ANTÔNIO CABRERA - O Estado de S.Paulo
"Se a Petrobrás é eficiente,
ela não precisa ser estatal.
Se não é eficiente, ela
não merece ser estatal."
Durante a vida, num processo democrático, você será
criticado de duas maneiras: pelo que faz ou pelo que deixa de fazer. Se é
para receber crítica, então que esta apareça pela contribuição que
desejo fazer ao meu país. Não há mais nenhuma justificativa plausível
para o Brasil manter uma empresa pública como a Petrobrás. Explico.
Em primeiro lugar, quero reafirmar categoricamente que o petróleo é
nosso. Já a Petrobrás, com essa política do governo de controlar os
preços dos combustíveis de acordo com sua conveniência
político-eleitoral, transformou-se num buraco negro de dinheiro público.
Essa desastrada política de intervencionismo, pois a Petrobrás é a
única empresa no mundo que vai ao mercado para comprar por 100 e vender
por 90, causou nos últimos anos uma perda de mais de R$ 200 bilhões no
preço de suas ações em bolsa. Em qualquer país sério não passaria em
branco uma destruição dessa magnitude da riqueza pública. O resultado,
fugindo da esterilidade da confrontação ideológica, é que o Brasil se
tornou o único país do mundo que prefere importar gasolina e diesel a
importar capitais para produzi-lo.
Reforçando, a verdade inconveniente é que o petróleo é um negócio
extremamente arriscado e caro que não deve envolver dinheiro do povo
(vide Eike Batista), mas, sim, auferir benefícios pela arrecadação de
impostos, o que não ocorre com a contribuinte Petrobrás. Aliás, segundo a
Cambridge Energy Research Associates, o Brasil deixa de ganhar em
impostos cerca de US$ 1,5 bilhão a US$ 3 bilhões por não aplicar à
Petrobrás uma política fiscal para a produção de petróleo e gás natural
similar à dos EUA, da Grã-Bretanha ou da Noruega. Mas, ao tempo que
isenta a Petrobrás, concomitantemente tributa qualquer doação destinada à
educação e é o único país do mundo que tributa a mensalidade escolar.
Não bastasse isso, nossa tão propalada autossuficiência em petróleo
sempre foi volumétrica e nunca monetária: exportamos petróleo bruto
(mais barato) e importamos derivados (mais caros). Para minimizar esses
prejuízos a fatura ficou ainda mais salgada quando, em 2011, um
burocrata de prancheta decidiu manter artificialmente o preço da
gasolina na bomba e, posteriormente, diminuir e eliminar a Contribuição
de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) da gasolina. Pura ironia, os
recursos da Cide deveriam ter sido aplicados em "infraestrutura de
transporte" (não vi ninguém reclamando disso nas passeatas pelo aumento
das passagens de ônibus em São Paulo) e "programas ambientais para
reduzir os efeitos da poluição causada pelo uso de combustíveis".
Traduzindo, como o etanol continua recolhendo a Cide, o Brasil é o
único país do mundo que tributa um combustível limpo e desonera um
combustível fóssil e poluente (e também não vi ninguém pedindo "veta
gasolina"). Mas não para aí, pois, enquanto livra a gasolina da Cide,
neste retorno às aulas os pais estão pagando em média de impostos mais
de 47% nas canetas e mais de 43% nas borrachas de seus filhos. Educação é
prioridade?
Enquanto ninguém faz contas de quanto será esta conta que imoralmente
estamos deixando para as gerações futuras, nos EUA os avanços nas
técnicas de perfuração horizontal e fratura hidráulica vêm permitindo
explorar reservas de gás antes inacessíveis, a custo economicamente
viável e gerando uma nova revolução industrial, oferecendo às indústrias
norte-americanas um custo de energia imbatível. Mas "notícia, se a boa
corre, a ruim avoa", o México vem de privatizar seu setor de petróleo e
energia: continua sendo propriedade do governo mexicano, mas companhias
privadas poderão explorá-lo sozinhas. Com um custo de exploração em
águas profundas menor que o do Brasil e tendo uma logística imbatível,
eis que é vizinho do maior consumidor do planeta, o risco do País não é
ser explorado pelos capitalistas de plantão, mas ser completamente
ignorado. Se na nata do bolo apenas um consórcio apareceu no leilão de
Libra, e agora? A resposta é que o governo vai perfurar poços de
petróleo sozinho, mas não vai perfurar as barreiras educacionais do
último Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa), em que
nossos alunos estacionaram nas derradeiras posições.
Em segundo lugar, nunca antes neste país um setor tão vibrante do
agronegócio foi moído em bagaços como o sucroenergético. Na última safra
mais de 70 usinas fecharam ou estão em recuperação judicial e 60 podem
vir a fazê-lo nos próximos 24 meses, com multinacionais deixando o País e
grupos nacionais atolados em dívidas. O que se exigiu dos
biocombustíveis em dois anos nunca se exigiu do petróleo. Embora seja um
setor que emprega mais de 1 milhão de pessoas (incluindo indiretas) e
ancorado numa movimentação financeira que supera US$ 86 bilhões/ano, do
corte da cana até o abastecimento do automóvel, o etanol passa por uma
longa cadeia produtiva que, de acordo com estudo da Embrapa
Agrobiologia, pode chegar a ser 80% menos poluente do que os
procedimentos que levam a gasolina aos postos de combustível. Mas a mão
pesada do Estado no preço da gasolina resultou em que somente 23% dos
brasileiros com carros flex utilizaram etanol este ano - em 2009 foram
66% -, com todos esses benefícios ambientais jogados na lata do lixo.
Com inúmeras vantagens da natureza a nosso favor, não suplicamos
privilégios do governo, mas não suportamos o subsídio estatal à
gasolina.
Por fim, neste país rico de recursos e pobre de decisões, recorro a
Demóstenes: "Há pessoas que creem embaraçar aquele que sobe à tribuna
perguntando-lhe: então, que fazer? A essas dou a resposta que me parece a
mais equânime e veraz: não fazer o que estais fazendo atualmente". A
educação brasileira agradece.
FOI MINISTRO DA AGRICULTURA
E REFORMA AGRÁRIA E
SECRETÁRIO DA AGRICULTURA DO ESTADO DE SÃO PAULO