São Paulo - Nesta segunda-feira (14), os ministros do Planejamento, Nelson Barbosa, e da Fazenda, Joaquim Levy,
anunciaram um pacote para conter o rombo nas contas do
governo. Entra as medidas previstas, duas podem ter impacto direto sobre a
renda do brasileiro: a volta da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (
CPMF) e o aumento do imposto sobre lucro na venda de imóveis por valor superior a 1 milhão de reais.
De acordo com Arthur Vieira de Moraes, agente autônomo de investimentos,
como a CPMF incidiria sobre todas as transações bancárias, o imposto
contribuiria para o aumento dos preços finais para o
consumidor.
“A CPMF tem um efeito em cascata: cada vez que o dinheiro sai de uma
mão para outra ela é cobrada. Uma alíquota de 0,20% pode parecer baixa,
mas o fornecedor paga, o comerciante paga e na ponta da cadeia o
consumidor paga também, o que encarece os produtos”, diz.
Ainda que a alíquota inicialmente proposta pelo governo seja de 0,20%,
quando a CPMF vigorou entre 1997 e 2007, a alíquota inicial era de 0,25%
e foi elevada para 0,38% em 2002.
Segundo o jornal Valor Econômico,
governadores inclusive já se manifestaram dizendo que aceitam negociar
no Congresso a volta da CPMF e sua elevação a 0,38% para que a
arrecadação seja compartilhada com estados e municípios.
O efeito da CPMF sobre os preços pode ser tanto maior quanto mais
complexa for a produção do bem em questão. Itens manufaturados, por
exemplo, que passam por várias etapas de produção até chegar ao
consumidor final, podem sofrer maior aumento de
preço.
Além da provável elevação de preços, ao saber que um novo tributo incide
sobre as movimentações, o brasileiro tende a segurar mais seu dinheiro,
pensando duas vezes antes de realizar compras e transferências, o que
pode reduzir a circulação de dinheiro e contribuir para o esfriamento da
economia.
“O dinheiro é o lubrificante da economia. Se ele fica mais caro é como
se gerasse mais atrito na máquina, assim menos negócios são realizados”,
afirma André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos.
Por causa da menor circulação de moeda, Arthur Vieira de Moraes acha que
o tiro do governo pode sair pela culatra. “O governo acha que ganha com
a CPMF porque vai melhorar a arrecadação no curto prazo, mas a menor
circulação de dinheiro é um freio grande para a economia.”
Outro efeito possível da CPMF é a inibição dos investimentos. Em 2001,
quando o imposto vigorava, operadores de bolsa chegaram a fazer uma
greve para pedir a isenção do tributo para investimentos em
ações.
Na época, para fugir da CPMF, investidores passaram a comprar mais ADRs (American Depositary Receipt,
na sigla em inglês), que são recibos de ações de empresas brasileiras
negociados nas bolsas norte-americanas, aumentando as negociações no
mercado de ações dos Estados Unidos em detrimento do brasileiro.
André Perfeito lembra, no entanto, que ao longo dos anos o
mercado financeiro
passou a contar com algumas medidas que o blindavam contra a CPMF. “Se a
medida for aprovada, pode haver uma proteção maior para o mercado
financeiro. Mas, de qualquer forma, precisamos ver se esse pacote vai
passar mesmo e quais medidas seriam aprovadas. Muita água ainda vai
rolar", diz.
Para estimular os investimentos na época em que a CPMF vigorava, o
governo criou em 2004 a chamada conta investimento, dentro da qual os
investidores podiam movimentar recursos de uma aplicação a outra com
isenção da CPMF. De todo modo, toda vez que o dinheiro era movimentado
da conta investimento para a conta corrente ou vice-versa, a CPMF
incidia.
"A CPMF é muito ruim porque encarece o insumo básico da economia, que é o
dinheiro. Mas tudo depende de como isso pode ser feito, se ela vai
afetar todos os setores e qual será tamanho da alíquota. Eu não me
entusiasmo muito com essas medidas, mas acho que elas são necessárias e
eu confio muito no discernimento do ministro
Joaquim Levy", opina Perfeito.
Imóveis
A outra medida que deve impactar diretamente o bolso dos brasileiros é o
aumento do imposto sobre ganho de capital (lucro) na venda de
imóveis.
Atualmente, quando o imóvel é vendido por um valor superior ao seu custo
de aquisição, o vendedor paga um imposto de 15% sobre esse lucro - caso
a transação não se encaixe nas regras de isenção, como a que isenta o
ganho de capital nas vendas de imóveis por menos de 440 mil reais. A
ideia do governo é tornar essa tributação progressiva.
De acordo com a proposta, para imóveis de até 1 milhão de reais, a
alíquota permanece em 15%, mas para imóveis entre 1 milhão e 5 milhões
de reais, o imposto sobre o lucro passaria a ser de 20%, para imóveis de
5 a 20 milhões de reais, subiria a 25% e chegaria a 30% se o valor
superasse os 20 milhões de reais.
O imposto progressivo pode contribuir para o aumento da informalidade,
na opinião de Arthur Vieira de Moraes, à medida que vendedores podem
informar no registro de venda que o imóvel foi comprado por menos de 1
milhão de reais e solicitar uma parte do valor por fora para fugir do
imposto.
Outro possível efeito do aumento do imposto sobre imóveis, segundo
Moraes, é a diminuição dos preços para que a venda se enquadre na faixa
de imposto de 15%. Ainda que isso seja positivo para o comprador, que
pode conseguir descontos maiores, proprietários podem optar por
postergar as vendas, contribuindo ainda mais para a desaceleração do
mercado imobiliário.