O
Comitê de Política Monetária (Copom) se reunirá em um cenário de
incertezas e expectativas na próxima terça-feira (17) e quarta-feira
(18). O colegiado iniciou em agosto do ano passado um movimento de
afrouxamento monetário, que levou a Selic de 13,75% para 10,5% nesse
ano. Os cortes foram pausados na reunião de junho e julho. Agora, no
entanto, o mercado e os próprios dirigentes do Copom levantam a
possibilidade de um novo ciclo de altas ser necessário. Mas o que mudou
no cenário da última reunião até agora que explica essa necessidade de
novo aperto?
Para Luciano Sobral, economista-chefe da
Neo Investimentos, o crescimento forte da demanda interna é um vetor
significativo de inflação. No início de setembro, o resultado do PIB do
segundo trimestre surpreendeu ao mostrar crescimento de 1,4% – acima da
mediana das estimativas, que indicava uma elevação de 0,9%, e perto do
teto das projeções de analistas, que iam de 0,4% a 1,6%. "A principal
mensagem do PIB é que a demanda interna está muito aquecida", explica
Sobral. Segundo ele, tanto o consumo das famílias e o gasto do governo
têm impulsionado o crescimento a um nível incompatível com a queda da
inflação. Outro indicador que aponta uma economia mais forte e que pode
pressionar a inflação para cima é o desemprego, que está no menor
patamar da última década. Quando o desemprego está baixo, há maior
demanda por bens e serviços, o que pode pressionar os preços para cima,
alimentando a inflação.
A desancoragem das expectativas de
inflação é um dos argumentos mais fortes para aqueles que defendem uma
alta da Selic, destaca Andrea Damico, economista-chefe da Armor Capital.
"As expectativas seguem desancoradas, o que tem sido um desconforto
para o Banco Central", afirma. Apesar de haver sinais de uma inflexão
nas projeções de inflação de mais longo prazo nos últimos meses, ela
destaca que o Banco Central (BC) continua observando o comportamento das
expectativas com cautela. Na última segunda-feira (9), a mediana das
expectativas dos analistas ouvidos pelo relatório Focus indicava uma
inflação de 3,92% em 2025 e de 3,6% em 2026 – ambos acima do centro da
meta, de 3%.
O modelo do BC
Para
Andrea Damico, um dos fortes argumentos contra a elevação da Selic é
justamente o modelo do Banco Central para o horizonte relevante, que é
do início de 2026. "[Na última reunião] o
BC divulgou, no cenário que tem juros estáveis, uma projeção de inflação
de 3,2% e disse que está acima da meta", recorda. "O que a gente viu da
comunicação depois, principalmente pelo Galípolo, é que 3,1% seria
considerado ao redor da meta. E geralmente, quanto a projeção indica uma
inflação ao redor da meta, a autoridade monetária não mexe na política
monetária", afirma a economista. "É uma linha muito tênue, está muito
próximo, se estivesse 3,4% ou 3,5%, ninguém teria dúvida de que tem de
subir", argumenta. Ainda segundo ela, mesmo atualizando o modelo do BC
com as novidades desde a última reunião – como o fortalecimento do dólar
e a surpresa positiva do PIB – há um componente que compensa esses
fatores: os preços das commodities. "O petróleo caiu mais de 10% entre uma reunião e outra, e isso tem um peso grande na inflação pelo modelo do BC", destaca.
Inflação corrente
A avaliação de economistas sobre os dados correntes de inflação é
mista. Em agosto, o IPCA mostrou uma leve deflação de 0,02%. Para Andrea
Damico, o cenário de inflação corrente é mais favorável do que o
esperado, pois aponta que o IPCA mais recente veio melhor, o que poderia
dar ao BC uma margem para manter a Selic inalterada. Ou seja, ainda que
exista um possível risco de maior inflação por causa do mercado de
trabalho apertado e economia aquecida, esse risco não está se
materializando, pelo menos por enquanto. Sobral, no entanto, discorda
que esse alívio seja sustentável. Ele menciona que a queda nos preços de
alimentos e nas tarifas de energia elétrica foram fatores temporários,
que não se repetirão nos próximos meses. "A energia elétrica já reverte
em setembro", alerta ele, com a determinação da bandeira vermelha de
energia. Além disso, Sobral argumenta que a inflação de serviços, um
componente sensível à política monetária, continua elevada e acelerando.
"Estamos vendo a inflação de serviços rodar a 5% nos últimos 12 meses, o
que é bem alto", completa.
Troca de comando no Banco Central
O mandato do atual presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, se
encerra no fim deste ano, e o governo já indicou Gabriel Galípolo como
seu sucessor. Embora a nomeação ainda precise passar pelo crivo do
Congresso, muito se especula que ele esteja buscando uma elevação da
Selic para conquistar credibilidade no mercado. E desde a última
reunião, o dirigente tem adotado um tom mais duro em suas falas.
"Galípolo se posicionou de forma mais dura e acabou se colocando numa
situação que o mercado precificou, e agora vai ser difícil voltar
atrás", opina Marco Bismarchi, da TAG Investimentos. Ou seja, agora, que
a maior parte do mercado acredita na alta, uma manutenção da taxa
poderia assustar. Sobral sugere que a decisão de elevar os juros já
estava, em parte, precificada: "No início parecia que o principal
elemento por trás da alta era uma tentativa do novo presidente ganhar um
pouco de credibilidade, mas depois ficou mais consensual."
Um
fator que pode influenciar a decisão do Copom são as perspectivas para o
câmbio. E a relação entre real e dólar pode mudar justamente por causa
das decisões de política monetária. Isso porque, se confirmado o
movimento para cima da Selic e para baixo dos juros nos Estados Unidos,
aumenta o diferencial de juros entre os dois países – o que tende a
atrair investimentos para cá. "A gente está vendo o real voltando a ser
de longe a moeda que mais paga juros no mundo", comenta Sobral. Embora
essa apreciação ainda não tenha se materializado, ele sugere que, caso
aconteça, poderia facilitar o trabalho do Banco Central no controle da
inflação. Para Bismarchi, isso pode ser um importante vetor de
desinflação no Brasil e pode fazer com que, mesmo confirmado o ciclo de
elevação da Selic, o movimento seja mais sutil.
Com Redação da B3