O
Tribunal de Contas da União decidiu incluir o empresário Joesley
Batista, dono da JBS, num processo que apura desvios em financiamento do
BNDES à empresa. Por decisão unânime, a corte convocou o empresário
para dar explicações sobre um empréstimo de R$ 2,3 bilhões feito à sua
empresa pelo banco estatal para a compra do frigorífico norte-americano
Swift Foods, por R$ 8 bilhões, em 2007.
A corte de contas também decidiu ignorar a cláusula do acordo de delação premiada que impede o uso de provas produzidas por Joesley contra ele mesmo. Conforme disse o procurador-geral do Ministério Público junto ao TCU, Paulo Soares Bulgarin, as delações dos executivos da JBS foram as primeiras a prever esse tipo de blindagem.
Com as decisões, caso o TCU decida que houve prejuízo aos cofres públicos na operação, Joesley será um dos responsáveis por ressarcir os danos ao erário. Também ficou definido que as provas de desvio de dinheiro público apresentadas pela JBS em seus acordos de colaboração (delação premiada e leniência) podem ser usadas para instruir processos administrativos contra os executivos da empresa.
O TCU seguiu o voto do relator do processo, ministro Augusto Sherman Cavalcanti, que dedicou a maior parte de sua argumentação à cláusula de limites ao uso de provas. A barreira está no parágrafo 3º da cláusula 19 do acordo. Para o ministro, o dispositivo impede que a delação premiada cumpra seus objetivos, segundo a Lei 12.850/2013: obter provas e a “recuperação do produto ou proveito das infrações penais praticadas”.
“Em termos de lógica interna, não me parece juridicamente correto interpretar uma lei de forma que seja possível buscar a concretização de um de seus objetivos e, ao mesmo tempo, impedir a consecução de outros”, afirmou. “Entendo inexistir fundamento, legal e lógico, para que, em contrapartida ao atingimento de um objetivo previsto em lei, o acordo de colaboração premiada estabeleça cláusula que impeça que as provas produzidas sejam utilizadas no atingimento de outros objetivos previstos na mesma lei.”
Campeã nacional
O processo em discussão no TCU avalia conclusões do setor de auditoria da corte sobre o empréstimo do BNDES à JBS. A companhia brasileira comprou o controle da Swift Foods em 2007, por R$ 8 bilhões, em valores atuais, corrigidos pela área técnica do TCU. Desse total, US$ 750 milhões, ou R$ 2,3 bilhões, vieram do BNDES por meio da BNDESPar, braço do banco para compra de participação societária em empresas.
Com o negócio, a JBS passou a ser a terceira maior empresa de carnes dos Estados Unidos. E com a operação, o BNDES passou a ser sócio do grupo brasileiro. A negociação fez parte da estratégia de “campeões nacionais”, começada no governo Lula, por meio da qual eram escolhidas grandes empresas brasileiras para incentivar o crescimento e expansão internacional.
Mas, de acordo com a auditoria do TCU, houve irregularidades na operação. O laudo afirma que a direção do BNDES favoreceu a JBS com a compra da participação: houve ágio de R$ 0,50 por ação, o que resultou num “prejuízo” de R$ 69,7 bilhões ao banco estatal.
Os auditores afirmam que “não havia quaisquer razões mercadológicas” para o pagamento do prêmio — ou “valor maior que o preço justo”, no entendimento dos auditores.
Em sua defesa, a JBS afirma que o negócio funcionou dentro do permitido por lei e dentro dos limites estabelecidos pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), agência reguladora do mercado de capitais. Os valores pagos foram os de mercado, devidamente aprovados pela CVM, disse a companhia, ao TCU.
Atualização às 19h14 do dia 5 de junho: em nota, o Grupo J&F, dono da JBS, afirma que a decisão do TCU "viola as cláusulas protetivas do acordo de colaboração celebrado com a Procuradoria Geral da República". "Utilizar contra os colaboradores as provas que foram entregues pelos mesmos é um lamentável ataque ao mecanismo de colaboração." As empresas informam que vão recorrer da decisão.
TC 010.398/2017-1
Leia a nota do Grupo J&F:
A decisão do TCU viola as cláusulas protetivas do acordo de colaboração celebrado com a Procuradoria Geral da República. Utilizar contra os colaboradores as provas que foram entregues pelos mesmos é um lamentável ataque ao mecanismo de colaboração. As partes envolvidas irão recorrer da decisão.
A corte de contas também decidiu ignorar a cláusula do acordo de delação premiada que impede o uso de provas produzidas por Joesley contra ele mesmo. Conforme disse o procurador-geral do Ministério Público junto ao TCU, Paulo Soares Bulgarin, as delações dos executivos da JBS foram as primeiras a prever esse tipo de blindagem.
Com as decisões, caso o TCU decida que houve prejuízo aos cofres públicos na operação, Joesley será um dos responsáveis por ressarcir os danos ao erário. Também ficou definido que as provas de desvio de dinheiro público apresentadas pela JBS em seus acordos de colaboração (delação premiada e leniência) podem ser usadas para instruir processos administrativos contra os executivos da empresa.
O TCU seguiu o voto do relator do processo, ministro Augusto Sherman Cavalcanti, que dedicou a maior parte de sua argumentação à cláusula de limites ao uso de provas. A barreira está no parágrafo 3º da cláusula 19 do acordo. Para o ministro, o dispositivo impede que a delação premiada cumpra seus objetivos, segundo a Lei 12.850/2013: obter provas e a “recuperação do produto ou proveito das infrações penais praticadas”.
“Em termos de lógica interna, não me parece juridicamente correto interpretar uma lei de forma que seja possível buscar a concretização de um de seus objetivos e, ao mesmo tempo, impedir a consecução de outros”, afirmou. “Entendo inexistir fundamento, legal e lógico, para que, em contrapartida ao atingimento de um objetivo previsto em lei, o acordo de colaboração premiada estabeleça cláusula que impeça que as provas produzidas sejam utilizadas no atingimento de outros objetivos previstos na mesma lei.”
Campeã nacional
O processo em discussão no TCU avalia conclusões do setor de auditoria da corte sobre o empréstimo do BNDES à JBS. A companhia brasileira comprou o controle da Swift Foods em 2007, por R$ 8 bilhões, em valores atuais, corrigidos pela área técnica do TCU. Desse total, US$ 750 milhões, ou R$ 2,3 bilhões, vieram do BNDES por meio da BNDESPar, braço do banco para compra de participação societária em empresas.
Com o negócio, a JBS passou a ser a terceira maior empresa de carnes dos Estados Unidos. E com a operação, o BNDES passou a ser sócio do grupo brasileiro. A negociação fez parte da estratégia de “campeões nacionais”, começada no governo Lula, por meio da qual eram escolhidas grandes empresas brasileiras para incentivar o crescimento e expansão internacional.
Mas, de acordo com a auditoria do TCU, houve irregularidades na operação. O laudo afirma que a direção do BNDES favoreceu a JBS com a compra da participação: houve ágio de R$ 0,50 por ação, o que resultou num “prejuízo” de R$ 69,7 bilhões ao banco estatal.
Os auditores afirmam que “não havia quaisquer razões mercadológicas” para o pagamento do prêmio — ou “valor maior que o preço justo”, no entendimento dos auditores.
Em sua defesa, a JBS afirma que o negócio funcionou dentro do permitido por lei e dentro dos limites estabelecidos pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), agência reguladora do mercado de capitais. Os valores pagos foram os de mercado, devidamente aprovados pela CVM, disse a companhia, ao TCU.
Atualização às 19h14 do dia 5 de junho: em nota, o Grupo J&F, dono da JBS, afirma que a decisão do TCU "viola as cláusulas protetivas do acordo de colaboração celebrado com a Procuradoria Geral da República". "Utilizar contra os colaboradores as provas que foram entregues pelos mesmos é um lamentável ataque ao mecanismo de colaboração." As empresas informam que vão recorrer da decisão.
TC 010.398/2017-1
Leia a nota do Grupo J&F:
A decisão do TCU viola as cláusulas protetivas do acordo de colaboração celebrado com a Procuradoria Geral da República. Utilizar contra os colaboradores as provas que foram entregues pelos mesmos é um lamentável ataque ao mecanismo de colaboração. As partes envolvidas irão recorrer da decisão.
Pedro Canário é editor da revista Consultor Jurídico.
http://www.conjur.com.br/2017-jul-05/tcu-afasta-clausula-delacao-jbs-cita-joesley-bndes