quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

O que vai acontecer se São Paulo ficar realmente sem água?


 
São Paulo – A crise da água em São Paulo está se agravando e o cenário não deve melhorar nos próximos meses. Especialistas consultados por EXAME.com afirmam que as soluções de curto prazo existentes já foram tomadas e o que nos resta agora é o rodízio de abastecimento. A Sabespcogita um revezamento severo, de cinco dias sem água por semana. Com isso, a pergunta que todo paulistano se faz é: o que vai acontecer se ficarmos realmente sem água?

Os cenários traçados vão desde o esgotamento dos nossos lençóis freáticos, devido à perfuração excessiva de poços, até a redução do horário de funcionamento de alguns estabelecimentos, além da instituição de férias coletivas nas empresas em decorrência da falta de água. Dentro de casa, estocagem de água e economia de alimentos.

O fato é que a atual crise veio para ficar, e os paulistas precisarão mudar os hábitos radicalmente, segundo Gabriela Yamaguchi, gerente de campanhas do Instituto Akatu, instituição que atua na promoção do consumo consciente.

“Esse cenário não vai ficar só em 2015. Devemos permanecer pelo menos dois anos com pouca chuva. Portanto, a situação dos reservatórios não vai melhorar no curto prazo”, afirma Gabriela.


O engenheiro Julio Cerqueira Cesar Neto, especialista na área hídrica, reforça o diagnóstico: “Quando acabar o volume morto do Cantareira deixaremos de ter cerca de 30 metros cúbicos por segundo. Esse é o tamanho do problema. E não tem de onde tirar esse volume de água num curto prazo”, afirma. Antes da crise, a vazão retirada do Cantareira era de 31 metros cúbicos por segundo.

Hoje, esse número já baixou para 14, de acordo com a Sabesp.

Caso esse cenário se concretize, Gabriela afirma que a prioridade será dada para serviços essenciais, como hospitais, polícia, bombeiros e escolas. “Em outros locais, como shoppings, é possível que haja uma redução do horário de funcionamento. Também já ouvimos entidades empresariais falarem em férias coletivas para os funcionários, devido à falta d’água”, afirma.

No entanto, a representante do Akatu argumenta que esse tipo de situação ainda pode ser evitado. A solução estaria estar na articulação dos diversos atores sociais para garantir a economia de água.

“Para que não se chegue a isso, é preciso ter mais coordenação no diálogo. Não é possível esperar que só uma campanha de diminuição de consumo da população resolva o problema. Precisamos da participação do setor industrial e do agronegócio”, afirma.


Poços


Enquanto essa coordenação não se concretiza, muitos estabelecimentos já estão recorrendo à perfuração de poços e, em casos extremos, à contratação de caminhões-pipa.

Mas os especialistas explicam que a perfuração não pode ser levada ao extremo. “Se perfurar um poço muito próximo de outro, os dois podem ficar sem água”, diz Cesar Neto.

Outro problema é a possibilidade de que, com muitos poços, a cidade esgote outra fonte de recursos hídricos: os lençóis freáticos. “Com a perfuração de poços, o que estamos fazendo é apenas substituir uma fonte de água por outra. O raciocínio precisa ser diferente. Precisamos mudar nossos hábitos em relação ao consumo”, diz Gabriela.

Um dos caminhos para um uso mais consciente da água, segundo a especialista, é o reuso. A água usada no enxague da máquina de lavar, por exemplo, pode ser reutilizada na descarga. Outra atitude necessária é o aproveitamento da água da chuva, inclusive com a construção de cisternas.

Outro ponto fundamental é observar nosso consumo de produtos que utilizam muita água em sua cadeia produtiva. “O exemplo clássico é o desperdício de alimentos. O maior consumidor de água do mundo é o agronegócio. E o maior desperdício que há no planeta é o de alimentos. Isso precisa diminuir”, afirma.

De acordo com a coluna Painel, da Folha de S.Paulo, o prazo dado pela Sabesp para iniciar um rodízio drástico no abastecimento é de menos de dois meses. Sendo assim, é preciso correr para aprender a economizar água e a trabalhar em conjunto pela preservação dos recursos hídricos.

Itaú faz provisão de R$1 bi por ver ano difícil, diz CEO



Alexandre Battibugli /EXAME
Agência do Itaú
Itaú: "Estamos bastante confortáveis com o provisionamento", disse Roberto Setubal
 
Aluisio Alves, da REUTERS


São Paulo - O Itaú Unibanco fez uma provisão adicional superior a 1 bilhão de reais no ano passado, prevendo um cenário difícil para o setor empresarial em 2015, disse nesta quarta-feira o presidente-executivo, Roberto Setubal.

Ele frisou, contudo, que o banco está confiante em seu modelo de medição de risco e que as provisões previstas para 2015 serão suficientes, mesmo com riscos potenciais decorrentes da Operação Lava Jato, que investiga o escândalo de corrupção envolvendo a Petrobras e as algumas da maiores empreiteiras do país, e de um potencial racionamento de energia no país.

"Estamos bastante confortáveis com o provisionamento, mesmo diante da conjuntura mais adversa, acompanhando as questões envolvendo a Lava Jato", disse Setubal. A preocupação maior, disse, não é com as empresas diretamente envolvidas nas investigações, mas com os possíveis efeitos disso na economia.

Em janeiro, o diretor de Controladoria e de Relações com Investidores do maior banco privado do país, Marcelo Kopel, disse à Reuters que o Itaú estava monitorando os reflexos da Lava Jato sobre a cadeia de fornecedores e que poderia fazer um reforço das provisões se necessário. Segundo Setubal, a originação mais recente de crédito pelo banco tem melhor qualidade e não há chance de os atuais níveis de calotes subirem muito, mesmo diante de uma piora da economia.

O grupo anunciou na terça-feira que teve no quarto trimestre a décima queda seguida dos calotes totais, no piso desde a fusão entre Itaú e Unibanco, em novembro de 2008. O índice medido pelo saldo de operações vencidas com mais de 90 dias foi de 3,1 por cento no quarto trimestre, ante 3,2 por cento no trimestre anterior e 3,7 por cento um ano antes.

As despesas com provisões para perdas esperadas com calotes, no entanto, somaram 4,6 bilhões de reais no trimestre, alta anual de 10,1 por cento. O avanço foi influenciado por uma provisão adicional de 670 milhões de reais no período e o banco prevê que o atual cenário econômico pode ter impacto em alguns setores.

Para 2015, o banco prevê que as despesas nessa linha fiquem na faixa de 13 bilhões a 15 bilhões de reais, a mesma indicada para 2014. As provisões no ano passado foram de 13 bilhões de reais.

De acordo com Setubal, o volume adicional de provisionamento feito em 2014 especificamente para o segmento grandes empresas superou um bilhão de reais, um volume de 3 a 4 vezes superior ao padrão histórico.
"Estamos confortáveis com nosso provisionamento", disse.


Sucessão


Setubal disse ainda que o grupo deve anunciar em abril os diretores das áreas de atacado e de varejo, dentro do planejamento sucessório da presidência. O executivo deve se manter no posto até o começo de 2017.

Por enquanto, disse Setubal, alguns assuntos estão sendo delegados por ele a outros executivos.

O presidente do Itaú Unibanco explicou também que o banco segue interessado em ampliar sua presença na América Latina, embora considere elevados os preços atuais dos ativos.

"Se houver uma queda nos preços mundiais de commodities, pode ter algum impacto e aumentar a atratividade", disse.

Troca de comando da Petrobras sinaliza mais mudanças




REUTERS/Ueslei Marcelino
A presidente da Petrobras, Graça Foster
Graça Foster: imagem desgastada com a crise da companhia que ela comandou nos últimos anos
 
 
 
 
São Paulo – A Petrobras confirmou a renúncia de Graça Foster e outros cinco diretores do comando da empresa. 

Na sexta-feira o Conselho de Administração da companhia se reunirá para decidir quem ocupará o cargo daqui para frente. 

Nomes de mercado, como o do ex-presidente do BC, Henrique Meirelles, e o do ex-presidente da Vale, Roger Agnelli, estão na lista dos mais cotados.  

De qualquer forma, a troca já foi bem recebida pelo mercado. Tanto que as ações da empresa já subiram quase 30% só nesta semana. 

A recuperação se dá, principalmente, pela mudança ser encarada como uma nova postura da Petrobras frente aos seus desafios.

“A troca da presidência e parte da diretoria mostra a preocupação da companhia em manter uma governança séria e respeitada pelo mercado”, afirma Bruno Piagentini, analista da Coinvalores.

Um novo comando seria um sinal de que outras modificações estão por vir, acredita o analista.

“O valor patrimonial da empresa é bem maior do que o negociado hoje, por isso o mercado responde de maneira positiva e imediata”, diz ele.


Sem máscara


Para André Perfeito, economista chefe da Gradual, a Petrobras tem hoje três desafios principais: redirecionar investimentos, se descolar estrategicamente do governo e combater a corrupção.

“Nas mãos de Graça, a empresa caminhava para essas direções, a reavaliação dos aportes em ativos e o ajuste de preço da gasolina mostravam isso”, afirma o economista.

As decisões seriam, na opinião de Perfeito, uma maneira do governo mostrar ao mercado que a empresa não seria mais usada como motivadora do crescimento da economia do país.

Entretanto, os anos de empresa e o currículo técnico impecável de Graça não foram suficientes para separar sua identidade da crise de imagem da empresa. Ambas estavam desgastadas. 

Nas mãos de outro presidente, acredita Perfeito, a Petrobras poderá realçar com mais facilidade seus feitos operacionais em meio ao escândalo de corrupção pelo qual está passando.

“Um líder que vira máscara de Carnaval não pode mais ser levado a sério”, diz ele.

A mudança por si só não fará com que a Petrobras saia ilesa de uma avaliação mais estrutural de longo prazo, acredita Adriano Gomes, professor da ESPM e sócio da Méthode Consultoria.

“Passada a euforia com a notícia, o mercado deve analisar a parte estratégica da Petrobras que tem, por exemplo, apresentado custos de exploração e venda quase que similares e precisa rever isso com urgência”, diz ele.

Quanto o novo comando trará de vantagens ou não para a companhia – e economia brasileira, por consequência - de fato só o tempo dirá.

Cade aprova entrada da Sabesp no capital social da PGE



RICARDO CORREA / EXAME
Estação de Tratamento de Água da Sabesp, na cidade de Franca
Estação da Sabesp: a PGE é concessionária das pequenas centrais hidrelétricas de Guaraú e Cascata
 
Luci Ribeiro, do Estadão Conteúdo

Brasília - O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) aprovou, sem restrições, a aquisição de participação de 25% no capital social da Paulista Geradora de Energia (PGE) pela Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), conforme despacho publicado no Diário Oficial da União (DOU).

A PGE é concessionária das pequenas centrais hidrelétricas de Guaraú e Cascata, localizadas em Eta Guaraú e Vertedouro da Cascata, no Estado de São Paulo. 

Depois do fechamento da operação, o capital social da PGE será dividido em 37,5% para a Servtec, 37,5% para a Tecniplan e 25% para a Sabesp.

Por que o Banco do Brasil cai enquanto outros bancos sobem? Petrobras pode ser a resposta


Analistas citam risco de contaminação da Operação Lava Jato

Por Infomoney


22-atualizar-boleto-banco-do-brasilDescoladas do setor financeiro, as ações do Banco do Brasil (BBAS3, R$ 20,20, -2,2%) apareceram entre as maiores quedas do Ibovespa no início desta semana, enquanto os papéis de outros grandes bancos subiam, como Itaú Unibanco (ITUB4, R$ 33,32, +1,3%) e Bradesco (BBDC3, R$ 34,35, +2,5%; BBDC4, R$ 34,08, +1%). Essa é a quarta queda seguida dos papéis do BB. Para o analista Flávio Conde, só pode haver uma explicação para esse movimento: uma possibilidade do Planalto usar o banco para \"salvar\" as empreiteiras, a Petrobras e as fornecedoras envolvidas na Operação Lava Jato, da Polícia Federal.

Em um levantamento feito pelo Brasil Plural, o BB seria o banco mais exposto à Lava Jato – considerando não somente a ligação com a estatal, mas outras companhias que \"tomaram\" crédito no banco e foram diretamente envolvidas na operação. \"Concordamos que há risco sistêmico (da repercussão em outras esferas da economia) e risco crescente de liquidez no curto prazo, ainda que não haja risco relevante de quebra da empresa\", escreveu a casa de research Empiricus. Segundo uma reportagem do Valor Econômico, Banco do Brasil, Itaú Unibanco, Bradesco e Caixa Econômica Federal teriam R$ 31 bilhões em crédito concedido direto à Petrobras em setembro. Deles, os principais seriam a Caixa, que tinha empréstimos de R$ 11,5 bilhões, e o BB, que havia repassado R$ 9,4 bilhões.

Ainda há o risco do potencial crescimento da inadimplência nos empréstimos concedidos aos fornecedores da empresa, lembrando que a estatal já cancelou diversos contratos. Uma das maiores prestadoras de serviço, que é a OAS, já entrou em default seletivo e tinha, no fim de 2013, crédito bancário de R$ 2 bilhões, além de R$ 2,6 bilhões em títulos de dívidas emitidos no mercado doméstico.

Graça Foster e diretores renunciam ao comando da Petrobras



Ueslei Marcelino/Reuters
A presidente da Petrobras, Graça Foster, é vista no Aeroporto Internacional de Brasília após encontro com Dilma Rousseff
Graça Foster: ela deixou Planalto sem se pronunciar se vai deixar presidência da Petrobras
 
 
 
 
São Paulo – A mudança no comando da maior empresa do país acaba de ser confirmada. A presidente da Petrobras, Graça Foster, e outros cinco diretores renunciaram aos cargos.

A informação foi divulgada agora na área de Relações com os Investidores da companhia, em resposta à BM&F sobre o compartamento das ações da empresa na bolsa ontem. 

Os papéis começaram a subir depois da especulação de uma possível troca de presidência na Petrobras - que de fato aconteceu. 

Na nota, a empresa informa que "seu Conselho de Administração se reunirá na próxima sexta-feira, dia 06.02.2015, para eleger nova Diretoria face à renúncia da Presidente e de cinco Diretores".
A executiva deixou ontem o Planalto sem se pronunciar com a imprensa depois de uma longa conversa com a presidente Dilma Rousseff.

Nomes de mercado, como o do ex-presidente do BC, Henrique Meirelles, e o do ex-presidente da Vale, Roger Agnelli, estão entre os cogitados. 

Seria uma saída "à la Levy", como batizou o mercado, em alusão ao ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que era diretor do Bradesco e foi chamado para o governo.

quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

"Em ações de seguro, juízes ignoram códigos para atender a questão social"




Quando Sergio Barroso de Mello começou a advogar para empresas de seguro, verificou que o setor contribuía com míseros 0,5% para o Produto Interno Bruto brasileiro. Ficou surpreso ao perceber o salto para os atuais quase 5% da participação desse ramo no somatório de todas as riquezas do país. E não foi só a maior presença dessa área o que impressionou o especialista em quase 30 anos de atuação. A consolidação do Direito Securitário foi a grande e, na avaliação dele, a mais importante consequência desse crescimento.

Mello conta que o tão esperado marco legal dos seguros veio em 2003, com o novo Código Civil. De uma tacada só, um capítulo com 50 artigos dirimiu as principais dúvidas do setor. “Esse arcabouço jurídico entrou em vigor e provocou na Susep (Superintendência de Seguros Privados), que é o órgão regulador, um sem-número de circulares e orientações que adaptaram o mercado a essa nova norma. Isso se refletiu no Poder Judiciário, que hoje conta com um ambiente juridicamente seguro em relação a vários temas polêmicos”, explica o advogado.

A segurança jurídica contribuiu para a expansão do setor. Seguradoras internacionais investiram no país e produtos voltados para os mais diversos públicos foram lançados, inclusive para a população menos favorecida. De acordo com Mello, hoje o Brasil observa um efeito então não previsto: a concessão de indenizações, pelo Poder Judiciário, meramente por questões sociais.

“Há a interpretação dos contratos pelo Judiciário um pouco mais flexibilizada, feita com base em teorias modernas pelas quais, em casos de dúvida sobre as cláusulas, julga-se a favor do segurado. Particularmente acho correta essa teoria da interpretação do contrato em favor do segurado nos casos em que existam dúvidas. Essa tese foi consagrada pelo Código do Consumidor e temos que respeitá-la. Mas não é só isso: às vezes encontramos no Judiciário (...) decisão muito mais ligada a uma percepção social que à estrutura jurídica consagrada nos códigos”, afirma.

A tendência cada vez maior do Judiciário de julgar de “forma mais humana” os pedidos para o pagamento de sinistros, sobretudo os feitos pelos mais carentes, ainda não chega a ser considerada um problema para as seguradoras. Mas acendeu o alerta do setor, que vem acompanhando com cautela as decisões.
“Política social quem faz não é o Judiciário, mas os Poderes Executivo e Legislativo. O que Judiciário faz é interpretar a lei, o negócio jurídico e o contrato. E isso com base no direito e não em um sentimento social”, destaca o advogado com conhecimento de causa. É que ele acabou de assumir cargo na cúpula da principal entidade mundial do setor de seguros — a Associação Internacional do Direito do Seguro (Aida, sigla em inglês).
Presente em mais de 70 países, a Aida é uma entidade sem fins lucrativos, que desenvolve atividades de estudo e pesquisa em Direito de Seguro e Resseguro. Em outubro último, Mello assumiu a vice-presidência e se tornou o primeiro brasileiro a ocupar um alto posto na associação. À ConJur, ele fala sobre a importância para o Brasil dessa representação e os planos que tem para o seu mandato.

Leia na entrevista:

ConJur — Qual a importância para o Brasil ter um representante em uma entidade como a Aida?
Sergio Barroso de Mello A Aida é uma associação de advogados que atuam fundamentalmente na área de seguros. A entidade tem 52 anos de existência, com sede em Londres, e está presente em 78 países. É uma associação acadêmico-científica, de apoio ao desenvolvimento desse setor. Ao longo de sua existência, muitos estudos foram produzidos: o que gerou novos produtos, assim também como a melhoria nas relações com os consumidores. Um exemplo é a franquia, criada após estudos técnicos e jurídicos da Aida nos anos de 1970. As regras de compliance também são outro exemplo. Nos últimos anos, a entidade tem tido uma preocupação grande de estudar regras e boas práticas para manter a indústria de seguros firme. O objetivo da entidade é ajudar no desenvolvimento saudável do mercado de seguros. Interessa a todos um mercado economicamente forte, mas com acesso fácil ao consumidor. Então, acho muito importante a participação efetiva do Brasil nessa associação porque ela é vista no mundo inteiro como uma grande companheira acadêmica e científica do mercado. Acho que o Brasil, carimbando sua presença lá, deixará bem claro que se preocupa com o desenvolvimento e a qualidade do setor de seguros. Por outro lado, essa presença garantirá ao país acesso a tudo que está acontecendo no setor em escala mundial. É claro que o mundo globalizado de hoje já nos facilita o acesso a informações, mas há práticas acontecendo que nem sempre encontramos na mídia da noite para o dia. Então, estando lá, poderemos ver de perto tudo o que está acontecendo.

ConJur — Como vice-presidente, o senhor pretende apresentar alguma pauta de trabalho?
Sergio Barroso de Mello — O próximo congresso mundial será no Rio de Janeiro, em 2018. E uma das minhas tarefas é fazer a ponte entre a Aida Brasil, que é a organizadora do evento, e a Aida mundial. Os congressos da Aida são preparados com muita antecedência, pois nele são examinados de 15 a 20 temas. Os congressos são muito ricos e profundos.

ConJur — Com relação ao arcabouço jurídico na área de seguros, como o senhor avalia o Brasil?
Sergio Barroso de Mello — O Brasil está muito bem estruturado no campo jurídico. Até 2002, o Código Civil era a nossa fonte principal para os contratos. Em 2003, com a atualização dessa lei, passamos a ter um capítulo específico, o de número 15, com 50 artigos, todos dedicados ao setor de seguros — de pessoas a propriedades em geral. Esse arcabouço jurídico entrou em vigor e provocou na Susep, que é o órgão regulador, um sem-número de circulares e orientações que adaptaram o mercado a essa nova norma. Isso se refletiu no Poder Judiciário, que hoje conta com um ambiente juridicamente seguro em relação a vários temas polêmicos. Temos também uma segurança jurídica enorme para efeito de operação na área de seguro e resseguro.

ConJur — Há algum tema ainda controverso para o setor e que necessitaria de lei específica?
Sergio Barroso de Mello Acredito que não. Vejo a nossa legislação muito bem preparada. Se compararmos o Brasil não só com os nossos vizinhos — como a Argentina, Colômbia e Chile, que contam com boas legislações — mas também com os países europeus, veremos que a nossa legislação não é muito diferente. Na verdade, temos uma lei muito parecida com a dos países mais desenvolvidos. Isso até por conta do papel da Aida de promover a harmonização da legislação no mundo inteiro. A associação produziu vários projetos de lei, com linguagem e sistematização muito parecidas. Isso gerou e está gerando leis parecidas sobre contratos de seguros.

ConJur — Como o senhor avalia a jurisprudência brasileira na área?
Sergio Barroso de Mello — Vejo que existem algumas áreas de seguro, por exemplo como os de saúde, microsseguro, DPVAT e outros de massa, que a sociedade menos favorecida, digamos assim, adquire, mas tem certa dificuldade de interpretação. Há a interpretação dos contratos pelo Judiciário um pouco mais flexibilizada, feita com base em teorias modernas pelas quais, em casos de dúvida sobre as cláusulas, julga-se a favor do segurado. Particularmente acho correta essa teoria da interpretação do contrato em favor do segurado nos casos em que existam dúvidas. Essa tese foi consagrada pelo Código do Consumidor e temos que respeitá-la. Mas não é só isso: às vezes encontramos no Judiciário, talvez até por desconhecimento da técnica do seguro, decisão muito mais ligada a uma percepção social que à estrutura jurídica consagrada nos códigos. Então, não é raro vermos, por exemplo, uma decisão tecnicamente contrária ao Código Civil. Exemplos são as ações de responsabilidade civil, que hoje abarrotam os tribunais. Segundo estatísticas do CNJ, essas demandas são maioria no Judiciário e não raro a questão do seguro está por trás de boa parte delas. Temos visto que as interpretações adotadas, às vezes, ignoram a técnica do contrato: ou seja, o próprio código. De um lado há uma família muito carente, que não tem a menor condição de sobreviver, após o falecimento de um familiar, se não for por meio do pagamento de uma indenização... Essa é questão social que pode tocar um pouco mais o magistrado. Notamos aí essa percepção do Judiciário de julgar com base em uma visão menos jurídica e mais humana.

ConJur — Isso é ruim?
Sergio Barroso de Mello — Esse é o ponto. Quando falamos em negócios, falamos também em segurança jurídica. Nenhum empresário faz negócio se não houver segurança jurídica. E essa segurança é fundamental para todos, inclusive os beneficiários, para que possam saber o que é um direito, uma obrigação e até mesmo um dever. Então, quando há uma decisão fora da lei, há a consagração da insegurança jurídica, o que é ruim para todo mundo. Política social quem faz não é o Judiciário, mas os Poderes Executivos e Legislativo. O que Judiciário faz é interpretar a lei, o negócio jurídico e o contrato. E isso com base no direito e não em um sentimento social. Do contrário, ele poderá beneficiar um consumidor em um primeiro momento e em outro trazer prejuízos com insegurança jurídica que estará provocando ao acabar por afastar os consumidores da oportunidade de contratar novos negócios com preços e condições melhores. Então, esse é um reflexo indiscutível dessas decisões em seguro de massa.

ConJur — Essas interpretações ocorrem em qual escala? De fato tem preocupado as seguradoras?
Sergio Barroso de Mello — Acho que é uma coisa em menor escala. É mais um movimento que estamos observando. Se olharmos para o Judiciário como um todo, veremos que ele trabalha bem, que já teve uma percepção diferente da área de seguros. Isso também porque no Código Civil anterior havia uma regulação menor. O contrato de seguros era visto de uma maneira diferente, não se tratava tão bem dele como agora. Sobretudo a partir de 2003, quando o novo Código Civil entrou em vigor, a segurança jurídica chegou ao Judiciário, que se debruçou sobre a norma e passou a interpretá-la de maneira muito clara e tranquila. Isso fez com que o mercado de seguros pudesse ter segurança jurídica para produzir novos produtos, como os seguros populares. Os seguros massificados só vão funcionar com essa segurança jurídica. Assim como outros.

Para fazermos um paralelo, temos os seguros de responsabilidade civil de empresários. Hoje temos esse problema da Petrobras. Quem está envolvido? Diretores, gerentes e conselheiros. Todos têm seguros de responsabilidade civil, o famoso D&O, que se desenvolveu no Brasil ao longo desses anos pela boa segurança jurídica que extraímos do capítulo de responsabilidade civil do novo Código Civil. Esse é um belíssimo produto. Já se pagou indenizações em milhões de reais nesse país, assim também como já se recolheu milhões de reais de prêmio. É um seguro que atende a todos. Claro que a má-fé não está coberta, mas muitas vezes o administrador de uma empresa pode se envolver numa situação de corrupção sem saber e nesse caso ele estará coberto.

ConJur — Mas como provar se houve ou não má-fé?
Sergio Barroso de Mello — É difícil. A prova é basicamente testemunhal e documental. Muitas vezes há um diretor financeiro que pode estar junto com uma equipe produzindo a ilicitude. Os diretores administrativo e comercial, por exemplo, não estão enxergando isso. Aí vem o escândalo, a denúncia contra a empresa é apresentada e o processo é aberto contra todos os diretores. O que vai fazer o segurador de D&O? Vai guardar a evolução desse processo criminal. Ao final, se perceber que a responsabilidade é de determinado diretor, aqueles que entraram de boa-fé e que não sabiam o que estava acontecendo vai ter garantia do seguro. Esse é só um exemplo.

ConJur — Com relação à tributação, como é que o senhor vê as seguradoras mundiais que querem atuar no Brasil?
Sergio Barroso de Mello — Já tivemos uma discussão muito forte sobre tributação quando o mercado de resseguros abriu. A tributação acabou sendo consolidada. Confesso que não sou um especialista em tributos, mas o que vimos da discussão foi a interpretação equivocada sobre o aumento de alíquotas. Ao fim as alíquotas aplicadas até foram razoáveis e isso não impediu a vinda de resseguradores para o Brasil, tampouco o pagamento de indenizações.

ConJur — Para os advogados, como é o mercado de seguros?
Sergio Barroso de Mello — Faltam advogados com conhecimento de seguros e resseguros no mercado. Temos muito poucos que entendem a fundo a técnica e o direito desse setor. Quando eu comecei a exercer essa atividade, o setor de seguros representava 0,5% do PIB. Hoje chega quase a 5%. Foi um salto grande. E o potencial crescimento desse setor é enorme. Há, então, muitas áreas a explorar. Não existe nenhuma indústria que se sustente sem crédito e seguro. Esses são os dois pilares fundamentais do desenvolvimento de qualquer negócio. Precisamos de profissionais para dar sustentação a essa área.