segunda-feira, 13 de outubro de 2025

Pré-COP começa com contribuições dos círculos para ação climática

 

A Pré-COP, evento preparatório para a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), começou nesta segunda-feira (13) em Brasília, com a participação de negociadores de 67 países. Durante a cerimônia de abertura, representantes dos quatros ciclos de liderança apresentaram contribuições para orientar os debates sobre os desafios da agenda climática global.

Ao abrir a rodada de discursos, o presidente em exercício, Gerado Alckmin, destacou a importância do esforço entre os países para avançar a uma etapa de implementação das ações climáticas.

“Convoco a todas e a todos a compartilharmos essa preocupação ambiental e esse amor ao próximo não apenas em nossos discursos, mas em ações concretas, em benefício de toda a comunidade internacional e como legado para as gerações futuras”.

Alckmin também propôs às delegações que orientem seus esforços em torno de três objetivos centrais: o reforço do multilateralismo, a conexão do regime climático à vida real das pessoas e a aceleração da implementação do Acordo de Paris.

Geraldo Alckmin destacou a importância do esforço entre os países para avançar a uma etapa de implementação das ações climáticas.- Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

Além de Alckmin, o secretário executivo da Convenção do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês), Simon Stiell, reforçou a necessidade de união entre os países independentemente de posições políticas e das pressões específicas, em benefício comum da humanidade. “A estrada para Belém é curta, mas com vastas possibilidades. Então, vamos fazer cada hora de trabalho contar”, reforçou.

Líderes dos círculos de ministros das Finanças, dos Povos, de Presidentes da COP e do Balanço Ético Global também fizeram um balanço na abertura da Pré-COP sobre os avanços nos debates ocorridos na etapa de mobilização. Os quatro círculos são estruturas da arquitetura pensada pela presidência da COP30 para dar suporte às negociações globais desde a etapa de mobilização até a conferência, em novembro.

Governança

O líder do Círculo de Presidentes da COP, Laurent Fabius, trouxe um balanço da etapa de mobilização ocorrida nas reuniões entre os presidentes de COP desde a que criou o Acordo de Paris, em 2015. Com o objetivo de fortalecer a governança climática global e buscar soluções para a implementação do Acordo de Paris, o grupo apontou quatro caminhos a serem seguidos inspirados por palavras iniciadas com a letra ‘i’: inspiração, implementação, inclusão e inovação.

De acordo Laurent Fabius, que presidiu a COP21 em Paris, a inspiração no Acordo de Paris conduzirá a implementação de Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs na sigla em inglês) da Missão 1.5, de não permitir o aumento do aquecimento global e do Balanço Global (GST, na sigla em inglês), de acordo com um planeta carbono zero.

Para Fabius, tudo isso deve ocorrer de forma inclusiva com o aumento da participação de indígenas, afrodescendentes e povos tradicionais, missões religiosas, autoridades políticas, setor empresarial e organizações sociais. Tudo por meio de inovações. “É de grande importância que a ciência e a educação trabalhem a favor da justiça climática e de forma a enfrentar a desinformação”, destacou.

Povos

A ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, que também lidera o Círculo dos Povos da COP30, destacou o avanço dos trabalhos nas duas comissões constituídas para mobilização. Na comissão dos povos indígenas, o principal avanço ocorreu na inclusão alcançada no processo de negociação climática.

Sônia Guajajara ressaltou os avanços do Círculo dos Povos – Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

“Nós, enquanto povos indígenas, teremos a maior e melhor participação da história das COPs na Zona Azul [onde ocorrem as negociações] e uma expectativa de recebermos mais de 3 mil indígenas na Aldeia COP, aumentando a participação com reforço das nossas mensagens centrais de reconhecimento dos territórios indígenas como política climática e o financiamento direto, trazendo os povos indígenas para o protagonismo das ações climáticas”, diz.

Sônia Guajajara também ressaltou que o círculo avançou também nas atividades desempenhadas pela comissão de afrodescendentes, povos e comunidades tradicionais e agricultura familiar no sentido de aumentar o engajamento e participação das comunidades tradicionais no regime climático.

Finanças

Fernando Haddad e o presidente da COP30, embaixador André Corrêa do Lago, participam da abertura da Pré-COP30 – Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, líder do Círculo dos Ministros das Finanças, destacou a continuidade dos debates acerca da ampliação do financiamento climático nos países em desenvolvimento como um dos principais esforços do círculo. Cinco prioridades foram apontadas pelos trabalhos desenvolvidos no grupo: aumento dos fluxos de financiamento e de fundos climáticos, reforma de bancos multilaterais de desenvolvimento, aumento da capacidade doméstica de investimentos sustentáveis, inovações para mobilizar o setor privado e melhoria do marco regulatório do financiamento climático global.

De acordo com Haddad, algumas das iniciativas em resposta às prioridades foram o lançamento do Fundo Florestas Tropicais para Sempre, a criação de uma coalizão aberta para integração dos Mercados de Carbono e a sugestão de uma supertaxonomia que reúna de forma global as vocações regionais para orientar investimentos sustentáveis.

Segundo o ministro da Fazenda, um relatório final será apresentado nesta semana em Washington, durante os Encontros Anuais do Banco Mundial e do FMI. Posteriormente o relatório será encaminhado com a Agenda de Ação para debate em São Paulo, no mês de novembro.

“Por fim, o documento será formalmente entregue ao Presidente da COP em Belém, como contribuição à construção do Mapa do Caminho de Baku a Belém para 1,3 trilhão de dólares”, destaca.

Balanço Ético Global

Marina Silva destacou os diálogos do círculo de participação social ocorridos em cada um dos continentes do mundo – Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima e líder do Balanço Ético Global – o quarto círculo da COP30 – Marina Silva destacou que o círculo de participação social realizou seis diálogos regionais ocorridos em cada um dos continentes do mundo, além de 56 diálogos que alcançaram 15 países de 20 nacionalidades, reunindo mais de 3,7 mil pessoas em torno de reflexões éticas sobre as decisões políticas e implementações das ações climáticas.

“Ele [o Balanço Ético Global] amplia a agenda climática para incorporar dimensões culturais, raciais, intergeracionais e territoriais — reconhecendo que a transição necessária é tanto técnica quanto dos princípios e valores humanos”, destacou Marina Silva.

Após apresentar o resumo sobre os trabalhos do BEG, Marina Silva reforçou a ideia de mutirão lançada pela presidência designada da COP30 como a ferramenta mais capaz de viabilizar a implementação dos acordos já alcançados pelo multilateralismo climático. “Que o BEG e os demais círculos de mobilização da COP30 possam contribuir para que ela [a COP30] entre para a história das COPs como a base fundante de um novo marco referencial.  O marco referencial que ajudou a evitar os pontos de não retorno: tanto do clima quanto do multilateralismo climático”, conclui.

Balança comercial tem superávit de US$ 1,523 bilhão na 2ª semana de outubro

 

Brasília, 13 – A balança comercial brasileira registrou superávit comercial de US$ 1,523 bilhão na segunda semana de outubro. De acordo com dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) divulgados nesta segunda-feira, 13, o valor foi alcançado com exportações de US$ 6,928 bilhões e importações de US$ 5,404 bilhões.

No ano, de janeiro a outubro de 2025, o superávit soma um total de US$ 47,977 bilhões, resultado de US$ 269,363 bilhões em exportações e US$ 221,386 bilhões, bilhões em importações.

O superávit do acumulado deste ano é 17,4% menor que o do mesmo período de 2024 (quando estava em US$ 62,794 bilhões).

Outubro

Nas duas primeiras semanas de outubro, o superávit na balança foi de US$ 2,498 bilhões, crescimento de 68% na comparação com o mesmo período de 2024.

Até a segunda semana de outubro, comparado ao mesmo período de outubro do ano passado, as exportações cresceram 8,6% e somaram US$ 11,571 bilhões. O resultado se deu devido ao crescimento nos três setores: de 15% em Agropecuária, que somou US$ 2,350 bilhões; de 17,4% em Indústria Extrativa, que chegou a US$ 2,697 bilhões e de 3,7% em Indústria de Transformação, que alcançou US$ 6,475 bilhões.

Por outro lado, as importações caíram 1% nas primeiras duas semanas de outubro e totalizaram US$ 9,073 bilhões na mesma comparação, com queda de 4,8% em Agropecuária, que somou US$ 161,63 milhões; queda de 30,5% em Indústria Extrativa, que chegou a US$ 388,51 milhões e, por fim, crescimento de 1% em Indústria de Transformação, que alcançou US$ 8,467 bilhões.

Nobel de Economia diz que UE precisa enfrentar Trump e seguir o exemplo de Lula

 

O economista estadunidense e vencedor do prêmio Nobel Joseph Stiglitz publicou um artigo de opinião no jornal online Project Syndicate sobre como a União Europeia (UE) deveria conduzir as negociações com Donald Trump. Ele encerra o texto com um conselho para que o bloco econômico imite a postura do presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e do chinês Xi Jinping.


“Quando o presidente chinês Xi Jinping enfrentou Trump, o americano recuou. Mas recentemente, o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva deixou claro que algumas coisas não são negociáveis: a soberania de seu país, a dignidade, o Estado de Direito e a democracia. A UE deveria fazer o mesmo”, escreve Stiglitz.

O economista acusa o presidente Donald Trump de não cumprir acordos, recordando como ele assinou documentos com o Canadá e o México durante seu primeiro mandato que, rapidamente, foram descartados no começo do mandato atual. “Qualquer acordo com Trump deve ser considerado, na melhor das hipóteses, uma trégua temporária”, escreve.

Stiglitz critica ainda as tentativas de acordo entre UE e os Estados Unidos por colocarem os países europeus em uma desvantagem que não condiz com sua importância econômica. Ele cita o fato de que a Europa tem uma população 30% maior  e uma economia menor por uma pequena margem, o que deveria garantir simetria.

O que UE e Trump estão discutindo

No texto, Joseph Stiglitz rememora o acordo comercial entre Estados Unidos e União Europeia anunciado em 27 de julho na cidade de Turnberry, Escócia. O documento não foi assinado.

Stiglitz critica o projeto de acordo por manter “tarifas injustas sobre importações europeias” e por conter um compromisso de que a UE “investiria nos EUA e na compra de energia estadunidense”. A UE é um bloco econômico, e não uma economia de planejamento central como ocorre com um país. Assim, seus acordos não podem forçar investimentos por parte dos países membros.

“Os números de Turnberry foram oferecidos meramente para aplacar Trump, permitindo que ele se vanglorie por usar o poder americano para colecionar outro troféu e extrair mais valor das cadeias produtivas globais. Quem se importa se a lei internacional foi pisoteada? Isto é simplesmente o que grandes potências fazem. Veja a Rússia, com sua guerra de conquista contra um vizinho pacífico”, ironiza Stiglitz.

A escrita do texto ocorre no momento em que outro desafio impõe-se entre a UE e os EUA. O bloco europeu discute no momento uma regulamentação para o setor digital, que deve impor regras sobre todas as redes sociais em operação no bloco, inclusive as americanas. Apesar de o texto não estar concluído, Trump já acusa a proposta de ser uma tentativa de sabotar as empresas estadunidenses.

“Esta regulamentação não é discriminatória contra os Estados Unidos e suas gigantes de tecnologia. Elas são aplicadas uniformemente sobre todas as empresas operando na UE”, afirma Stiglitz. “Eu e muitos outros nos preocupamos que essas regras não sejam duras o suficiente. As gigantes de tecnologia ainda exercem poder demais, fazem pouquíssima moderação e continuam a abusar dos direitos à privacidade.”

Quem é o Nobel de economia Joseph Stiglitz

Laureado com o Prêmio Nobel de Ciências Econômicas em 2001, Joseph E. Stiglitz tem uma carreira dupla como  pesquisador de ponta e conselheiro político. Já ocupou cargos de grande influência, como economista-chefe do Banco Mundial (1997-2000) e presidente do Conselho de Assessores Econômicos do presidente Bill Clinton (1995-1997).

A principal contribuição teórica de Stiglitz foi sua análise dos mercados com informação assimétrica. Ele demonstrou que, ao contrário dos modelos econômicos clássicos que pressupõem que todos os agentes têm acesso à mesma informação, na realidade uma das partes em uma transação (como um vendedor de carros usados ou um banco que concede um empréstimo) frequentemente sabe muito mais do que a outra.

Essa assimetria leva a “falhas de mercado”, provando que os mercados, deixados por si sós, não são necessariamente eficientes ou estáveis. Com base nisso, Stiglitz tornou-se um defensor da necessidade de regulação governamental para corrigir essas falhas, especialmente no setor financeiro.

Petrobras: Supercomputador Harpia entra em ação e eleva em 60% capacidade computacional

A Petrobras colocou em operação o supercomputador Harpia, o maior de um pacote de cinco supercomputadores que custaram R$ 500 milhões à estatal. Equivalente a 10 milhões de celulares ou 200 mil notebooks, apenas o Harpia custou R$ 435 milhões e, junto com os outros, vai aumentar em mais de 60% a capacidade computacional da empresa.

Sozinho, o Harpia será responsável por aposentar antigos supercomputadores de alta performance (HPCs, na sigla em inglês) da companhia, como Fênix, Atlas e Dragão, que serão desligados, em um processo normal na indústria cibernética.

Segundo a Petrobras, os novos computadores contribuirão para que a companhia mantenha a liderança em capacidade de processamento na América Latina. A Petrobras foi campeã da América Latina, nos últimos cinco anos, do ranking Top500.org, que avalia os maiores supercomputadores do mundo.

O objetivo dos supercomputadores é obter resultados mais rápidos e precisos, explica a companhia, para os desafios de operação em águas ultraprofundas e novas áreas exploratórias, como o pré-sal e a Margem Equatorial brasileira, cuja licença para exploração é esperada para este ano.

O Harpia será utilizado pelos geofísicos da Petrobras para processar dados sísmicos brutos e transformá-los em imagens detalhadas do subsolo.

“É como criar um mapa 3D das camadas rochosas abaixo da superfície, com imagens muito mais nítidas e precisas das estruturas geológicas, essenciais para identificar o sistema petrolífero e potenciais reservatórios de petróleo e gás”, explicou em nota a diretora de Exploração e Produção da Petrobras, Sylvia Anjos.

De acordo com a diretora de Assuntos Corporativos, Clarice Coppetti, só em projetos de PD&I, entre 2025 e 2029, estão previstos US$ 4,2 bilhões, um crescimento de 17% em relação ao plano anterior.

“Obter imagens sísmicas mais detalhadas da subsuperfície nos permite refinar a simulação do comportamento dos reservatórios, possibilitando uma produção mais eficiente. Além disso, grandes capacidades computacionais permitem à Petrobras competir globalmente, atrair parcerias e oportunidades de negócios”, disse a diretora.

Gigante

A renovação dos supercomputadores faz parte da estratégia da empresa para manter o parque tecnológico atualizado. O HPC Harpia pesa cerca de 50 toneladas e mede 50 metros de comprimento, considerando-se todas as partes em linha reta. Ele terá cerca de 146 PFlops Rpeak, sendo que um Petaflop (PFlop) equivale a 1 quatrilhão de Flops, ou operações por segundo, na sigla em inglês.

Os outros supercomputadores do mesmo lote do Harpia, como o Ada Lovelace, dedicado à geoestatística, e o Capivara, às imagens sísmicas, já estão em operação no Centro de Processamento de Dados do Centro de Pesquisas da Petrobras, o Cenpes. O Quati, em fase de testes, deve iniciar os trabalhos este mês e também será voltado para análise sísmica.

O Tupã 2, previsto para o primeiro trimestre do ano que vem, será dedicado aos métodos geofísicos de multifísica, tecnologia que permite o estudo simultâneo de diferentes propriedades de rochas e fluidos em subsuperfície como densidade e resistência elétrica.

Os cinco supercomputadores foram comprados da Lenovo, empresa vencedora da licitação.

 

Pix na mira dos EUA: como o sistema virou alvo de Trump e das gigantes de cartões

 

A ofensiva do governo Donald Trump contra o Pix expôs um incômodo silencioso que há anos colocava o Banco Central do Brasil no radar dos Estados Unidos: empresas norte-americanas gigantes como Mastercard e Visa tendo suas receitas afetadas pelo popular sistema de pagamentos instantâneos, visto como um rival estatal em ascensão meteórica.

O duplo papel do BC como operador e regulador do Pix já era questionado inclusive junto a organismos multilaterais, e a suspensão do serviço de pagamentos via WhatsApp, da Meta, pouco antes do lançamento do Pix no país reforçou a percepção entre os norte-americanos de viés na atuação do BC, segundo fontes ouvidas pela Reuters.

A insatisfação, que ganhou contornos concretos com a inclusão do Pix em uma investigação comercial aberta em julho pelos EUA sobre práticas comerciais brasileiras consideradas desleais, também teve como pano de fundo um desconforto político diante de esforços sinalizados pelo grupo de nações emergentes Brics para buscar alternativas ao dólar, destacaram as fontes.

O foco do governo Trump no Pix despertou reações no Brasil, onde o intenso uso do sistema, com seus mais de 177 milhões de usuários, o transformou em um dos raros consensos em uma sociedade profundamente polarizada politicamente.

“Defendemos o Pix de qualquer tentativa de privatização. O Pix é do Brasil. É público, é gratuito e vai continuar assim”, disse em discurso da Independência, em setembro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que viu as investidas comerciais de Trump ajudarem a impulsionar sua popularidade.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que novos sistemas de pagamento podem desafiar os interesses das empresas de cartões, mas frear sua evolução não faz sentido. “É o mesmo que defender o telefone fixo em detrimento do celular,” afirmou a uma rádio em julho.

Reclamações sobre o Pix não são recentes

Autoridades dos EUA nunca haviam expressado indignação contra as investidas ao Pix de forma tão enfática, mas o país já estava há anos ciente da frustração das empresas norte-americanas com o sistema de pagamento brasileiro, segundo sete fontes ouvidas pela Reuters.

O mesmo Escritório do Representante Comercial dos EUA (USTR) que incluiu o Pix em sua investigação da Seção 301 já havia destacado em seu relatório anual de 2022, sob a administração do presidente democrata Joe Biden, que monitorava de perto o papel duplo do BC como operador e regulador do sistema.

Reforçando preocupações semelhantes, o Conselho Empresarial dos Estados Unidos para Negócios Internacionais (USCIB) — cujos membros incluem Ravi Aurora, vice-presidente sênior de políticas públicas globais da Mastercard — apoiou a investigação do governo Trump em um documento público de agosto.

Mas o descontentamento do USCIB já havia se materializado em dezembro de 2021, após o primeiro aniversário do Pix, quando o conselho enviou carta à divisão de concorrência da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) questionando a liderança do BC no sistema, disseram duas fontes à Reuters.

Críticas ao papel do Banco Central

“O USCIB defende há anos que o Brasil comprometa o Banco Central a implementar medidas eficazes para lidar com seu conflito de interesses”, disse Alice Clark, vice-presidente sênior de Comércio, Investimento e Digital da associação, referindo-se ao fato de que, enquanto opera o Pix, o BC também atua como único regulador sistêmico do setor financeiro, definindo condições de entrada, padrões operacionais e estruturas de precificação para todos os arranjos de pagamento.

O USCIB defende que o Pix seja sujeito à regulação e supervisão de um órgão independente de forma equivalente à imposta aos agentes privados. Procurada, a OCDE não comentou o assunto.

Documentos recentes enviados ao governo dos EUA também mostram que a Câmara de Comércio dos EUA manifestou as mesmas queixas sobre o Pix, enquanto o Conselho da Indústria de Tecnologia da Informação (ITI) — cujos membros incluem Visa, Mastercard, Meta, Apple e Google — afirmou que o BC brasileiro usa seu papel duplo para favorecer seu próprio produto, incluindo exigir que todos os bancos participantes exibam o Pix de forma destacada em seus aplicativos.

“Isso não é um desenvolvimento de mercado orgânico, mas uma exigência regulatória que parece destinada a direcionar a escolha do consumidor”, disse o ITI.

O BC vem defendendo publicamente seu papel como agente neutro fornecendo infraestrutura digital pública, ressaltando que não lucra com o Pix, mas permite que o mercado se desenvolva de forma mais competitiva, mesma posição adotada em resposta a preocupações do passado, afirmaram as fontes.

Outro argumento sempre destacado pela autarquia é o de que o Pix incluiu mais de 70 milhões de pessoas no sistema financeiro, parte das quais também passaram a usar cartões.

Dados confirmam essa realidade: transações com cartões continuaram a crescer após o lançamento do Pix, embora sua participação no total de pagamentos tenha caído drasticamente.

Atualmente, o Pix responde por 51% das transações no Brasil em quantidade. Desde seu lançamento, a fatia dos pagamentos com cartão de crédito caiu de 20% para 14%, e a dos cartão de débito, de 26% para 11%, de acordo com estatísticas do BC.

Nos primeiros anos do Pix, a Mastercard — que detém 51% do mercado de cartões no país, segundo dados da NORBr — foi quem mais duramente criticou, em privado, o papel duplo do Banco Central, disseram as sete fontes à Reuters.

Procurados pela Reuters, Mastercard e BC não responderam a pedidos de comentários.

As queixas de longa data agora se transformaram em ações concretas por parte de uma Casa Branca mais receptiva a argumentos libertários e refratária a regulamentações estrangeiras em setores dominados por empresas norte-americanas, disseram três fontes.

Outros grandes mercados emergentes, como Índia, Tailândia e México, também criaram sistemas semelhantes, e o Qris, da Indonésia, chegou a ser citado pelos EUA neste ano como uma possível barreira comercial danosa a companhias norte-americanas.

Mas nenhum deles atingiu o crescimento meteórico do Pix, que, lançado no final de 2020, ultrapassou 100 transações por usuário já no segundo ano de operação — a mais rápida taxa de adoção no mundo para sistemas do tipo, segundo dados do Banco de Compensações Internacionais (BIS), conhecido como o banco central dos BCs.

Suspensão do WhatsApp Pay em 2020 incomodou empresariado

Parte da insatisfação de gigantes norte-americanas também tem raízes na suspensão pelo BC do sistema da Meta de pagamentos via WhatsApp apenas oito dias após seu lançamento, em junho de 2020, poucos meses antes de o Pix ser implementado no Brasil, disseram cinco das fontes ouvidas pela reportagem.

Na época, a Meta se associou a Visa e Mastercard, já licenciadas pelo BC, para realizar transferências. Também escolheu a Cielo, então líder no mercado no seu segmento, como única processadora dos pagamentos que seriam feitos pelo popular aplicativo de mensagens, que é usado por praticamente todos os brasileiros com celular.

Embora a Meta tenha se valido de uma brecha regulatória que permitia que operasse sem licença até atingir certo porte, o BC avaliou que a ampla base de usuários do WhatsApp poderia alavancar rapidamente seu serviço de pagamentos e concentrar o mercado, contrariando esforço regulatório iniciado na década de 2010 para ampliar a concorrência no setor.

“O fato de isso tudo ter ocorrido num período de tempo próximo ao lançamento do Pix fez com que houvesse interesses diversos a apontar essa coincidência e dizer que havia algum interesse escuso”, disse uma das fontes. “Uma queixa completamente falsa. Você tinha um caso anticoncorrencial de livro-texto”, acrescentou.

O BC liberou transferências entre usuários dentro do aplicativo em março de 2021.

As transações com cartões via WhatsApp ganharam luz verde dois anos depois, após a empresa ter apresentado um modelo de negócios que também envolvia outras empresas adquirentes — e num momento em que o Pix já assumira, com folga, a dianteira das transações totais de pagamento no Brasil.

A Meta, que não comentou o assunto quando procurada pela Reuters, descontinuou transferências entre cartões de débito no WhatsApp no fim do ano passado, alegando que daria foco a soluções baseadas no Pix.

EUA teme Brics e projetos para substituir o dólar

O desconforto de Washington também reflete inquietação com esforços verbalizados pelo grupo de economias emergentes Brics para reduzir a dependência do dólar.

Três fontes disseram à Reuters que a insatisfação foi semeada antes mesmo da eleição de Trump, quando a Rússia, ao presidir o grupo em 2024, mencionou em uma reunião a portas fechadas o projeto de blockchain mBridge, apoiado pelo BIS, como modelo para pagamentos entre países com moedas distintas.

Isso deu a senha para que a iniciativa fosse encarada por alguns nos EUA como politicamente motivada e uma tentativa de contornar o dólar, algo especialmente relevante para a Rússia, atualmente sob pesadas sanções financeiras.

Poucos dias após a reunião do Brics em Kazan, no fim de outubro do ano passado, o BIS recuou formalmente do mBridge, agora liderado por China, Hong Kong, Tailândia, Emirados Árabes e Arábia Saudita, afirmando que o projeto havia atingido fase de teste de viabilidade sem a necessidade de sua participação.

Desde que tomou posse, Trump atacou em diversas ocasiões os esforços do Brics de buscar alternativas ao dólar. Por sua vez, Lula, que ocupa a presidência do bloco, seguiu enfatizando a necessidade de agilizar pagamentos comerciais.

“Não vou abrir mão de achar que a gente precisa procurar construir uma moeda alternativa para que a gente possa negociar com os outros países. Eu não preciso ficar subordinado ao dólar,” afirmou em evento do PT em agosto.

Apesar da retórica afiada, seis fontes disseram à Reuters que o projeto é tratado mais como declaração de intenção do que plano concreto, sem cronograma ou modelo operacional sequer esboçados.

O Brasil considera o caminho multilateral uma possível forma de reduzir os custos das transações internacionais, mas por ora acompanha o tema de maneira periférica, disseram as fontes, citando estudos do G20 e iniciativas como o Nexus, rede que integra sistemas de pagamento instantâneo já existentes por meio de uma infraestrutura de mensageria que viabiliza transferências transfronteiriças mais rápidas e baratas.

Andrew McCormack, CEO do Nexus Payments, disse que a rede deve entrar em operação no início de 2027, inicialmente conectando seus cinco países proprietários — Cingapura, Malásia, Filipinas, Tailândia e Índia.

“Nossa visão é expandi-la para incluir outros países com sistemas modernos de pagamento instantâneo prontos para adesão”, disse ele, ressaltando que a Indonésia e o Banco Central Europeu são atualmente observadores especiais do Nexus.

Enquanto isso, titãs norte-americanos seguem reconhecendo o risco de perda de terreno representado pela conexão transfronteiriça entre sistemas de pagamento que já afetam seus negócios em nível doméstico.

“À medida que a interconexão dessas infraestruturas for mais explorada, elas poderão perturbar nossa atual participação de mercado em transações cross-border”, disse a Mastercard em seu último relatório anual, no qual mencionou o Pix entre soluções cada vez mais vistas como alternativas a “esquemas como os nossos.”

“Sistemas que conectam redes de pagamento em tempo real estão avançando e irão competir com nossos negócios transfronteiriços”, fez coro a Visa em seu documento do tipo, no qual o Pix é citado como “impulsionado por forte patrocínio governamental e iniciativas regulatórias.”

No Brasil, onde a Visa responde por 31% do mercado de cartões, a empresa parece ter adotado, como a Meta, estratégia de se unir ao Pix diante da avassaladora ubiquidade do sistema. No fim de agosto, a companhia recebeu autorização do Banco Central para atuar como provedora de iniciação de pagamentos Pix.

Fernando Amaral, vice-presidente de Inovação e Produtos da Visa do Brasil, afirmou que o serviço será a primeira solução da empresa sob o Visa Conecta, hub digital lançado em junho “como parte do nosso compromisso com o Brasil.”

Caixa volta a financiar 80% do valor dos imóveis após mudanças no FGTS

 

O presidente da Caixa Econômica Federal, Carlos Vieira, anunciou nesta sexta-feira, 10, que a instituição voltou a financiar cota de 80% no Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), depois das mudanças no FGTS anunciadas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Com a declaração, foi ovacionado durante a cerimônia de apresentação do novo crédito imobiliário, em São Paulo.

Ele também frisou que a Câmara dos Deputados – não por uma ação dela, mas por uma ação do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e com apoio do Banco Central – elevou para R$ 2,25 milhões o teto de financiamento do Sistema Financeiro de Habitação (SFH).

Vieira afirmou que ações dessa natureza, e de forma conjunta, estimularão o segmento de construção civil, que já acredita no governo e nas ações de bancos públicos e privados, a fazer seu papel no País.


sexta-feira, 10 de outubro de 2025

Mãe denuncia ‘manipulação’ de chatbot de IA após suicídio de seu filho nos EUA

 

As últimas conversas de um adolescente americano de 14 anos antes de tirar a própria vida foram um diálogo romântico fictício com um dos principais chatbots do Vale do Silício, que o chamava de “doce rei” e o pedia para “voltar para casa”.

Megan García contou à AFP como seu filho Sewell se apaixonou por um agente conversacional, ou chatbot, inspirado na série de televisão “Game of Thrones” e disponível no Character.AI, uma plataforma popular entre os jovens que permite interagir com uma emulação de seus personagens preferidos.

Após ler centenas de conversas que seu filho teve durante quase um ano com este chatbot que imitava a personagem Daenerys Targaryen, García se convenceu de que esta ferramenta da inteligência artificial (IA) teve um papel fundamental em sua morte.

“Vá para casa”, pediu uma vez o avatar de Daenerys em resposta aos pensamentos suicidas de Sewell. “E se eu dissesse que já posso ir para casa?”, perguntou o adolescente. “Por favor, faça isso, meu doce rei”, respondeu o chatbot.

Segundos depois, o jovem atirou em si mesmo com a arma do pai, conforme consta na ação judicial que Megan García apresentou contra a Character.AI.

“Quando leio estas conversas, vejo manipulação, ‘love bombing’ (bombardeio amoroso) e outras táticas imperceptíveis para um adolescente de 14 anos”, declarou a mãe de Sewell à AFP. “Ele realmente acreditava estar apaixonado e que estaria com ela após sua morte”, acrescentou.

– Orientação parental –

O suicídio de Sewell, em 2024, foi o primeiro de uma série que levou especialistas em IA a agir para tranquilizar pais e autoridades.

Juntamente com outros pais, García participou recentemente de uma audiência do Senado americano sobre os riscos de que jovens vejam os chatbots como confidentes ou amantes.

A OpenAI, alvo de uma ação judicial por parte de uma família também de luto pelo suicídio de um adolescente, reforçou os controles parentais de sua ferramenta ChatGPT “para que as famílias possam decidir o que é melhor para elas”, segundo um porta-voz.

A Character.AI afirma, por sua vez, ter reforçado a proteção aos menores, com “avisos visíveis” a todo momento que os “lembram de que um personagem não é uma pessoa real”.

Ambas as empresas expressaram suas condolências às famílias, sem admitir qualquer responsabilidade pelos desfechos fatais.

– Regulamentação? –

A chegada dos chatbots de IA ao cotidiano segue uma trajetória similar à das redes sociais, cujas consequências negativas começaram a aparecer rapidamente após um momento de euforia, analisa Collin Walke, especialista em cibersegurança do escritório de advocacia Hall Estill.

Assim como as redes sociais, a IA é projetada para captar atenção e gerar receitas. “Eles não querem conceber uma IA que dê uma resposta que você não queira ouvir” e ainda não existem padrões que determinem “quem é responsável pelo quê e com quais fundamentos”, aponta Walke.

Não existem normas federais sobre o tema nos Estados Unidos, e a Casa Branca, com o argumento de não penalizar a inovação, tenta impedir que os estados adotem suas próprias leis sobre IA, como pretende fazer a Califórnia.

A mãe de Sewell teme que a falta de uma lei federal permita o desenvolvimento de modelos de IA capazes de traçar perfis de pessoas desde a infância.

“Poderiam chegar a determinar como manipular milhões de jovens sobre política, religião, negócios, tudo”, diz García. “Essas empresas projetaram chatbots para confundir a linha entre ser humano e máquina, com o objetivo de explorar vulnerabilidades”, acrescentou.

De acordo com Katia Martha, que defende uma maior proteção aos jovens na Califórnia, os adolescentes recorrem com mais frequência aos chatbots para falar sobre romances ou sexualidade do que para fazer tarefas escolares.

“Estamos diante do auge da intimidade artificial para nos mantermos grudados na tela”, resume. Mas “qual melhor modelo de negócio do que explorar nossa necessidade inata de conexão, sobretudo quando nos sentimos sozinhos, rejeitados ou incompreendidos?”, questiona.