quinta-feira, 3 de agosto de 2023

Sucesso na marra

 

O que explica o fenômeno "Barbie" 
 
 
A onda cor-de-rosa, quem diria, começou a ser explicada há mais de uma década

 

Não se deve colocar todos os ovos na mesma cesta, reza o ditado popular endossado por empresários e investidores. Mas essa lógica não funciona para a indústria do entretenimento – e para a do cinema, em especial. "Barbie", que tem levado multidões às salas, é um exemplo. Segundo a imprensa, o filme consumiu em investimentos de marketing quase o mesmo montante despendido em sua produção. Uma decisão que, embora arriscada, faz parte do DNA de Hollywood – e quem explica o porquê é uma professora e pesquisadora de Harvard. Ao investigar a "cauda longa", em fins da primeira década dos anos 2000, Anita Elberse percebeu que a expectativa de maior fragmentação das vendas dos produtos culturais não se confirmara. Relembremos: segundo a tese de Chris Andersen, no universo virtual os custos de armazenagem e distribuição cairiam significativamente. Com isso, varejistas não precisariam mais concentrar-se apenas em best-sellers. Seria possível lucrar vendendo poucas cópias de uma infinidade de mercadorias culturais de nicho. O mundo do entretenimento se tornaria mais diversificado graças à viabilidade econômica desses títulos menos votados, responsáveis pela "cauda longa" do gráfico de vendas (que você pode ver aqui).

De posse dos números da indústria, Elberse deu-se conta de que, sim, aumentara a oferta de produtos culturais, mas as vendas continuaram concentradas em alguns poucos títulos. Ou seja, aumentou a facilidade de produção, distribuição e armazenagem, mas a lógica comercial se manteve: uma pequena parte dos lançamentos garantia a lucratividade de produtores e varejistas. Os prováveis motivos? Bem, em primeiro lugar, quase todo consumidor de nicho também adquire hits, mas o contrário não é verdadeiro: o consumidor de hits não é um consumidor de nicho. O consumidor de nicho é, também, heavy user da categoria como um todo – consome mais produtos culturais que os demais, o que inclui desde os mais populares até os mais obscuros. Não é, portanto, um admirador específico de produções hipersegmentadas (salvo quando adepto de um gênero, seja musical, cinematográfico ou literário). E como os produtos de nicho são pior avaliados que hits, interpõe-se uma barreira adicional à sua difusão, visto que o boca-a-boca é um recurso espontâneo de divulgação de mercadorias culturais.

As implicações para a indústria cultural, então, não poderiam ser diferentes: seguir fazendo elevados investimentos em poucas produções. Devido aos custos de reprodução insignificantes, produtos que viram hits tornam-se extremamente lucrativos. Minimiza-se o risco buscando atalhos: apostar em continuações e adaptações de filmes, livros, estilos musicais e programas de TV, por exemplo, ou simplesmente copiar o concorrente. E mantendo táticas intensivas de distribuição e promoção, para que o sucesso aconteça quase na marra. Parece familiar com o que andamos vendo, lendo e ouvindo sobre "Barbie", recentemente? Pois está aí a razão. A onda cor-de-rosa, quem diria, começou a ser explicada (ou "prevista") há mais de uma década, como se pode ler aqui (em inglês).

 

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