quinta-feira, 10 de junho de 2021

Deixou de ser vilã? Huawei agora estuda fabricar equipamentos 5G no Brasil


A chinesa Huawei esteve no centro do debate do 5G, por conta das pressões dos EUA para banir a empresa dos leilões ao redor do mundo – inclusive no Brasil. O executivo Atilio Rulli fala ao NeoFeed sobre os planos da companhia no País

 


A Huawei fabrica 40% do que vende ao Brasil localmente

A novela do 5G está perto de chegar ao seu clímax no Brasil e a chinesa Huawei, que até pouco tempo atrás era pintada como uma vilã, tem a chance de dar uma reviravolta nesse enredo.

A companhia, que é considerada uma ameaça à segurança nos Estados Unidos, mesmo sob o governo do democrata Joe Biden, que manteve as restrições impostas na época de Donald Trump, não deve ser banida do Brasil.

Com isso, as empresas de telefonia, como Vivo, Claro e TIM,  poderão comprar os equipamentos de telecomunicações de 5G da companhia chinesa. O leilão das frequências da quinta geração da internet móvel, que em testes reais apresentou taxas de transmissão até 100 vezes superior a das redes 4G, deve acontecer no segundo semestre de 2021 e as atividades comerciais devem entrar em operação em 2022.

E, em mais uma trama desse enredo do 5G, a Huawei informou que está estudando a fabricação de equipamentos 5G no Brasil. Hoje, a empresa tem fábricas em Sorocaba e Manaus e 40% de tudo o que vende no País sai de uma delas.

“Temos planos sim. Não tenho uma data exata do início de fabricação. É uma previsão. Precisamos ter volume”, diz ao NeoFeed Atilio Rulli, diretor executivo da Huawei no Brasil.

Rulli, que é umas faces públicas da Huawei e um dos principais porta-vozes da companhia no Brasil, com bom trânsito pelos corredores de Brasília, condiciona a fabricação ao volume e as exportações para outros países da região. “Fabricar no Brasil significa justificar exportar para a América do Sul e para a América Latina. É um estudo de fabricação em Sorocaba”, diz o executivo.

Aparentemente, isso não deve ser um problema. Hoje, a Huawei estima que 50%  das redes de telefonia do Brasil usem seus equipamentos. Esse percentual, em tese, já é um sinal de que terá pedidos, pois é mais fácil fazer a implantação sobre a rede já instalada. Em alguns casos, bastaria uma troca de placas ou a atualização de software, diz Rulli.

Presente há 23 anos no Brasil, a Huawei atua com equipamentos de telecomunicações, como as estações rádio bases (as populares antenas de telefonia celular), que são seu principal negócio por aqui. Além disso, ela atende o segmento corporativo com soluções de telefonia, tem presença na área de computação em nuvem (é concorrente de AWS, Microsoft e Google) e conta com produtos para consumidores finais, como celulares, tablets e smartwatches.

Atilio Rulli,diretor executivo da Huawei

Mesmo com os problemas com os Estados Unidos, a Huawei segue sendo uma gigante no setor de telecomunicações. Globalmente, ela faturou US$ 136,7 bilhões e lucrou US$ 9,9 bilhões, em 2020. No Brasil, os dados não são divulgados – a companhia diz apenas que conta com 16 mil funcionários diretos e indiretos no País.

Nesta entrevista, o executivo da Huawei fala ainda sobre as acusações de espionagem, diz que as companhias chinesas são perseguidas pelos Estados Unidos por conta de uma guerra comercial. E acrescenta que isso é óbvio no caso do 5G. “Os Estados Unidos sempre tiveram uma pujança em tecnologia, mas eles perderam o timing no 5G. Existem motivos comerciais óbvios.” Leia os principais trechos:

Havia resistências do governo brasileiro para que as empresas de telefonia comprassem os equipamentos da Huawei quando as redes 5G começassem a ser construídas. Como está essa situação?
Respondendo sua pergunta no dia 9 de junho de 2021: eu diria que não é que acabou, mas, em todos os processos que estão em curso, não existe nenhuma restrição ou banimento da Huawei. O processo foi aprovado em 25 de fevereiro desse ano pelo conselho da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) e foi encaminhado para o TCU (Tribunal de Contas da União) em março. Nesse processo, que está em curso no TCU, não tem nenhuma restrição. O leilão deve ocorrer no segundo semestre e só quando as regras do leilão forem oficialmente publicadas vamos ter essa resposta. Até então, não há nenhum impedimento e esperamos que continue assim.

Que trabalho a Huawei fez para convencer o governo brasileiro a não bani-la como uma fornecedora de equipamentos de infraestrutura para as empresas de telefonia, como queria os Estados Unidos?
A Huawei começou a trabalhar com 5G em 2009. O Brasil implementou o 4G em 2012. O nosso trabalho com o Brasil começou há aproximadamente três anos, quando a Anatel começou a fazer os primeiros drafts (do edital). Fizemos um trabalho de mostrar nossas tecnologias, nossa experiência de desenvolvimento nesses 12 anos, os cases mundiais de 2018 e 2019 até agora. E um grande trabalho, esse não é mérito da Huawei, mas da indústria de telecom, foram as operadoras de telefonia na sua unanimidade se manifestaram a favor de não ter uma restrição a Huawei. E isso tem um peso até mais forte.

Qual o percentual que as redes de telecomunicações dessas operadoras têm de equipamentos da Huawei?
Temos cerca de 50% do market share. Em algumas operadoras, um pouco menos. Em outras, um pouco mais.

A Huawei tem planos de fabricar equipamentos 5G no Brasil?
Temos planos sim. Não temos, no momento, uma previsão ainda exata. Mas temos planos de fabricar 5G no Brasil.

O que você quer dizer quando afirma não tem previsão?
Não tenho uma data exata do início de fabricação. É uma previsão. Precisamos ter volume. E fabricar no Brasil significa justificar exportar para a América do Sul e para a América Latina. É um estudo de fabricação em Sorocaba.

“Os Estados Unidos sempre tiveram uma pujança em tecnologia, mas eles perderam o timing no 5G. Existem motivos comerciais óbvios”

O governo do republicano Donald Trump, nos EUA, iniciou uma guerra comercial com a China. E fazia pressão em diversos países para banir a Huawei do 5G. Com a vitória do democrata Joe Biden, imaginava-se que isso ia mudar. Mas, em março, o governo do Biden considerou a Huawei uma empresa que ameaça a segurança nacional americana. E vários países acusam a Huawei de espionagem. Como vocês respondem a esses questionamentos?
Com a mudança do Trump para o Biden existia uma expectativa de que isso ia mudar. Mas não do nosso lado. A Huawei e muitas empresas chinesas vêm sendo perseguidas desde o primeiro mandato do presidente Barack Obama. Desde 2011, essa guerra comercial ocorre. E vamos lembrar que o vice-presidente do Obama, naquela época, era o Biden. Nós não estávamos com a esperança de uma grande melhora porque essa questão faz parte de uma grande guerra comercial. A Huawei continua em uma lista que os EUA chamam de “Entity List”, que é a lista de empresas que fazem a ameaça à segurança dos EUA. No caso do 5G, isso é muito claro. Se nós formos ver os grandes players de 5G no mundo: temos uma empresa finlandesa (Nokia), uma sueca (Ericsson) e uma chinesa. Está faltando um país com pujança em tecnologia, que não tem nenhuma presença de 5G. É facilmente explicável o porquê dessa guerra. Os Estados Unidos sempre tiveram uma pujança em tecnologia, mas eles perderam o timing no 5G. Existem motivos comerciais óbvios.

E os outros países que fazem acusações semelhantes?
Nessa questão, só temos os Estados Unidos e Austrália efetivamente banindo. Muitos países falam, a mídia fala, mas nós não temos banimentos oficiais em outros países.

O Reino Unido não baniu a Huawei?
O Reino Unido fez uma restrição para o futuro. Ele fez um timeline para 2025, mas ainda continua usando e tem entregas da Huawei lá. Temos, inclusive, um laboratório de cibersegurança em parceria com o governo.

O Japão também não baniu a Huawei?
O Japão fez restrições, mas não fez banimento.

Você colocou esses banimentos e restrições em um contexto de uma guerra comercial, mas objetivamente o que a Huawei tem a dizer sobre a espionagem?
Objetivamente, eu diria que não existe nenhuma comprovação. A Huawei segue as leis nos 170 países em que está. Nunca teve nenhum problema de espionagem oficialmente confirmado. A Huawei é a única empresa de infraestrutura de telecom que abre seus códigos para o governo. Se o governo quiser analisar códigos de software e hardware dos nossos produtos, nós abrimos. As outras não abrem. E sem medo de errar, a Huawei é a empresa mais testada do mundo por essas razões de ameaças. Os governos testam. As operadoras testam. E testam muito. E nunca pegaram nada. Sobre a questão de espionagem, nós temos total segurança que não existe nada. E a Huawei tem todas as certificações internacionais de cibersegurança possíveis e imagináveis.

“A Huawei é a empresa mais testada do mundo por essas razões de ameaças. Os governos testam. As operadoras testam. E testam muito. E nunca pegaram nada”

Quantas operadoras usam a tecnologia 5G?
Nós divulgamos contratos até 2019. Foram 92 contratos com operadoras no mundo com o 5G. Em 2020 e 2021, não divulgamos por uma política interna.

Você disse que não havia, pelo menos na visão da Huawei, uma perspectiva de mudança da política americana em relação às empresas chinesas. Falando do Brasil, cujo governo de Jair Bolsonaro era mais alinhado com o governo Trump do que com Biden. Houve mudança da posição do governo brasileiro?
O governo brasileiro, independentemente de o governo americano ter a guerra comercial com a China, tinha muito mais proximidade com o governo Trump do que com o Biden. Mudou mais a relação entre esses dois governos do que na nossa esfera. Nós continuamos na “Entity List” americana.

Mas havia uma pressão clara do governo americano para que outros países banissem a Huawei. Isso acabou?
Eu sinceramente acho que não acabou. Mas diminuiu a narrativa e a truculência.

Isso ajudou a Anatel a fazer um edital sem restrições aos fornecedores?
A Anatel fez um edital tecnicamente muito bem escrito. E não colocou restrições, porque a Huawei atende tecnicamente todos os requisitos.

Quanto vocês investem no Brasil. E com o 5G, isso vai aumentar?
Vou dar alguns números. Em 2020, a Huawei pagou R$ 1,3 bilhão em impostos. E executou compras locais de R$ 600 milhões dentro do Brasil. Fazemos investimentos desde modernizações de plantas até centros de open lab, um conceito em que criamos espaço para nossos parceiros estarem dentro da Huawei e testarem ou customizarem nossos produtos. Não temos hoje um investimento específico em P&D no Brasil. Somos uma das empresas que mais investem no mundo. Em média, 15% da nossa receita anual é reinvestida em P&D. Em 2020, fechamos com US$ 136 bilhões em receita e investimentos de US$ 21 bilhões em P&D.

Qual o impacto que o 5G vai ter para a economia brasileira?
A Deloitte fez uma pesquisa, sob nossa solicitação, cujo principal destaque é que a implementação do 5G em sua plenitude vai gerar um aumento do PIB em 1,25% ao ano. E, sem dúvida, o grande propulsionador desse aumento é B2B. Não é o consumidor final.

A Huawei tentou duas vezes entrar no mercado de smartphones no Brasil. Como está a operação?
Hoje, estamos como uma operação muito pequena de celulares no Brasil, praticamente nula. A nossa parte de ‘consumer’ está limitada a smartwatches, tablets e outros dispositivos wearables. No caso de celular, é muito simples a explicação. Os banimentos recentes, a Entity List, as restrições de chipset e do Android pago nos atingiu demais. A Huawei, por sua vez, é bem ágil e lançou essa semana um sistema operacional próprio, chamado de HarmonyOS. Ele abrange notebooks, tablets, celulares e smartTVs. O HarmonyOS vai ser a parte disruptiva de voltarmos em mercados, no qual o banimento nos pegou em cheio, sendo bem franco. E o Brasil foi um deles.

Em 2019, a Huawei foi a segunda maior vendedora de smartphones do mundo. Em 2020, caiu para terceiro. E no primeiro trimestre não está nem entre as cinco maiores empresas. A explicação é o fato de não poder usar o Android?
Foram dois fatores. O primeiro foi o banimento porque em vários países nós deixamos de vender e tínhamos um certo market share. Não era o caso do Brasil, mas, em vários países da América do Sul, tínhamos uma presença muito forte. Mas o segundo fator foi até mais responsável do que esse. A Huawei tinhas duas linhas de celulares: uma Huawei e outra chamada Honor, que vendemos. E, como ela era uma unidade mais low cost, vendia mais aparelhos. Com a venda, perdemos um grande market share.

 

 https://neofeed.com.br/blog/home/deixou-de-ser-vila-huawei-agora-estuda-fabricar-equipamentos-5g-no-brasil/?utm_source=Emails+Site&utm_campaign=d6c0352011-EMAIL_CAMPAIGN_2021_06_10_10_56&utm_medium=email&utm_term=0_c1ecfd7b45-d6c0352011-404839180

 

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