A concorrência entre os dois principais fabricantes de chocolates finos do Brasil mostra que, em um ano de crescimento econômico moderado, as boas oportunidades podem estar nos mercados mais competitivos.
Marina Gentil, gerente de expansão do Grupo CRM: passagem de cinco anos pela concorrente, Cacau Show
São paulo - O mercado de chocolates finos no Brasil é dominado por dois grandes concorrentes. De um lado está a Cacau Show,
com 1.540 lojas e faturamento de mais de 2 bilhões de reais no ano
passado. Do outro, o Grupo CRM, com faturamento de 760 milhões de reais e
345 lojas das marcas Kopenhagen, de 85 anos de tradição, e mais 460 da Chocolates Brasil Cacau.
Ambos vivem um momento de crescimento e, de certa
forma, reposicionamento. A Cacau Show, até o fim do ano, deverá
inaugurar uma loja-conceito em lugar ainda não definido, mas em formato
parecido com o da loja premium da empresa, Café & Chocolate, aberta
no fim do ano passado em um dos endereços com metro quadrado mais caro
do Brasil: a avenida Faria Lima, em São Paulo, ao lado do shopping Iguatemi.
Com dois andares, o espaço oferece experiências ao consumidor, como
montar a própria trufa ou tomar um cappuccino com chocolate, com direito
a um chocolatinho de brinde, em uma confortável cadeira. Um ambiente
bastante parecido com o da loja-conceito da Kopenhagen, aberta três
meses antes na rua Oscar Freire, em São Paulo.
Também em 2013, a Cacau Show anunciou a compra do controle acionário
da Brigaderia, rede de 11 lojas do docinho com toque gourmet que a
Cacau Par, holding criada pelo presidente e fundador, alexandre Costa,
pretende expandir para 50 até 2015.
Essas ações sinalizam uma tentativa da Cacau Par de se sofisticar e
começar a atacar a concorrente num segmento que até então
permanecia exclusivo da Kopenhagen, do grupo CRM.
"A Gol seguiu a mesma estratégia quando comprou a Varig, marca que já
tinha tradição e era sinônimo de sofisticação”, afirma Eduardo Murad,
professor e coordenador adjunto de comunicação do Ibmec, do Rio de
Janeiro, especializado em planejamento de marketing e gestão de marcas.
Contratando no concorrente
A ofensiva da Cacau Par no segmento de luxo deverá movimentar o mercado
de trabalho, a exemplo do que aconteceu anos atrás, quando o grupo CRM
criou, em 2009, a marca Chocolates Brasil Cacau para tentar recuperar a
liderança do mercado de chocolates finos, perdida em 2004 para a Cacau
Show.
Nas lojas da nova marca, os chocolates podem custar um quinto
dos equivalentes da Kopenhagen. A estratégia de copiar a rival
parece ter dado resultado, já que a marca mais jovem do CRM dobrou de
tamanho no ano passado e ultrapassou a pioneira, Kopenhagen.
Para ter uma ideia, a rede Chocolates Brasil Cacau começou 2013 com 232
lojas e terminou o ano com 460. Com o crescimento exponencial,
a fábrica do grupo CRM precisou mais do que dobrar sua força de
trabalho, de 900 para 1 900 pessoas.
No escritório, em São Paulo, os 80 funcionários receberam mais 70
colegas em um ano, e o quadro deverá crescer em torno de 10% em 2014,
para dar sustentação a essa rede de franquias que cresce três dígitos.
Desses novos funcionários, sete vieram justamente da concorrente Cacau
Par. "Busco talentos no mercado de franquias de alimentos. Pessoas que
já passaram por lá podem ter uma trajetória que cabe hoje em nossa
empresa", diz Daniella Marqueti, diretora de RH do Grupo CRM.
Uma dessas pessoas é a executiva Marina Gentil, gerente de expansão do
Grupo CRM, de 34 anos. Marina passou quase cinco anos na Cacau Show e
acredita que o fato de saber lidar com a ascensão de franquias
"democráticas" a ajudou a conseguir o cargo.
Para os especialistas, o intercâmbio de funcionários é comum
entre empresas que competem no mesmo segmento. "Apareceu uma nova
classe média, que exige melhores produtos e atendimento, mas não
quer pagar o que a Kopenhagen cobra. O Grupo CRM fez essa nova
marca para atingir um público maior sem precisar popularizar seu selo
mais tradicional", afirma Eduar do Murad, do Ibmec.
Atender esse novo público exige certa expertise, e um jeito efciente de
obtê-la é buscando talentos no concorrente. "O próprio Eike fazia isso:
tirava as pessoas da Petrobras para trabalhar com ele, por exemplo",
diz Eduardo.
"Quando existe a necessidade do concorrente de comprar
conhecimento específco, como gerentes de operações, vendas, modelos de
análise e expansão, isso acaba refetindo em uma disputa por mão de
obra", afirma Leonardo de Souza, diretor executivo da Michael Page.
Em outras palavras, quando duas ou mais empresas estão crescendo e
competindo, há mais oportunidades para profissionais daquela
indústria. No caso do mercado de chocolates finos, ambos os grupos têm
boas perspectivas para os próximos anos: a Cacau Show pretende chegar a
2.000 lojas e, para isso, precisará de mais profissionais
com conhecimento em expansão, cuja atribuição seja buscar bons
pontos comerciais para lojas e dar suporte aos franqueados.
Apesar de projetar um crescimento menos ambicioso, o Grupo CRM pretende
alcançar a marca de 800 lojas da Chocolates Brasil Cacau e 380
da Kopenhagen até 2015, e também deverá precisar de profissionais com
esse mesmo perfil.
Na Cacau Par, líder incontestável com 70% do mercado, não se admite a
estratégia de copiar o modelo de negócio ou de buscar profissionais do
concorrente para atuar em seus novos negócios no segmento de luxo.
"Prefiro trazer pessoas de outros mercados a procurar na
concorrência. Conseguimos, em 25 anos, fazer muito mais do que eles em
85", alfineta o presidente, Alexandre Costa. "Como formo as
pessoas aqui, não tenho mão de obra que me interesse em uma empresa como
a Kopenhagen."
Mesmo assim, a ofensiva da Cacau Par no terreno do luxo ainda deve
gerar muitas oportunidades. Com um caixa de 50 milhões de reais para
investir, Alexandre está em negociação para produzir no Brasil os
produtos de uma marca estrangeira de chocolates finos — belga ou suíça.
De acordo com fontes do mercado, a mais cotada é a belga Godiva.
Foi justamente para a Bélgica que Alexandre enviou seu mais novo
diretor de operações, Marco Aurélio Lauria, de 44 anos. Marco Aurélio
começou a trabalhar na Cacau Par no dia 2 de janeiro e dois dias depois
já estava embarcando para uma imersão no mundo dos chocolates finos.
Durante a expedição, o executivo visitou fábricas de chocolates e 15
lojas das principais marcas belgas, entre elas a Godiva, para analisar
desde display dos produtos, embalagens, qualidade e composição do doce
até a forma de atendimento. Sinal de que novos negócios podem estar
prestes a ser fechados, com muitas contratações a caminho.