Algumas pessoas me acham polêmico, ou
que adoro um debate. Estão certas quanto ao debate, mas não me julgo
polêmico. Ao menos não é a polêmica em si que busco, e sim a verdade, o
conhecimento, os fatos. E, para tanto, é fundamental amar o debate. Eu
adoro debater. E claro: a premissa para a existência de um bom debate é o
pensamento contraditório. Debate com um espelho não é debate, é
monólogo.
Mas confesso uma angústia: é mais
difícil encontrar um esquerdista honesto que quer realmente debater do
que um unicórnio ou um duende. Dependendo da quantidade de álcool – ou
de erva proibida, dependendo da preferência – é até possível cruzar com
um duende por aí. Mas um esquerdista honesto? Isso tem sido
completamente impossível.
Leio todos eles. Alguns me chamam até de
masoquista, e talvez eu seja, racionalizando o vício com a desculpa
velha dos “ossos do ofício”. Mas eu leio, isso que importa. Leio as
colunas na Folha, as entrevistas, encaro Celso de Barros, André Singer,
Laura Carvalho, Vladimir Safatle, Gregorio Duvivier, a turma toda! E não
consigo pescar um só argumento verdadeiro, uma só evidência de que o
objetivo, ali, é de fato chegar à verdade.
Vou citar dois exemplos aqui. No
primeiro deles, a troca de artigos entre Alexandre Schwartsman e Nelson
Barbosa. O ex-diretor do Banco Central provou por A + B que o
ex-ministro de Dilma foi não só um dos responsáveis pela Nova Matriz
Econômica que afundou nossa economia, como se faz de sonso e condena a
lentidão da recuperação, como se nada tivesse a ver com a crise.
Schwartsman conclui em sua tréplica definitiva:
Mais recentemente reclama da
velocidade de recuperação da economia, a mesma recuperação que jurava
ser impossível por força do “austericídio”, e recomenda… aumento de
gastos, seu elixir de óleo de cobra para qualquer ocasião.
Tais ideias têm que ser combatidas
e, se Barbosa resolveu ser seu arauto, seria bom também se acostumar com
as críticas, em particular sobre sua competência para educar qualquer
um, que está severamente comprometida por sua visível incapacidade de
aprender com seus próprios erros.
O sujeito ferrou o Brasil e ainda quer
dar lição aos que apontavam o desastre iminente e eram ridicularizados
pelos defensores do governo petista! É muita cara de pau, muita
desonestidade intelectual mesmo.
O segundo caso é de um vanguardista do atraso, que esteve completamente errado em todas as
análises e ações, há décadas! O histórico de erros de Bresser-Pereira é
simplesmente imbatível: aponte uma medida estúpida que levou ao caos e
lá estava sua aprovação empolgada; aponte alguma reforma positiva e lá
estava ele a condenando. Não tem para ninguém!
Não obstante, ele ainda tem a cara de pau de escrever um texto oferecendo
a “solução” para nossa crise: mais do mesmo, um novo
“desenvolvimentismo”! É como se alguém invadisse sua casa, destruísse
tudo, deixasse um rastro de caos e desordem, e depois batesse à porta
para lhe oferecer um ótimo seguro contra invasores e um excelente plano
de arrumação para sua casa. É o cúmulo do absurdo! Rodrigo Saraiva
Marinho, do Livres, desabafou sobre o texto do desenvolvimentista:
Mas essa gente continua com espaço na
mídia mainstream, sendo entrevistada pelos jornalistas, tratada como
“especialistas” que deveriam ser levados a sério pela opinião pública. É
uma patota que se retroalimenta, que se protege, que possui uma cota
ideológica: a esquerda radical terá sempre um espaço amplo garantido na
imprensa que ela mesma chama de golpista e burguesa. O círculo se fecha.
Já aqueles que desde sempre apontaram os desastres que seriam e foram causados pela esquerda, que cantaram a crise atual já em 2010,
que explicaram em pormenores o que daria errado na Nova Matriz
Econômica, esses são quase sempre ignorados, e chamados de radicais e
polemistas.
Aí você vai lá e diz que isso tudo é uma
grande palhaçada, que esses dementes estão blindados de qualquer
escrutínio jornalístico por afinidade ideológica, que as “fake news”
pululam nos principais veículos de comunicação, e está tudo “provado”:
você só pode ser um radical em busca de polêmica! É de lascar…
Volto, para fechar, à pergunta do
título, e dou a resposta: ora, porque a esquerda quer apenas poder, e
danem-se os fatos! Em sua coluna
de hoje, Pondé pergunta o que aconteceria se o PT voltasse ao poder, e
descreve algo perto de um Apocalipse. Não é forçar a barra: é a pura
realidade. A Venezuela seria nosso destino. Mas a esquerda não liga. Ao
contrário: ela vive da miséria alheia, como explica Pondé, pegando carona em nosso saudoso dramaturgo reacionário:
Nelson Rodrigues dizia que, no dia
em que acabasse a pobreza do Nordeste, dom Helder, o arcebispo vermelho,
perderia sua razão de existir. Por isso, ele e a miséria do Nordeste
andavam de mãos dadas.
O truque do PT e associados é o
mesmo: destruir a economia, acuar o mercado, alimentar uma parceria com
os bilionários oligopolistas a fim de manter o país miserável e, assim,
garantir seu curral eleitoral.
Como o velho coronelismo nordestino
–conheço bem a região: sou nascido no Recife e vivi muitos anos na
Bahia–, o PT e associados têm na miséria e na dependência da população
seu capital.
A esquerda finge não ter nada com a
crise que causou porque ela se alimenta da crise e da mentira, eis a
resposta. Quem acha que um típico esquerdista está mesmo disposto a
travar um debate honesto precisa, portanto, rever sua otimista premissa.
E é por isso que, com essa gente, não se pode dar moleza, fazer
concessões demais, assumir que se está diante de um interlocutor sério
preocupado com a verdade. São cínicos, e não devemos temer os rótulos
que cínicos colocam na gente, normalmente diante de um espelho.
Rodrigo Constantino
Economista pela PUC com MBA de Finanças pelo IBMEC, trabalhou por vários
anos no mercado financeiro. É autor de vários livros, entre eles o
best-seller “Esquerda Caviar” e a coletânea “Contra a maré vermelha”.
Contribuiu para veículos como Veja.com, jornal O Globo e Gazeta do Povo. Preside o Conselho Deliberativo do Instituto Liberal.
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