Sede do Banco Central, em Brasília
Por Luana Maria Benedito
SÃO PAULO (Reuters) – A confirmação de que o secretário-executivo
do Ministério da Fazenda, Gabriel Galípolo, será o indicado do governo
para a diretoria de Política Monetária do Banco Central foi recebida
pelos mercados financeiros como o primeiro passo em direção a um Copom
mais brando no combate à inflação, mas analistas estão divididos quanto
ao tempo e à intensidade dessa esperada transição.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, confirmou a futura nomeação
de Galípolo nesta segunda-feira, destacando que o governo não quer
“formar bancada” na cúpula da autarquia, mas busca maior coordenação e
harmonia entre políticas fiscal e monetária.
Denilson Alencastro, economista-chefe da Geral Asset, a princípio deu
o benefício da dúvida a Haddad e a Galípolo. “Agora é acompanhar se
teremos ou não algum tipo de influência política no BC. Quero acreditar
que não; o BC presidido pelo Roberto Campos Neto tem sido bastante
técnico e a tendência é isso seguir”, disse ele, citando o histórico de
Galípolo no mercado financeiro como um fator positivo.
Outros participantes do mercado argumentaram que, embora Galípolo
seja bastante alinhado ao governo e possa encorpar discursos mais
“dovish” –ou leniente no combate à inflação– dentro do BC, ele não terá o
poder de mudar a política monetária da noite para o dia.
“É necessário ressaltar que o Comitê de Política Monetária do Banco
Central é formado pelo presidente e mais oito diretores, de maneira que a
indicação de apenas um nome não significa que o governo passará a ter
controle da condução dos juros do país daí para frente, tendo, no
máximo, um voto a seu favor”, disse Matheus Pizzani, economista da CM
Capital.
Além de ter confirmado o nome de Galípolo, Haddad disse que Ailton
de Aquino Santos, servidor de carreira do BC, será indicado para a
diretoria de Fiscalização do órgão. O presidente Luiz Inácio Lula da
Silva ainda terá neste ano mais duas vagas para indicar ao BC, já que em
dezembro serão encerrados os mandatos dos diretores de Relacionamento,
Cidadania e Supervisão de Conduta, Maurício Moura, e de Assuntos
Internacionais e de Gestão de Riscos Corporativos, Fernanda Guardado.
Desta forma, para muitos economistas, a nomeação de Galípolo é apenas
uma etapa de uma mudança mais ampla e lenta no viés de política
monetária da diretoria do BC.
“Não acho que o Galípolo vai muito para esse lado ideológico e tem
noção de que não se pode simplesmente baixar a taxa de juros nesse
momento. Mas, embora a maioria do Copom ainda esteja com uma cabeça mais
cautelosa, até o final do ano o governo tem mais nomes que vai
anunciar. E, se governo quer uma maioria no Copom, é porque o governo
quer outra cara para o Copom”, disse Rafael Pacheco, economista da Guide
Investimentos.
Alguns economistas se mostram mais pessimistas, interpretando a
confirmação de Galípolo como uma interferência política direta no Banco
Central, que é independente, e prevendo mudanças mais imediatas na forma
de conduzir a taxa de juros.
“Acho que a indicação dele vai na linha de não ter um Banco Central
tão independente na prática nos próximos anos; isso que a gente está
vendo agora, que é realmente o Banco Central independente, deve sumir”,
disse Gustavo Cruz, estrategista-chefe da RB Investimentos, que faz
parte da ala do mercado que vê Galípolo como o provável próximo
presidente do BC.
“Eu acredito que ele entra muito por conta da sua lealdade às
políticas públicas que o Lula quer… e portanto deve já ir bem alinhado
com a ideia de baixar a taxa de juros o máximo que der o quão antes
possível. Então a minha dúvida é se já no começo do ano que vem os
diretores do Banco Central já começam a votar com Galípolo e não mais
com Roberto Campos Neto”, alertou Cruz.
Na mesma linha, Alberto Ramos, diretor do grupo de pesquisa
macroeconômica para América Latina do Goldman Sachs, disse que “a
percepção de que Galípolo eventualmente substituirá Campos Neto tem o
potencial de gerar alguns atritos e mal estar no Copom”, ao mesmo tempo
que pode gerar “decisões divididas” e “visões diametralmente opostas
sobre qual deveria ser a postura adequada” dentro do colegiado.
Alexandre Schwartsman, economista e ex-diretor de Assuntos
Internacionais do Banco Central do Brasil, comparou a possível intenção
do governo de que Galípolo seja o sucessor de Campos Neto à trajetória
de ascensão do ex-presidente do BC Alexandre Tombini dentro da
autarquia. Tombini ocupou a chefia da instituição durante a gestão da
então presidente Dilma Rousseff, de janeiro de 2011 a meados de 2016.
“Se a história servir de guia, tal indicação revela a intenção do
governo de colocar no BC um presidente subserviente, alguém que, como
Tombini, está preparado para conduzir a política monetária para outros
objetivos que não a meta de inflação”, disse Schwartsman, que foi
diretor durante o primeiro governo Lula .
Já Eduardo Moutinho, analista de mercado da Ebury, ponderou que o
cenário macroeconômico pode nublar uma análise mais profunda sobre se
eventuais cortes da Selic serão resultado de influência política ou de
argumentos técnicos que miram unicamente o objetivo de inflação.
“A gente já está vendo uma desaceleração da economia em diversos
setores e uma inflação um pouco mais controlada, então uma queda na taxa
tem argumentos. Isso torna um pouco mais difícil de avaliar se (as
decisões dos) novos membros (do Copom) são puramente pressão da ala
política ou uma necessidade real”, disse ele.
Ainda assim, para Moutinho, é inegável que a nomeação de Galípolo
“provavelmente será o primeiro passo para uma mudança de postura do
Banco Central pra um viés mais ‘dovish'”.