Acordos x Lei
Prestes
a completar 30 anos de existência, o Tribunal Regional do Trabalho da
15ª Região enfrenta cortes em seu orçamento de cerca de R$ 50 milhões. A
alternativa tem sido reduzir custos estruturais, como água, luz,
telefone e funcionários terceirizados da vigilância e da limpeza. Até os
investimentos no processo judicial eletrônico, que tem sido celebrado
na Justiça, sofreram um corte de mais de 80%.
Ao contrário do orçamento, a quantidade de processos que chega à Justiça do Trabalho não diminui. No último ano, 280 mil processos foram julgados pelos 371 juízes do trabalho da 15ª Região. À frente do TRT-15, o desembargador Lorival Ferreira dos Santos busca soluções para manter o trabalho no mesmo ritmo. Um dos pontos tem sido os centros integrados de conciliação, que usam inclusive os servidores como mediadores, sob a supervisão de magistrados.
Lorival Ferreira completa 30 anos na magistratura do Trabalho em junho. No comando da corte desde 2014 e agora na presidência do Colégio de Presidentes e Corregedores dos Tribunais Regionais do Trabalho (Coleprecor), desde novembro de 2015, ele tem esperança de que o presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Ives Gandra da Silva Martins Filho consiga auxiliar na busca da Justiça Trabalhista por mais verbas.
O desembargador não concorda que a Justiça do Trabalho proteja demais o trabalhador. Segundo ele, a legislação é assim e deve ser interpretada para dar proteção ao lado mais fraco da relação, como ocorre também com idosos, crianças ou consumidores. Um dos fatores que enfraquecem o trabalhador nas disputas, diz ele, é a falta de representatividade dos sindicatos.
Favorável à ratificação Convenção 87 da Organização Internacional do Trabalho, que permite a liberdade sindical, pelo Brasil, ele afirma: “Se todos os sindicatos tivessem representatividade, poderia perfeitamente ser feito o negociado sobre o legislado”. A liberdade sindical, diz Lorival Ferreira, seria uma maneira de flexibilizar algumas questões de forma ordenada.
O presidente do TRT-15 vê pouco espaço para uma reforma trabalhista. Quanto à flexibilização de jornada, tem experimentado o home office para servidores do tribunal, “mas desde que o chefe imediato tenha um controle semanal da produtividade”.
Leia a entrevista:
ConJur — Quais são as desobediências mais recorrentes às leis trabalhistas?
Lorival Ferreira — As desobediências mais comuns referem-se às horas extraordinárias. O trabalhador é contratado para cumprir um horário e trabalha mais que o combinado — quando rescinde o contrato, procura a Justiça para receber por essas horas. Agora, na atual crise econômica, nós temos notado muitas reclamações postulando verbas rescisórias. Obviamente, numa situação de dificuldade econômica, os empresários têm dificuldade de honrar o pagamento das verbas rescisórias e os trabalhadores vêm postular essas verbas e outras que, normalmente, vêm de problemas que o advogado aponta como passíveis de reparação.
ConJur — O presidente do TST, ministro Ives Gandra, recentemente disse que a Justiça do Trabalho é paternalista. A Anamatra disse que isso representava uma opinião pessoal do juiz e não necessariamente dos juízes. A Justiça do Trabalho é paternalista?
Lorival Ferreira — O ministro Ives Gandra é um homem extremamente preparado que tem as suas posições que todos nós respeitamos, em razão da alta sabedoria científica que ele conserva. No entanto, eu penso que, no âmbito trabalhista, o legislador deu uma superioridade jurídica em favor do trabalhador para compensar a supremacia econômica do empresário. Se não fosse assim, certamente haveria muita dificuldade para que o trabalhador fosse fazer uma postulação contra uma grande empresa. Então eu penso que nós, juízes do trabalho (já se vão cerca de 30 anos na magistratura), interpretamos a norma. A legislação é favorável ao trabalhador, que é considerado um hipossuficiente e, por isso, recebe a proteção da legislação. Mas não é só na área trabalhista que existe isso. O Código do Consumidor protege o consumidor. As leis da Previdência protegem quem depende dela. Cada ramo do Direito dá uma proteção àqueles que são os mais fracos. Os idosos, crianças e adolescentes... Todos recebem um benefício da legislação.
ConJur — Empresas que atuam no Brasil e no exterior, como HSBC e TAP, dizem que eles perdem, no Brasil, o mesmo percentual de ações trabalhistas que ganham lá fora. Não há um desequilíbrio nisso?
Lorival Ferreira — Na verdade, quem pode alterar a legislação trabalhista é o Congresso. Os parlamentares é que podem propiciar um debate, uma discussão, e alterar. A nós, juízes, cabe apenas interpretar a legislação posta. Hoje, se fala muito de avançar via normas coletivas e eu concordo com isso. Mas a legislação trabalhista, no artigo 444 da CLT, fala que pode-se negociar tudo, desde que não contravenha as disposições de proteção mínima. Onde estão essas proteções mínimas? Na Constituição da República, na Consolidação das Leis do Trabalho, em leis esparsas. Eu reconheço que, efetivamente, as taxas que se cobra com relação à Previdência Social e outros e outros impostos possa ser, trazer alguma dificuldade para o empresário, mas cabe aos empresários debater isso junto ao governo federal.
ConJur — Médicos, engenheiros, jornalistas e advogados devem ter o mesmo tratamento, como hipossuficientes, que um trabalhador braçal, uma empregada doméstica, por exemplo?
Lorival Ferreira — Evidentemente um engenheiro, um médico ou um alto executivo não pode receber esse mesmo tratamento. Nem mesmo a legislação dá o mesmo tratamento. Dependendo do cargo, o trabalhador sequer ele tem direito a horas extraordinárias. Mas, se tem carteira assinada, a legislação é aplicável. Não poderiam jamais dizer que um gerente teria a mesma proteção que um doméstico. Isso é uma coisa elementar, nós estamos no século XXI. Talvez devesse haver uma adequação nesse aspecto, para excepcionar expressamente essas figuras que, atualmente, não estão excepcionadas na legislação.
ConJur — O Ministério Público do Trabalho no Rio de Janeiro está representando contra vários escritórios de advocacia, acusando-os de considerar sócios quem é, na verdade, empregado. Diante da resistência dos escritórios em fornecerem, ao Ministério Público do Trabalho, os seus contratos sociais, o MPT intimou as empresas a fornecerem seus contratos com escritórios de advocacia e os contratos sociais dos escritórios para essa investida. Em São Paulo, há alguma coisa parecida?
Lorival Ferreira — Até hoje, não tomamos conhecimento a respeito desse tipo de ação. A legislação trabalhista considera trabalhador aquele que explora atividade econômica e equipara a esse mesmo empregador os profissionais liberais e outros, até entidades beneficentes que utilizem de empregados. Então é preciso examinar se, efetivamente, essas pessoas que estão lá atuando como advogados são empregados ou sócios de fato, porque há uma distinção. Só vamos saber disso examinando caso a caso.
ConJur — O Supremo Tribunal Federal, no ano passado, contrariou um entendimento antigo do TST e decidiu que os trabalhadores que aderiram a acordos do plano de demissão incentivada ou voluntária não têm direito a entrar com uma nova reclamação trabalhista pleiteando valores ou itens que não foram contemplados no acordo. Os advogados reclamam que juízes trabalhistas continuam aceitando a esse tipo de pedido. O senhor tem visto isso?
Lorival Ferreira — Quando determinada empresa quer, digamos assim, resolver um problema de excesso de empregados, propõe um plano de demissão voluntária, com o pagamento de cinco ou dez salários para quem aderir. A Justiça do Trabalho tem interpretado que é possível postular outras verbas às quais ele possa ter direito, como horas extraordinárias ou diferenças salariais no passado, levando em consideração que esse PDV seria uma forma de indenização por ele estar abrindo mão de o direito de continuar trabalhando na empresa. A gente tem o dever de acatar e acompanhar decisões da Suprema Corte e se houver descumprimento dessa decisão, a parte prejudicada pode utilizar o instituto da reclamação perante o Supremo, para reformar essa decisão do juiz. Mas essa decisão do STF deve ser também interpretada.
ConJur — O Congresso, o Planalto e o Supremo já sinalizaram ser favoráveis a uma amplitude maior da terceirização que se pratica hoje. Mas a Justiça do Trabalho e o Ministério Público do Trabalho são contra a ampliação do escopo da terceirização. O que acontece?
Lorival Ferreira — Eu costumo dizer que a terceirização não tem volta. Ela veio com a globalização e veio para ficar. O que nós precisamos, e eu acho que aí é um trabalho do Parlamento, é procurar fazer com que ela seja menos gravosa para o trabalhador. Não é razoável ter dois trabalhadores exercendo praticamente a mesma função, com um ganhando R$ 3 mil e o outro ganhando R$ 1 mil. Por enquanto, eu me filio àquela posição de que podemos terceirizar todas as demais atividades periféricas para que o empresário possa se dedicar à atividade-fim. Preocupa-me a terceirização da atividade-fim, porque nós temos verificado alguns casos de precarização. Até os órgãos públicos têm terceirizados, não dá pra ser sectário e resistir a isso. Uma coisa boa que o projeto sobre terceirização que tramita no Congresso traz é a responsabilidade solidária. Hoje, aplicamos a responsabilidade subsidiária: primeiro, se cobra aquele que é o empregador. Se ele não pagar, cobramos o beneficiário da prestação de serviços. O Supremo Tribunal Federal foi chamado a examinar esse aspecto, sobre o artigo 71 da Lei 8.666, e fez uma interpretação interessante. No âmbito do serviço público, é preciso verificar se fiscalizou o prestador de serviço. Isso porque é comum, nas terceirizações, que uma empresa que não tem lastro nenhum, com capital de R$ 2 mil ou R$ 3 mil, pegue um contrato de um grande ente público e, de repente, desapareça, deixando o trabalhador fica sem receber. O beneficiário da prestação de serviço só pode se eximir se tiver fiscalizado.
ConJur — Ministros e juízes assinaram manifestos contra a terceirização. Não era o trabalhador que deveria encabeçar um movimento, já que ele é o titular do direito em questão? Ou será que isso dá razão às duas representações feitas por todas as centrais sindicais do Brasil contra o Ministério Público do Trabalho, na OEA, acusando o órgão de representar interesses próprios — e não dos trabalhadoras?
Lorival Ferreira — Você tem razão quando diz que essa representação deveria ser dos trabalhadores. Ocorre que, no Brasil, lamentavelmente, nós não temos a pluralidade sindical. Com ela, teríamos vários sindicatos e, talvez, o movimento fosse um pouco mais aguerrido. Algumas categorias profissionais fazem um trabalho fantástico, como dos metalúrgicos, dos bancários, e outros. Mas temos muitos sindicatos fracos. O Congresso precisa fazer um debate, aprovar a Convenção 87 da OIT e, talvez, mudar o padrão do movimento sindical, para que tenhamos mais trabalhadores participando e exigindo o cumprimento dos seus direitos. O Brasil está caminhando devagar a vai conseguir chegar lá, eu tenho essa esperança muito otimista a respeito disso.
ConJur — O TRT da 15ª Região tem uma atuação intensa no programa de combate ao trabalho infantil e ao trabalho escravo. Além desses dois temas, o Ministério Público do Trabalho, também se dedica bastante à eliminação do amianto. Esses três problemas, no volume de processos que tramitam pela Justiça do Trabalho, é estatisticamente significativo?
Lorival Ferreira — Nós temos comitês sobre essas questões. Fazemos seminários, palestras e debatendo os problemas. Estatisticamente, são poucos casos, mas são minorias que precisam de cuidado. Nós não estamos aqui para cuidar apenas das maiorias. Há situações difíceis, em que é preciso buscar uma atuação na sociedade, de prevenção.
ConJur — A decisão do STF, que autoriza cumprimento de pena já após a segunda condenação, na segunda instância, se aplica à Justiça Trabalhista?
Lorival Ferreira — Nós não examinamos esse aspecto jurídico, ainda, mas faz sentido. O que nós sempre reclamamos é que há aquela vontade de litigar e a Constituição, as leis permitem uma série de recursos. Acho que devemos valorizar as decisões de primeiro grau. Há um projeto de lei para que a pessoa que recorre de uma decisão e perde pague a mais, para tentar diminuir o número de recursos.
ConJur — Fala-se muito da necessidade de uma reforma trabalhista. Como seria?
Lorival Ferreira — Não são muitos pontos. Os princípios devem ser preservados.
ConJur — Redução da jornada seria um item?
Lorival Ferreira — No meio rural, onde tem o cortador de cana, que é uma jornada análoga ao trabalho degradante, deveria ser uma jornada de seis horas e não de oito. Às vezes, eles praticam dez horas, porque ganham por produção — e, no afã de ganhar um pouco mais, trabalham até a estafa. Precisa haver uma alteração legislativa para buscar um certo equilíbrio. Nós podemos avançar, por exemplo, nas conciliações.
A Justiça do Trabalho tem um verdadeira vocação conciliatória desde a sua criação. Mas hoje temos 100 milhões de ações na Justiça. Aqui no TRT da 15ª Região, estamos fazendo um grande esforço, criamos oito centros integrados de conciliação — implantamos já sete — e criamos um centro de conciliação no segundo grau.
A Justiça do Trabalho é considerada uma das mais céleres, mas, mesmo assim, nós estamos vivendo uma contradição: num período em que há desemprego em massa, com aumento de reclamações da ordem de cerca de 10%, nós tivemos um corte orçamentário de cerca de R$ 49 milhões. Temos aposentadorias que não podemos repor.
ConJur — Qual é o impacto disso no funcionamento do tribunal e das varas?
Lorival Ferreira — Nós tivemos que fazer a adequação de horário de funcionamento, cortes e mais cortes em água, luz, telefone, terceirizados da vigilância e da limpeza. O processo judicial eletrônico sofreu um corte de mais de 80% e precisa de manutenção.
Nossa expectativa é que o nosso presidente Ives Gandra possa nos ajudar a buscar, junto aos órgãos do governo, uma solução. Nós não queremos e não podemos comprometer a solução dos processos aos trabalhadores e aos empregadores. Conseguimos cortar, até agora, R$ 25 milhões. Falta cortar R$ 24 milhões. De onde vamos tirar? Houve uma discriminação com a Justiça do Trabalho, pois outros ramos do Judiciário não sofreram esse corte astronômico. Será um preconceito com a Justiça do Trabalho?
ConJur — Quantos processos foram julgados no último ano?
Lorival Ferreira — Na primeira instância, chegaram 315 mil processos, foram solucionados 280 mil. Na segunda instância, chegaram 116 mil e 103 mil foram solucionados.
ConJur — Como está o déficit de servidores?
Lorival Ferreira — Temos um déficit de mais de mil servidores. Para se ter uma ideia, tem inclusive um projeto que está no Congresso — já passou pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho e pelo Conselho Nacional de Justiça — cria 973 cargos. Ou seja, o déficit passa de mil.
ConJur — Como é possível manter o ritmo de julgamentos?
Lorival Ferreira — Nós estamos trabalhando no limite. Os servidores e os magistrados do primeiro grau vestem a camisa. Tem vara com três ou quatro servidores a menos e que não pode repor. No TRT, cada gabinete recebe, em média, 12 processos por dia. O tribunal da 15ª Região, como disse a ministra Ellen Gracie, em despacho, é o tribunal mais produtivo do país. E a gente se orgulha disso. São mais de 3,6 mil servidores, 371 juízes no primeiro grau e 55 desembargadores.
ConJur — O trabalho de conciliação tem contado, inclusive, com servidores atuando como mediadores, certo?
Lorival Ferreira — Eles auxiliam nesse papel, com a supervisão de um ou dois magistrados.
ConJur — Qual é o percentual de casos que são resolvidos pela mediação ou conciliação?
Lorival Ferreira — Nos casos espontâneos de conciliação no primeiro grau, vai de 42% a 45%. Nos Centros Integrados de Conciliação (CICs), o índice é maior, vai de 60% a 70%. Fazemos conciliação até por WhatsApp. Isso tem deixado a gente muito confiante. Tem sete CICs espalhados em regiões geográficas e, agora, nós vamos montar um em Sorocaba. Mas isso não quer dizer que os juízes da vara não venham insistindo nas conciliações.
ConJur — O TRT-15 completa 30 anos de existência. Como o senhor define a importância da corte para esta vasta região, que alcança cerca de 600 municípios paulistas?
Lorival Ferreira — Ele nasceu de um desmembramento da 2ª região e nós ficamos com 599 municípios. Na época, tinha apenas 38 juntas de conciliação, não era nem vara. Hoje, alcançamos 153 varas do Trabalho, dez postos avançados e duas varas itinerantes. São mais de 21 milhões de trabalhadores na jurisdição. O tribunal nasceu pequeno, mas, durante os anos, foi se agigantando, mesmo porque o interior do estado passou a crescer bastante. Nesses 30 anos, o TRT-15 foi um órgão importantíssimo para os trabalhadores e para os empregadores, não apenas na solução dos processos, mas também pela representação que tem. A corte não apenas julga processos e participa das conciliações, mas também procura exercer até o trabalho na área social. No processo da Shell-Basf, por exemplo, houve um acordo entre o Ministério Público e a empresa que resultou numa fixação de dano moral coletivo de R$ 200 milhões, que nós remetemos ao Hospital do Câncer de Barretos. Lá em Barretos foram aplicados R$ 35 milhões e, aqui em Campinas, o prefeito doou um terreno onde será construído um hospital do câncer com outros R$ 35 milhões. Várias instituições foram indicadas pelo Ministério Público do Trabalho para receber essas verbas.
ConJur — O senhor assumiu o Coleprecor (Colégio de Presidentes e Corregedores dos TRTs) em novembro. Tem alguma plataforma específica?
Lorival Ferreira — A plataforma é discutir com os 24 regionais todos os problemas relevantes envolvendo a área trabalhista. Nós temos uma interlocução de área através do WhatsApp. Uma vez por mês, durante dois dias, nos reunimos em Brasília para debater. Discutimos coisas como o aperfeiçoamento do PJE, conciliações, o próprio Direito do Trabalho...
ConJur — Como o senhor vê as pressões pra que haja uma flexibilização das leis trabalhistas, principalmente considerando o advento da internet, com home office e outras alternativas?
Lorival Ferreira — Há uma flexibilização já aqui, no âmbito do tribunal. Nós permitimos e regulamentamos o trabalho a distância, tem muita gente trabalhando à distância. Vai contribuir com a mobilidade urbana, vai contribuir com economia de uma maneira geral.
ConJur — Tem um controle da produtividade?
Lorival Ferreira — Nós permitimos esse trabalho desde que o chefe imediato tenha um controle semanal da produtividade. No âmbito das relações típicas trabalhistas, talvez seja possível pensar na flexibilização em negociação coletiva.
ConJur — O que o senhor acha da noção do predomínio do combinado do negociado sobre o legislado?
Lorival Ferreira — No governo Fernando Henrique Cardoso, se pretendeu fazer prevalecer o negociado sobre o legislado. A preocupação foi, exatamente, com relação aos sindicatos fracos, que não tivessem representatividade. Se todos os sindicatos tivessem representatividade, poderia perfeitamente predominar o negociado sobre o legislado, mas ocorre que não temos segurança jurídica com relação à representatividade. Então essa prevalência precarizaria determinados direitos de trabalhadores, o que não seria possível. A flexibilização de forma desordenada seria ruim.
Seria bom ter uma regulamentação com relação a demissões coletivas, instituindo a forma dessas demissões. Nós já tivemos o caso de uma grande empresa que despediu 798 trabalhadores e eu fiquei numa audiência a tarde inteira negociando. Ao fim, estabelecemos um layoff que possibilitou uma requalificação dos trabalhadores. Nesse campo, quem sabe haja uma negociação.
ConJur — Como o senhor vê a atuação do Ministério Público do Trabalho, hoje?
Lorival Ferreira — A atuação do Ministério Público do Trabalho no âmbito da 15ª Região é boa. Eles têm desempenhado com zelo e dedicação o seu trabalho. Acompanham os problemas no setor produtivo, às vezes abrindo inquérito civil público, às vezes ingressando com as ações civis públicas.
ConJur — A Justiça do Trabalho tem preocupação com a empregabilidade e com o desenvolvimento?
Lorival Ferreira — Os juízes do Trabalho são brasileiros, que amam o país. Há uma preocupação, sim, nem poderia ser diferente. Mas a contribuição dos magistrados e do Ministério Público é muito limitada, como nas palestras, nos seminários, no debate público. O restante é para o empresariado e a classe política.
Ao contrário do orçamento, a quantidade de processos que chega à Justiça do Trabalho não diminui. No último ano, 280 mil processos foram julgados pelos 371 juízes do trabalho da 15ª Região. À frente do TRT-15, o desembargador Lorival Ferreira dos Santos busca soluções para manter o trabalho no mesmo ritmo. Um dos pontos tem sido os centros integrados de conciliação, que usam inclusive os servidores como mediadores, sob a supervisão de magistrados.
Lorival Ferreira completa 30 anos na magistratura do Trabalho em junho. No comando da corte desde 2014 e agora na presidência do Colégio de Presidentes e Corregedores dos Tribunais Regionais do Trabalho (Coleprecor), desde novembro de 2015, ele tem esperança de que o presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Ives Gandra da Silva Martins Filho consiga auxiliar na busca da Justiça Trabalhista por mais verbas.
O desembargador não concorda que a Justiça do Trabalho proteja demais o trabalhador. Segundo ele, a legislação é assim e deve ser interpretada para dar proteção ao lado mais fraco da relação, como ocorre também com idosos, crianças ou consumidores. Um dos fatores que enfraquecem o trabalhador nas disputas, diz ele, é a falta de representatividade dos sindicatos.
Favorável à ratificação Convenção 87 da Organização Internacional do Trabalho, que permite a liberdade sindical, pelo Brasil, ele afirma: “Se todos os sindicatos tivessem representatividade, poderia perfeitamente ser feito o negociado sobre o legislado”. A liberdade sindical, diz Lorival Ferreira, seria uma maneira de flexibilizar algumas questões de forma ordenada.
O presidente do TRT-15 vê pouco espaço para uma reforma trabalhista. Quanto à flexibilização de jornada, tem experimentado o home office para servidores do tribunal, “mas desde que o chefe imediato tenha um controle semanal da produtividade”.
Leia a entrevista:
ConJur — Quais são as desobediências mais recorrentes às leis trabalhistas?
Lorival Ferreira — As desobediências mais comuns referem-se às horas extraordinárias. O trabalhador é contratado para cumprir um horário e trabalha mais que o combinado — quando rescinde o contrato, procura a Justiça para receber por essas horas. Agora, na atual crise econômica, nós temos notado muitas reclamações postulando verbas rescisórias. Obviamente, numa situação de dificuldade econômica, os empresários têm dificuldade de honrar o pagamento das verbas rescisórias e os trabalhadores vêm postular essas verbas e outras que, normalmente, vêm de problemas que o advogado aponta como passíveis de reparação.
ConJur — O presidente do TST, ministro Ives Gandra, recentemente disse que a Justiça do Trabalho é paternalista. A Anamatra disse que isso representava uma opinião pessoal do juiz e não necessariamente dos juízes. A Justiça do Trabalho é paternalista?
Lorival Ferreira — O ministro Ives Gandra é um homem extremamente preparado que tem as suas posições que todos nós respeitamos, em razão da alta sabedoria científica que ele conserva. No entanto, eu penso que, no âmbito trabalhista, o legislador deu uma superioridade jurídica em favor do trabalhador para compensar a supremacia econômica do empresário. Se não fosse assim, certamente haveria muita dificuldade para que o trabalhador fosse fazer uma postulação contra uma grande empresa. Então eu penso que nós, juízes do trabalho (já se vão cerca de 30 anos na magistratura), interpretamos a norma. A legislação é favorável ao trabalhador, que é considerado um hipossuficiente e, por isso, recebe a proteção da legislação. Mas não é só na área trabalhista que existe isso. O Código do Consumidor protege o consumidor. As leis da Previdência protegem quem depende dela. Cada ramo do Direito dá uma proteção àqueles que são os mais fracos. Os idosos, crianças e adolescentes... Todos recebem um benefício da legislação.
ConJur — Empresas que atuam no Brasil e no exterior, como HSBC e TAP, dizem que eles perdem, no Brasil, o mesmo percentual de ações trabalhistas que ganham lá fora. Não há um desequilíbrio nisso?
Lorival Ferreira — Na verdade, quem pode alterar a legislação trabalhista é o Congresso. Os parlamentares é que podem propiciar um debate, uma discussão, e alterar. A nós, juízes, cabe apenas interpretar a legislação posta. Hoje, se fala muito de avançar via normas coletivas e eu concordo com isso. Mas a legislação trabalhista, no artigo 444 da CLT, fala que pode-se negociar tudo, desde que não contravenha as disposições de proteção mínima. Onde estão essas proteções mínimas? Na Constituição da República, na Consolidação das Leis do Trabalho, em leis esparsas. Eu reconheço que, efetivamente, as taxas que se cobra com relação à Previdência Social e outros e outros impostos possa ser, trazer alguma dificuldade para o empresário, mas cabe aos empresários debater isso junto ao governo federal.
ConJur — Médicos, engenheiros, jornalistas e advogados devem ter o mesmo tratamento, como hipossuficientes, que um trabalhador braçal, uma empregada doméstica, por exemplo?
Lorival Ferreira — Evidentemente um engenheiro, um médico ou um alto executivo não pode receber esse mesmo tratamento. Nem mesmo a legislação dá o mesmo tratamento. Dependendo do cargo, o trabalhador sequer ele tem direito a horas extraordinárias. Mas, se tem carteira assinada, a legislação é aplicável. Não poderiam jamais dizer que um gerente teria a mesma proteção que um doméstico. Isso é uma coisa elementar, nós estamos no século XXI. Talvez devesse haver uma adequação nesse aspecto, para excepcionar expressamente essas figuras que, atualmente, não estão excepcionadas na legislação.
ConJur — O Ministério Público do Trabalho no Rio de Janeiro está representando contra vários escritórios de advocacia, acusando-os de considerar sócios quem é, na verdade, empregado. Diante da resistência dos escritórios em fornecerem, ao Ministério Público do Trabalho, os seus contratos sociais, o MPT intimou as empresas a fornecerem seus contratos com escritórios de advocacia e os contratos sociais dos escritórios para essa investida. Em São Paulo, há alguma coisa parecida?
Lorival Ferreira — Até hoje, não tomamos conhecimento a respeito desse tipo de ação. A legislação trabalhista considera trabalhador aquele que explora atividade econômica e equipara a esse mesmo empregador os profissionais liberais e outros, até entidades beneficentes que utilizem de empregados. Então é preciso examinar se, efetivamente, essas pessoas que estão lá atuando como advogados são empregados ou sócios de fato, porque há uma distinção. Só vamos saber disso examinando caso a caso.
ConJur — O Supremo Tribunal Federal, no ano passado, contrariou um entendimento antigo do TST e decidiu que os trabalhadores que aderiram a acordos do plano de demissão incentivada ou voluntária não têm direito a entrar com uma nova reclamação trabalhista pleiteando valores ou itens que não foram contemplados no acordo. Os advogados reclamam que juízes trabalhistas continuam aceitando a esse tipo de pedido. O senhor tem visto isso?
Lorival Ferreira — Quando determinada empresa quer, digamos assim, resolver um problema de excesso de empregados, propõe um plano de demissão voluntária, com o pagamento de cinco ou dez salários para quem aderir. A Justiça do Trabalho tem interpretado que é possível postular outras verbas às quais ele possa ter direito, como horas extraordinárias ou diferenças salariais no passado, levando em consideração que esse PDV seria uma forma de indenização por ele estar abrindo mão de o direito de continuar trabalhando na empresa. A gente tem o dever de acatar e acompanhar decisões da Suprema Corte e se houver descumprimento dessa decisão, a parte prejudicada pode utilizar o instituto da reclamação perante o Supremo, para reformar essa decisão do juiz. Mas essa decisão do STF deve ser também interpretada.
ConJur — O Congresso, o Planalto e o Supremo já sinalizaram ser favoráveis a uma amplitude maior da terceirização que se pratica hoje. Mas a Justiça do Trabalho e o Ministério Público do Trabalho são contra a ampliação do escopo da terceirização. O que acontece?
Lorival Ferreira — Eu costumo dizer que a terceirização não tem volta. Ela veio com a globalização e veio para ficar. O que nós precisamos, e eu acho que aí é um trabalho do Parlamento, é procurar fazer com que ela seja menos gravosa para o trabalhador. Não é razoável ter dois trabalhadores exercendo praticamente a mesma função, com um ganhando R$ 3 mil e o outro ganhando R$ 1 mil. Por enquanto, eu me filio àquela posição de que podemos terceirizar todas as demais atividades periféricas para que o empresário possa se dedicar à atividade-fim. Preocupa-me a terceirização da atividade-fim, porque nós temos verificado alguns casos de precarização. Até os órgãos públicos têm terceirizados, não dá pra ser sectário e resistir a isso. Uma coisa boa que o projeto sobre terceirização que tramita no Congresso traz é a responsabilidade solidária. Hoje, aplicamos a responsabilidade subsidiária: primeiro, se cobra aquele que é o empregador. Se ele não pagar, cobramos o beneficiário da prestação de serviços. O Supremo Tribunal Federal foi chamado a examinar esse aspecto, sobre o artigo 71 da Lei 8.666, e fez uma interpretação interessante. No âmbito do serviço público, é preciso verificar se fiscalizou o prestador de serviço. Isso porque é comum, nas terceirizações, que uma empresa que não tem lastro nenhum, com capital de R$ 2 mil ou R$ 3 mil, pegue um contrato de um grande ente público e, de repente, desapareça, deixando o trabalhador fica sem receber. O beneficiário da prestação de serviço só pode se eximir se tiver fiscalizado.
ConJur — Ministros e juízes assinaram manifestos contra a terceirização. Não era o trabalhador que deveria encabeçar um movimento, já que ele é o titular do direito em questão? Ou será que isso dá razão às duas representações feitas por todas as centrais sindicais do Brasil contra o Ministério Público do Trabalho, na OEA, acusando o órgão de representar interesses próprios — e não dos trabalhadoras?
Lorival Ferreira — Você tem razão quando diz que essa representação deveria ser dos trabalhadores. Ocorre que, no Brasil, lamentavelmente, nós não temos a pluralidade sindical. Com ela, teríamos vários sindicatos e, talvez, o movimento fosse um pouco mais aguerrido. Algumas categorias profissionais fazem um trabalho fantástico, como dos metalúrgicos, dos bancários, e outros. Mas temos muitos sindicatos fracos. O Congresso precisa fazer um debate, aprovar a Convenção 87 da OIT e, talvez, mudar o padrão do movimento sindical, para que tenhamos mais trabalhadores participando e exigindo o cumprimento dos seus direitos. O Brasil está caminhando devagar a vai conseguir chegar lá, eu tenho essa esperança muito otimista a respeito disso.
ConJur — O TRT da 15ª Região tem uma atuação intensa no programa de combate ao trabalho infantil e ao trabalho escravo. Além desses dois temas, o Ministério Público do Trabalho, também se dedica bastante à eliminação do amianto. Esses três problemas, no volume de processos que tramitam pela Justiça do Trabalho, é estatisticamente significativo?
Lorival Ferreira — Nós temos comitês sobre essas questões. Fazemos seminários, palestras e debatendo os problemas. Estatisticamente, são poucos casos, mas são minorias que precisam de cuidado. Nós não estamos aqui para cuidar apenas das maiorias. Há situações difíceis, em que é preciso buscar uma atuação na sociedade, de prevenção.
ConJur — A decisão do STF, que autoriza cumprimento de pena já após a segunda condenação, na segunda instância, se aplica à Justiça Trabalhista?
Lorival Ferreira — Nós não examinamos esse aspecto jurídico, ainda, mas faz sentido. O que nós sempre reclamamos é que há aquela vontade de litigar e a Constituição, as leis permitem uma série de recursos. Acho que devemos valorizar as decisões de primeiro grau. Há um projeto de lei para que a pessoa que recorre de uma decisão e perde pague a mais, para tentar diminuir o número de recursos.
ConJur — Fala-se muito da necessidade de uma reforma trabalhista. Como seria?
Lorival Ferreira — Não são muitos pontos. Os princípios devem ser preservados.
ConJur — Redução da jornada seria um item?
Lorival Ferreira — No meio rural, onde tem o cortador de cana, que é uma jornada análoga ao trabalho degradante, deveria ser uma jornada de seis horas e não de oito. Às vezes, eles praticam dez horas, porque ganham por produção — e, no afã de ganhar um pouco mais, trabalham até a estafa. Precisa haver uma alteração legislativa para buscar um certo equilíbrio. Nós podemos avançar, por exemplo, nas conciliações.
A Justiça do Trabalho tem um verdadeira vocação conciliatória desde a sua criação. Mas hoje temos 100 milhões de ações na Justiça. Aqui no TRT da 15ª Região, estamos fazendo um grande esforço, criamos oito centros integrados de conciliação — implantamos já sete — e criamos um centro de conciliação no segundo grau.
A Justiça do Trabalho é considerada uma das mais céleres, mas, mesmo assim, nós estamos vivendo uma contradição: num período em que há desemprego em massa, com aumento de reclamações da ordem de cerca de 10%, nós tivemos um corte orçamentário de cerca de R$ 49 milhões. Temos aposentadorias que não podemos repor.
ConJur — Qual é o impacto disso no funcionamento do tribunal e das varas?
Lorival Ferreira — Nós tivemos que fazer a adequação de horário de funcionamento, cortes e mais cortes em água, luz, telefone, terceirizados da vigilância e da limpeza. O processo judicial eletrônico sofreu um corte de mais de 80% e precisa de manutenção.
Nossa expectativa é que o nosso presidente Ives Gandra possa nos ajudar a buscar, junto aos órgãos do governo, uma solução. Nós não queremos e não podemos comprometer a solução dos processos aos trabalhadores e aos empregadores. Conseguimos cortar, até agora, R$ 25 milhões. Falta cortar R$ 24 milhões. De onde vamos tirar? Houve uma discriminação com a Justiça do Trabalho, pois outros ramos do Judiciário não sofreram esse corte astronômico. Será um preconceito com a Justiça do Trabalho?
ConJur — Quantos processos foram julgados no último ano?
Lorival Ferreira — Na primeira instância, chegaram 315 mil processos, foram solucionados 280 mil. Na segunda instância, chegaram 116 mil e 103 mil foram solucionados.
ConJur — Como está o déficit de servidores?
Lorival Ferreira — Temos um déficit de mais de mil servidores. Para se ter uma ideia, tem inclusive um projeto que está no Congresso — já passou pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho e pelo Conselho Nacional de Justiça — cria 973 cargos. Ou seja, o déficit passa de mil.
ConJur — Como é possível manter o ritmo de julgamentos?
Lorival Ferreira — Nós estamos trabalhando no limite. Os servidores e os magistrados do primeiro grau vestem a camisa. Tem vara com três ou quatro servidores a menos e que não pode repor. No TRT, cada gabinete recebe, em média, 12 processos por dia. O tribunal da 15ª Região, como disse a ministra Ellen Gracie, em despacho, é o tribunal mais produtivo do país. E a gente se orgulha disso. São mais de 3,6 mil servidores, 371 juízes no primeiro grau e 55 desembargadores.
ConJur — O trabalho de conciliação tem contado, inclusive, com servidores atuando como mediadores, certo?
Lorival Ferreira — Eles auxiliam nesse papel, com a supervisão de um ou dois magistrados.
ConJur — Qual é o percentual de casos que são resolvidos pela mediação ou conciliação?
Lorival Ferreira — Nos casos espontâneos de conciliação no primeiro grau, vai de 42% a 45%. Nos Centros Integrados de Conciliação (CICs), o índice é maior, vai de 60% a 70%. Fazemos conciliação até por WhatsApp. Isso tem deixado a gente muito confiante. Tem sete CICs espalhados em regiões geográficas e, agora, nós vamos montar um em Sorocaba. Mas isso não quer dizer que os juízes da vara não venham insistindo nas conciliações.
ConJur — O TRT-15 completa 30 anos de existência. Como o senhor define a importância da corte para esta vasta região, que alcança cerca de 600 municípios paulistas?
Lorival Ferreira — Ele nasceu de um desmembramento da 2ª região e nós ficamos com 599 municípios. Na época, tinha apenas 38 juntas de conciliação, não era nem vara. Hoje, alcançamos 153 varas do Trabalho, dez postos avançados e duas varas itinerantes. São mais de 21 milhões de trabalhadores na jurisdição. O tribunal nasceu pequeno, mas, durante os anos, foi se agigantando, mesmo porque o interior do estado passou a crescer bastante. Nesses 30 anos, o TRT-15 foi um órgão importantíssimo para os trabalhadores e para os empregadores, não apenas na solução dos processos, mas também pela representação que tem. A corte não apenas julga processos e participa das conciliações, mas também procura exercer até o trabalho na área social. No processo da Shell-Basf, por exemplo, houve um acordo entre o Ministério Público e a empresa que resultou numa fixação de dano moral coletivo de R$ 200 milhões, que nós remetemos ao Hospital do Câncer de Barretos. Lá em Barretos foram aplicados R$ 35 milhões e, aqui em Campinas, o prefeito doou um terreno onde será construído um hospital do câncer com outros R$ 35 milhões. Várias instituições foram indicadas pelo Ministério Público do Trabalho para receber essas verbas.
ConJur — O senhor assumiu o Coleprecor (Colégio de Presidentes e Corregedores dos TRTs) em novembro. Tem alguma plataforma específica?
Lorival Ferreira — A plataforma é discutir com os 24 regionais todos os problemas relevantes envolvendo a área trabalhista. Nós temos uma interlocução de área através do WhatsApp. Uma vez por mês, durante dois dias, nos reunimos em Brasília para debater. Discutimos coisas como o aperfeiçoamento do PJE, conciliações, o próprio Direito do Trabalho...
ConJur — Como o senhor vê as pressões pra que haja uma flexibilização das leis trabalhistas, principalmente considerando o advento da internet, com home office e outras alternativas?
Lorival Ferreira — Há uma flexibilização já aqui, no âmbito do tribunal. Nós permitimos e regulamentamos o trabalho a distância, tem muita gente trabalhando à distância. Vai contribuir com a mobilidade urbana, vai contribuir com economia de uma maneira geral.
ConJur — Tem um controle da produtividade?
Lorival Ferreira — Nós permitimos esse trabalho desde que o chefe imediato tenha um controle semanal da produtividade. No âmbito das relações típicas trabalhistas, talvez seja possível pensar na flexibilização em negociação coletiva.
ConJur — O que o senhor acha da noção do predomínio do combinado do negociado sobre o legislado?
Lorival Ferreira — No governo Fernando Henrique Cardoso, se pretendeu fazer prevalecer o negociado sobre o legislado. A preocupação foi, exatamente, com relação aos sindicatos fracos, que não tivessem representatividade. Se todos os sindicatos tivessem representatividade, poderia perfeitamente predominar o negociado sobre o legislado, mas ocorre que não temos segurança jurídica com relação à representatividade. Então essa prevalência precarizaria determinados direitos de trabalhadores, o que não seria possível. A flexibilização de forma desordenada seria ruim.
Seria bom ter uma regulamentação com relação a demissões coletivas, instituindo a forma dessas demissões. Nós já tivemos o caso de uma grande empresa que despediu 798 trabalhadores e eu fiquei numa audiência a tarde inteira negociando. Ao fim, estabelecemos um layoff que possibilitou uma requalificação dos trabalhadores. Nesse campo, quem sabe haja uma negociação.
ConJur — Como o senhor vê a atuação do Ministério Público do Trabalho, hoje?
Lorival Ferreira — A atuação do Ministério Público do Trabalho no âmbito da 15ª Região é boa. Eles têm desempenhado com zelo e dedicação o seu trabalho. Acompanham os problemas no setor produtivo, às vezes abrindo inquérito civil público, às vezes ingressando com as ações civis públicas.
ConJur — A Justiça do Trabalho tem preocupação com a empregabilidade e com o desenvolvimento?
Lorival Ferreira — Os juízes do Trabalho são brasileiros, que amam o país. Há uma preocupação, sim, nem poderia ser diferente. Mas a contribuição dos magistrados e do Ministério Público é muito limitada, como nas palestras, nos seminários, no debate público. O restante é para o empresariado e a classe política.