Compra
e comercialização de metanol são restritas e regulamentadas pela ANP.
Produto usado no país é importado. Polícia Federal investiga uso da
substância na adulteração de bebidas.A Polícia Federal abriu nesta
terça-feira (30/09) um inquérito para investigar a distribuição de
bebidas alcoólicas adulteradas com metanol no Brasil. A investigação
busca identificar a origem da substância e uma possível rede de
distribuição. Por ser um produto altamente tóxico e impróprio para
consumo humano, a sua compra e comercialização são restritas e
regulamentadas pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e
Biocombustíveis (ANP).
O metanol, atualmente, não é produzido no
Brasil, ou seja, todo o produto que circula no país é importado, segundo
a ANP, e apenas empresas com autorização do órgão podem fazer essa
aquisição. “Para realizar importação, é preciso obter autorização da ANP
como agente de comércio exterior ou distribuidor de solventes, e cada
carga importada precisa receber anuência da agência, por meio de
licenças de importação”, disse a ANP em nota à DW.
No Brasil, o
metanol é usado principalmente na produção de biodiesel. A resolução
987/2025 estabelece as regras para a venda dele para empresas do ramo.
Segundo o documento, as empresas com autorização da ANP para a
importação desse tipo de produto devem detalhar a quantidade de metanol
comprada e também à sua destinação. Essas informações devem ser
fornecidas mensalmente.
Além disso, os produtores de biodiesel não
podem vender metanol. “Fica vedada a venda de metanol pelos produtores
de biodiesel autorizados pela ANP, sendo, também, de sua
responsabilidade, a destinação indevida do produto”, diz o artigo 21 da
resolução.
Outro
uso comum do metanol é na indústria, para a fabricação de formol, ácido
acético, tintas, solventes e plásticos, além de estar em produtos como
limpa-vidros e removedores de tinta.
Nesse caso, a resolução 937
de 2023 é que determina as regras que devem ser seguidas pelos
distribuidores de solventes compreendendo tanto produtores quanto os
importadores de metanol. Essas empresas também precisam ter cadastro
junto à ANP para fazer a importação e aquisição do metanol e enviar
mensalmente ao órgão os dados de movimentação de produtos.
Rastreabilidade do metanol
“A
ANP monitora o metanol desde sua importação até a distribuição interna.
A agência atua fortemente no combate ao uso irregular do produto,
agindo tanto na ponta da cadeia, com fiscalização intensiva dos postos;
como também na origem do produto, com análise minuciosa das licenças de
importação e da veracidade dos dados do destinatário (capacidade de
armazenamento e de produção, por exemplo)”, acrescentou o órgão.
A
relação das licenças de importação de metanol no país fica disponível
às autoridades e também para qualquer pessoa no Relatório de Licenças de
Importação Deferidas, disponível no portal da ANP.
Além disso, a
agência também tem um Painel de Monitoramento de Metanol na Produção de
Biodiesel, que monitora o uso da substância na produção de biodiesel e
permite que o mercado e a sociedade também façam esse acompanhamento.
“Pouca
gente sabe sobre essa rastreabilidade do metanol. É importante que
empresas que usam esse produto em algum de seus processos e também as
pessoas fiquem atentas e em qualquer suspeita de irregularidade denuncie
na Vigilância Sanitária”, diz Carlos Rayol, advogado especialista em
direito do consumidor.
Por se tratar de um insumo utilizado em
vários tipos de indústrias, a venda do metanol não é proibida no Brasil
desde que tenha origem comprovada. Em plataformas de comércio online,
por exemplo, é possível encontrar o produto para compra em pequenas
quantidades, como galão de um ou cinco litros.
Para fiscalizar
esse ambiente, a ANP tem um acordo de cooperação com plataformas de
marketplace, que prevê a remoção de anúncios desses produtos que estejam
sendo vendidos de forma irregular. A agência tem ainda acesso a
informações que “podem ser utilizadas como vetores de inteligência em
suas ações de fiscalização, aumentando ainda mais sua atuação no combate
às irregularidades do mercado”, acrescentou o órgão.
Possível origem do metanol
Por
ser mais barato do que o etanol, o metanol acaba atraindo a atenção de
fraudadores que atuam no setor de combustível, que usam o produto para
adulterar principalmente gasolina e álcool.
Em agosto, uma
operação do Ministério Público de São Paulo contra o crime organizado
constatou o uso da substância em combustível adulterado. Um dos
principais eixos dessa fraude foi justamente a importação irregular de
metanol.
O produto, que chega ao país pelo porto de Paranaguá
(PR), não estaria sendo entregue aos destinatários indicados nas notas
fiscais. Em vez disso, a substância estaria sendo desviada e
transportada clandestinamente, com documentação fraudulenta, e
direcionada a postos e distribuidoras, nos quais é utilizado para
adulterar combustíveis.
Em entrevista à TV Brasil, Rodolpho
Ramazzini, diretor da Associação Brasileira de Combate à Falsificação
(ABCF), disse que o metanol importado pelo crime organizado para
adulterar combustíveis pode ter sido redirecionado para distribuidoras
clandestinas de bebidas, o que, segundo ele, explicaria os casos de
intoxicação em São Paulo.
Segundo Ramazzini, este redirecionamento
teria ocorrido principalmente após a Operação Carbono Oculto, do
Ministério Público e órgãos parceiros, que desmantelou, no final de
agosto, um esquema de fraudes, lavagem de dinheiro e falsificação no
setor de combustíveis.
Divergências sobre a possível origem do metanol
Em
entrevista coletiva nesta terça, o diretor-geral da Polícia Federal,
Andrei Augusto Passos Rodrigues, afirmou que a ligação do crime
organizado com a adulteração de bebidas alcoólicas com metanol está
sendo investigada pelo órgão federal. Segundo ele, há possível conexão
com investigações sobre a importação de metanol que chega pelo porto de
Paranaguá.
Por outro lado, o governador de São Paulo, Tarcísio de
Freitas, e o secretário da Segurança Pública, Guilherme Derrite,
descartaram a participação do PCC (Primeiro Comando da Capital) nos
casos de adulteração de bebidas alcoólicas.