No mesmo dia em que a ex-presidente do Brasil, Dilma Roussef, era afastada do cargo através de um impeachment, seu vice e, naquele momento, recém-confirmado presidente Michel Temer, embarcava para a China, para participar de um encontro do G20, o grupo dos países detentores das 20 maiores economias do mundo.
Michel Temer e Xi Jinping se cumprimentam durante encontro do G20 na China
Os perfis políticos de Dilma e de Temer
não poderiam ser mais diferentes um do outro. Ela de esquerda,
ex-guerrilheira, e primeira presidente mulher da história do Brasil. Ele
conservador, integrante de um partido com ideologia heterogênea, e que
não havia nomeado nenhuma mulher para ocupar qualquer cargo em seu
gabinete, nos meses que antecederam o impeachment.
Graças a essas e outras diferenças de
perfil, muito se tem discutido sobre os possíveis rumos que o Brasil vai
tomar com a chegada e confirmação de Michel Temer ao poder. A partir de
agora, analisaremos um aspecto específico dessas discussões: as
consequências que o impeachment terá nas relações Brasil-China. Daremos bastante atenção à participação de Michel Temer no G20, focando nos acordos comerciais entre Brasil e China que foram firmados no encontro, e nas consequências desses acordos para o mundo dos negócios no Brasil.
A reação da China ao Impeachment
Poucas horas depois de decretado o impeachment,
os presidentes da Bolívia, da Venezuela e do Equador, todos de
orientação esquerdista, afirmaram que iriam retirar do Brasil as
representações diplomáticas de seus respectivos países. Isto seria uma
forma de protesto, contra o que eles consideraram como sendo um golpe
por parte de Michel Temer e seus aliados, e também por todos os
adversários políticos de Dilma envolvidos no processo do impeachment, para tirá-la do poder.
Cena do momento da declaração do impeachment de Dilma
Ora, a China também é um país de
orientação esquerdista. O Partido Comunista, único partido legalizado e
autorizado no país, chegou ao poder há várias décadas, e desde então,
tem governado a China de modo que ela adquirisse muitas das
características da esquerda mais tradicional. Era de se esperar,
portanto, que a reação do governo chinês demonstrasse a insatisfação de
seus líderes com o impeachment, assim como nossos vizinhos latinos, certo?
Errado. A mídia chinesa foi extremamente imparcial no que diz respeito ao
impeachment. Tanto o
China Daily e o
Global Times, dois dos maiores jornais chineses, quanto a
agência de notícias Xinhua,
do governo chinês, limitaram-se a transmitir e contextualizar os fatos
ocorridos no Brasil, sem qualquer mensagem positiva ou negativa sobre o
impeachment.
Na esfera governamental, a reação da China ao impeachment foi a mesma. A recepção de Michel Temer no G20
ocorreu da forma mais natural possível, como se ele já tivesse sido o
presidente do Brasil por um longo período de tempo. Além disso, durante
todo o encontro do G20, não faltaram fotos mostrando Michel Temer e Xi Jinping,
o presidente da China, apertando as mãos e sorrindo, o que deixa clara a
mensagem transmitida pelo governo chinês, que não receia o fato de a
presidência do Brasil ser ocupada por Temer.
Michel Temer no G20
O G20 é o principal grupo econômico do
mundo. No total, ele representa mais de 80% do PIB mundial, mais de 80%
do comércio mundial, e cerca de dois terços da população do planeta. Por
reunir os 20 países mais ricos do mundo, cada um de seus encontros
oferece oportunidades valiosas de melhorar as relações entre esses
países, e também de fechar acordos comerciais com eles.
Os países do G20, grupo que compõe as maiores economias do mundo
Para se ter uma ideia da importância dada pela China ao evento, basta observar como o governo de Pequim organizou o
G20 2016. As autoridades chinesas fizeram com que dois dos seis milhões de habitantes da
cidade de Hangzhou,
onde ocorreu o evento, deixassem a cidade, decretando um feriado
municipal de uma semana, a fim de deixar a cidade mais tranquila e de
facilitar o trabalho da polícia.
Forças armadas especiais ajudaram no patrulhamento, inclusive na capital do país, 1200 Km ao norte de Hangzhou.
Essas e outras medidas deixam claro que a
importância de se participar desses encontros, portanto, é inegável.
Via de regra, todos os países membros enviam seus principais
representantes para esses eventos, sejam eles presidentes ou
primeiros-ministros. Mas no caso específico do Brasil, qual a
importância da participação de Michel Temer no G20? É o que saberemos agora.
A imagem do Brasil no G20 2016, após o impeachment
A
atual crise brasileira
já não é tão recente. Há mais de um ano já que, tanto a mídia nacional
quanto a internacional, vêm relatando casos relacionados aos problemas
políticos e econômicos do Brasil, em vários países do mundo. Isso tem
causado um deterioramento na imagem que os outros países têm do Brasil.
Afinal, nos últimos meses, muitos empresários e investidores
estrangeiros podem ter ficado apreensivos na hora de investir por aqui,
em períodos diferentes.
Por exemplo, no auge da Operação
Lava-Jato, poderiam ficar na dúvida de qual político ou empresa deveriam
contactar, por não saberem qual seria o próximo da lista a ser
descoberto pela justiça por casos de corrupção. Já nos meses que
antecederam o impeachment, em que Dilma havia sido
afastada, e Temer assumira o poder interinamente, poderiam ficar
receosos de investir em um país sem presidente definido. É compreensível
que tenha surgido esse tipo de dúvida na mente de investidores
estrangeiros, no período mais turbulento enfrentado pelo Brasil. Quem
seria o(a) presidente do Brasil nos meses seguintes? Que tipo de leis
poderiam ser postas em prática? Essas são perguntas que qualquer
empresário ou dirigente político se faz antes de investir em outro país.
E o longo processo do impeachment de Dilma teve repercussão direta nisso.
Por isso mesmo, um dos principais objetivos de
Michel Temer no G20, foi justamente o de mostrar para as maiores potências mundiais que o Brasil, depois do
impeachment,
não vai continuar enfrentando a instabilidade que vinha enfrentando até então,
e que, a partir de agora, é um país confiável para receber
investimentos externos. Para transmitir essa mensagem, Temer utilizou
principalmente duas ferramentas: seus discursos no encontro do G20; e as
fotos tiradas dele ao lado dos mandatários dos outros países.
Em seus discursos,
Temer focou bastante no aspecto fiscal,
apresentando os caminhos que seu governo vai seguir no combate à
inflação, na reforma do sistema previdenciário brasileiros, e nas
parcerias público-privadas. Todas essas medidas visando, no fim, a
retomada do
crescimento econômico brasileiro após o
impeachment.
O próprio teor e conteúdo desses discursos, mostra a intenção de
recuperar a credibilidade parcialmente perdida pelo Brasil no meio
internacional nos últimos meses, a fim de atrair investimentos
estrangeiros de volta para o país.
Já as fotos entre Michel Temer e Xi Jinping,
e entre líderes de outros países, têm um poder maior do que se pode
imaginar em um primeiro momento. A primeira função delas, é fazer com
que o mundo todo saiba quem, afinal, é o presidente do Brasil. Se nos
últimos meses, a população (e até os governantes) de muitos países
tinham essa dúvida, agora não têm mais. A outra função das fotos, é
afirmar a aceitação da mudança de presidente por parte dos outros
países, ao mostrar seus líderes sorrindo ao lado de Michel Temer, e
apertando sua mão amigavelmente.
Os acordos comerciais entre Brasil e China firmados no G20
Durante o
encontro do G20 2016, foram assinados vários
acordos comerciais entre o Brasil e a China. No total,
esses acordos atingem a cifra de mais de 15 bilhões de dólares,
envolvendo diversos setores industriais e empresarias do Brasil,
inclusive com algumas das maiores empresas brasileiras. Esses acordos
vão desde o setor de energia até o aéreo-espacial, passando pelo
siderúrgico e de infra-estrutura. Os principais acordos seguem abaixo.
Embraer – Colorful Yunnan – Colorful Guizhou Airlines
Camargo Correa – CPFL – State Grid
A
empresa chinesa State Grid adquiriu 23% de participação na CPFL,
a empresa responsável pela distribuição de energia no Brasil, e que, no
momento, é controlada pela Camargo Correa. A quantia de dinheiro
envolvida nessas transações chega quase a 6 bilhões de reais. Outra
empresa chinesa que comprou direitos de participação no Brasil foi a
Fosun, que fechou negócio com a sociedade de investimentos Rio Bravo, e adquiriu 50,1% de participação na empresa.
WTorre – China Communications and Construction Company
O Estado do Maranhão ganhou bastante com a participação do
Brasil no G20. A chinesa
China Communications and Construction Company (CCCC) fechou acordos com duas entidades brasileiras: uma com o
grupo WTorre (WPR), e uma com o Banco Modal. O governo do Estado do Maranhão também assinou acordo com a
CBSteel, para a construção de uma siderúrgica no município de Macabeira.
No primeiro acordo, entre a CCCC e a
WPR, ficou estabelecido um investimento de 1,5 bilhão de reais na
construção de um terminal multi-cargas, na região de São Luís, e isso
somente na primeira fase do projeto. O terminal terá capacidade
instalada para 14 milhões de toneladas de grãos, 3,6 milhões de
toneladas de líquidos, 3,5 milhões de toneladas de fertilizantes, e 3
milhões de toneladas de celulose, todos esses valores referentes ao
período de um ano.
Já o acordo firmado entre o governo estadual do Maranhão e a empresa chinesa CBSteel prevê um investimento de 3 bilhões de dólares, para se construir uma siderúrgica em Macabeira.
Estima-se que esse projeto poderá criar até 5 mil empregos no Brasil,
além da produção de 3 milhões de toneladas de aço durante sua primeira
fase.
Fundo de Investimento para a Agricultura
Considerações finais sobre o
Impeachment e o Brasil no G20
O impeachment de Dilma
vai ocasionar mudanças na maneira como a política e a economia do Brasil
serão dirigidas a partir de agora. Como dissemos, os dois possuem
perfis bem diferentes um do outro, e isso vai acabar se refletindo na
maneira como o país é governado. Em mais de uma ocasião, Temer já
afirmou que vai cortar gastos e controlar as despesas do governo,
adotando um perfil diferente ao anterior de Dilma, que gastava quantias
maiores com seus programas de investimento.
Mas independente de quem governa o
Brasil, o fato é que as oportunidades de negócio entre nosso país e a
China são imensas! A própria OCDE (Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico) afirmou que
a solução para a crise brasileira poderia estar na China, país que se tornou nosso principal parceiro econômico há vários anos atrás.
Além de acordos comerciais, o G20 na China pode fortalecer os laços entre Brasil e China
As oportunidades trazidas pelo encontro do G20 na China
não se resumem somente aos acordos comerciais que expusemos aqui. O
aumento da rede de contatos e o fortalecimento das relações já
existentes entre Brasil e China, com certeza terão efeitos benéficos
para nosso país durante os próximos anos. Além disso, as discussões que
permearam o G20 2016 giraram, principalmente, em torno à abertura
comercial e o fim do protecionismo no comércio mundial.
Esses dois fatores, juntos, podem nos
ajudar a superar a crise, e fortalecer os laços já extremamente fortes
entre Brasil e China. Se isso acontecer, será mais fácil para os
brasileiros aproveitaram as
oportunidades oferecidas pela China, e finalmente deixar para trás os tempos difíceis pelos quais temos passado ultimamente.
Por Gabriel Condi, diretamente de Presidente Prudente, SP, Brasil
Fontes: China Daily, Global Times, Xinhua, New York Times, Washington
Post, The Guardian, Portal G1, o Globo, Valor Econômico, International
Centre for Trade and Sustainable Development, Clarín
http://www.chinalinktrading.com/blog/impeachment-e-relacoes-brasil-china/