Dias após o anúncio do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de tarifas que chocaram vários parceiros comerciais e os mercados globais, alguns países estão surgindo como possíveis vencedores, embora o risco de uma recessão induzida limite os ganhos.
Com
aliados de longa data e parceiros comerciais próximos dos EUA,
incluindo a União Europeia, o Japão e a Coreia do Sul, entre os mais
atingidos – com tarifas de 20% ou mais – rivais que vão do Brasil à Índia e da Turquia ao Quênia veem uma luz no fim do túnel.
O
Brasil está entre as economias que escaparam com a menor tarifa
“recíproca” dos EUA, de 10%. Além disso, o país pode se beneficiar das
tarifas retaliatórias da China, que provavelmente atingirão os
exportadores agrícolas dos EUA.
As mais recentes tarifas dos EUA entrarão em vigor em 9 de abril.
O
Brasil, como importador líquido de mercadorias dos Estados Unidos,
exemplifica a maneira como alguns países podem tirar proveito da guerra
comercial que Trump está travando principalmente contra a China e outros
grandes exportadores que têm superávits comerciais com os EUA.
Marrocos, Egito, Turquia e Cingapura,
todos com déficits comerciais com os EUA, podem encontrar uma
oportunidade nas dificuldades de países como Bangladesh e Vietnã, que
têm grandes superávits e foram duramente atingidos por Trump.
Enquanto
os dois últimos estão enfrentando tarifas esperadas de 37% e 46%,
respectivamente, os outros, como o Brasil e a maioria de seus vizinhos,
terão tarifas de 10% cada – mais como um tapinha na mão na nova ordem
mundial de Trump.
“Os EUA não impuseram tarifas apenas ao Egito”,
disse Magdy Tolba, presidente da joint venture egípcio-turca T&C
Garments. “Eles impuseram tarifas muito mais altas a outros países. Isso
dá ao Egito uma excelente oportunidade de crescimento.”
Tolba listou a China, Bangladesh e Vietnã como principais concorrentes do Egito no setor têxtil.
“A oportunidade está à vista de todos”, disse ele. “Nós só precisamos agarrá-la”.
A
Turquia, cujas exportações de ferro, aço e alumínio foram afetadas
pelas tarifas anteriores dos EUA, agora deve se beneficiar à medida que
outros comerciantes globais enfrentam taxas ainda mais altas.
O
ministro do Comércio, Omer Bolat, chamou as tarifas sobre a Turquia de
“as melhores das piores”, considerando as taxas impostas a muitos outros
países.
Da mesma forma, o Marrocos, que tem um acordo de livre
comércio com os EUA, poderia emergir como um beneficiário relativo do
sofrimento tanto da UE quanto das antigas potências asiáticas.
“A
tarifa é uma oportunidade para o Marrocos atrair investimentos de
investidores estrangeiros dispostos a exportar para os EUA, dada a
tarifa comparativamente baixa de 10%”, disse um ex-funcionário do
governo, falando sob condição de anonimato.
Ainda assim, o
funcionário e outros observaram que os riscos se aproximam, com o perigo
de que grandes investimentos chineses recentes, incluindo US$ 6,5
bilhões da Gotion High Tech para o que seria a primeira gigafábrica da
África, possam atrair atenção negativa de Trump.
Rachid Aourraz,
economista do Instituto Marroquino de Análise de Políticas (MIPA), um
think tank independente em Rabat, observou que os setores aeroespacial e
de fertilizantes do país ainda podem ser afetados.
“Embora o
impacto direto pareça limitado, já que os EUA não são um mercado
importante para as exportações do Marrocos, as ondas de choque criadas
pelas tarifas e o espectro da recessão podem afetar o crescimento
econômico marroquino”, disse ele.
O Quênia, país com o qual os EUA
têm um superávit comercial, também pode ter efeitos mistos de um golpe
tarifário relativamente leve. Os produtores de têxteis, em particular,
expressaram a expectativa de que poderiam obter uma vantagem comparativa
em relação aos concorrentes dos países mais afetados pelas tarifas.
Preocupações
Preocupações
semelhantes estão ocorrendo em Cingapura, onde o índice de referência
Straits Times caiu 7,5% na segunda-feira, a maior queda desde 2008, e
ampliou as perdas nesta terça-feira.
Embora a cidade-Estado possa
se beneficiar de alguns fluxos de investimento à medida que os
fabricantes buscam diversificar, eles ainda estariam sujeitos a regras
substanciais de fabricação e conteúdo local, disse Selena Ling,
economista do OCBC.
“A história absoluta é que não há ‘vencedores’
se a economia dos EUA e/ou global sofrer uma parada brusca ou uma
recessão”, disse ela. “É tudo relativo.”
Chua Hak Bin, economista
do Maybank, acrescentou: “Cingapura não pode vencer em uma guerra
comercial global, dada a forte dependência do comércio.”
A Índia, apesar de uma tarifa de 26%, ainda está procurando oportunidades nas dores de seus rivais asiáticos.
De
acordo com uma avaliação interna do governo compartilhada com a
Reuters, os setores em que a Índia pode ganhar participação de mercado
nos embarques para os EUA incluem têxteis, vestuário e calçados. Logo
após o anúncio da tarifa, o Ministério do Comércio indiano disse que
estava “estudando as oportunidades que podem surgir devido a esse novo
acontecimento na política comercial dos EUA”.