Estamos finalizando o mês de março com três movimentos em ebulição:
o primeiro é para tirar Dilma do poder e dar posse para Michel Temer (o
mais pronto possível); o segundo é a operação abafa tudo (das castas
implicadas em corrupção); o terceiro é para continuar a punição de todos
os envolvidos com corrupção.
Ex-ministros de FHC processados
Faz
parte dessa terceira frente a decisão da 1ª Turma do STF que aceitou
recurso da PGR, interposto contra o arquivamento de processos
(determinado por Gilmar Mendes, em 2002) que pedem a reparação de prejuízos relativos à ajuda do BC para bancos no tempo do governo FHC. Haverá a retomada de duas ações de reparação de danos por improbidade administrativa
contra os ex-ministros do governo de Fernando Henrique Cardoso, do
PSDB: Pedro Malan (Fazenda), José Serra (Planejamento, Orçamento e
Gestão), Pedro Parente (Casa Civil), além de ex-presidentes e diretores
do Banco Central. O recurso questionava a assistência financeira de R$
2,97 bilhões do Banco Central dada, no governo FHC, aos bancos Econômico
e Bamerindus, em 1994, dentro do Programa de Estímulo à Reestruturação e
ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional (Proer), que socorreu
bancos em dificuldades. “Afundar um banco é muito mais rentável que roubar um banco”
(Bertold Brecht). Gilmar Mendes tinha arquivado tudo sob o argumento
(tido como inconsistente) de que os valores apontados “em muito
ultrapassam os interesses individuais” dos envolvidos. Os ministros da
1ª Turma reverteram esse entendimento.
O STF e a Lava Jato, doravante, com tantas delações e provas,
certamente tentarão fechar o cerco contra grande parte das castas
dominantes, de todos os partidos. Mas não será tarefa fácil enquadrar as
soberbas castas influentes e governantes. Os contra-ataques já estão
começando. Essa foi a tática usada na operação Mãos Limpas na Itália
(que acabou sufocada).
Operação Mãos Limpas
Dois
magistrados italianos (Gherardo Colombo e Piercamillo Davigo), que
atuaram durante longos anos na operação Mãos Limpas (Itália), foram
taxativos
[1]:
(a)
a Mãos Limpas foi contra-atacada pelos políticos (que queriam preservar
suas carreiras dentro das castas intocáveis – aprovaram leis de
anistia, diminuíram prescrição, aboliram vários crimes, houve um decreto
“salva-ladrão” etc.); (b) a magistratura italiana sofreu bombardeios
pesados deles, particularmente midiáticos – “juízes comunistas”, “juízes
interferindo na política”, “juízes parciais”, “o diabo também veste
toga” etc.); (c) o apoio popular foi muito relevante enquanto se
investigava a corrupção das castas poderosas, dos de cima (5 partidos
desapareceram); (d) foi diminuindo ao longo dos anos e se derreteu
quando começaram a investigar a corrupção de todos, não só dos políticos
e empresários.
Mais:
(e) a Justiça criminal é impotente para mudar o cenário da corrupção, quando esta é difusa na sociedade
[2];
(f) sem modificar a educação e a cultura pouca mudança acontece; (g) a
Itália hoje é corrupta tanto quanto era antes da Mãos Limpas (aliás,
ocupa a posição 61ª do ranking da Transparência Internacional; o Brasil
está no 76º lugar).
Próximos passos no Brasil:
as castas intocáveis (políticos e empresários envolvidos com a corrupção
e as pilhagens do país) vão contra-atacar, ou seja, descarregarão todas
as suas forças contra a Lava Jato e seus operadores. Enquanto se
investigava o PT e seus aliados era uma coisa, agora há “planilhas” e delações contra todos.
A Lava Jato “deixou de ser interessante” para as castas poderosas que
querem continuar desfrutando dos seus privilégios seculares. Todos os deslizes legais
da Lava Jato serão duramente castigados (por todos os políticos e
empresários acusados de corrupção, pouco importando o partido).
De várias maneiras as castas atacarão:
(a) destruindo a imagem dos juízes, procuradores e policiais; (b)
tentando aprovar leis de anistia (o que favoreceria, desde logo, Eduardo
Cunha, Renan, Lula, várias lideranças do PSDB etc.); (c) fazendo
“acordão” para preservar os mandatos dos processados (Cunha, Renan
etc.); (d) enfatizando que a corrupção é generalizada no país; (e)
protelando as investigações (tanto quanto possível), (f) favorecendo a
morosidade do STF (que até hoje só recebeu uma denúncia no caso
Petrolão) etc.
Se não houver intensa mobilização da sociedade, as castas intocáveis vencerão mais uma guerra
(apesar de perderem alguns soldados). Mais: sem educação de qualidade
para todos e mudanças culturais profundas teremos o mesmo destino da
Itália: continuaremos um país sistematicamente corrupto, longe da
observância da lei e da Justiça para todos.
O Brasil é grande, é um gigante, mas não tem sido historicamente maior que suas castas influentes e governantes. Elas se julgam intocáveis e sempre ditaram as regras da ordem social, garantindo sua impunidade. Se esses pontos centrais não forem alterados, perderemos mais um século (o XXI). Nosso sistema socioeconômico e cultural é suicida:
as castas querem para elas mais poder para fazer mais dinheiro e mais
dinheiro para se conquistar mais poder e mais poder ainda para ter mais
dinheiro e assim vai.
De qualquer modo, não se pode ir para ruas
dizendo que “os políticos e os empresários [das castas envolvidas] são
ladrões”, se no momento seguinte não temos comportamento condizente com
as placas que levantamos nas “Avenidas Paulistas” do país.
Temos o direito e o dever de nos indignar
e todas as críticas do mundo devemos lançar contra as castas poderosas,
mas, em países profundamente cleptocratas, como o nosso, ninguém está isento de criar vergonha na cara. Mudar hábitos
arraigados constitui um bom começo. A alternativa a isso é pior: seria
cultivar o cinismo e deixar que o enterrem com a inscrição “aqui jaz mais um cínico e hipócrita” (que inclusive levantava bandeiras nas manifestações populares).
A propósito: o jornal
O Globo divulgou pesquisa do
Data Popular
que diz: “80% dos entrevistados conhece alguém que já cometeu alguma
ilegalidade, 70% admitem que já cometeram algum tipo de infração e 22%
conhecem um corrupto. Porém, apenas 3% dos participantes se consideram
corruptos”
[3].
Corrupto é o outro (diz
a matéria do jornal citado). Quando milhões vão às ruas por mais ética,
o jornal flagra pequenos delitos no dia a dia. Apesar de admitir que já
fez algo irregular, a maioria só enxerga desrespeito às regras em
terceiros. Vale para o brasileiro a “lei da vantagem” ou a “lei de
Gérson” (criada em meados de 70).
A matéria diz ainda ter
identificado alguns “desvios éticos” praticados na sociedade e que
deixam a falsa sensação de que faz parte do DNA dos brasileiros querer
levar a melhor em tudo, seja ao não dar uma nota fiscal, tentar subornar
o guarda para evitar multa, falsificar uma carteirinha de estudante,
furar fila, comprar produtos falsificados, bater ponto para o colega,
colar na prova da escola ou fazer “gato” na TV paga, entre outros.
Maioria admite que já fez algo irregular
Pesquisa Data Popular sobre percepção de corrupção – Arte/O GLOBO
Em
outro estudo realizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), a
percepção dos entrevistados em relação a forma de agir do brasileiro
reflete como tratamos as pessoas, mesmo as que nos são mais próximas:
82% acham que a maioria quer tirar vantagem, e só 16% dizem que as
pessoas agem de maneira correta.
“O que tem é essa visão de que o
brasileiro sempre quer tirar vantagem, ele passa pelo acostamento, fura
fila, não devolve o troco, cola na prova, e isso afeta essa avaliação.
As pessoas podem defender uma sociedade sem corrupção, mas, nessas
pequenas coisas, elas não têm essa ética, e aí você começa a perder
confiança. É uma confiança desconfiada — conta Renato da Fonseca,
coordenador da pesquisa”.
“Dependendo dos óculos que você usa, da
pessoalidade ou da impessoalidade, pode enxergar determinada atitude
como um crime, se for alguém que você não conhece, ou mudar essa
classificação para uma pequena infração ou delito, quando se trata de
alguém próximo. Aqui há uma elasticidade moral muito grande, que se
estica mais ou menos conforme a situação que se apresenta. No trânsito,
por exemplo, respeito às regras, mas todos os dias vejo as pessoas
cometerem infrações, e elas sequer conseguem enxergam isso, pois acham
que dirigem melhor do que o outro” (Roberto DaMatta).
Os 10
delitos que você já ouviu falar são: (1) transporte “de graça”; (2)
fraude do funcionário público no ponto; (3) fuga da blitz da
lei seca;
(4) habilitação comprada; (5) fraude na meia-entrada (falsidade de
carteira de estudante); (6) sonegação de imposto (R$ 118 bilhões somente
em 2015); (7) comprar produtos piratas; (8) crimes no trânsito; (9)
suborno de guardas e (10) corrupção de fiscais.
Dizia Ruy Barbosa: “O problema do Brasil é a falta de indignação!”
O império das castas intocáveis contra-ataca:
a mídia “engajada” com as grandes causas das castas dominantes será
escalada para cumprir o papel de combatente da Lava Jato. Uma das
técnicas será, doravante, ratificar o que o PT dizia: “a corrução é
generalizada; todos praticamente somos corruptos; quem nunca pecou que
jogue a primeira pedra”. A arma mais poderosa dos opressores (das castas) é o desânimo e a apatia dos oprimidos (do povo).
Tudo será feito para desmobilizar a população.
Se o nível de indignação
popular diminuir, o apoio à Lava Jato vai se esfriando, até se esgotar.
- CAROS
internautas que queiram nos honrar com a leitura deste artigo: sou do
Movimento Contra a Corrupção Eleitoral (MCCE) e recrimino todos os
políticos comprovadamente desonestos assim como sou radicalmente contra a
corrupção cleptocrata de todos os agentes públicos (mancomunados com
agentes privados) que já governaram ou que governam o País, roubando o
dinheiro público. Todos os partidos e agentes inequivocamente envolvidos com a corrupção (PT, PMDB, PSDB, PP, PTB, DEM, Solidariedade, PSB etc.), além de ladrões, foram ou são fisiológicos (toma lá dá ca) e ultraconservadores não do bem, sim, dos interesses das oligarquias bem posicionadas dentro da sociedade e do Estado. Mais: fraudam a confiança dos tolos que cegamente confiam em corruptos e ainda imoralmente os defende.