Temos já estabelecido, nesse nosso
diálogo semanal, o que buscamos explorar como linha central: a busca
pela sustentabilidade. Postos os elementos dessa busca nas primeiras
quatro semanas dos textos que trago a vocês, podemos agora falar de
exemplos, positivos e negativos, da postura humana diante do tema.
Trago hoje exemplo que considero dos
mais positivos: o da postura adotada pelas instituições financeiras para
elevar a régua da legalidade a patamares outros. Trata-se do conjunto
de regras, adotadas voluntariamente para o exame voltado à concessão de
crédito, denominado de Princípios do Equador.
Em síntese, o que se faz por meio da
aplicação dessas regras é, a partir da identificação do risco degradador
das atividades produtivas, classifica-las em três categorias, que podem
ser chamadas de categorias de exclusão, salvaguardas e indução, para as
quais as instituições financeiras dão o seguinte tratamento:
(i) para as atividades classificadas como sujeitas a exclusão, nega-se a concessão de crédito;
(ii) para as atividades classificadas
como sujeitas a salvaguardas, condiciona-se a concessão do crédito à
adoção de medidas, pelo interessado, que garantam mecanismos e sistemas
de controle de riscos adicionais àqueles postos pela lei, aplicando-se
ainda à concessão do crédito um maior custo de captação, quanto maiores
forem os riscos não evitados ou mitigados, não apenas os ambientais, mas
também os de imagem às instituições financeiras; e
(iii) Por fim, para as atividades
classificadas como merecedoras de indução, dada sua interação positiva
com o meio ambiente e com a ética da apropriação racional dos recursos
naturais, as instituições financeiras ofertam custo de captação de
recursos incentivado.
Vejamos um exemplo de cada categoria.
Certa instituição financeira, diante dos
riscos ambientais e ocupacionais reconhecidos, e de questionamentos
sociais e judiciais acerca do uso de determinado mineral como
matéria-prima industrial, hesitava frente a pedido de concessão de
crédito de agente econômico que explora tal mercado para ampliação de
suas atividades. A tendência da instituição financeira era de negar o
crédito, sob o argumento de que o uso daquele minério poderia trazer
riscos, não apenas ambientais e ocupacionais, mas também à imagem e
reputação do financiador, que inviabilizariam o crédito pretendido.
Após exaustivos debates, a instituição
financeira decidiu pela concessão do crédito, aplicando taxas de
captação altas, e vinculando os desembolsos das parcelas do
financiamento à adoção, pelo interessado, de medidas que excederam, em
muito, os parâmetros legais e condicionantes do licenciamento ambiental
realizado para a atividade. A exclusão que se desenhava, pelo risco da
atividade ao meio ambiente, aos trabalhadores e à reputação de quem a
financiasse, tornou-se salvaguarda diante da intervenção da instituição
financeira, que com isso gerou uma articulação positiva entre as
variáveis ambiental (garantiu mecanismos e sistemas excedentes em muito à
lei), econômica (atividade que caminhava para a inviabilização restou
viabilizada) e social (empregos diretos e indiretos que não seriam
gerados tornaram-se possíveis).
O segundo exemplo está na concessão de
crédito a atividade que trazia, no licenciamento, mecanismos
insuficientes a preservar, de forma eficiente, riscos de acidentes em
obra de infraestrutura. Equipe multidisciplinar trabalhou arduamente
para estabelecer os mecanismos e sistemas contratuais que viabilizaram
controle mais adequado dos riscos, reduzindo-se assim o custo de
captação dos recursos para a atividade.
E, por fim, o exemplo da indução. Por
decisão de política pública acertada, determinado país passou a
estimular a instalação de plantas de geração de energia a partir da
fonte eólica. As instituições financeiras daquela nação, em conjunto,
reduziram sensivelmente o custo de captação de recursos para os
empreendimentos eólicos, criando assim um círculo virtuoso de
desenvolvimento energético.
A forma de controle das atividades
contempladas pela concessão de crédito, no plano das salvaguardas, é
simples, e pauta-se nos seguintes parâmetros:
(A) As medidas e sistemas adicionais
àqueles estabelecidos pela lei e pelo licenciamento ambiental das
atividades contempladas são determinados nos contratos de financiamento,
no capítulo da sustentabilidade;
(B) Tais mecanismos e sistemas podem
ser procedimentais, ou seja, de determinação de revisões, auditorias,
vistorias e redundâncias aos processos de controle estabelecidos pela
lei e pelo licenciamento; ou podem ser estruturais, para impor a
implementação de equipamentos e mecanismos adicionais àqueles igualmente
estabelecidos em lei e licenciamento;
(C) Havendo uma não-conformidade com
qualquer das regras, ou seja, lei, licenciamento ou contrato, comissão
definida no contrato cuidará de estabelecer as medidas de correção a
serem adotadas, sob pena de suspensão ou até rescisão do financiamento;
(D) Adotadas as medidas de correção,
análise independente atestará sua eficácia, ou indicará as medidas ainda
necessárias, e assim por diante, até se ter o empreendimento adequado
aos parâmetros contratuais.
Os Princípios do Equador constituem um
dos maiores exemplos de mecanismos não legais na busca pela
sustentabilidade E representam, na opinião deste que vos escreve, um
interessante salto de qualidade nas relações entre as variáveis
econômica, social e ambiental.
Fonte da imagem: greenpowerconferences.com (créditos e divulgação)
Sobre o Autor
Werner Grau - advogado, com especialização, mestrado e
doutorado pela USP, Werner é sócio de Pinheiro Neto Advogados, além de
presidir o Conselho Consultivo da The Nature Conservanc-TNC no Brasil.
Consultor de entidades como o Banco Mundial, BID, GTZ e Funbio, Werner é
ativista da proteção animal, coordenando o GT de Defesa dos Direitos
dos Animais da Comissão de Meio Ambiente da OAB/SP. Membro de dois
abrigos para animais de rua (http://www.adoteumfocinho.com.br e Facebook
- Abrigo Voz Animal), Werner é também Vice-Presidente da Confederação
Brasileira de Rugby - CBRu.