Ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira
reutersi
Desde
que ficou decidida a saída do presidente da Vale, Eduardo Bartolomeo,
em março deste ano, a companhia ficou “acéfala” e “sem alguém com
autoridade” para tratar de assuntos que são relevantes ao interesse
nacional, afirmou o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, à
Reuters.
Na avaliação do ministro, a situação dificulta a
conclusão de um acordo entre Vale, BHP e Samarco com autoridades
federais e estaduais para a reparação e compensação pelo rompimento de
barragem em Mariana, em Minas Gerais, que ocorreu em 2015. Silveira, que
é mineiro, disse estar preocupado com a “falta de proatividade” das
companhias.
“Me
preocupa inclusive uma postura da Vale, que parece que só vai mudar,
infelizmente, na hora que nós tivermos que aplicar medidas e sanções
mais duras na empresa. E se necessário até avaliar a legislação
brasileira nesse sentido, dela mudar a postura arrogante dela com
relação ao Brasil”, afirmou Silveira em entrevista à Reuters na
quarta-feira, durante visita ao Estado de Sergipe.
A
expectativa de todas as partes, inclusive do governo, é que um acerto
seja concluído ainda neste ano. Havia expectativa de que o acordo
pudesse ser fechado até o final do primeiro semestre, mas uma proposta
de desembolso totalizando 140 bilhões de reais ficou aquém do pretendido
pela autoridades.
“Não
deveria ser assim, mas o fato de a Vale estar acéfala é evidente que
está atrasando um acordo (por Mariana)”, disse o ministro.
Segundo
Silveira, a Vale “deixou de ser mineradora” e “passou a ser quase que
exclusivamente vendedora da infraestrutura”, não explorando ativos
estratégicos no país.
‘Sanções mais duras’
Ele
disse ainda que o governo estuda inclusive “medidas e sanções mais
duras” contra a empresa, avaliando a legislação brasileira, e por meio
de políticas públicas, sem entrar em detalhes.
Silveira comentou também que tem de “estar muito atento” para a postura da maior companhia de mineração do país.
Para
ele, trata-se de uma mineradora “quase que monopolista, que deixou e
deixa de explorar ativos estratégicos no país, que passou a
comercializar esses ativos com investidores internacionais e distribui
esses dividendos sem nenhum critério estratégico convergente com o
interesse do país”.
Uma fonte com conhecimento do assunto afirmou,
na condição de anonimato, que há estudos sobre possível mudança nas
regras sobre direitos minerários. Essa fonte não detalhou o que poderia
ser alterado.
Com frequência, o ministro e o próprio presidente
Luiz Inácio Lula da Silva têm feito duras críticas contra a Vale e sua
gestão, em momento em que a companhia, uma das maiores mineradoras do
mundo e privatizada há cerca de 30 anos, trabalha no processo de
sucessão de seu presidente.
Mudança na presidência
O
mandato do CEO vencia em maio deste ano, mas foi estendido até dezembro,
após o conselho — responsável pela escolha da nova liderança — ter
ficado dividido entre manter o presidente por mais um período ou abrir
um processo para a escolha de uma nova liderança.
“Desde que
anunciaram a saída do atual presidente, a gente sabe bem como isso
acontece, a Vale ficou sem alguém com autoridade para tratar de assuntos
que são extremamente relevantes ao interesse nacional”, disse Silveira.
“Está
passando inclusive do limite da razoabilidade a forma e a condução da
direção da Vale com relação a esses assuntos que precisam ser
resolvidos, e eu vou te afirmar que está muito próximo do limite da
tolerância.”
Procurada, a Vale afirmou que não tem comentários
sobre as declarações do ministro. Disse ainda que segue “engajada” junto
com autoridades para estabelecer um acordo sobre o desastre de Mariana
“que garanta a reparação justa e integral às pessoas atingidas e ao meio
ambiente”.
Bartolomeo manterá seu cargo até o final de dezembro
deste ano. A companhia definiu também que o CEO apoiará a transição para
a nova liderança no início de 2025 e que atuará como advisor da
companhia até 31 de dezembro do próximo ano.
‘Nunca houve uma ingerência do governo’
O
impasse no conselho sobre a sucessão da Vale ocorreu em meio a diversas
notícias de que o governo estaria tentando emplacar o ex-ministro da
Fazenda Guido Mantega como CEO da mineradora. Silveira voltou a afirmar
que “nunca houve uma ingerência do governo com relação à Vale”.
“E
eu afirmei peremptoriamente e desafiei qualquer conselheiro a dizer que
nós intervirmos falando sobre o ministro (Guido Mantega)”, disse
Silveira.
Na semana passada, o colunista Lauro Jardim publicou que
o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, foi
sondado por conselheiros da Vale para entrar na corrida pela
presidência.
Questionado sobre a notícia, Silveira disse entender “que seria um grande erro, porque o secretário-executivo é governo”.
“Eu
sou daqueles que entendem que na vida pública não basta ser honesto,
tem que parecer ser honesto”, afirmou. “Não basta a gente não querer
intervir. A gente tem que parecer que não está intervindo.”
O
conselho da Vale tem competência exclusiva para decidir sobre a escolha
do presidente da companhia. No início do mês, a mineradora anunciou a
segunda renúncia de um membro independente de seu conselho de
administração em três meses.
No primeiro caso, ao deixar a empresa
em março, o então membro independente José Luciano Penido enviou uma
carta ao presidente do colegiado, apontando que o processo de sucessão
estava sendo conduzido de maneira manipulada, com influência política,
segundo o documento visto pela Reuters à época.
Penido defendia a renovação do mandato de Bartolomeo, segundo a Reuters publicou à época.
Silveira,
porém, defendeu que “o que ele (Penido) diz não tem nada a ver com o
governo”. “Todo mundo teve essa impressão. O Penido fez uma denúncia com
relação ao conselho da Vale”, afirmou.
O ministro disse ainda que
quer que a escolha do novo presidente “aconteça rápido” e de forma
técnica para ter “alguém que possa compreender melhor o papel da Vale”.
Nos
últimos anos, a Vale passou a ter um controle pulverizado, com novas
normas para tentar blindar sua governança corporativa de interferências
políticas. Mas tem ainda como importante acionista a Previ, o fundo de
pensão dos funcionários do Banco do Brasil, que é uma instituição de
economia mista controlada pelo Estado brasileiro.