Elas trabalham e sabem valorizar o que é excepcionalmente ótimo. A
imagem recorrente das madames acomodadas em "chaises" aguardando o
marido chegar com presentes caros gradativamente perde espaço para um
novo perfil de consumidora de luxo, a "power woman".
A definição foi
feita pela consultoria Bain & Co, que todo ano realiza uma pesquisa
global sobre o setor em parceria com a associação italiana Altagamma.
"Da China para os demais emergentes, elas têm o poder da decisão de
compra. São mais experientes e exigentes que as demais compradoras de
luxo em todas as categorias passando por roupas, joias, relógios e até
carros", diz Cláudia D'Arpizio, que coordena o estudo da consultoria.
Essa configuração também foi detectada pela Qualibest na La Clé, sua
rede fechada de pesquisa com consumidoras AAA que gastam em média R$ 3,5
mil todo mês em itens pessoais. "Grande parte das participantes dos
nossos levantamentos (47%) exerce uma função remunerada, com uma carga
média de sete horas por dia. Em geral são advogadas, arquitetas,
consultoras e empresárias", conta Daniela Chammas Malouf, sócia-diretora
da Qualibest e criadora da La Clé.
As mulheres têm sido as grandes responsáveis pelo crescimento do
mercado de produtos pessoais de luxo, que até recentemente era dominado
por itens femininos de moda. Mas os homens estão cada vez mais ativos e
interessados no universo fashion e cuidados pessoais, de tal forma que
estão na frente em gastos nos países em desenvolvimento. Globalmente,
elas são responsáveis hoje por "pouco menos de 60%, o equivalente a 119
bilhões de euros", diz Cláudia D'Arpizio. Mas o Brasil é uma exceção a
esse fenômeno. "As mulheres respondem por 75% dos gastos do total do
mercado brasileiro de 2,7 bilhões de euros em 2012", completa.
Com um poder tão absoluto sobre o luxo no país, essas consumidoras
precisam constantemente ser investigadas. Não só sobre o que querem, mas
em que segmentos podem influenciar. Nos levantamentos da La Clé, por
exemplo, as mulheres revelaram que reinam nos guarda-roupas masculinos.
"Elas dizem que os maridos e namorados só seguem as tendências e se
interessam por grifes porque elas compram", conta Daniela.
Na área da beleza, elas não só compram como esticam o mercado. Elas
colocam nas sacolas sete subcategorias de cabelo e 15 só em tratamento
para o rosto. Fora as vitaminas e complementos alimentares.
A empresária
Cristiana Arcangeli, que começou no setor importando produtos top de
beleza, tem clareza desta compartimentalização do mercado. "Nos últimos
cinco anos, as mulheres estão mais conhecedoras e críticas. Quando eu
trazia as marcas lá atrás, as consumidoras de luxo só diferenciavam se
era importado ou nacional. Hoje, buscam o que melhor combina com seu
estilo de vida."
Em 2010, ela lançou no mercado a Beauty In, uma nova categoria de
produto que chama de "alimético" (alimento + cosmético). "Com uma
distribuição seletiva, o conceito foi rapidamente absorvido pelas
classes A e B. Agora vamos levá-lo aos supermercados e facilitar o
acesso para as consumidoras." A marca também prepara sua expansão
internacional.
As brasileiras são famosas gastadoras com beleza em todas as classes
sociais. No mercado de luxo, sua sede de compras é ainda mais
expressiva. Pelo levantamento da Bain & Co, os gastos com perfumes e
cosméticos respondem por 60% do mercado de luxo no país.
Mas esse
interesse está migrando para o, digamos, status. Esta é uma das razões
que fizeram com que as grifes internacionais olhassem o Brasil com mais
seriedade e fincassem suas bandeiras por aqui. "Essas marcas estão
fazendo tudo para impulsionar o crescimento de vestuário e acessórios no
Brasil. E este esforço já está dando resultado em especial em famílias
com duas rendas e sem filhos", diz Cláudia.
Para atender a brasileira localmente, as empresas têm feito um mix
regionalizado. Apostam aqui em itens coloridos e fáceis de usar, que
mais se identificam com o "jeito de ser da terra", porque a consumidora
tende a comprar os produtos com design europeu e americano nos países de
origem, ou seja, quando viajam. " De uma forma geral, o design
monocultural está sumindo do mercado de luxo", diz Cláudia.
Há particularidades, evidentemente. A marca francesa Longchamp se
tornou conhecida por suas bolsas de nylon e pela versatilidade de suas
peças. Nos últimos anos, contudo, tem buscado um posicionamento mais
"high end".
A parceria com a modelo Kate Moss foi fundamental para o
rejuvenescimento da marca e sua entrada na categoria de "luxo
acessível". Pois bem, as consumidoras brasileiras que entram em suas
lojas hoje têm motivação bem diferente das demais compradoras da marca.
"Aqui elas preferem as peças de couro porque querem coisas boas. Mas
enquanto na Europa essa bolsa serve tanto no trabalho quanto para sair,
aqui ela ainda quer ter peças diferentes para as duas ocasiões", diz
Kika Rivetti, coordenadora de marketing da Longchamp no Brasil.
Como uma nação de novos ricos, é natural que as consumidoras estejam
em vários estágios de relacionamento com as grifes. As dominantes neste
momento, acredita Dimitri Mussard, sócio da Acaju do Brasil, são as
ávidas por símbolos de pertencimento.
"A mulher da classe AAA do Brasil
está, como em outros países emergentes, caracterizada por um
comportamento irracional de compra. Está mais interessada em grifes e
logos que as europeias", diz ele, que na sua empresa busca reunir marcas
sofisticadas "com qualidade e design". Para Mussard, o termo "luxo" já
ganhou um sentido pejorativo. Suas clientes, portanto, são uma categoria
de "consumidora nova que valoriza o produto pelo design".
Há brasileiras que já passaram da fase do deslumbramento e, assim
como as representantes de fino trato da "velha Europa", estão mais
focadas na qualidade e no valor duradouro do luxo. "As mulheres tendem a
preferir produtos mais caros que possam ser usados em várias ocasiões e
por muitas estações. E compram as tendências nas varejistas de moda.
Este comportamento é observado em todas as mulheres, mas ele é mais
acentuado entre as consumidoras de luxo", diz Cláudia, da Bain & Co.
Em uma das pesquisas feitas com as integrantes da rede La Clé, a
tendência hi-lo aparece bem acentuada. "Elas dizem que hoje não sentem
tanto a falta de novas marcas de luxo no mercado. Acreditam que as
principais já estão aqui. Mas destacam que queriam ter mais opções de
marcas bacanas e com bom preço, como H&M e Banana Republic ", diz
Daniela. Interessante também é que, apesar de aprovarem as coleções
assinadas por estilistas consagrados para as grandes varejistas, elas
temem pela linha tênue entre acesso e popularização.
O ritual de compra na loja é fundamental para esta consumidora
brasileira. Vendedora atenciosa, mas não invasiva ou petulante. Mas ela
não rejeita novos canais para ter seu item preferido. Entre as
pesquisadas da La Clé, 57% já compraram roupas pela internet e 30% já
fizeram isso mais de dez vezes. E 62% não teriam restrição a adquirir
uma bolsa num e-commerce. No mundo, apenas 4% das compras de luxo são
feitas on-line, apesar de o percentual estar crescendo num ritmo de 25% a
cada ano.
A moda é segmento mais exuberante entre as mulheres de fino trato.
Mas há outras categorias em que elas se destacam. Viagens, por exemplo.
E, é bom que se diga, não só as expedições de compras. " São elas que
definem as férias da família e a opção romântica para o casal", diz
Carolina Perez, organizadora da feira de turismo de luxo Travel Week.
Recentemente, um outro modelo tem prosperado bastante entre as moçoilas,
as "férias de maridos". "Estas mulheres já têm todas as bolsas, duas
casas de lazer e tudo o que o dinheiro pode comprar. Então, elas buscam
novas emoções e experiências", diz Carolina.
Depois dos 60 anos, as mulheres continuam preponderantes nos roteiros
de luxo. "Elas vão em frente cheias de curiosidade. Os homens já se
acomodam." Entre os destinos, nunca é demais repetir Paris, Londres,
Nova York e Roma, mas a natureza e o exotismo seduzem em safáris na
África, cavalgadas na Patagônia e na exuberância de Myanmar e Tailândia.
Com uma taça na mão, as mulheres determinam o espiríto do momento.
Para a marca de champanhe Veuve Clicquot, elas respondem por metade das
vendas. E nos Estados Unidos são mais relevantes, em especial em Nova
York. "É um hábito das mulheres que moram lá. Consumir um champanhe é
uma maneira de relaxar numa cidade tão estressante e curtir a companhia
de um amigo a qualquer hora do dia", diz Jean-Marc Lacave, presidente da
Maison Veuve Clicquot. No Brasil, 90% das moças da bacaneza bebem
champanhe e o consomem de uma a duas vezes por semana, pelo levantamento
da La Clé. Faz sentido. Elas têm muito que relaxar e comemorar. Estão
podendo.