São Paulo - Em depoimento à
Polícia Federal no dia 24 de fevereiro, o presidente da
Odebrecht Infraestrutura, Benedicto Barbosa, explicou suas conversas com o dono da holding
Marcelo Odebrecht interceptadas pela
Lava Jato.
Benedicto Barbosa afirmou que, em um dos diálogos de novembro de 2014, eles tratam de doações para o presidente nacional do
PSDB Aécio Neves e da preocupação do tucano com o ex-governador do
Rio de Janeiro
Sérgio Cabral (PMDB), investigado na Lava Jato por suspeita de ter
recebido propina de empreiteiras envolvidas nas obras do Complexo
Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj).
É a primeira vez que os nomes do tucano e do peemedebista são citados
por executivos da Odebrecht aos investigadores da Lava Jato.
"Que deseja consignar que a interpretação dada pelo analista (da Polícia
Federal) de que havia preocupação, por parte da Odebrecht, em relação a
Sérgio Cabral no caso MF, é equivocada, uma vez que tal preocupação
teria sido manifestada por Aécio Neves", afirmou o executivo aos
investigadores, sem dar mais detalhes sobre como essa preocupação do
tucano foi relatada a eles.
Benedicto afirma ainda que a preocupação não envolve nenhuma "conduta
criminosa". Em março de 2015 o Superior Tribunal de Justiça abriu
inquérito para investigar o governador do Rio, Luiz Fernando Pezão, e o
ex Sérgio Cabral por suspeita de terem recebido R$ 30 milhões em 2010 do
esquema de corrupção na Petrobras.
Em um dos diálogos Benedicto diz: "Preciso resolver R$ 100 mil (tarja
preta). Vou aproveitar este momento PT/PSDB", e Marcelo Odebrecht
responde: "Não entendi, depois vc me fala seguro". Eles estavam
discutindo doações eleitorais para Aécio e "Piciani".
As empresas do grupo Odebrecht doaram R$ 8 milhões à campanha do tucano e
R$ 16,7 milhões ao comitê da presidente Dilma Rousseff.
Nem o deputado federal Leonardo Picciani (PMDB) nem o seu pai e
presidente da Assembleia Legislativa do Rio, Jorge Picciani, aparecem
como destinatários de doações da Odebrecht. A empreiteira, contudo, doou
R$ 13,9 milhões ao PMDB em 2014.
"Que sobre o diálogo da página 35 da representação, a qual refere um
suposto canal seguro existente entre o declarante e Marcelo Odebrecht
para conversas, deseja consignar que interpreta que o diálogo se refere a
falar quando estivesse seguro, não por meio de um meio seguro", disse o
executivo.
Ele afirmou ainda que considera "seguro" para conversar com Marcelo Odebrecht o telefone de seu escritório na empreiteira.
Benedicto não explica nem é questionado pelos investigadores da Polícia
Federal que, por se tratar de uma investigação em primeira instância,
não envolve políticos, porque teriam sido tratadas as doações eleitorais
com Marcelo em 7 de novembro, 12 dias após o fim do segundo turno das
eleições de 2014 na qual Dilma foi reeleita.
Pela legislação eleitoral até então, as campanhas presidenciais podiam
receber doações mesmo depois de terminado o segundo turno, até um prazo
limite. Atualmente, por determinação do STF, as doações empresariais
para campanhas estão proibidas
Os diálogos entre os executivos foram um dos elementos utilizados pela
Polícia Federal para a deflagração da 23ª fase da Lava Jato, que levou à
prisão o casal de marqueteiros João Santana e Mônica Moura, que
trabalharam nas campanhas presidenciais de Lula (2006) e Dilma Rousseff
(2010 e 2014), e também à prisão temporária de Benedicto, solto no dia
26 de fevereiro.
Nos diálogos apresentados ao juiz Sérgio Moro, a PF coloca tarja preta
em alguns nomes e siglas para preservar a identidade de políticos e
autoridades com prerrogativa de foro. Em seu depoimento, contudo,
Benedicto cita os políticos relacionados aos diálogos, sempre
inocentando eles de quaisquer condutas criminosas.
Para a Polícia Federal, contudo, os diálogos entre Marcelo Odebrecht e
Benedicto indicam que eles tratavam "de assuntos escusos", "certamente
não se limitando a obter recursos para financiamento oficial de
campanhas eleitorais", diz a Polícia Federal no relatório que embasou a
23ª fase da operação.
TSE
As doações da Odebrecht a Aécio Neves foram uma das irregularidades
apontadas pelo Tribunal Superior Eleitoral ao julgar a prestação de
contas da campanha tucana em 2014.
De acordo com a assessoria técnica do tribunal, Aécio repassou para o
PSDB uma doação de R$ 2 milhões da Odebrecht, mas não registrou a
transferência na prestação de contas.
Questionada na época, a assessoria de imprensa do PSDB afirmou que todos
os questionamentos foram respondidos e as doações, contabilizadas.
A Odebrecht ainda não comentou teor do depoimento do executivo.
A assessoria de Leonardo e Jorge Picciani disse que "como é sabido,
todas as doações recebidas na eleição de 2014, mesmo quando recebidas
via diretórios nacional ou estadual dos partidos, passaram a ter
obrigatoriamente a identificação da origem, ou seja, da empresa que doou
o dinheiro ao Diretório".
Segundo a assessoria, basta conferir no site do TSE e "a única
explicação que pode haver para o nome de Picciani ter sido citado neste
contexto é o fato de ele, como é sabido, ter coordenado, no Rio, a
campanha presidencial de Aécio Neves em 2014, tanto no primeiro quanto
no segundo turno".
Ainda de acordo com a assessoria, a atuação de Picciani, entretanto, era
apenas política. "Ele nunca tratou de questões relativas ao
financiamento da campanha de Aécio, cujas despesas eram de
responsabilidade do comitê financeiro do candidato."
A assessoria de Aécio Neves explicou que "o depoimento mencionado pelo
jornal apenas confirma as informações prestadas à Justiça Eleitoral.
É de conhecimento público que a empresa Odebrecht, assim como diversas
outras, fez doações à campanha do PSDB, inclusive, como prevê a lei,
depois das eleições, para cobrir débitos existentes".
Com relação aos diálogos, a assessoria diz que o "senador não é parte de
nenhum deles, não tendo, portanto, nada o que acrescentar".