Por Roberto Rodrigues
Apesar do desânimo de boa parte da população brasileira com o
frustrante cenário da política, os diferentes setores econômicos e
sociais do País se movimentam com a aproximação das eleições, tendo em
vista as políticas públicas a serem implementadas pelo novo governo a
partir de janeiro. E o agronegócio não fica fora dessa discussão.
Mas com uma diferença fundamental em relação às eleições anteriores,
quando as instituições ligadas ao agro sempre entregaram aos principais
candidatos a cargos majoritários suas propostas para melhorar a
competitividade do campo. Disso ficou uma lição amarga: todos os demais
setores fizeram a mesma coisa, de modo que os governos eleitos não
tinham condições de atender a tudo o que era reivindicado, e os planos
caíam no esquecimento com as imposições do imediatismo.
Desta vez é diferente. Há o convencimento de que o sucesso do
agronegócio não se deve exclusivamente à febril atividade agropecuária
que produz recordes a cada ano, salvando o PIB nacional, gerando
excedentes exportáveis que garantem o saldo comercial externo e criando
empregos mais qualificados: o consenso é que esse êxito não existiria
sem o trabalho urbano. De fato, os insumos todos (máquinas e
equipamentos, fertilizantes, defensivos, veículos) são produzidos em
fábricas urbanas, bem como os serviços (crédito, seguro, assistência
técnica) e os recursos humanos formados nas escolas que também criam
tecnologias. Tudo urbano. Como são urbanas as construtoras de estradas,
ferrovias, portos e armazéns, ou as indústrias de transformação, as de
embalagens, as empresas de transporte, as tradings e as agências de
propaganda e marketing. Ora, esses segmentos interagem para sustentar o
sucesso do agro.
Portanto, nada mais óbvio do que montar um programa que considere o
conjunto desses fatores, e não apenas para um governo, mas para um
período mais longo de, no mínimo, dez anos. E é isso o que está sendo
organizado, com o apoio da academia, envolvendo instituições de ensino,
de pesquisa e de extensão, e o trabalho de duas dezenas de técnicos e
especialistas da mais alta qualidade. Este não será apenas um Plano de
Governo, mas de Estado, visto demandar ações do Executivo, do
Legislativo, da sociedade civil organizada e do Judiciário.
As lideranças do agro decidiram montar um projeto de caráter liberal,
no qual serão apontadas as condições macroeconômicas a buscar, aí
incluídas as reformas necessárias para colocar o País na direção do
desenvolvimento sustentado.
E o foco é a contribuição brasileira para enfrentar um tema central
para a Humanidade: garantir segurança alimentar global sem destruir
recursos naturais, que é um dos maiores desafios do século 21.
E mais
ainda: sabe-se que não haverá paz enquanto houver fome, e também que o
Brasil é um dos poucos países capazes de atender à crescente demanda
interna e externa por alimentos, energia e fibras. O Plano busca então
transformar nosso País no campeão mundial da segurança alimentar e, por
conseguinte, da paz. Esse desafio estará colocado a todos os cidadãos,
urbanos e rurais, pois a todos envolve.
A partir da identificação do que cabe ao Brasil produzir nessa
missão, serão definidos todos os temas que vão compor a estratégia. E aí
entrarão: inovação tecnológica, política comercial, política
industrial, política de renda, gestão do agronegócio (inclusive formação
de gente em todos os níveis), infraestrutura e logística, defesa
sanitária, inclusão social, agroenergia, associativismo, comunicação e,
sobretudo, sustentabilidade, sem o que não haverá competitividade.
Haverá ampla discussão sobre todo este temário, convergindo para a
produção de documento que será debatido com os candidatos e suas equipes
de planejamento estratégico até a exaustão, em busca da compreensão de
cada um quanto ao alcance da proposta.
Desta vez, portanto, o agronegócio não fará nenhum projeto de seu
interesse. Fará um programa de interesse do Brasil que dirá respeito a
todos os cidadãos, e isso é inédito (Roberto Rodrigues, ex-ministro da
Agricultura e coordenador do Centro de Agronegócios da Fundação Getúlio
Vargas;
O Estado de S.Paulo, 8/4/18)