Empresas desenvolvem tecnologias que transportam a revolução 4.0 para o campo e ajudam a otimizar produção, controle e manejo.
As agrotehs, startups que oferecem tecnologias voltadas ao
agronegócio, estão ajudando a impulsionar ainda mais o segmento
responsável por 22% do PIB nacional, que em 2017 foi de R$ 6,6 trilhões.
Enquanto algumas oferecem soluções que contribuem com o aumento da
produtividade, outras auxiliam na tomada de decisão, analisando grande
volume de dados.
Entre elas está a CowMed, de Thiago Martins, que
monitora e avalia questões nutricionais, sanitárias e reprodutivas de
vacas. “Brinco que nosso grande negócio é expressar a ‘opinião’ da vaca
para o produtor.”
A tecnologia é embarcada em coleira usada pelos animais. “O
equipamento emite dados sobre o comportamento de ruminação, que é
indicador da saúde animal.” O desenvolvimento do produto começou em 2010
e foi lançado há dois anos.
“O idealizador foi meu pai. Ele é professor universitário e foi fazer
doutorado em Portugal. Na Europa, conheceu sistemas de monitoramento de
vaca chamado pedômetro. Na volta, sugeriu que eu, aluno de engenharia
mecânica, e Leonardo, meu irmão, aluno de engenharia elétrica,
iniciássemos pesquisa sobre o assunto.”
Atualmente, a tecnologia atende 50 propriedades. “Depois que a
solução chegou ao mercado, percebemos a necessidade de assessorar o
pecuarista na interpretação dos dados e passamos a oferecer plano de
monitoramento de saúde e bem-estar animal”, conta.
Ele mantém equipes que acompanham e interpretam dados 24 horas por
dia. “Quando identificamos que algo está errado emitimos alerta ao
proprietário.”
Segundo ele, pelas variáveis dos dados, muito mais que dar alertas,
as vacas dão ‘opinião’. “Identificamos, por exemplo, quando estão se
preparando para parir, quando estão com estresse térmico, se estão
gostando da comida ou prestes a ficar doentes. Com base nessas
informações, os pecuaristas tomam medidas preventivas e evitam o
adoecimento dos animais.”
Ele conta que um cliente reduziu em 50% a taxa de descarte de animal
por ano. Já a produção de outro produtor passou de 28 litros de leite
por vaca/dia, para 38 litros por vaca/dia.
“Não é milagre, é que agora os produtores ‘escutam’ as vacas e elas
estão felizes, por isso, entregam mais qualidade.” Até o final do ano a
empresa espera monitorar 20 mil animais. Hoje, monitora quatro mil.
Pesquisa
Pós-doutorado em genética e manejo de culturas agrícolas, o CEO da
Smartbreeder, Eder Giglioti, atua há 25 anos na área de pesquisa.
Legenda: Eder Giglioti
“Sempre busquei uma solução inteligente para otimizar a performance e
a gestão do manejo das plantações, porque os produtores gastam muito
com insumos para controlar doenças, pragas e fazer adubação.”
Segundo ele, pela complexidade de cada cultura, os produtores perdem
40% do investimento, porque não acertam onde, como e quando usar os
insumos de maneira ideal.
“Assim, fazem mais aplicações de produtos e o volume de adubação tem
de ser maior. E por não fazerem o manejo adequado, não atingem a
produtividade ideal.”
Giglioti ressalta que vivemos a quarta revolução da agricultura. “É
revolução da informação, mas mais que informações precisas, o produtor
precisa tomar decisões assertivas e isso é possível por meio de
modelagens matemática e algoritmos.”
A plataforma desenvolvida pela Smartbreeder utiliza tecnologia de big
data, inteligência artificial, dados em nuvem e conhecimentos de
biologia, física, medicina e estatística.
“Trabalhamos com essa
camada de inteligência e orientamos os produtores. As recomendações
incluem desde o dimensionamento de equipe necessária para uma ação até
locais onde há cultura de bicho-da-seda, apiários e assentamentos.
Analisamos mais de 100 milhões de dados”, afirma.
A plataforma foi desenvolvida e validada ao longo de seis anos e
chegou ao mercado no final de 2015. “A solução já foi empregada em dois
milhões de hectares de cana-de-açúcar e ajudou a aumentar a produção em
seis milhões de toneladas.”
Giglioti tem como meta, até 2019, atender 300 mil hectares de plantações e chegar a 1,5 milhão de hectares em 2020.
Queimada
“O nível de perdas de plantações e florestas atingidas por incêndios é
muito grande e todo o sistema de detecção e controle sempre foi feito
manualmente, contando com apoio da sociedade”, afirma o CEO da
Sintecsys, Rogério Cavalcante.
Legenda: Rogério Cavalcante
Para sanar o problema, a empresa desenvolveu algoritmo e utiliza
câmeras acopladas em torres para detectar focos de incêndio localizados
em um raio de até 15 km de distância.
“A tecnologia é 100% nacional e
consiste em câmera que gira 360º em busca de fumaça. Ao identificar um
foco de fumaça é emitido alerta para o operador do sistema, que realiza a
triangulação de imagens e obtém a coordenada do foco.”
Segundo ele, a tecnologia reduz o tempo de detecção de 40 para cinco
minutos. Além disso, reduz em mais de 90% o tempo de duração do incêndio
e em 100% a aplicação de multas ambientais. “Oferecemos o sistema por
meio de locação.”
A empresa está no mercado desde 2016 e espera crescer 60% este ano em
contratos assinados. “Dentro de dois anos pretendemos começar o
processo de internacionalização, porque já existe demanda.”
Cavalcante destaca que o produto também pode evitar catástrofes
ambientais provocadas por incêndios, como as que ocorrem nos Estados
Unidos, Austrália e Portugal.
Segundo ele, para ter acesso ao serviço o proprietário investe R$ 6,9
mil por mês. “Um único ponto é capaz de monitorar a propriedade
inteira, porque abrange cerca de 20 mil hectares. Os proprietários podem
se unir e adicionar novas torres ao sistema, abrangendo área cada vez
maior.”
Empresa monitora territórios para orientar tomada de decisão
No mercado há dez anos, a plataforma Agrotools, de Sergio Rocha, é
uma startup que cresceu e conquistou inserção nacional e internacional. A
empresa desenvolveu sistema que identifica à distância o que acontece
em um determinado território.
Legenda: Sergio Rocha
“Em um país com dimensões como o nosso é importante ter informações
sobre as áreas de interesse de nossos clientes, para que eles saibam se
ela está sofrendo consequências das mudanças climáticas ou se é
apropriada ao plantio de soja, milho, algodão etc.”
Ele diz que isso é possível usando a tecnologia geomática – técnica
que integra todos os meios usados para a aquisição e gerenciamento de
dados espaciais, como cartografia, mapeamentos digitais, sensoriamento
remoto, sistemas de informações geográficas, hidrografia e imagens de
satélite.
“Um dos alicerces da empresa é a nossa capacidade de traduzirmos
essas informações, que resultam em webmaps. Além disso, nesses dez anos,
colecionamos muitos dados, suprindo a carência de dados na área de
agronegócio existente no País.”
Ele afirma que a empresa faz curadoria e arquiteta esses dados de
maneira que respondam a algum desafio do agronegócio em áreas como
cadeia de suprimentos, crédito, seguro ou mesmo em relação a compliance.
“O agronegócio moderno não admite mais a produção em área que
prejudique as futuras gerações ou que demande a destruição de
florestas.”
Rocha conta que a Agrotools tem linha de produtos só de compliance.
“Atestamos, por exemplo, que o produtor não tem trabalho escravo, não
está em área indígena, não desmata, não ocupa área de preservação.
Usamos a geotecnologia para isso. Esse tipo de informação vira atributo e
estratégia de vendas para toda a cadeia.”
A empresa tem entre seus clientes grandes varejistas que querem entender a origem dos produtos de seus fornecedores.
“Não orientamos o produtor sobre como melhor aproveitar o território,
mas sim como aquele território está sendo tratado. Nossa agenda é fora
da porteira. Os clientes utilizam esses dados para saber se podem
acessar crédito melhor, seguro mais adequado, ou atrair comprador de
melhor qualidade e obter melhor preço”, afirma.
“Usamos inteligência de dados para melhorar o posicionamento do
produtor. Nosso ator principal é o território, que é o conector disso
tudo.”
Rocha diz que mais de 15% das maiores empresas do agronegócio são
atendidas pela Agrotools – bancos, seguradoras, indústrias, trades etc.
“Eles, por sua vez, têm milhares de fornecedores. Nós os ajudamos a
saberem mais sobre esses fornecedores.”
O empresário afirma que as informações fornecidas contribuem com a
tomada de decisão dos clientes e com a transformação digital desses
negócios. “As grandes corporações conseguem ser mais automatizadas e
entender para quem estão dando crédito ou de quem estão comprando.
Assim, criam grau de entendimento do risco mais qualificado.”
O negócio possui escritório na Argentina e já atendeu clientes de
diversos países. “Vendemos a inteligência dos dados para determinado
objetivo.”
Rocha diz que o mundo tecnológico que estava muito distante do mundo agro está se aproximando com muita velocidade.
“Isso estava represado e agora está vindo com grande velocidade. Há
dez anos, falávamos praticamente sozinhos e ficávamos roucos ao tentar
mostrar que a revolução agro 4.0 estava para acontecer. Agora, já
aconteceu de fato e fomos um dos indutores. Lideramos o mercado de
utilização de dados.”
(O Estado de S.Paulo, 13/5/18)