Por Junior Milério
Especial para o Estado
A verdade é um ferrão: as abelhas estão ameaçadas. Um fenômeno ainda
sem explicação está levando ao desaparecimento de colmeias inteiras. E
junto com o mel, o sumiço das abelhas põe em risco não só os produtos
diretos gerados por elas (geleia real, cera), mas lavouras e pomares que
podem minguar na ausência das polinizadoras universais. O risco é
geral, afeta diferentes países e independe da espécie de abelha.
No Brasil, a ameaça é ainda mais preocupante, pois o ambiente é
especialmente favorável à produção de méis. Há por aqui tanto os méis de
Apis mellifera, aquela amarela e preta, com ferrão, trazida pelos
jesuítas no final do século 19 para o Rio de Janeiro, como um patrimônio
único e incalculável do ponto de vista gastronômico, de méis produzidos
por centenas de espécies nativas, de nomes populares que vão de jataí a
mamangava. Esses méis podem desaparecer antes mesmo de serem
devidamente conhecidos. Antes de serem reconhecidos e liberados para a
venda.
FOTO: Celio Messias/Estadão
Para entender a gravidade do caso, tome como exemplo a abelha canudo,
típica da América tropical. Segundo o Slow Food Brasil, essa espécie é
responsável pela polinização de 80% da flora na Amazônia. Manejadas por
índios sateré-maués, as abelhas canudo produzem um “mel fluido, saboroso
e aromático, com grande potencial gastronômico”, como explica o
professor de história da gastronomia do Senac, Sandro Dias. Se elas
sumirem, vão junto o mel, o saber fazer indígena e o guaraná amazônico,
que é polinizado por elas.
Os desdobramentos do eventual sumiço das abelhas são tema do
documentário Mais que Mel, que estreia amanhã no Brasil. Dirigido pelo
cineasta suíço Markus Imhoof, o documentário percorre o mundo em busca
de colmeias para tentar explicar a situação das abelhas e sua
importância na dieta humana. As viagens ao longo de cinco anos retratam
um cenário preocupante e ainda sem solução.
Ninguém sabe a causa exata do sumiço. Estresse, desmatamento, uma
doença desconhecida, manejo apícola inadequado e uso de pesticidas são
suspeitos… Mas certeza não há.
FOTO: Felipe Rau/Estadão
O fenômeno corresponde a uma rápida perda da população de uma
colmeia, que inexplicavelmente não volta à colônia. Na União Europeia,
agrotóxicos associados ao sumiço desses insetos foram temporariamente
banidos. No Brasil, algumas medidas preventivas estão em análise. Os
técnicos do Ibama estão estudando a situação desde 2010 (já registraram
dois casos) e alertam para o risco de que a síndrome afete colmeias por
aqui.
O custo da substituição das abelhas na função de polinizadoras seria
inviável para a agricultura, não há dúvidas. A abelha tem a anatomia
ideal para penetrar nas flores e carregar grande quantidade de pólen em
uma única e longa viagem.