segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Alta do dólar ajuda exportador a fisgar bons negócios e recuperar mercados



 
 
O preço do produto brasileiro no exterior nos últimos três meses está 10% mais competitivo. Cálculos da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) indicam que o impacto maior da desvalorização do real se dará nas vendas de produtos manufaturados, e a perspectiva de alta no valor da receita exportada na balança comercial brasileira, no próximo ano, é de, no mínimo, US$ 7 bilhões.

Os cosméticos (foto) estão entre os setores beneficiados pela valorização do dólar frente ao real - a moeda norte-americana neste ano já acumula alta superior a 16% - ao lado de veículos, produtos químicos, máquinas, calçados, têxteis, joias e móveis. São beneficiados segmentos do agronegócio, como suco de laranja e açúcar refinado.

“Ainda temos um mercado internacional retraído e há outras moedas, além do real, desvalorizando-se. Não sabemos se o dólar ficará em R$ 2,30 ou R$ 2,40. Mas de uma coisa temos certeza: a situação está bem melhor para as exportações demanufaturados. Já começamos a ver luz no fim do túnel”, assegura o presidente da AEB, José Augusto de Castro.

De janeiro a julho, o comércio externo teve déficit de US$ 4,9 bilhões, com exportações de US$ 135,2 bilhões e importações de US$ 140,2 bilhões. 

Para o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Calçados (Abicalçados), Heitor Klein, a partir do cenário atual já é possível projetar um incremento leve nas exportações do setor este ano. Ele observa que, nos sete primeiros meses do ano, o valor das exportações foi praticamente o mesmo do ano passado, que já havia sido o pior em 25 anos (US$ 1,09 bilhões). Por outro lado, em pares de calçados, a exportação cresceu quase 11% neste período. “O motivo é justamente o dólar valorizado, que fez com que o exportador brasileiro conseguisse um preço mais competitivo no mercado externo”, explica.

Ricardo Wirth, calçadista do Vale dos Sinos, ressalta que as empresas da região tentam voltar sua produção ao mercado externo. “O dólar desvalorizado foi o fator que mais nos prejudicou nos últimos anos. A curto prazo, a situação continuará difícil, mas acreditamos em melhora.”

O presidente da Associação Brasileira das Indústrias Têxteis (Abit), Fernando Pimentel, reforçou a premissa de que as coisas vão, finalmente, melhorar para o setor. Ele lembrou que é preciso esperar para ver o que deve acontecer com a economia norte-americana. “A alta do dólar é favorável ao setor, mas não dá para prever ou fazer estimativas de curto prazo”, diz o presidente da Associação Brasileira da Indústria Moveleira (Abimóvel), Daniel Lutz.

As boas perspectivas quanto ao futuro animam micro e pequenos empresários, de acordo com o presidente do Sebrae, Luiz Barretto. Ele enfatiza que, 
nesse primeiro momento, o impacto está ocorrendo principalmente na receita dos exportadores, que recebem mais em real pelos produtos. “Para as 
empresas que exportam, a alta do dólar já está contribuindo para tornar seus produtos mais competitivos”, acredita Barretto.

A área de comércio exterior do governo comemora a alta do dólar, e isso ficou claro na recente declaração do ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel. No dia em que a moeda norte-americana bateu R$ 2,45, Pimentel disse considerar “ótima” a cotação do dólar. Pela primeira vez em sete anos a diferença entre o total de empresas exportadoras que abriram as portas e as que encerraram atividades foi positiva. 
De janeiro a julho, surgiram 19 empresas.

Fonte: http://jcrs.uol.com.br

Impacto do dólar nas compras de brasileiros no exterior preocupa



 






A alta do dólar pode estar beneficiando os exportadores, mas, de outro lado, a forte dependência do país de insumos e bens intermediários importados preocupa a área econômica. Há produtos que não são fabricados no Brasil e precisam ser trazidos de fora. Mesmo com a queda das tarifas de importação de alguns produtos, a variação cambial tem sido pesada. Assim, será inevitável o impacto da nova realidade cambial nos preços ao consumidor no fim deste ano e a partir de 2014.

A indústria de veículos sente o impacto dos dois lados da balança. O presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Luiz Moan Yabiku, diz que o setor “festeja e chora” ao mesmo tempo o valor do dólar. 
 
No curto prazo, de acordo com ele, há impactos para a indústria automotiva porque grande parte dos insumos é importada. “Mesmo assim, o governo reduziu os impostos para parte desses insumos, diminuindo um pouco esse impacto.” Como ponto positivo do preço da moeda norte-americana, aponta o estímulo à retomada das exportações.
 
A exportação de veículos apresentou, em julho, o melhor desempenho para o mês de toda a série histórica. O volume de carros embarcados cresceu 2,4% ao chegar a 52.456 unidades, contra 51.233 em junho, segundo dados da Anfavea.
 
Na comparação do montante exportado em julho com o do mesmo mês do ano passado, o crescimento alcançou 75,9%. No acumulado do ano, o aumento foi 24,9%, com 318.610 veículos vendidos no mercado exterior, ante 255.194 registrados no mesmo período de 2012. De acordo com o presidente da entidade, este também foi o acumulado dos sete meses. A Anfavea revisou as projeções para as exportações, de 4,6% para mais de 20%.
 
Apesar do câmbio, compras no exterior seguem atrativas. Mesmo com o avanço do dólar este ano, o brasileiro tem motivos de sobra para fazer compras nos Estados Unidos. Em Miami, um dos destinos favoritos, uma cesta de 18 produtos - como tablet, perfume, tênis e produtos infantis - somava R$ 6.884,00 em janeiro, quando a cotação era de R$ 1,99. Quando a cotação chegou a R$ 2,37, o total subiu para R$ 8.199,00 - alta de 9%. Ainda assim, revela o levantamento, os mesmos produtos, se comprados no Brasil, custariam 59,8% a mais: R$ 13.105,00.
 
A diferença seria ainda maior se considerado o dólar do fim de janeiro de 2012 (a R$ 1,74), quando a mesma seleção sairia a R$ 6.019,00. Nesse caso, o valor no Brasil seria 117% mais caro.Um mesmo produto, se adquirido aqui, pode ser até três vezes (200%) mais caro do que nos EUA.
 
É o caso de um tapete de atividades para bebê (Gymini Amiguinhos da Natureza Tiny Love). No site do Walmart para entrega em Miami, o item sai a R$ 120,72; e em Nova Iorque, a R$ 123,66. Na versão brasileira do mesmo site, custa R$ 368,00. Segundo especialistas, além da alta do dólar, o varejo brasileiro sofre, sobretudo, com a carga tributária elevada. Para os brinquedos, diz o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), os impostos representam 39,7% do preço.
 
Os fabricantes brasileiros, sejam de brinquedos ou de  outro produto que sofre a concorrência dos importados, dizem que a tributação é positiva porque evita enxurrada de mercadorias de fora no mercado interno, fazendo concorrência predatória.Segundo Alípio Camanzano, presidente do site Decolar.com, o brasileiro consegue comprar com vantagem até a cotação do dólar chegar a R$ 3,00. Para ele, o pior é a volatilidade da moeda. 
 
“O dólar tem que parar de pular. Mesmo com o avanço atual da moeda, o poder de compra do brasileiro nos EUA ainda é um diferencial”, destaca Camanzano, lembrando que as vendas de passagens em agosto subiram 45% ante igual mês de 2012.A percepção de Camanzano está em linha com os dados divulgados pelo Banco Central (BC). 
 
Em julho, os brasileiros gastaram US$ 2,21 bilhões no exterior, alta de 10,1% em relação ao mesmo mês de 2012. Esse foi um dos motivos que ajudaram o País a registrar déficit em transações correntes de US$ 77,7 bilhões nos 12 meses encerrados em julho, correspondendo a 3,39% do Produto Interno Bruto (PIB). 
 
O número é maior que os 2,21% de julho de 2012.O fato é que os brasileiros vão cada vez mais para Miami e Nova Iorque. Segundo a Greater Miami Convention, entre 2002 e 2012 houve alta de 70,11% no número de turistas, para 689,9 mil. No ano passado, gastaram US$ 1,49 bilhão na cidade. Em Nova Iorque, diz a NYC & Company, houve avanço de 838,63% no fluxo em 10 anos, para 826 mil. Em 2011, os brasileiros gastaram US$ 1,62 bilhão na Big Apple. 
 
Mesmo com a cotação da moeda americana em alta, a empresária de moda Andréa Galvão é categórica ao afirmar que vai continuar viajando. Ela esteve em Nova Iorque em maio e vai a Miami em novembro. Com procura em alta, as agências criam pacotes. A CVC lançou uma viagem para Black Friday, queima de estoque do varejo norte-americano em 29 de novembro. “O brasileiro gosta de comprar nos Estados Unidos. Sempre foi mais barato.
 
Em média, as pessoas que vão para comprar ficam entre três e cinco dias. Mas é preciso contabilizar, por exemplo, gastos com passagem aérea, hotel e alimentação”, diz Maria Dolores, gerente de uma agência de turismo.Segundo agências de viagem, uma passagem de ida e volta para Nova Iorque custa entre R$ 2,5 mil e R$ 3 mil se comprada com um mês de antecedência. Três noites em um hotel três estrelas sai por R$ 1,5 mil. Para Miami, a passagem custa cerca de R$ 2 mil, e a estadia por R$ 1 mil. Segundo pesquisa da Decolar.com, passagem e hotel somam até 40% dos gastos de um viajante.    Fonte: redação com agências 

OMC revisa para baixo crescimento do comércio internacional em 2013 e 2014



 
 
O diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), Roberto Azevêdo (foto), confirmou nesta segunda-feira que a entidade revisou para baixo as perspectivas de crescimento do comércio internacional para 2013, que agora ficou situado em 2,5%, ao contrário dos 3,3% calculados anteriormente.

Os intercâmbios comerciais em 2014 também serão menores do que os esperados, com uma nova projeção de 4,5%, contra os 5% estimados. Em sua primeira entrevista coletiva como principal responsável da OMC, Azevêdo explicou que a principal razão desta revisão é que os analistas esperavam que a economia da União Europeia começasse a subir no segundo trimestre do ano, algo que não aconteceu.

Um ligeira recuperação foi recém observada no trimestre atual, comentou o diplomata brasileiro, que assumiu suas funções de diretor-geral da organização no começo do mês. Os analistas "esperavam uma recuperação mais rápida da economia europeia, que a melhora começasse no segundo trimestre e que como resultado o comércio iria melhor". No entanto, a economia europeia na realidade "chegou ao fundo do poço" entre abril e junho, e uma melhora "começou a ser vista no terceiro trimestre", explicou. "Essa brecha foi a causa que da projeção ser revisada para baixo, o que provocou um ajuste nos números", acrescentou.

A OMC apresentará neste mês, em uma data ainda por confirmar, seu relatório anual com as previsões completas da evolução do comércio internacional. 

Fonte: EFE

Delfim defende regulação em commodities


Por Luiz Henrique Mendes | De São Paulo
Luis Ushirobira/Valor / Luis Ushirobira/Valor 
 
Para Delfim, incentivo do governo brasileiro à concentração na área de frigoríficos é um grave erro, porque cria oligopsônio na compra e oligopólio na venda.
 
O processo de globalização da economia resultou em uma estrutura perversa no mercado de commodities, em que pouco mais de uma dezena de tradings agrícolas controlam bilhões de produtores rurais. Em escala global, as tradings atuam como um oligopsônio na aquisição de produtos agrícolas, limitando o poder de negociação dos agricultores, e como um oligopólio na venda desses produtos.

Para equilibrar esse processo, o Estado, que de algum modo aceitou e até promoveu a consolidação dessa estrutura, terá de agir e lançar mão de instrumentos de regulação, tais como agências específicas para isso. Essa é a avaliação do economista Antônio Delfim Netto, professor emérito da Universidade de São Paulo (USP) e ex-ministro da Fazenda, do Planejamento e da Agricultura.

Em entrevista ao Valor, Delfim, aos 85 anos, diz que a política de concentração dos frigoríficos brasileiros, capitaneada pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), foi um "grave erro", e é parte desse processo global da oligopolização da produção global de alimentos. "Mesmo quando há grandes economias de escala, estruturas oligopsônicas e oligopolísticas são contra o aumento da produtividade", afirma.

Na entrevista, Delfim tratou de algumas das principais discussões da economia agrícola. Em meio ao debate sobre a desaceleração da China, ele não crê que haverá uma "debacle" nos preços agrícolas. O período de forte alta nas cotações, porém, já passou e o Brasil, segundo Delfim, não soube aproveitar o boom para investir em infraestrutura.

Sobre a política agrícola nacional, o ex-ministro elogia o último Plano Safra, válido para o ciclo 2013/14. De acordo com ele, o plano ataca aquele que talvez seja o principal gargalo da agricultura atualmente: a política de seguro rural. Para Delfim, a ausência de uma política de seguro agrícola consistente foi responsável pela pecha de caloteiros - externada até mesmo pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) - que os agricultores ganharam.

O ex-ministro ressalta, ainda, o papel que a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) tem no desenvolvimento da agricultura nacional. Segundo ele, a estatal continua a ser um elemento "distintivo" do país. Na opinião de Delfim, a perda de participação da Embrapa em mercados cobiçados como os de sementes de soja e milho não é um problema. "A Embrapa não foi feita para substituir o setor privado", diz.

Na seara política, Delfim diz que a bancada ruralista no Congresso Nacional também cumpre sua função de maneira adequada. Em questões polêmicas, como a indígena e a ambiental, o papel de árbitro cabe ao Estado, afirma. Nos casos de exploração de trabalho análogo à escravidão no campo, não há como tergiversar, diz Delfim. "Só pondo na cadeia", afirma. A seguir, os principais trechos da entrevista:

Valor: O Brasil foi beneficiado na última década pelo explosão da demanda chinesa. Esse ciclo acabou?

Antônio Delfim Netto : A demanda por produtos agrícolas depende, no fundo, do crescimento da população e da urbanização. Mas eu não vejo que você vai ter uma redução muito importante da taxa de crescimento da demanda de produtos agrícolas nos próximos anos. O que vai mudar, seguramente, é a estrutura da demanda. Você vai caminhar mais para produtos proteicos, porque o mundo está melhorando seu nível de renda. Mas não vejo nenhuma razão para imaginar uma debacle nos preços agrícolas. Teremos, no fundo, uma relativa estabilização. Os preços, provavelmente, vão voltar a declinar lentamente como sempre acontece, o que não significa que a demanda global vai diminuir.

Valor: Mas o maior salto já foi?

Delfim : O principal salto foi o avanço espetacular da China, que não vai se repetir. Mas imaginar que a China vai reduzir a sua demanda dramaticamente é um erro. Ela vai continuar crescendo 4,5%, 5% ao ano. E mais importante: vai aumentar muito a urbanização, o que reduz a oferta de produtos agrícolas de um lado e aumenta a demanda de outro, porque aumenta a renda.

Valor: O sr. acha que o Brasil aproveitou bem o boom da China?

Delfim : O Brasil não aproveitou bem o boom das commodities. Durante dez anos, tivemos um crescimento das relações de trocas importante, o que significa que a renda crescia mais do que o PIB. Teria sido o momento para fazer as mudanças estruturais que nós precisamos. Mas optamos por um caminho um pouco diferente. Usamos muito mais desses recursos na redistribuição de renda do que no aumento da eficiência produtiva, o que é compensado por um aumento do bem-estar visível. Mas um dos aspectos mais difíceis de entender é que você sacrificou uma parte das vantagens da melhoria das relações de troca para valorizar o câmbio e para combater inflação - ou seja, você jogou fora uma parte desses recursos.

Valor: De algum modo, o Brasil é refém da "maldição" dos recursos naturais, se é que ela existe?

Delfim : Não tem maldição nenhuma. O Brasil aproveitou esses recursos e desenvolveu um setor agrícola extremamente eficiente. A agroindústria, que talvez seja um quarto do PIB, é um setor altamente eficiente. É um setor sofisticadíssimo, mas muito prejudicado por falta de estrutura, de transportes, de portos, por falta de armazenagem e por falta de uma política importante, que é a política de seguro de safra.

Valor: O último Plano de Safra avançou na questão do seguro?

Delfim : Evoluiu muito. Esse último plano de safra é dos melhores que já foram produzidos no Brasil. Ele atentou para algumas coisas críticas. Está começando a haver uma consciência de que o país não tem conseguido fazer chegar a essa gente o progresso da tecnologia na pequena propriedade. No fundo, se abandonou um sistema de assistência técnica que já foi muito eficiente no Brasil e esse plano começou a reconstruí-lo. Se você conseguir mobilizar a pequena agricultura com os avanços da tecnologia que estão na gaveta, vai produzir uma revolução.

Se conseguirmos mobilizar a pequena agricultura com os avanços da tecnologia, haverá uma revolução

Valor: Num artigo de 2004, o sr. dizia que, depois do completo desastre que foi a política agrícola do governo Collor e da pecha de caloteiros no governo FHC, o relação do governo com o setor começava a melhorar. Isso se comprovou?

Delfim : Melhorou. O problema da agricultura é que ela é uma atividade de altíssimo risco. A agricultura depende da vontade de São Pedro. Como a agricultura precisa de crédito, o fato de a receita ser altamente influenciada pelas variações climáticas coloca uma dificuldade gigantesca. Por quê? Quando, por efeito do clima, há uma queda da oferta de produtos, os preços não sobem para suprir a renda. O agricultor vê seu patrimônio desaparecer. Como não há seguro de safra, ele fica devendo. Na próxima vez, você tem um acordo com o governo. Mas o governo é pior do que o pior dos banqueiros. Cada negociação de dívida é uma tragédia, ou foi uma tragédia no passado. Você embutia custos espantosos, taxas de juros gigantescas. Desse ponto de vista, houve uma avanço muito grande. Já começou no Fernando Henrique e veio avançando. Para a agricultura funcionar tranquilamente, ela tem que ter seguro de safra. Ou seja, se houver um acidente, a tua renda é complementada e você pode honrar os seus compromissos.

Valor: Nesse sentido, qual é o papel do Estado na política agrícola? 

Delfim : Provavelmente, a pesquisa não se sustenta simplesmente com financiamento privado. O Estado produziu, ou pelo menos divulgou, todas a grandes invenções, da internet até a semente do milho transgênico.

Valor: Como o senhor vê a atuação da Embrapa. É natural que ela perca participação nos mercados mais cobiçados como soja e milho?

Delfim : A Embrapa não foi feita para substituir o setor privado. Ela é um instrumento de pesquisa. O mundo se aproveita das pesquisas da Embrapa. Quando você diz que a Embrapa reduziu participação, ela não reduziu o seu papel. Ela está se sofisticando e é claro que os ganhos são menores, na margem. A base é muito mais alta. Mas a Embrapa foi e é um instrumento distintivo, que distingue a economia brasileira do resto do mundo. O que você não pode é pensar que essas coisas acontecem por acaso. E não é só no Brasil, não. A soja nos EUA também dependeu do departamento de agricultura [USDA]. O Estado é um fator importante no processo de desenvolvimento.

Valor: O sr. acha que o Estado deve intervir nos preços agrícolas?

Delfim : O Estado precisa de um estoque regulador por causa da flutuação da agricultura, da oferta. A política de estoques é fundamental. Não para perturbar, mas para regular o mercado quando há um acidente climático.

Valor: O Estado brasileiro incentivou uma concentração entre frigoríficos? O sr. concorda com isso?
Delfim : Isso é um grave erro, porque cria organismos que são um oligopsônio na hora de comprar e oligopólios na hora de vender. Você não pode ter milhões de produtores e dois sujeitos comprando tudo o que eles produzem. Aliás, essa é uma tragédia que está acontecendo no mundo. O número de empresas que transacionam commodities se reduziu dramaticamente. O monopólio é muito ruim. Estruturas oligopsônicas e oligopolíticas são contra o aumento da produtividade, mesmo quando se diz que há grandes economias de escala. A estrutura em que você reduz a quantidade de oferta ou reduz a quantidade de compradores é uma estrutura perversa.

Valor: Mas uma das alegações, no caso dos frigoríficos, é que a concentração ajudaria a melhorar a sanidade da cadeia produtiva.

Delfim : A política sanitária é coisa do governo. Você não precisa de gente grande para comprar gado bom. Você pode ter gente pequena comprando gado da melhor qualidade do ponto de vista da sanidade.

Valor: E o que fazer para combater esse processo de concentração?

Delfim : O Estado não pode deixar que se formem monopólios. Quando existir um monopólio, ele tem que ter uma agência reguladora independente e que ele não possa se apropriar dela.

Valor: No caso do Brasil, o Estado escolheu os vencedores?

Delfim : Isso não importa. A política em si é que está equivocada. Não é que se escolheu A ou B. Pode até ter escolhido pessoas ou empresas que vão progredir. Mas o que está errado é a política.

Valor: Na área política, como o sr. vê o papel da bancada ruralista? Existem polêmicas na questão ambiental, na questão indígena...

Delfim : A bancada ruralista faz o seu papel. A questão indígena está definida na Constituição. Sempre há dois lados. Se você entrega tudo para antropólogos, vai para um lado. Se você entrega para empresários agrícolas, vai para o outro. É por isso que tem que ter o Estado para arbitrar.

Valor: E como conciliar produção agrícola e preservação ambiental?

Delfim : Não há contradição entre a preservação do meio ambiente a agricultura. Só um agricultor muito burro não preserva o meio ambiente. O que há é uma certa contradição entre algumas pessoas que gostariam muito de voltar para a Idade da Pedra e aqueles que acham que não têm que tomar conhecimento de nada, e querem colocar um trator onde puder. De novo: por isso é que existe o Estado, Deus meu!

Valor: E o que fazer com os frequentes casos de exploração de trabalho análogo à escravidão?

Delfim : Pondo na cadeia.

Valor: O que o senhor acha da proposta de expropriar a terra de quem fizer esse tipo de exploração?

Delfim : Não é uma solução, mas seguramente é uma forma de impedir que isso aconteça. Tem que ser uma punição draconiana.

O psicólogo que pode ser o “novo Abilio” do Pão de Açúcar


Ronaldo Iabrudi é o representante do Grupo Casino no Brasil; ex-presidente da Telemar, o mineiro é um dos cotados para comandar o conselho do Pão de Açúcar

CAROL CARQUEJEIRO/Valor Econômico
Ronaldo Iabrudi, representante do Casino no Brasil, em foto de 2005
Ronaldo Iabrudi: cotado para substituir Abilio, executivo teve passagem conturbada pela Telemar

São Paulo – A saída de Abilio Diniz do Pão de Açúcar colocou fogo no mercado de apostas sobre quem vai substituí-lo na presidência do conselho do grupo fundado por seu pai, há 65 anos. Por ora, um dos mais cotados é Ronaldo Iabrudi, representante do Grupo Casino no Brasil.

Caso Iabrudi seja confirmado no posto, terá protagonizado uma ascensão meteórica ao comando da maior rede de varejo do país. Isto porque o executivo foi contratado no início de junho como representante dos interesses do Casino no Brasil. Um mês depois, ele já era indicado para assumir um assento no conselho de administração do Pão de Açúcar.

No comunicado em que apresentou Iabrudi como seu homem forte no Brasil, há três meses, o Casino o qualificou como “um executivo altamente experiente”, e sua contratação reafirmava “o compromisso [do Casino] com o Brasil.”


O cortador de custos


Iabrudi pode não ser uma celebridade do mundo dos negócios, como Abilio Diniz, mas sua atuação à frente de grandes empresas mostra como seu estilo foi forjado – e um pouco do que estaria esperando o Pão de Açúcar.

Seu maior cartão de visitas foi a presidência da Telemar (atual Oi), entre o final de 2002 e meados de 2006. Foi ali que Iabrudi viveu seus melhores dias, com resultados elogiados por analistas, e também a sua maior guerra corporativa. E, nesses episódios, apurou seu estilo de atuação.

Iabrudi foi contratado pela Telemar em 2000, para dirigir as operações do Nordeste. Seus resultados na região o levaram para o topo da hierarquia. Em julho de 2001, ele assumiu a presidência da empresa, com a missão de torná-la mais enxuta, racional e lucrativa.

E o executivo não se fez de rogado. A reestruturação, lançada em agosto daquele ano, unificou as operações das 16 empresas controladas pela holding, abateu 120 milhões de dólares em custos e reduziu o número de funcionários de 20.629 para 11.886. Tudo isso em apenas um ano.

Poderia se esperar um estilo mais brando de gestão de um psicólogo formado pela PUC de Minas Gerais, com mestrado em Formação de Adultos, mas o foco em resultados deu o tom de sua gestão. Conta-se que, em uma das rodadas de cortes, Iabrudi demitiu 30 diretores na véspera de Natal.
Conflitos


Mas a gestão de Iabrudi na Telemar não escapou a críticas e a uma guerra interna por poder. Do lado de fora da empresa, consumidores seguiam se queixando do atendimento da operadora, que figurava entre as mais reclamadas pelos consumidores.

Do lado de dentro, Iabrudi disputou espaço com uma estrela então em ascensão: Luiz Eduardo Falco. Ex-diretor de marketing da TAM, Falco entrou para a Telemar em 2001 e transformou uma minúscula operação de telefonia celular na hoje conhecida Oi.

Pelo caminho, como era de se esperar, trombou com o presidente da Telemar, Iabrudi, a quem se reportava no papel, mas não na prática.

Esta foi uma das maiores guerras por poder a que o mundo dos negócios brasileiro assistiu, no final da década passada. Em um determinado momento, Iabrudi submeteu a área de telefonia móvel ao seu controle. O contra-ataque foi a demissão de uma série de executivos ligados à telefonia fixa, o bastião de Iabrudi.

O expurgo foi apresentado como um civilizado corte de custos e de sobreposição de funções, mas o mercado o interpretou como o avanço de Falco na estrutura da Telemar. O motivo foi simples: na maior parte dos cargos, quem foi eliminado era da telefonia fixa. Eram os aliados de Falco galgando poder. Iabrudi deixou a presidência da Telemar em 2006 com seus resultados questionados pelo mercado e por parte dos donos da operadora.


Nova chance


O executivo teve outra passagem por uma grande empresa entre o final de 2007 e o início de 2012, quando foi levado pela GP Investimentos à presidência da mineradora Magnesita, conhecida por seus produtos refratários.
 
Lá, o executivo atacou em duas frentes. Primeiro, cortou custos. Somente nos primeiros meses de sua gestão, 25% dos funcionários saíram, sejam pelo plano de demissão voluntária, seja por cortes mesmo. Iabrudi vendeu ativos não diretamente relacionados ao foco do negócio e terceirizou funções.

Mas sua maior tacada foi a compra da alemã LWB por 657 milhões de euros. O negócio catapultou a Magnesita, na época, da décima para a terceira posição no ranking dos produtores de refratários.


Balanço


O ponto é que nem todos os números da gestão de Iabrudi à frente da Magnesita foram positivos. É verdade que a receita líquida da empresa saltou de 861,709 milhões de reais, em 2007, para 2,319 bilhões em 2001 – o último ano cheio de Iabrudi na empresa.

O outro lado, porém, é que o lucro líquido caiu de 108,794 milhões de reais para 98,550 milhões no mesmo período – com direito a um prejuízo de 32,541 milhões em 2009, e a um lucro de 92,344 milhões em 2010.

Até aqui, a trajetória de Iabrudi equilibra-se entre conquistas e alguns resultados que não impressionaram os analistas. Os cortes de custos que promoveu nas empresas pelas quais passou surtiram efeitos, é claro – mas não a ponto de colocá-lo no hall das celebridades. Se for mesmo confirmado como novo líder do Pão de Açúcar, terá a chance de passar pela prova dos nove.
 

Gabrielli quer resposta dura para espionagem à Petrobras


O ex-presidente da estatal considerou "abominável" a tentativa da NSA de espionar a companhia

Sabrina Valle, do
Marcello Casal Jr./Agência Brasil
José Sérgio Gabrielli, presidente da Petrobras
Gabrielli: ele ressalva que o sistema de tecnologia da Petrobras "é muitíssimo bem protegido"

Rio - O ex-presidente da Petrobras José Sergio Gabrielli considerou "abominável" a tentativa da Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos (NSA) de espionar a companhia. Gabrielli defendeu uma resposta contundente pela via diplomática do Brasil, comentando o assunto na manhã desta segunda-feira, 9.

"A simples tentativa de 'hackear' informações da Petrobras é abominável. Merece uma resposta enérgica por parte da diplomacia brasileira", disse ele, hoje secretário de Planejamento da Bahia.

Gabrielli ressalva que o sistema de tecnologia da Petrobras "é muitíssimo bem protegido" e que a tentativa de invasão não significa que de fato tenha havido roubo de informações.

Segundo ele, a empresa sofre milhares de tentativas de ataque cibernético. "As tentativas de ataque são frequentes, corriqueiras, são milhares. Mas o fato de tentarem invadir não significa que houve sucesso", disse.

Gabrielli diz que informações econômicas e estratégicas da companhia podem ser motivo de espionagem, mas que tentar acertar o alvo de interesse não passa de especulação neste momento, sendo necessário apurar. 

O executivo lembra que, durante sua gestão, houve tentativa, por exemplo, de roubo de imagens submarinas, em área de produção offshore.

Enquanto presidente da Petrobras, Gabrielli disse que a companhia dialogava com a embaixada americana. Acrescenta, inclusive, que esteve pessoalmente com o presidente Barack Obama durante sua gestão.

Considerou normal a troca de informações da companhia com o governo americano - reforçando que julga "abominável" hackear informações sigilosas para espionagem. Gabrielli lembra que comenta o caso como ex-presidente e cidadão, já que deixou a companhia há 1,5 ano.
Silêncio mantido


A Petrobras manteve a posição de ontem e informou, na manhã de hoje, via assessoria de imprensa, que não vai comentar a denúncia de que a NSA teria usado seu aparato de espionagem para obter informações estratégicas da companhia.

Negociações da Rodada Doha devem ser intensificadas


O embaixador brasileiro Roberto Carvalho de Azevêdo, de 55 anos, é o primeiro latino-americano na direção-geral da OMC

Carolina Sarres, da
Antonio Cruz/ABr
Primeiro brasileiro eleito diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), o embaixador Roberto Carvalho de Azevêdo
Roberto Carvalho de Azevêdo: diretor-geral da OMC acredita que o multilateralismo é a melhor solução contra o protecionismo

Brasília - O diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), o brasileiro Roberto Carvalho de Azevêdo, disse hoje (9) que os prejuízos gerados pelo fracasso das negociações na Rodada Doha serão ainda maiores do que os benefícios de um possível sucesso. Azevêdo discursou no início a manhã, em Genebra, na Suíça, na cerimônia que marcou o início de sua gestão na OMC.

"O mundo não vai esperar a OMC por tempo indeterminado. E as soluções não serão tão eficientes e inclusivas quanto as que encontrarmos aqui", destacou o diretor-geral, sobre as alternativas que têm sido buscadas por diversos países devido à paralisia de Doha, cujos temas voltarão a ser discutidos na 9ª Conferência Ministerial da OMC, em Bali, na Indonésia, no início de dezembro.

Azevêdo já havia dito, em outros discursos, que a necessidade de intensificação das negociações de Doha seria o principal desafio de sua gestão. "O que as pessoas veem é [a Rodada] Doha e a percepção que têm é de falta de efetividade, paralisia. O nosso fracasso irá lançar uma sombra sobre o sistema e é essencial dar novo fôlego às negociações", disse.

O diretor-geral acredita que o multilateralismo é a melhor solução contra o protecionismo e explicou que irá privilegiar os países em desenvolvimento e de menor desenvolvimento relativo nas negociações para garantir que "suas vozes sejam ouvidas" no âmbito do sistema multilateral.

O discurso de Azevêdo foi o primeiro como diretor-geral da organização. Sua posse ocorreu na manhã de hoje, embora ele tenha assumido o cargo há uma semana, em substituição ao francês Pascal Lamy. O chanceler brasileiro, Luiz Alberto Figueiredo Machado, está em Genebra para acompanhar a posse do colega.

O embaixador brasileiro Roberto Carvalho de Azevêdo, de 55 anos, é o primeiro latino-americano na direção-geral da OMC. Disputada até o último minuto, a eleição envolveu uma longa negociação que vem desde o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.