O grupo Odebrecht investiu 10 bilhões de reais em etanol. Hoje só tem dívidas e prejuízos. Discretamente, negocia agora uma solução radical para o problema
Usina da Odebrecht Agroindustrial: 50% da capacidade
São Paulo - Ninguém está fazendo tantos negócios no Brasil de hoje quanto o conglomerado baiano Odebrecht.
O fôlego do grupo tem sido impressionante. Somente nos últimos três
meses, arrematou três concessões com investimentos previstos de quase 24
bilhões de reais em aeroporto, rodovia e sistema de transporte urbano.
Hoje, a Odebrecht tem 14 empresas e fatura cerca de 100 bilhões de
reais por ano. Tudo parece muito bem, mas, por trás dessa voracidade
toda, se esconde um problemão — a investida do grupo no setor de etanol.
Criada em 2007 com o nome ETH Bioenergia, a Odebrecht Agroindustrial já
consumiu cerca de 10 bilhões de reais na construção e na expansão de
usinas de etanol pelo país.
O plano era assumir a liderança de um mercado promissor e abrir o
capital em 2012. Para isso, comprou em 2010 a quebrada Brenco, usina
modernosa criada por gente como o magnata das comunicações Steve Case, o
investidor indiano Vinod Khosla e o empresário brasileiro Ricardo
Semler. Passados sete anos, porém, a empresa se transformou numa
gangrena que pode repercutir no conglomerado inteiro.
Tudo deu errado com a Odebrecht Agroindustrial. A empresa sofre dos males que afligem todo o setor de etanol (o
maior deles é a concorrência desleal com o preço da gasolina, mantido
artificialmente baixo pelo governo). Mas sofre também por ter muita
dívida. Na última safra, a empresa teve um prejuízo de 1,2 bilhão de
reais, o maior de sua história.
Nas últimas três safras, a dívida da companhia dobrou de tamanho, para
10 bilhões de reais, o que representa 22 vezes sua geração de caixa. A
média do setor é três vezes, segundo o banco Itaú BBA. Suas usinas
operam atualmente com apenas 50% da capacidade.
O resultado de 2013 acendeu a luz vermelha na Odebrecht. As despesas com pagamento de juros cresceram.
Mesmo respondendo por apenas 2,5% da receita do grupo, a empresa é
responsável por 16% do endividamento total da Odebrecht. Embora ninguém
fale abertamente sobre o assunto, uma crise de insolvência no braço de
etanol poderia colocar em risco a reputação de todo o grupo.
“Essa área é minha maior preocupação”, diz Marcelo Odebrecht,
presidente do conglomerado, cuja dívida total dobrou de 2011 a 2012,
atingindo 62 bilhões de reais (o número de 2013 ainda não foi
divulgado).
Discretamente, a Odebrecht começou a colocar em operação um plano para
resolver o problema de forma radical. Ameaça cortar, se o setor não
melhorar, os 3 bilhões de reais em investimentos previstos para os
próximos três anos.
No fim de 2013, o grupo transferiu algumas usinas e parte da dívida da
Odebrecht Agroindustrial para outra empresa do conglomerado, a
Odebrecht Energias Renováveis, que investe em geração de energia eólica e
solar.
A operação ocorreu apenas no papel, já que a Odebrecht Agroindustrial
continuará operando as usinas, e quase 4 bilhões de reais do
endividamento total serão migrados ao longo dos próximos três anos. O
objetivo é claro — diluir o risco de insolvência da empresa. Ao mesmo
tempo, o grupo propôs um aumento de capital para a Odebrecht
Agroindustrial que pode chegar a 2 bilhões de reais.
Com o aporte, conseguiria transformar a dívida em algo mais razoável e
captar mais recursos. O problema é que a Odebrecht tem sócios
minoritários no negócio — as gestoras de recursos Tarpon e Ashmore.
Eles não gostaram nada da ideia de acompanhar uma capitalização que,
para eles, tem como objetivo final aliviar a situação do grupo
Odebrecht. Segundo EXAME apurou, os dois acionistas não devem participar
da operação e, portanto, terão sua participação diluída. Não que eles
esperassem ter retornos fantásticos para seus investimentos.
Em dezembro, a Ashmore, dona de 13% das ações, fez uma provisão de
perdas equivalente a 90% de seu aporte. Já a Tarpon, que tem 2,5% da
Odebrecht Agroindustrial, dá de ombros para a operação. Há mais de um
ano, reconheceu a perda quase total de seu investimento na companhia,
que correspondia a 0,5% do total de recursos sob sua gestão.
Desde 2011, os sócios da Tarpon não se envolvem mais com a empresa.
Procuradas, Tarpon e Ashmore não comentaram. Se ninguém embarcar na
capitalização, a conta vai sobrar toda para a Odebrecht.
A esperança, claro, é que o velho e bom BNDES,
sócio da empresa com 14% das ações, ajude. Procurado, o BNDES disse que
ainda não tem um posicionamento sobre o tema. Com a capitalização e
quase metade da dívida transferida para outra empresa do grupo, a
Odebrecht teria um pouco mais de tempo para resolver o problema de sua
aventura no etanol.