O
presidente da Argentina, Javier Milei, obteve neste domingo, 26, o aval
dos eleitores para seguir adiante com sua reforma radical da economia,
apesar das amplas críticas às medidas de austeridade por ele adotadas.
O
partido de Milei, La Libertad Avanza (LLA), saiu vitorioso das eleições
legislativas de meio de mandato, que renovaram metade da Câmara dos
Deputados e um terço do Senado, com cerca de 40% dos votos. O resultado
foi bem melhor do que o esperado por Milei e seus apoiadores. A oposição
peronista obteve cerca de 25%.
A boa votação pode ser entendida
como um amplo apoio da população argentina ao governo de Milei, que
completará dois anos no poder em dezembro. A maior conquista dele foi a
redução da inflação por meio de um severo plano de ajuste que, do outro
lado, gerou desemprego, precariedade no mercado de trabalho e
turbulência nos mercados financeiros e elevou a dívida do país.
Os
escândalos e as alegações de corrupção envolvendo o presidente e seus
colaboradores próximos, incluindo sua irmã Karina, tiveram pouco efeito
nas urnas.
A
aproximação de Milei com o governo do presidente dos EUA, Donald Trump,
os empréstimos concedidos ao país pelo Fundo Monetário Internacional
(FMI) e a ajuda financeira do Tesouro dos EUA para apoiar o peso
argentino parecem ter sido aceitos pela população.
Decisivas para reformas
As
eleições eram decisivas para a agenda ultraliberal de Milei e lhe dão
margem de manobra para levar adiante suas políticas de ajuste econômico e
desregulamentação da economia nos dois anos finais do seu mandato.
Durante
a campanha eleitoral, Milei declarara que seu objetivo era conquistar
um terço das cadeiras na Câmara dos Deputados para sustentar suas
reformas. Ele não só conquistou esse objetivo como também chegou muito
perto de alcançar um terço do Senado, considerando a aliança estratégica
com o partido de direita PRO.
Após
a vitória, Milei declarou que vai implementar “as reformas que ainda
faltam” e que o novo Congresso será fundamental para garantir esse rumo.
“Durante os próximos dois anos, temos de fazer avançar o caminho
reformista que iniciamos”, disse. “Teremos, sem dúvida, o Congresso mais
reformista da história da Argentina”, acrescentou.
Vitória também para Trump
Os
resultados também agradaram ao presidente Donald Trump, cujo governo
enfrentou críticas após conceder um vultoso resgate financeiro à
Argentina.
Para conter a desvalorização do peso, Milei queimara
bilhões de dólares em reservas cambiais. Numa ação extraordinária, o
governo Trump ofereceu um resgate no valor de 40 bilhões de dólares,
incluindo um swap cambial de 20 bilhões de dólares já assinado e uma
proposta de linha de crédito de mais 20 bilhões.
Trump
condicionara a ajuda à Argentina a uma vitória de Milei nas urnas. “Se
ele vencer, ficaremos com ele; se não vencer, sairemos”, disse no início
do mês, após receber Milei na Casa Branca.
Neste domingo, o
presidente americano felicitou o argentino pela “vitória esmagadora” nas
eleições legislativas. “Ele está fazendo um excelente trabalho! O povo
argentino justificou a nossa confiança nele”, escreveu Trump na rede
social dele, a Truth Social.
Mais uma chance a Milei
Analistas
disseram que o desempenho melhor do que o esperado pode ser um sinal de
que, diante do risco de uma nova turbulência econômica, os argentinos
acharam melhor optar pelas políticas de austeridade de Milei, que, mesmo
tendo cortado subsídios há muito usados por muitos argentinos, ao menos
conseguiram desacelerar drasticamente a inflação.
Essa foi a
análise do diretor da empresa de pesquisas Zuban Córdoba, Gustavo
Córdoba, que se declarou surpreso com o desempenho de Milei e que
considerou que o resultado das urnas reflete a preocupação com a
potencial repetição das crises econômicas de governos anteriores.
“Muitas pessoas estavam dispostas a dar outra chance ao governo”, disse
ele. “Veremos quanto tempo a sociedade argentina dará ao governo. Mas o
triunfo é inquestionável”, declarou à agência de notícias Reuters.
A
cientista política Maria Laura Tagina, da Universidade Nacional de San
Martin, disse que, apesar de o índice de aprovação de Milei ter sofrido
com as medidas de austeridade e os escândalos de corrupção, é possível
que os argentinos desiludidos tenham decidido ficar em casa. A
participação eleitoral foi de cerca de 68%, a menor em mais de uma
década, segundo relatos da mídia.
O eleitorado parece dividido
entre os beneficiários das reformas de Milei e aqueles que dizem que
nunca enfrentaram tantas dificuldades para sobreviver. Num refeitório
comunitário num subúrbio de Buenos Aires, Epifanía Contreras, de 64
anos, disse sentir que está arcando com o peso das reformas. “Não dá
para viver com uma aposentadoria de 290 mil pesos por mês com a inflação
atual”, disse ela. “A situação está piorando cada vez mais.”
“Voto
por obrigação, nada mais”, disse o corretor imobiliário Matías Paredes,
de 50 anos, cuja clientela estrangeira desapareceu com o câmbio forte
de Milei. “Nenhuma dessas figuras inspira otimismo. Estamos apenas
escolhendo o mal menor.”
O que vem por aí
Os resultados
automaticamente posicionam Milei como candidato à reeleição em 2027. Ele
acenou com uma reforma ministerial após a eleição, que poderá incluir
membros do partido centrista PRO, um aliado frequente do governo no
Congresso e que é liderado pelo ex-presidente Mauricio Macri.
De
acordo com suas próprias declarações e as de membros de seu partido, o
presidente pretende implementar um novo regime tributário e uma mudança
substancial nas leis trabalhistas.
Milei chegou ao poder com a
promessa de reduzir impostos, algo que até agora não conseguiu, e que
vem sendo reivindicado por diversos setores produtivos e empresariais
nacionais, bem como por grupos de investimento estrangeiro. Além disso,
Milei pretende modificar os procedimentos de contratação, flexibilizar
as contribuições previdenciárias e restringir a representação sindical.