Estadão Conteúdo
Os bancos começaram nesta quinta-feira, 16, a suspender
temporariamente a concessão de crédito consignado para aposentados após o
Conselho Nacional de Previdência Social de 2,14% para 1,70% ao mês o
teto de juros para essas operações de crédito. O teto também desceu de
3,06% para 2,62% para as operações com cartão consignado. Entre os
bancos que anunciaram a decisão estão o Itaú, Mercantil Brasil, Banco
Pan e Daycoval.
A mudança nos juros no momento atual de restrição da oferta de
crédito foi feita à revelia do ministério da Fazenda pelo ministro da
Previdência Social, Carlos Lupi, e acabou gerando um embaraço para o
presidente Luiz Inácio Lula – já que uma eventual reversão da medida tem
custo político para o governo.
O presidente criticou em evento nesta semana o anúncio de medidas por
seus ministros sem o aval da Casa Civil. Um dos alvos do recado de Lula
foi justamente o ministro da Previdência, que no início do governo já
tinha sido desmentido pelo ministro da Casa Civil, Rui Costa, depois de
acenado com reversão de regras aprovadas na reforma da Previdência.
Cerca de 14,5 milhões de aposentados do INSS têm empréstimo consignado,
com valor médio de R$ 1.576,19.
Lupi comemorou nas redes sociais a decisão afirmando que a redução
dos juros é uma bandeira do governo. Mas a decisão não teve aval da área
econômica, que avalia defender uma reversão da medida diante do cenário
de risco de crédito.
Segundo apurou o Estadão, os argumentos que foram levados ao
Palácio do Planalto para a reversão da medida é que a oferta do crédito
será fortemente reduzida porque, com esse teto de juros, a margem de
lucro das instituições financeiras nas operações de crédito consignado
ficou negativa – margem que já estava próxima de zero com o teto de
2,14%.
Nesse cenário, os aposentados podem acabar sendo obrigados a procurar
linhas mais caras. O problema maior é que 42% dos tomadores do crédito
consignado do INSS estão negativados. Ou seja, são pessoas inadimplentes
em birôs de crédito, o que dificulta a tomada de empréstimo. A taxa de
juros para o crédito negativado é de 20% ao mês. O consignado tem a
menor taxa do mercado porque a parcela já é descontada na folha de
pagamento ou, no caso do INSS, do benefício.
Resolução de Banco Central proíbe que os bancos operem com margem
negativa em empréstimos feitos por meio de correspondente bancários,
como é o caso das lotéricas. O Brasil tem hoje cerca de 77 mil
correspondentes bancários que atuam na intermediação do crédito
consignado. A maioria é pequenas e médias empresas.
“Cada banco tem sua estratégia comercial de negócio na concessão de
linhas de crédito e não houve qualquer decisão coletiva”, disse ao Estadão
a Federação Brasileira de Bancos (Febraban). Segundo a entidade, como
essa decisão não é uma iniciativa setorial, cada banco tem sua política
comercial de concessão de crédito, não cabendo reportar à Febraban as
linhas de crédito que concedem ou deixam de conceder.
Em nota, a entidade destacou que o teto de juros do consignado tinha
subido de 1,80% para 2,14% ao mês no momento em que a taxa básica de
juros (Selic) estava em 9,25% ao ano. “E, agora, com a Selic de 13,75%
ao ano, o teto foi reduzido para 1,70% ao mês”, destaca a entidade.
Segundo a Febraban, o setor financeiro já havia se manifestado – e
agora reitera a posição – junto ao Ministério da Previdência, INSS e a
outros interlocutores no Governo, afirmando que, neste momento,
considerando os altos custos de captação, eventual redução do teto
poderia comprometer ainda mais a oferta de empréstimo consignado e do
cartão de crédito consignado.
A Febraban diz ainda que os patamares de juros fixados não suportam a
estrutura de custos da linha e os novos tetos têm elevado risco de
reduzir a oferta do crédito consignado, levando um público, carente de
opções de crédito acessível, a produtos que possuem em sua estrutura
taxas mais caras (produtos sem garantias), pois uma parte considerável
já está negativada. A entidade aponta que essas são as únicas linhas
acessíveis ao público mais vulnerável que está negativado.
As duas linhas de crédito consignado do INSS (empréstimo e cartão)
têm um saldo de R$ 215 bilhões, com R$ 7,6 bilhões de concessão em
janeiro de 2023 e média mensal de concessão, nos últimos 12 meses, de R$
5,2 bilhões.
“Inciativas como essas geram distorções relevantes nos preços de
produtos financeiros, produzindo efeitos contrários ao que se deseja, na
medida em que tende a restringir a oferta de crédito mais barato,
impactando na atividade econômica, especialmente no consumo”, alerta a
entidade.
Em nota, o Banco Pan afirmou que, “em função da redução do teto de
juros aprovada pelo Conselho Nacional da Previdência Social (CNPS),
suspendeu temporariamente novas operações consignadas do INSS de
empréstimo, cartão e cartão benefício”.
O Banco Daycoval disse que irá suspender temporariamente as operações
e que “decidiu concentrar esforços para a operação de empréstimo
consignado para funcionários públicos nos 200 convênios ativos”.
O Banco Mercantil do Brasil, com foco em clientes acima de 50 anos,
também suspendeu as operações e disse que está “avaliando a situação e
ajustando o produto às novas condições”. “O cartão consignado e as
demais modalidades de crédito pessoal continuam vigentes”, disse em
nota.