
mantinha uma linha de “tolerância zero” com o crime que lhe rendia
críticas de setores progressistas. Com a relatoria de inquéritos contra a
família Bolsonaro, a imagem pública do ministro inverteu-se, com
aclamação à esquerda e críticas na extrema direita.
O presidente
Luiz Inácio Lula da Silva (PT) também foi entrevistado. O petista
afirmou se preocupar com o “enfraquecimento do sistema democrático” ao
redor do mundo e criticou o uso de satélites da empresa de Elon Musk,
dono do X, em regiões de garimpo ilegal na Amazônia.