“Quem não vê, por exemplo, que tudo que é produzido ou
aperfeiçoado pela arte e pelo trabalho de um homem deve ser-lhe
assegurado como seu, a fim de encorajar esses úteis hábitos e
realizações? Ou ainda, que a propriedade deve passar por herança para os
filhos e parentes, tendo em vista o mesmo útil propósito?” […]
“Quem
não vê, por exemplo, que tudo que é produzido ou aperfeiçoado pela arte
e pelo trabalho de um homem deve ser-lhe assegurado como seu, a fim de
encorajar esses úteis hábitos e realizações? Ou ainda, que a propriedade
deve passar por herança para os filhos e parentes, tendo em vista o
mesmo útil propósito?” David Hume
Em novembro do ano passado, o Estado do Rio de Janeiro aumentou a alíquota do imposto sobre heranças e sobre doações,
de 5% para 8%, sob efusivos aplausos da esquerda. Este imposto, assim
como o tal imposto sobre grandes fortunas, é um dos fetiches dos
socialistas que encontram amparo em vários países capitalistas liberais,
como Estados Unidos, Reino Unido e Japão.
Nos Estados Unidos, há um movimento dentro do Partido Republicano que, com o aval do presidente Donald Trump, pretende extinguir o imposto de herança (inheritance tax), hoje na faixa dos 40%. Esperemos que prospere.
Como já tive a oportunidade de mencionar neste mesmo espaço,
este é um imposto temerário, não apenas por induzir a transferência de
riquezas para o exterior, mas principalmente porque fragiliza a taxa de
poupança doméstica, que tem nos muito ricos a sua maior fonte.
Como ensinou Adam Smith, a poupança
(que ele chamava de parcimônia) é condição sine qua non para o
investimento e a formação de capital, sem a qual não há aumento da
produção (crescimento econômico). Transferir poupança dos ricos para o
Estado é uma forma simples – e estúpida – de transformar poupança em
consumo (do governo), prejudicando a sociedade como um todo.
Entregar parte da poupança dos muito
ricos para os governos, assim como as decisões de onde investir essa
poupança para os políticos e os burocratas, pode até fazer algum bem ao
ego dos invejosos, mas em termos econômicos, para a sociedade em geral,
isso é altamente contraproducente.
Não por acaso, países que outrora
cobravam altos impostos sobre heranças e doações, alguns dos quais
bastante igualitários, estão voltando atrás. É a realidade se impondo
sobre as ilusões ideológicas. É o caso da Suécia.
O imposto de herança sueco existiu,
com várias alterações ao longo dos anos, desde o século XVII. A
alíquota do imposto sucessório alcançou seu recorde em 1983, com uma
taxa máxima de 70%, aplicável a cônjuges e filhos. A eliminação do
malfadado imposto, imposta pela realidade, começou alguns anos
depois. Em 2004, ano em que foi definitivamente revogado, por votação
unânime do parlamento, a alíquota já era de 30%.
Os principais problemas do imposto
sobre herança na Suécia recaíam sobre as empresas familiares. A base da
tributação, mesmo com as regras de alívio introduzidas em várias
ocasiões, especificamente para aliviar o ônus sobre as pequenas empresas
familiares, consistia muitas vezes em ativos societários (capital). Com
isso, os herdeiros das empresas eram muitas vezes obrigados a vender
ativos do negócio para pagar o imposto. Não era incomum que o imposto
sobre herança drenasse tanto capital das empresas, que seu
desenvolvimento futuro ficasse comprometido. Esses problemas, como é
óbvio, traziam conseqüências profundas para a sociedade em geral e para a
economia sueca em particular.
Por volta dos anos 90, a situação era
tão grave que famílias inteiras simplesmente deixaram o país, levando
consigo suas fortunas e negócios. O fundador da Tetra Pak, Ruben
Rausing, o fundador da IKEA, Ingvar Kamprad, e o industrial Fredrik
Lundberg, todos escolheram emigrar.
Em 2002, o governo social-democrata
nomeou uma comissão parlamentar para revisar e avaliar os impostos sobre
a propriedade. Parecia haver uma crescente compreensão, entre os
social-democratas, dos problemas relacionados a esses impostos. Havia
também uma crescente preocupação sobre como os impostos suecos sobre o
capital funcionavam em um mundo globalizado.
A comissão parlamentar sugeriu então, em junho de 2004, reduções substanciais do imposto sobre heranças e doações. Mas isso não foi suficiente. Em setembro de 2004, os social-democratas, o Partido Verde e o Partido de Esquerda concordaram em revogar completamente o imposto sobre heranças e doações.
A comissão parlamentar sugeriu então, em junho de 2004, reduções substanciais do imposto sobre heranças e doações. Mas isso não foi suficiente. Em setembro de 2004, os social-democratas, o Partido Verde e o Partido de Esquerda concordaram em revogar completamente o imposto sobre heranças e doações.
A abolição desse imposto marcou o
início de um debate mais amplo sobre questões de propriedade na Suécia,
um debate que levou também à abolição do imposto sobre riquezas
(fortunas) em 2007. É importante destacar que tais reformas foram
realizadas por um governo social-democrata e, posteriormente, levadas
adiante por um governo de centro-direita.
A revogação desses impostos
destrutivos deu à Suécia um sistema tributário mais inteligente e trouxe
empresários e capitais de volta ao país. Um sistema tributário mais
inteligente gera maior crescimento econômico e, portanto, maiores
receitas tributárias.
Não por acaso – como previram Arthur Laffer e outros economistas vinculados à chamada “Supply Side Economics”-,
a carga tributária sueca diminuiu, de 51% do PIB, em 2000, para 44% em
2014.
Apesar desta queda de 7% em relação ao PIB, a arrecadação fiscal, ajustada pela inflação, aumentou em SEK 260 bilhões no mesmo período, graças ao impulso do crescimento econômico.
Apesar desta queda de 7% em relação ao PIB, a arrecadação fiscal, ajustada pela inflação, aumentou em SEK 260 bilhões no mesmo período, graças ao impulso do crescimento econômico.
Hoje, Ingvar Kamprad e outros
empresários voltaram para a Suécia e os donos de empresas familiares não
precisam se preocupar mais com o planejamento tributário da sucessão
nas empresas. O apoio político a essas reformas ainda é forte, e apenas o
Partido de Esquerda mudou de opinião, desde 2004.
João Luiz Mauad é administrador de empresas formado pela FGV-RJ,
profissional liberal (consultor de empresas) e diretor do Instituto
Liberal. Escreve para vários periódicos como os jornais O Globo, Zero
Hora e Gazeta do Povo.
https://www.institutoliberal.org.br/blog/economia/o-imposto-sobre-herancas-e-o-exemplo-sueco/