"É contraditório aplicar verbas, que são escassas e provêm de uma fonte subfinanciada, em situações que poderiam ser abraçadas pelo mercado"
O Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social
(BNDES) será um dos patrocinadores da festa de réveillon na orla de
Copacabana, no Rio de Janeiro. Ao todo, o banco público destinará R$ 2
milhões de reais aos organizadores do evento, através da Lei Rouanet. A
festa, que de acordo com reportagem do jornal “O Globo”
custará R$ 25 milhões, será paga em parte pela prefeitura do Rio (R$ 8
milhões), e parte por patrocínios captados pela empresa SRCOM (R$ 17
milhões). Além do BNDES, a Petrobras é uma das empresas parceiras do
evento.
Mas a pergunta que fica é: o BNDES deveria utilizar recursos públicos para patrocinar o réveillon?
Para o professor de economia e especialista do Instituto Millenium, Vitor Wilher, a decisão é inadequada diante da jurisdição atribuída ao órgão. Ouça!
Wilher esclarece que o papel de um banco de desenvolvimento é atuar
fazendo o que o mercado não faz, preenchendo possíveis lacunas do setor
privado. Um exemplo seria o de investimentos em projetos onde o retorno
social é maior do que o custo a ser investido com dinheiro público, como
infraestrutura e saneamento básico, por exemplo. Desta forma, é
contraditório aplicar verbas, que são escassas e provêm de uma fonte
subfinanciada, em situações que poderiam ser abraçadas pelo próprio
mercado:
“A Lei Rouanet é um instrumento para captação de recurso através de
descontos no imposto, algo que não faz muito sentido para o BNDES
enquanto banco público. Ela pode ser utilizada para coisas
interessantes, como alavancar a cultura, mas nem sempre os eventos e
projetos têm o retorno social que gostaríamos que tivessem. Será que não
é possível fazer isso com outro tipo de mecanismo?”, questiona Wilher,
salientando que é contraditório aplicar os recursos públicos desta
forma, diante da grave crise fiscal que estamos vivendo no estado do Rio
e no Brasil.
O professor de economia lembra que, desde 2008, o BNDES vem crescendo
exponencialmente. O governo federal aumentou a dívida bruta e esse
dinheiro, que é caro e financiado por altas taxas de juros, foi
repassado ao banco para ser subsidiado a taxas muito menores. Wilher
afirma que a aprovação da TLP – Taxa de Longo Prazo vai melhorar o
cenário, já que a diferença entre o quanto o banco financia e empresta
será convergida, de modo que este subsídio tende a acabar.
“O Estado se endivida, pega esse dinheiro e dá para o BNDES para que
ele eleja algumas empresas e setores que acha que são estratégicos para o
desenvolvimento econômico. Esse instrumento não deu certo, tanto é que a
taxa de investimento não aumentou no período e nem teve nenhum efeito
no crescimento da economia, já que estamos vivendo uma das maiores
recessões da história. Esperamos que, com essa mudança, tenhamos uma
trajetória um pouco mais saudável no papel dessa instituição no
desenvolvimento econômico”, completa.
Vítor Wilher
Vítor Wilher é bacharel e
mestre em economia pela Universidade Federal Fluminense, tendo se
especializado na construção de modelos macroeconométricos e análise da
conjuntura macroeconômica doméstica e internacional. Sua dissertação de
mestrado foi na área de política monetária, titulada “Clareza da
comunicação do Banco Central e expectativas de inflação: evidências para
o Brasil”, defendida perante banca composta pelos professores Gustavo
H. B. Franco (PUC-RJ), Gabriel Montes Caldas (UFF), Carlos Enrique
Guanziroli (UFF) e Luciano Vereda Oliveira (UFF). É o criador do blog
Análise Macro, um dos melhores e mais ativos blogs econômicos
brasileiros e sócio da MacroLab Consultoria, empresa especializada em
data analysis, construção de cenários e previsões e fundador do extinto
Grupo de Estudos sobre Conjuntura Econômica (GECE-UFF).
https://www.institutomillenium.org.br/destaque/e-papel-do-bndes-patrocinar-o-reveillon-da-orla-de-copacabana/
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