De
acordo com estimativas da ONU, mais de dois terços de todas as
transações internacionais de mercadorias são hoje regulados pela
Convenção das Nações Unidas sobre Contratos de Compra e Venda
Internacional de Mercadorias (CISG), incluindo as transações dos
parceiros comerciais mais importantes do Brasil, como a China, países do
Mercosul, Estados Unidos, Canadá e várias nações europeias.
O
Brasil aderiu à CISG, após aprovação do Congresso Nacional, em outubro
de 2012 e a convenção entrará em vigor em abril deste ano, o que afetará
grande parte das nossas operações de comércio internacional.
Para
facilitar o entendimento dos operadores do direito a respeito da CISG, o
Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal (CEJ/CJF),
em coordenação e com o apoio financeiro do Centro de Arbitragem e
Mediação da Câmara de Comércio Brasil/Canadá (CAM/CCBC) e em parceria
com a Escola da Magistratura do Tribunal Regional Federal da 4ª Região
(Emagis), o Brazil Infrastructure Institute e a Universidade Positivo,
promove o I Congresso Internacional sobre a Convenção de Viena para Compra e Venda Internacional de Mercadorias e o Brasil.
O evento
acontece nos dias 19 e 20 de março, na Seção Judiciária do Paraná, em
Curitiba. As inscrições são gratuitas e podem ser feitas aqui.
“Diante da
intensidade do comércio internacional brasileiro e da ampla aplicação da
CISG em tais operações, seu estudo aprofundado é fundamental – e se
torna especialmente relevante na medida em que a CISG apresenta soluções
distintas das consagradas no direito brasileiro em diversos pontos”,
explica o doutor e mestre em direito pela PUC-SP e vice-presidente do
Brazil Infrastructure Institute, Cesar Guimarães Pereira, coordenador
científico do congresso.
Regras uniformes
Para
enriquecer as discussões, foram convidados renomados conferencistas
nacionais e internacionais, especialistas em contratos comerciais
internacionais. O corregedor-geral da Justiça Federal e diretor do CEJ,
ministro Arnaldo Esteves Lima, e o ministro aposentado do Superior
Tribunal de Justiça (STJ) Ruy Rosado de Aguiar são alguns dos mais de 40
palestrantes que já confirmaram presença.
A
conferência de abertura ficará a cargo da jurista alemã Ingeborg
Schwenzer, professora de direito privado e direito comparado na
Universidade da Basileia, Suíça. Ao final do evento, será lançada pela
editora RT-Thomson Reuters a tradução brasileira dos Comentários à CISG, coordenados por Schwenzer, considerada a mais importante obra internacional sobre o tema.
“A relevância do Brasil no mercado mundial de compra e venda de commodities
e de bens industrializados recomenda cada vez mais a sua adesão a um
sistema de regras uniformes e internacionais, destinado a dar segurança e
previsibilidade nessas transações”, comenta Cesar Pereira. Ele
acrescenta que a unificação do direito da compra e venda para contratos
transnacionais também leva à redução nos custos de transação, que seriam
de outro modo esperados na negociação de litígios em operações
internacionais.
A
adoção do sistema internacional, de acordo com ele, impede, por
exemplo, que sejam aplicadas as regras nacionais sobre a formação do
contrato de compra e venda ou se reconheça o direito ao ressarcimento de
danos não contemplados pela própria CISG. “Há diferenças importantes no
que se refere aos ônus do comprador de inspecionar as mercadorias e
logo informar ao vendedor os defeitos no produto, sob pena de perda do
direito de desfazer o contrato e obter ressarcimento”, aponta o
especialista.
Inovações
Outra
mudança trazida pela CISG, de acordo com ele, relaciona-se às
consequências do inadimplemento contratual. “Na CISG, exige-se, na maior
parte dos casos, que a parte inocente assegure à parte inadimplente um
prazo adicional para cumprimento, antes de promover a resolução do
contrato. Não há essa exigência no direito interno brasileiro”, observa
Cesar Pereira.
Há também
uma importante inovação metodológica. As regras da CISG impõem que ela
seja interpretada segundo os seus próprios princípios internos e de modo
uniforme no plano internacional. Isso exigirá do Judiciário brasileiro
uma abertura à experiência, à doutrina e à jurisprudência
internacionais.
Segundo
Cesar Pereira, a tradução da obra de Ingeborg Schwenzer – coordenada
pelos professores Eduardo Grebler e Vera Fradera e por ele próprio – é
uma importante iniciativa para tornar essas informações facilmente
acessíveis em português. Soma-se a outros esforços similares, como o
site www.cisg-brasil.net, que há anos reúne, traduz e oferece ao público brasileiro a jurisprudência e a doutrina internacionais sobre a CISG.
O encontro
contará com tradução simultânea para português e inglês. Diversas
instituições, como o STJ, a Escola de Magistratura do Paraná, a
Universidade Federal do Paraná e o Comitê Brasileiro de Arbitragem
(CBAr) também apoiam o evento, que conta com o aval oficial da Comissão
da ONU para o Direito do Comércio Internacional (ONU-Uncitral) e do
Chartered Institute of Arbitrators (CIArb). Mais informações podem ser
obtidas pelo e-mail secretaria@brazilinfra.com.
Entenda a convenção
A CISG
contém 101 artigos, dividindo-se em quatro partes. A parte I trata do
seu campo de aplicação e dispositivos gerais; a parte II prevê normas
sobre a formação do contrato; a parte III trata dos direitos e
obrigações do vendedor e do comprador e a parte IV se refere às
obrigações recíprocas entre os estados-parte.
A convenção
se aplica aos contratos de compra e venda de mercadorias firmados entre
agentes cujos estabelecimentos estejam situados em estados-parte
diferentes ou quando as regras de direito internacional privado levarem à
aplicação da lei de um estado-parte.
Algumas
modalidades de contratos de compra e venda estão excluídas do âmbito da
convenção, seja pelo propósito (mercadorias compradas para uso pessoal,
familiar ou doméstico), pela natureza da operação (venda feita em hasta
pública, execução judicial ou de outra forma determinada por lei) ou das
mercadorias (valores mobiliários, títulos de crédito, dinheiro, navios,
embarcações, aerobarcos, aeronaves ou eletricidade).
Uma
série de normas da convenção determina as obrigações do vendedor em
relação à qualidade dos bens. Traz, por exemplo, a obrigação de o
vendedor entregar mercadorias livres de qualquer direito ou
reivindicação de terceiros, incluindo direitos baseados em propriedade
industrial ou outra modalidade de propriedade intelectual.
Correspondentes
às obrigações do vendedor em relação à qualidade das mercadorias, a
convenção contém ainda disposições acerca da obrigação do comprador de
inspecionar os bens e notificar o vendedor em prazo razoável. Outro
dispositivo relevante da convenção é o que regula o momento em que o
risco em relação a perda ou deterioração das mercadorias é transferido
do vendedor para o comprador.
Fonte: Superior Tribunal de Justiça – STJ