Por Jornal de Negócios do Sebrae-SP
No início da pandemia de Covid-19, Marisol Kiyoko Hoshina decidiu
levar adiante a ideia de ter um negócio próprio. Formada em relações
públicas, e então com 30 anos de idade, tentou diversos caminhos.
Começou importando objetos do Nepal para o Brasil, ideia que acabou não
dando certo pelo aumento do dólar. Depois disso, resolveu vender
alimentos plant based, já que tinha conhecimento desse mercado.
“Reformei a cozinha para estar de acordo com as normas, pois já
trabalhei na parte de segurança alimentar, então sabia como funcionava.
Comecei a investir, mas notei que ainda não era o que eu procurava como
empreendedora”, conta.
Vendo o crescimento do mercado de delivery de alimentos, Marisol
então decidiu unir sua paixão pela culinária asiática à possibilidade de
empreender com tecnologia. Foi então que surgiu o Vou de Nekô, um app
de entrega de comida com foco em restaurantes orientais.
Além desse diferencial, a proposta era “humanizar” o sistema de
delivery. “Nós colocamos a foto do prato principal e do chef de cozinha
no nosso aplicativo. Para mim, é importante trazer a história de vida
das pessoas junto com seus pratos ofertados, principalmente quando
falamos da comunidade asiática, que já sofreu muito preconceito.”
O aplicativo tem outros diferenciais como raio de entrega de 12
quilômetros e taxa para os restaurantes parceiros de 17%, abaixo da
média do mercado, além do investimento na identidade visual e em
publicações com conteúdo sobre a Ásia nas redes sociais.
Assim como Marisol, mais mulheres assumiram a frente de um negócio
próprio durante a pandemia, especialmente na faixa até 30 anos. No
período, cresceu a quantidade de empreendedoras que passaram a ser as
únicas responsáveis pelos seus negócios, de acordo com a pesquisa “Voo
Delas”, realizada pelo Sebrae-SP com a participação do Movimento Aladas.
Além disso, a pesquisa mostra que o empreendedorismo feminino está mais
jovem.
A participação de mulheres de 18 a 30 anos à frente de um negócio
próprio subiu de 6% para 25% durante o período da pandemia. No caso de
Marisol, o exemplo começou em casa. Ela conta que a mãe, Ruth Hoshina,
divorciou-se e teve de cuidar dos dois filhos sozinha. Sempre a
incentivou a buscar conhecimento e estudo para ser bem-sucedida. “Sempre
aprendi que na vida você tem de lutar e fazer por você. Não é bom
depender de outras pessoas”, afirma.
Marisol começou aos 12 anos a praticar xadrez, um esporte em que, na
maioria, o destaque é dos homens. “Isso nunca foi um problema. Eu fui
campeã brasileira e vice-campeã sul-americana na Argentina. O xadrez me
trouxe uma outra perspectiva de vida”, diz. Ela também trabalhou por
seis anos em uma empresa como relações públicas, casou, viajou por mais
de 40 países, divorciou-se e voltou para o Brasil em busca de um novo
rumo na carreira.
Marisol começou a empreender sozinha, sendo responsável por todas as
áreas de sua empresa e investindo o próprio dinheiro. Conforme a
pesquisa “Voo Delas”, esse é o cenário mais comum: 78% das mulheres
entrevistadas abriram empresas com recursos próprios durante a pandemia.
Atualmente, o Vou de Nekô está em crescimento, tanto no número de
restaurantes disponíveis quanto na quantidade de pedidos.
Sonho antigo
O caminho para a igualdade de gênero ainda é distante, afinal, muitas
mulheres não conseguem focar inteiramente em seus negócios por ter
outras responsabilidades, como cuidar da casa e dos filhos, e, em grande
parte, não recebem nenhum tipo de apoio de seus parceiros. Mas, claro,
há as exceções. Isla Oliveira sempre teve o sonho de empreender e, desde
criança, é apaixonada por cozinhar.
No início da pandemia, aos 25 anos, resolveu abrir a Isla Oliveira
Ateliê de Doces com o apoio do marido, Tercio Fillipe. “É uma grande
sorte ter o apoio do meu marido, porque nem todas as mulheres têm isso
dentro de casa. O Tercio veste a camisa, bota a mão na massa. Se ele
tiver que tatuar a palavra ‘ateliê’ no próprio corpo, ele tatua e segue
em frente”, brinca Isla.
Empreender por desejo, sonho ou amor é um privilégio para muitas
mulheres – e esse número vem crescendo. No caso de Isla, que é
enfermeira, o desejo de empreender vem da flexibilidade que um negócio
próprio pode trazer, permitindo a ela conciliartodas suas tarefas com a
ajuda do marido. “Eu comecei a empreender desde pequena, sempre que
tinha a oportunidade, eu vendia doces no colégio e na faculdade.
E eu sempre tive essa vontade de ter meu negócio”, conta. Muito da
ajuda para concretizar a ideia de Isla veio da capacitação no Sebrae-SP.
“Eu participei do projeto Sebrae Delas e consegui aprimorar minhas
técnicas em vendas. Como consequência, aumentei minha produtividade,
minhas vendas e também consegui entender onde precisava melhorar o meu
financeiro”, diz. Isla foi homenageada em novembro passado no Sebrae
Aqui Mulher, em Barueri, por seu desempenho como mulher empreendedora, e
agora vê seu ateliê de doces artesanais ganhar mais clientes e ser mais
produtivo.
Muito da maior presença das mulheres no empreendedorismo durante a
pandemia surge também como reflexo do aumento da oferta de cursos,
especialmente de cursos online. “A pesquisa Voo Delas nos mostrou que o
número de mulheres que abriram empresas para atender a um propósito
cresceu. É um dado muito interessante, pois mostra como a mulher está se
permitindo mergulhar nos seus desejos. Essa mudança aconteceu com a
pandemia, pois fez muitas mulheres questionarem seus propósitos e
desejos” explica Camila Ribeiro, gestora estadual de empreendedorismo
feminino do Sebrae-SP.
O Sebrae Delas oferece uma série de programas de qualificação técnica
por meio de cursos, palestras, oficinas e workshops, além de facilitar o
acesso a crédito e aos mercados. Suas iniciativas incluem a capacitação
para mulheres em situação de vulnerabilidade, imigrantes, refugiadas,
indígenas, reeducandas do sistema prisional, vítimas de violência, com
deficiência e LGBTQIA+.
Em 2021, o projeto atendeu a 22 mil mulheres, e neste ano pretende
atender mais 40 mil. “O empreendedorismo é uma ferramenta muito
importante e transformadora para as mulheres, pois possibilita a
autonomia financeira. Com isso, é possível a mulher conseguir tomar a
decisão de sair de situações de fragilidade que fazem mal a elas e que
muitas vezes não conseguem por não terem condições financeiras”, afirma.
https://exame.com/pme/mais-jovem-empreendedorismo-cresce-entre-mulheres-de-18-a-30-anos/