Publicado por Luiz Flávio Gomes -
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tudo que já ficou comprovado até aqui, a Lava Jato, o processo de
impeachment de Dilma assim como o processo de cassação do mandato do
deputado Eduardo Cunha são marcos mais que suficientes para se decretar o
encerramento de mais um ciclo na História do Brasil, que deveria ser
chamado de República Velhaca (1985-2015).
A República Velhaca,
que é sucessora de uma ditadura civil-militar (1964-1985), de uma
República populista (1946-1964), de uma ditadura varguista (1930-1945) e
de uma República Velha oligarquizada (1889-1930), possui, dentre tantas
outras, quatro características marcantes:
(a) o incremento da
cleptocracia (governo de ladrões), que ganhou colorido especial com o
ingresso do lulopetismo como sócio do clube mafioso da clássica
corrupção praticadas pelas oligarquias dominantes (bem posicionadas
dentro do Estado)
(b) paradoxalmente, a eclosão de uma Justiça
criminal que começou a exercer com independência frente ao governo
central um controle mais efetivo de alguns dos membros desse clube
mafioso cleptocrata formado por oligarcas governante
(c) o povo em geral, particularmente depois do Plano Real
(1994) e do lulopetismo (2003-2015), melhorou sua qualidade de vida
(aos trancos e barrancos, houve melhora material; cada nova geração
conseguiu, apesar de tudo, melhorares condições de vida que a anterior)
(d) o agravamento das divisões classistas, partidaristas, gremiais, setoriais, corporativas, sindicalistas, eleitorais...
Um
aglomerado de gente, falando a mesma língua dentro de um mesmo
território, comandado por um governo central cada vez mais
centralizador, não significa necessariamente uma nação uniforme. O
Brasil, que nunca se destacou por uma intangível coesão do seu tecido
social (em virtude, particularmente, da visão matricial fundada numa
realidade existencial racista, que tem o poder de veto em relação à
distribuição mais equitativa e universal dos capitais econômicos,
culturais e sociais), foi se tornando cada vez mais irreconhecível
(invertebrado) como nação unificada (em torno de projetos comuns),
sobretudo depois do advento da redemocratização (ou seja: da República
Velhaca), que tem como protagonistas os governos de Sarney, Collor,
Itamar, FHC, Lula e Dilma (os dois últimos estão amalgamados pelo
lulopetismo).
Para além dos aspectos positivos (a) do princípio
de controle da cleptocracia oligárquica e (b) da melhora das condições
materiais de vida da maioria do povo brasileiro (a mortalidade infantil
caiu, o analfabetismo diminuiu, a escolaridade média aumentou, o número
de universitários cresceu, a expectativa de vida aumentou, a renda per
capita melhorou etc.), que está correndo sério risco de degradação, o
que se vê é o império da desintegração, da degeneração, da dispersão e
da decadência (nos campos da política, da governança, das ciências, da
pesquisa, da infraestrutura, da economia, da sociologia, da tecnologia,
da segurança pública, da qualidade do ensino, da mobilidade urbana
etc.).
A crise é mundial, mas nós estamos fazendo tudo que é necessário
para agravá-la ainda mais.
A conturbada escolha dos 65 membros da
Comissão Especial encarregada de analisar o pedido de impeachment de
Dilma constitui um exuberante exemplo da completa degeneração do sistema
político.
A governabilidade (em toda República Velhaca –
1985-2015) desenvolve-se pelo método do “presidencialismo de
coalização”, que nada mais é que uma governança fisiológica (toma lá dá ca),
constituída, em primeiro lugar, por um superbloco de partidos (da base
aliada). Desde 1980 essa base do governo teve como eixo o PMDB, que
muito contribuiu para se impor ao País um sistema político degenerado
que lembra mais um balcão de negócios que uma instituição que assegure a
prosperidade da nação (Marcos Nobre deu a isso o nome de “pemedebismo”,
que vai muito além do próprio do PMDB[1]).
O exagero fisiológico (toma lá dá ca)
não reside apenas na quantidade de partidos que possuímos (35), senão
também na infinitude dos blocos existentes dentro de cada partido, das
bancadas suprapartidárias (da bola, da bala, da bíblia, dos bancos, das
mineradoras, das empreiteiras etc.) assim como nas reivindicações
individuais de cada parlamentar.
O Brasil, neste momento,
encontra-se ingovernável. Cada um pensa em si e poucos ou ninguém está
cuidando do todo. O risco de perda das conquistas materiais dos últimos
30 anos é real. Seja quem for o Presidente da República nos próximos 3
ou 4 anos, tornou-se praticamente impossível gerenciar o País. Dias
melhores virão certamente, mas somente depois da faxina geral que a Lava
Jato vai fazer no Estado e no mercado brasileiros (ambos profundamente
corruptos).
[1]NOBRE, Marcos. Imobilismo em movimento. São Paulo: Companhia das Letras, 2013, p. 13 e ss.