Decathlon: como foco na prática de esportes, e
não em moda fitness, varejista cresceu 15% em 2016 (Caio
Cruz/Decathlon/Divulgação)
São Paulo – “Queremos ser referência para quem pratica
esporte
e não uma loja de moda ou estilo fitness”, define o presidente da
Decathlon no Brasil, Cedric Burel. Ele promete inaugurar ao menos três
pontos de venda no país neste ano.
Desde que o francês voltou a comandar a operação local da
varejista, há dois anos e meio, os produtos mais técnicos, voltados a “atividades físicas exigentes”, passaram a ser o foco.
De lá para cá, a empresa abandonou a venda de bermudas
casuais (só as de surfe permaneceram nas araras) e camisetas de algodão,
por exemplo.
Ano que vem, será a vez de dar adeus às cadeiras e
sombrinhas de praia. Por outro lado, a oferta de pranchas de surf e de
stand up paddle vai aumentar.
Para Burel, ter um público-alvo bem demarcado ajudou a
companhia a crescer 15% em vendas em 2016 frente ao anterior, o dobro do
desempenho do
setor, no geral.
Na contramão da crise, o varejo de artigos esportivos avançou 7,2% no mesmo período, segundo dados da Euromonitor.
A Decathlon não revela números absolutos, mas a SBVC
(Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo) estima que o faturamento
bruto da rede tenha ficado em torno de 500 milhões de reais em 2015,
sendo 10% vindo da loja online.
Outra estratégia reforçada sob a batuta de Burel foi a de fabricar mais produtos no Brasil.
A empresa vende mais de 7.000 mercadorias diferentes para 55
modalidades de esportes, 80% delas de marcas próprias. Dessas, cerca de
20% já são feitas no país.
São itens que vão de biquínis até bicicletas e proteínas,
moldados ao gosto do brasileiro. O grupo Oxylane, dono da Decathlon,
desenvolve o conceito e terceiriza a fabricação.
Alguns itens, entretanto, ainda não são encontrados na indústria local, como as raquetes de tênis, 100% importadas.
“Estamos procurando mais parceiros para agilizar a produção
nacional. Ela permite o abastecimento mais rápido (dos estoques) e
ficamos menos expostos ao câmbio”, comentou Burel.
A valorização do dólar, inclusive, foi um obstáculo para a
companhia francesa no Brasil em 2016, já que os produtos vindos de fora
ficaram mais caros em real.
A linha de biquínis brasileira até chegou a ser exportada
para Portugal e fez sucesso, conta o executivo, mas a prioridade ainda é
o mercado interno.
Menina dos olhos
Os artigos próprios (sejam fabricados aqui ou no exterior)
são a menina dos olhos da Decathlon. Entre as marcas mais conhecidas do
grupo estão a Quechua (para a prática de esporte em montanhas) e Tribord
(para esportes aquáticos).
Ao concentrar cadeia produtiva, distribuição e venda sob sua
gestão, a companhia consegue praticar preços mais baixos para o cliente
final, garante Cedric Burel.
E, além de aumentar a margem, marcas próprias geralmente
ajudam a fidelizar o consumidor, já que só podem ser encontradas nas
lojas da empresa, avalia Eduardo Yamashita, diretor de inteligência de
mercado do Grupo GS& Gouvêa de Souza.
“Por outro lado, é importante que essas mercadorias tenham
relação custo-benefício melhor do que as dos produtos de outras marcas.
Ou seja: os clientes esperam produtos de alta qualidade, porém com um
custo mais competitivo”, lembra.
Deixar claro esse custo-benefício é mais uma aposta da
Decathlon. Há 15 anos no Brasil, a companhia acredita que já tem um
público fiel e que o boca a boca é a sua maior propaganda, mas passou a
investir em formas de comunicar melhor o que ela vende.
Para isso, uma das saídas encontradas foi treinar a linha de
frente. Uma vez por, os melhores vendedores de cada uma das 21 lojas da
companhia se reúnem durante um fim de semana com a missão de testar
todas as novas linhas de produtos.
Eles têm que mergulhar, surfar, correr… E depois repassar as
experiências para os colegas. Os encontros acontecem em locais próprios
para cada atividade física, seja montanha, praia, ou cidade. O objetivo
é prepará-los para responder qualquer dúvida que os consumidores possam
ter.
Divulgar o máximo de informações sobre as mercadorias na vitrine online (incluindo avaliações de clientes) é outra medida.
“Temos um conteúdo muito forte com a descrição do produto.
Uma ficha completa, que abrange desde os tamanhos até porque ele foi
concebido e para que tipo de usuário. Isso não se encontra em outro
varejo com tanto detalhe”, diz Cedric Burel.
Na visão dele, as lojas físicas são o diferencial da companhia para competir com os grandes e-commerces de materiais esportivos.
“Lá o cliente pode experimentar o que vai comprar. Pode
subir numa bicicleta, patinar. Essa experiência real é muito valorizada,
principalmente pelo cliente novo”, afirma.
Dois terços dos clientes que compram nas unidades da Decathlon visitam o e-commerce antes, para pesquisar.
O mix de produtos, os preços, as ofertas e as condições de
pagamento são rigorosamente os mesmos nos dois canais. A única diferença
é o frete, que é cobrado nas compras pela internet.
Manter essa igualdade é mais um instrumento para aumentar a
margem da operação como um todo, considera Eduardo Yamashita, da GS&
Gouvêa de Souza.
Segundo ele, esse é hoje um dos maiores dilemas dos varejistas.
“Essa estratégia tende a funcionar melhor em segmentos de
varejo em que os produtos são difíceis de comparar entre os
competidores, são menos ‘comoditizados’. Não é indicada para segmentos
como o de eletroeletrônicos e eletrodomésticos, por exemplo”.
Esperança em 2017
A Decathlon quer inaugurar até cinco lojas neste ano. Três
delas já são dadas como certas: duas em São Paulo (na Marginal Tietê e
no Shopping Anália Franco) e outra em Porto Alegre, a primeira na
capital gaúcha.
A empresa está confiante em um 2017 melhor que 2016, quando
abriu duas lojas, ambas em São Paulo. Ela aposta em uma menor
volatilidade do câmbio e nas reformas prometidas pelo governo.
“Apesar da crise, a gente acredita nesse momento de
reestruturação da economia. A perspectiva para o Brasil é muito boa e
nossos planos de longo prazo não mudam em nada”, comenta Burel.
Nos próximos anos, a velocidade de expansão da varejista
pode aumentar. “Mas a gente não vai abrir uma loja que vai dar
prejuízo”, crava.
Quando perguntado sobre se a operação gera lucro, o executivo responde que está contente com o resultado “equilibrado”.