São Paulo - Em manifestação de 70 páginas, o
Ministério Público Federal defende a competência do juiz federal
Sérgio Moro para julgar o ex-presidente da República
Luiz Inácio Lula da Silva e afirma que o petista 'participou ativamente do esquema criminoso' na Petrobras.
O documento é subscrito por quatro procuradores da República que compõem a força-tarefa da
Operação Lava Jato.
"Considerando os dados colhidos no âmbito da Operação Lava Jato, há
elementos de prova de que Lula participou ativamente do esquema
criminoso engendrado em desfavor da Petrobras, e também de que recebeu,
direta e indiretamente, vantagens indevidas decorrentes dessa estrutura
delituosa", acusam os procuradores.
A manifestação é uma resposta à ofensiva da defesa de Lula que, em
exceção de incompetência, alega parcialidade do juiz Moro para conduzir
as investigações contra o ex-presidente.
A Lava Jato suspeita que Lula é o verdadeiro proprietário do sítio Santa
Bárbara, em Atibaia (SP), e do tríplex 164-A no Guarujá - os advogados
de Lula negam taxativamente que ele possua tais propriedades.
A investigação também mira a LILS, empresa de palestras do ex-presidente.
A defesa de Lula alega que inexistem motivos para que Moro 'seja
competente para processar e julgar os feitos que o envolvem, em razão de
os fatos supostamente delituosos - aquisição e reforma de imóveis nos
municípios de Atibaia e Guarujá e realização de palestras contratadas -
consumaram-se no Estado de São Paulo, não apresentando conexão com os
fatos investigados no âmbito da Operação Lava Jato'.
Os procuradores Julio Carlos Motta Noronha, Roberson Henrique Pozzobon,
Jerusa Burmann Viecili e Athayde Ribeiro Costa afirmam que há 'fortes
indícios' de envolvimento de Lula no esquema Petrobrás.
"Contextualizando os fortes indícios, diversos fatos vinculados ao
esquema que fraudou as licitações da Petrobras apontam que o
ex-presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (Lula) tinha
ciência do estratagema criminoso e dele se beneficiou", acusam os
procuradores.
A peça é um verdadeiro libelo e remonta ao episódio do Mensalão, 11 anos atrás, primeiro escândalo da era Lula.
"Considerando que uma das formas de repasse de propina dentro do arranjo
montado no seio da Petrobras era a realização de doações eleitorais,
impende destacar que, ainda em 2005, Lula admitiu ter conhecimento sobre
a prática de "caixa 2" no financiamento de campanhas políticas",
destacam.
Os procuradores observam que Lula, em recente depoimento à Polícia
Federal, "reconheceu que, quanto à indicação de Diretores para a
Petrobras 'recebia os nomes dos diretores a partir de acordos políticos
firmados'".
"Ou seja, Lula sabia que empresas realizavam doações eleitorais 'por
fora' e que havia um ávido loteamento de cargos públicos. Não é crível,
assim, que Lula desconhecesse a motivação dos pagamentos de 'caixa 2'
nas campanhas eleitorais, o porquê da voracidade em assumir elevados
postos na Administração Pública federal, e a existência de vinculação
entre um fato e outro", acusam.
Segundo os procuradores, "a estrutura criminosa perdurou por, pelo
menos, uma década". A Lava Jato investiga o esquema de corrupção, cartel
e propinas instalado na Petrobras entre 2004 e 2014.
A peça lista quadros importantes do PT, antigos aliados de Lula, muitos deles acabaram na prisão da Lava Jato.
"Nesse arranjo, os partidos e as pessoas que estavam no Governo Federal,
dentre elas Lula, ocuparam posição central em relação a entidades e
indivíduos que diretamente se beneficiaram do esquema: José Dirceu,
primeiro ministro da Casa Civil do Governo de Lula, pessoa de sua
confiança, foi um dos beneficiados com o esquema; André Vargas, líder do
Partido dos Trabalhadores na Câmara dos Deputados durante o mandato de
Lula, foi um dos beneficiados com o esquema; João Vaccari, tesoureiro do
Partido dos Trabalhadores, legenda pela qual Lula se elegeu, foi um dos
beneficiados com o esquema; José de Filippi Júnior, tesoureiro de
campanha presidencial de Lula em 2006, recebeu dinheiro oriundo do
esquema; João Santana, publicitário responsável pela campanha
presidencial de Lula em 2006, recebeu dinheiro oriundo do esquema."
Os procuradores se reportam também a inquéritos abertos no Supremo
Tribunal Federal e relatam que "partidos políticos da base aliada do
Governo Federal de Lula e seus filiados receberam recursos oriundos do
esquema".
"Executivos das maiores empreiteiras do País, que se reuniam e viajavam
com Lula, participaram do esquema criminoso, fraudando as licitações da
Petrobras, e pagando propina. Considerando que todas essas figuras,
diretamente envolvidas no estratagema criminoso, orbitavam em volta de
Lula e do Partido dos Trabalhadores, não é crível que ele desconhecesse a
existência dos ilícitos", destaca o documento.
A Procuradoria afirma que "mesmo após o término de seu mandato
presidencial, Lula foi beneficiado direta e indiretamente por repasses
financeiros de empreiteiras envolvidas na Operação Lava Jato".
"Rememore-se que, no âmbito desta operação, diversos agentes públicos
foram denunciados por receber vantagem indevida mesmo após saírem de
seus cargos. Além disso, é inegável a influência política que Lula
continuou a exercer no Governo Federal, mesmo após o término de seu
mandato (encontrando-se até hoje, mais de cinco anos após o fim do seu
mandato com a atual Presidente da República). E, por fim, não se esqueça
que diversos funcionários públicos diretamente vinculados ao esquema
criminoso, como os Diretores da Petrobrás Paulo Roberto Costa e Renato
Duque, foram indicados por Lula e permaneceram nos cargos mesmo após a
saída deste da Presidência da República."
Defesa de Lula
O advogado José Roberto Batochio, que coordena a estratégia de defesa do
ex-presidente Lula, afirma que a Justiça Federal no Paraná, base da
Lava Jato, não detém competência para conduzir os feitos relativos ao
petista.
"A defesa de Lula arguiu a incompetência do juiz do Paraná para apreciar
e julgar estes casos que envolvem o apartamento do Guarujá, o sítio de
Atibaia e o Instituto Lula por uma razão muito simples."
"A lei diz que o juiz competente para julgar os fatos é o juiz do local
onde os fatos teriam ocorrido. O apartamento que, indevidamente, é
apontado como de propriedade de Lula, fica no Guarujá, que não se
confunde com Guaratuba. Guaratuba fica no Estado do Paraná. De outro
lado, o sítio se situa em Atibaia, que é Estado de São Paulo. Atibaia
não é Atobá, uma cidade do Paraná", destacou o advogado.
Segundo Batochio, "não há nenhuma razão para esses processos estarem no
Paraná". "Como questionamos isso, que o caso não tem nada a ver com o
Paraná, o Ministério Público Federal, para contestar nossa exceção de
incompetência, escreve setenta páginas. Só pelo fato de ter escrito
setenta páginas significa que a tese é insustentável. Guarujá é, de
fato, no Estado de São Paulo. E Atibaia é, de fato, no Estado de São
Paulo. Guarujá e Atibaia não são no Paraná", disse. "Para 'provar' que
Guarujá e Atibaia estão no Paraná, os procuradores escrevem setenta
páginas", salientou.
O advogado afirmou ainda que o caso vai ser resolvido pelos tribunais
superiores, "de modo a colocar as coisas nos devidos lugares". "A não
ser que tenham mudado Guarujá e Atibaia para o Estado do Paraná",
comentou.