A engenheira de pesquisas Camille Varescon ativa a neuroprótese
implantada debaixo da pele de Marc, um paciente acometido pelo mal de
Parkinson, em Lausanne, Suíça, em 3 de novembro de 2023 - AFP
Um
homem com mal de Parkinson em estágio avançado recuperou quase
totalmente a capacidade de caminhar, graças a eletrodos implantados em
sua medula espinhal, informou um grupo de pesquisadores nesta
segunda-feira (6).
A
façanha médica pode ser uma tecnologia “revolucionária” para as pessoas
que lutam para se mover, apesar desse debilitante transtorno cerebral.
O
tratamento foi desenvolvido por pesquisadores suíços que já haviam
usado implantes na medula espinhal para ajudar que várias pessoas com
paraplegia voltassem a andar.
O paciente, Marc, um homem de 62
anos que vive na França, sofre de mal de Parkinson há aproximadamente 30
anos. Assim como mais de 90% das pessoas com Parkinson avançado, Marc
tem grande dificuldade para caminhar.
Os chamados episódios de
“congelamento”, durante os quais os pacientes ficam temporariamente
impossibilitados de se mover, expondo-os a risco de quedas, são
particularmente “terríveis”, disse Marc à AFP.
“Se
você tem um obstáculo ou se alguém passa na sua frente,
inesperadamente, você começa a ‘congelar’ e cai”, disse Marc, que não
quis revelar seu sobrenome.
Muitos aspectos do mal de Parkinson
ainda são desconhecidos, e o tratamento desses sintomas tem-se mostrado
difícil. Podem afetar seriamente a vida dos pacientes, às vezes
deixando-os acamados ou presos a uma cadeira de rodas.
Então,
quando surgiu a oportunidade de se submeter a uma cirurgia invasiva na
Suíça com o objetivo de resolver o problema, Marc não hesitou em
aproveitar a oportunidade.
– ‘Posso fazer o que eu quiser’ –
“Agora posso andar de um ponto a outro sem me preocupar em como chegarei lá”, disse.
“Posso dar um passeio, fazer compras sozinho. Posso fazer o que quiser”, acrescentou.
A
equipe suíça de pesquisadores implantou um sistema complexo de
eletrodos chamado “neuroprótese” em pontos-chave ao longo da medula
espinhal de Marc.
“Desenvolvemos uma neuroprótese que reduziu os
problemas de marcha, os problemas de equilíbrio e o congelamento da
marcha”, disse a equipe liderada pela cirurgiã Jocelyne Bloch e pelo
neurocientista Gregoire Courtine.
Os dois já haviam feito um
avanço usando implantes na medula espinhal que permitiram que pacientes
paraplégicos voltassem a andar.
A pesquisa mais recente, publicada na revista Nature Medicine, funcionou, segundo quase o mesmo princípio.
No
caso de pacientes paralisados, o trauma provém de um acidente, que
corta a comunicação entre o cérebro e a medula espinhal. Para Marc e
outros pacientes com Parkinson, essa comunicação ainda existe, mas o
sinal cerebral é afetado pelo desaparecimento progressivo dos neurônios
que geram a dopamina, que é um neurotransmissor.
Nesse caso, a
neuroprótese teve de fazer mais do que simplesmente enviar um estímulo
elétrico que provocasse o movimento. Também teve de assumir o papel do
cérebro na geração desse estímulo no momento adequado para que o
movimento resultante correspondesse aos desejos do paciente.
“A
ideia é medir os movimentos residuais, ou seja, a intenção de andar, com
pequenos sensores que se encontram nas pernas”, disse Courtine à AFP.
“Graças
a isso, sabemos se a pessoa quer balançar, ou parar, e podemos ajustar o
estímulo de acordo”, disse Courtine, pesquisadora do Instituto Federal
Suíço de Tecnologia em Lausanne.
– ‘Um grande avanço potencial’ –
A
neuroprótese foi testada primeiro em primatas e depois implantada em
Marc, que a usa aproximadamente oito horas por dia há quase dois anos.
Marc
disse que agora consegue andar com muito mais facilidade e que até
planeja uma viagem ao Brasil. Ainda assim, completou, o esforço exige
concentração, principalmente ao subir escadas.
Mas até que ponto
este implante pode ajudar muitos outros pacientes com Parkinson que
lutam para andar todos os dias? A doença afeta os pacientes de
diferentes maneiras.
A equipe suíça ampliou seu experimento para um grupo de seis pacientes com Parkinson.
O implante invasivo é bastante caro, o que limita o acesso de muitos pacientes.
Bloch
e Courtine lançaram uma “startup” chamada Onward para investigar sua
futura comercialização. Mas mesmo chegar a este ponto já representa “um
grande avanço potencial”, de acordo com David Dexter, diretor de
pesquisa do Parkinson’s UK.
“Este é um procedimento bastante
invasivo, mas pode ser uma tecnologia revolucionária para ajudar a
restaurar os movimentos em pessoas com Parkinson avançado”, disse
Dexter, enfatizando que são necessárias mais pesquisas.