Claire Cain Miller - The New York Times
Estudo mostra que, quando as mulheres entram num campo de trabalho em grande número, o pagamento diminui
A média anual de remuneração das mulheres teima em permanecer cerca de 20% abaixo da dos homens.
E o motivo pode ser uma realidade preocupante, segundo uma nova
pesquisa: o trabalho feito pelas mulheres simplesmente não é tão
valorizado.
A frase soa como uma banalidade, mas o estudo acadêmico por trás dela
ajuda a explicar a persistência da diferença de pagamento apesar de
fatores que há tempos eram considerados culpados haverem desaparecido.
As mulheres, por exemplo, têm hoje mais anos de escolaridade do que os
homens, quase tanta experiência quanto e as mesmas possibilidades de
perseguir uma carreira com altos salários. A diferença salarial não pode
mais ser descartada com observações simplistas de que as mulheres
superam os homens em trabalhos que pagam menos, como ensino e serviço
social.
Um novo estudo de pesquisadores da Universidade Cornell descobriu que a
diferença entre as carreiras e as indústrias em que os homens e as
mulheres trabalham se tornou recentemente a maior causa única da
discrepância salarial entre os gêneros, sendo responsável por mais da
metade dela. Na verdade, segundo outro estudo, quando as mulheres entram
em algum campo em grandes números, o pagamento diminui - pelo mesmo
trabalho que antes mais homens faziam.
Considere as discrepâncias em empregos que requerem educação formal e
responsabilidade parecidas, ou habilidades, mas dividido por gênero. As
remunerações médias para gerentes de tecnologia da informação (que na
maioria são homens) são 27% mais altas do que para os gerentes de
recursos humanos (em que a maioria é de mulheres), de acordo com dados
do Escritório de Estatísticas do Trabalho. Na outa ponta do espectro
salarial, encarregados da limpeza (normalmente homens) ganham 22 por
cento a mais do que empregadas e faxineiras domésticas (em geral
mulheres).
Quando as mulheres começam a entrar em um trabalho, "ele passa a não
parecer mais tão importante para os resultados ou a requerer tanta
habilidade", explica Paula England, professora de Sociologia da
Universidade Nova York. "O preconceito baseado em gênero está nessas
decisões."
Ela é coautora de um dos mais abrangentes estudos sobre esse fenômeno,
que usa dados do censo americano de 1950 a 2000, quando a parcela de
mulheres aumentou em muitos campos. O estudo, que conduziu com Asaf
Levanon, da Universidade de Haifa, em Israel, e Paul Allison, da
Universidade da Pensilvânia, descobriu que quando as mulheres entraram
em algumas áreas em grandes números, essas carreiras começaram a pagar
menos, mesmo depois de descontadas a educação, a experiência no emprego,
as habilidades, a raça e a geografia.
E existe evidência substancial de que os empregadores dão menos valor a
trabalhos feitos pelas mulheres. "Não é que as mulheres estão sempre
pegando as vagas menores em termos de habilidade ou importância. É
apenas que os patrões decidem pagar menos por elas", diz Paula.
Um exemplo flagrante pode ser encontrado no campo da recreação -
trabalhar em parques ou acampamentos importantes - em vagas que eram
predominantemente masculinas e se tornaram femininas de 1950 a 2000. Os
salários médios por hora nesse setor diminuíram 57 pontos percentuais,
contabilizando a mudança no valor do dólar, segundo uma fórmula complexa
usada por Levanon. O trabalho de bilheteiro também foi de
principalmente masculino para feminino durante esse período e os
salários caíram 43 pontos percentuais.
A mesma coisa aconteceu quando as mulheres se tornaram designers (os
pagamentos caíram 34 pontos percentuais) em grandes números, faxineiras
(queda de 21 pontos percentuais) e biólogas (diminuição de 18 pontos
percentuais no salário). O oposto também foi verdade quando um trabalho
atraiu mais homens. Programação de computadores, por exemplo, costumava
ser um trabalho relativamente insignificante feito por mulheres. Mas,
quando os programadores começaram a superar as mulheres nas vagas, o
setor passou a pagar mais e ganhou prestígio.
Apesar de a diferença vir diminuindo, continua grande. No geral, em
setores em que os homens são a maioria a média de pagamento é de US$962
por semana - 21 por cento mais alta do que em ocupações em que a maioria
é de trabalhadoras, segundo outro estudo novo, publicado pela Third
Way, empresa de pesquisa que tem como objetivo promover uma política de
ideias de centro.
Hoje, as discrepâncias nos tipos de trabalho de homens e mulheres dão
conta de 51% da diferença salarial, uma porção maior do que em 1980,
segundo uma nova pesquisa definitiva feita por Francine D. Blau e
Laurence M. Kahn, economistas da Cornell.
As mulheres estão ocupando vagas que historicamente eram dos homens em
mais campos administrativos do que como operárias. Ainda assim, a
diferença salarial é maior em empregos administrativos que pagam mais,
segundo Francine e Kahn. Uma razão para isso pode ser que esses empregos
demandem mais horas de trabalho e períodos menos flexíveis, e a
pesquisa mostrou que os trabalhadores são desproporcionalmente
penalizados por desejar horários mais livres.
Dos 30 empregos que mais pagam, incluindo executivos-chefes, arquitetos e
engenheiros de computação, 26 são dominados por homens, de acordo com
os dados do Departamento de Trabalho analisados por Emily Liner, autora
do relatório da Third Way. Dos 30 que pagam menos, incluindo
merendeiras, domésticas e cuidadores de crianças, 23 são dominados pelas
mulheres.
Muitas diferenças que contribuíram para a discrepância salarial
diminuíram ou desapareceram desde 1980, claro. Hoje as mulheres em geral
têm mais educação formal do que os homens e quase tanta experiência de
trabalho. As mulheres passaram das tarefas administrativas para empregos
de gerenciamento e se tornaram um pouco mais propensas do que os homens
a ser sindicalizadas. Essas duas mudanças ajudaram a melhorar a
paridade salarial, segundo a pesquisa de Francine e Kahn.
Sim, as mulheres algumas vezes escolhem ocupações que pagam menos porque
são atraídas por vagas que, por acaso, oferecem salários menores, como
cuidadoras ou voluntárias, ou porque querem empregos que demandam menos,
já que possuem responsabilidades familiares fora do trabalho. Mas
muitos cientistas sociais dizem que existem outros fatores
frequentemente difíceis de quantificar, como preconceito de gênero e
pressão social, que diminuem os salários para o trabalho feminino.
Paula England, em outra pesquisa, descobriu que qualquer vaga que
envolva tomar conta dos outros, como enfermagem ou professor de
pré-escola, paga menos, mesmo depois de descartar a parcela
desproporcional de mulheres trabalhando.
Depois de peneirar os dados, Francine e Kahn concluíram que a
discriminação pura pode ser responsável por nove por cento da diferença
salarial. A discriminação também é capaz de, indiretamente, responder
por uma porção ainda maior de discrepância salarial, segundo os
pesquisadores, ao, por exemplo, desencorajar mulheres a seguir carreiras
que pagam mais e que são dominadas por homens.
"Parte disso, sem dúvida, tem a ver com as preferências femininas, seja
por alguns tipos de trabalho ou por flexibilidade, mas podem existir
barreiras para a entrada de trabalhadoras e elas podem ser muito sutis.
Isso deve acontecer porque a própria cultura e a dominância masculina
sobre as carreiras agem como um impedimento", afirma Francine.
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