quinta-feira, 29 de junho de 2017

Eldorado, do grupo J&F, está à venda – mas seu passado a condena


Controlada pela família Batista, a Eldorado tornou-se uma das maiores produtoras de celulose do país na base da corrupção.



São Paulo — Os seis conselheiros da fabricante de celulose Eldorado sabiam que teriam uma reunião tensa na manhã do dia 16 de fevereiro. A empresa, que é controlada pelo grupo J&F, da família Batista, e tem como sócios dois dos maiores fundos de pensão do país, a Funcef (da Caixa Econômica) e a Petros (da Petrobras), estava envolvida em três operações da Polícia Federal. Para tentar acalmar as autoridades, a Eldorado havia concordado, meses antes, em permitir uma investigação independente para avaliar sua contabilidade e suas práticas internas. 

O relatório da investigação, conduzida pelo escritório de advocacia Veirano e pela consultoria EY, seria apresentado naquela reunião. Quando a apresentação começou, os dois conselheiros que representavam os fundos de pensão ficaram atônitos: parecia quase tudo bem, mas faltava uma explicação para um total de 37,4 milhões de reais em pagamentos feitos às empresas do doleiro Lúcio Funaro, preso desde julho de 2016 em meio à Operação Lava-Jato. Àquela altura, o papel de Funaro no submundo da política brasileira já era de conhecimento público. A recomendação dos advogados e dos consultores, caso quisessem detalhes, era que uma nova investigação, mais ampla, fosse feita para explicar quais serviços o doleiro havia prestado à Eldorado e à holding J&F. Coisa boa, pensaram alguns dos presentes, não deveria ser. 

Os representantes dos fundos de pensão no conselho concordaram, mas Joesley Batista, presidente do conselho na época, achou desnecessário. Teve início uma discussão e, no meio da confusão, o representante da Funcef, Max Pantoja, pediu licença para ir ao banheiro. Discretamente, levou consigo o relatório de EY e Veirano e foi embora. Dias depois, o relatório foi parar na mesa do procurador do Ministério Público Federal Anselmo Lopes, um dos responsáveis pela Operação Greenfield, que investiga transações fraudulentas em fundos de pensão, incluindo o investimento feito na Eldorado. Parte do relatório e do depoimento de Pantoja ao Ministério Público, em que ele especula que os controladores da Eldorado estavam tentando cobrir irregularidades que ocorriam na empresa, tornou-se pública. Na época, Joesley Batista classificou a denúncia de “estapafúrdia e de cunho pessoal”.

Tudo isso aconteceu três meses antes de Batista fechar um acordo com o Ministério Público e fazer uma delação premiada — nos depoimentos, em maio, ele não apenas confirmou como também deu detalhes das irregularidades envolvendo a Eldorado e acrescentou outras à lista. Segundo o empresário, a J&F subornou executivos do Funcef e da Petros para que os fundos se tornassem acionistas e aportassem, cada um, 550 milhões de reais na empresa — sem esse dinheiro, a operação jamais teria saído do papel. Ainda de acordo com Batista, houve doações à campanha do PT, a pedido do ex-ministro Guido Mantega, para conseguir empréstimos em bancos públicos, e pagou ao doleiro Lúcio Funaro para conseguir dinheiro com o FI-FGTS, fundo gerido pela Caixa Econômica Federal e que deveria buscar bons investimentos para o dinheiro dos trabalhadores ali depositado. O fundo acabou comprando 1 bilhão de reais em títulos da dívida da companhia, dando o impulso que faltava para concluir as obras da fábrica da Eldorado inaugurada em 2012. Ficou claro, nas informações prestadas pelo empresário, que a companhia dificilmente teria chegado aonde chegou sem as práticas ilegais, que garantiram recursos para erguer uma das maiores fábricas de celulose do mundo em tempo recorde. 

Seria apenas mais um caso de polícia no currículo dos irmãos Batista não fosse a Eldorado fundamental para a saúde do grupo J&F hoje. Os Batista decidiram vender a empresa e usar os recursos para ajudar a pagar parte da multa de 10,3 bilhões de reais estipulada no acordo de leniência fechado com o Ministério Público e reduzir o endividamento do grupo, que alcança 70 bilhões de reais somando a dívida de todas as empresas. Há interessados numa eventual aquisição. Os principais são as fabricantes de papel e celulose Fibria e Suzano, do Brasil, e Arauco, do Chile. O problema é que o histórico de corrupção torna a Eldorado um alvo que, se atrai cobiça, tem um quê de radioativo. A lista de preocupações dos potenciais compradores é extensa. Uma delas é o risco de a J&F não pagar o que deve e as autoridades decidirem buscar dinheiro nas empresas que faziam parte do grupo, o que está previsto no acordo de leniência. Para limitar o risco de perdas e conseguir fixar um preço para a Eldorado, segundo executivos próximos à transação, é preciso negociar em conjunto com o Ministério Público para não ter susto. Outro receio é a possibilidade de a empresa ser processada.

O conselheiro Max Pantoja quer processar a Eldorado e Joesley Batista pelas “declarações ofensivas” (procurado, ele não deu entrevista). EXAME apurou que o escritório Veirano, que analisou parte das operações da Eldorado, contratou um criminalista para avaliar o que fazer — o escritório não comenta, diz apenas que a investigação foi feita com base nas informações prestadas pela empresa. A consultoria EY diz que “os trabalhos foram realizados no limite do escopo contratado”. Por fim, os fundos de pensão tentam reverter as eventuais perdas que tiveram ao investir na companhia quando ela foi fundada em 2010.

A relação da cúpula da Eldorado com os fundos de pensão é a pior possível. Quando a Operação Greenfield começou, em setembro, a J&F, pressionada pelo Ministério Público, fechou um acordo em que se comprometeu a comprar a participação de Funcef e Petros na Eldorado por um valor que deveria assegurar o retorno das fundações sobre o montante investido. A partir daí, começou uma guerra de laudos de avaliação, com cada lado tentando ganhar em cima do outro. A consultoria Deloitte havia avaliado a Eldorado em 17,6 bilhões de reais em 2015, a pedido da J&F, mas o grupo argumentou que o valor havia diminuído em razão da queda dos preços da celulose. O interesse dos Batista, claro, é pagar o mínimo aos sócios — que têm 8,5% do capital cada um. Em 2016, a Funcef contratou a consultoria Baker Tilly Brasil, que avaliou a empresa em 4,7 bilhões de reais, o que renderia 399 milhões de reais para cada fundo, quase 30% menos do que os 550 milhões investidos originalmente — um valor que a fundação considerou inaceitável. 

Em janeiro deste ano, a Previc, órgão do Ministério da Previdência que regula os fundos de pensão, reforçou, num auto de infração, que a Petros pagou quantias superiores ao que valia a empresa. Petros e Funcef não comentaram. Executivos próximos às fundações afirmam que elas podem processar a Eldorado e a holding pedindo ressarcimento caso a diferença seja maior do que a quantia que elas já vão receber como parte do acordo de leniência. A EXAME, José Carlos Grubisich, diretor-presidente da Eldorado, disse que desconhece essa possibilidade e que a relação com os fundos não mudou. A J&F acredita, segundo pessoas próximas ao grupo, que deixa de ter a obrigação de recomprar a fatia dos fundos de pensão porque vai vender sua participação na Eldorado — o compromisso, então, passaria a ser dos novos donos (questionado sobre isso, o Ministério Público não respondeu). Como os fundos têm o direito de receber o mesmo prêmio pago aos controladores caso a Eldorado seja vendida, decidiram esperar para negociar com os futuros controladores.

Máquina de captar recursos

 

A criação da Eldorado, em 2010, surpreendeu Fibria e Suzano, as maiores fabricantes de celulose do país. Afinal, o plano era montar do zero a maior e mais moderna fábrica de celulose do mundo — à base de bilhões e bilhões de reais em financiamento. Não faltaram especialistas dizendo que o projeto iria naufragar. Diante de concorrentes atônitos com a “eficiência” da empresa em captar recursos, a primeira fase da fábrica da Eldorado foi inaugurada na cidade de Três Lagoas, em Mato Grosso do Sul, em 2012. A construção levou apenas dois anos, prazo recorde para um projeto desse tamanho. 

A festa de inauguração contou com uma apresentação do tenor italiano Andrea Bocelli e com a presença do então vice-presidente Michel Temer e do governador do estado, André Puccinelli. “A Eldorado é um produto de corrupção”, diz o executivo de um fundo de pensão. “A JBS foi turbinada pelo esquema de propina, mas a Eldorado foi viabilizada por ele.” A Eldorado passou a preparar uma possível abertura do capital para reduzir a dívida e expandir a fábrica. A operação não foi adiante. Primeiro, porque o declínio da economia brasileira praticamente inviabilizou novas ofertas de ações. Depois, porque a empresa entrou na mira da Justiça. A primeira vez em que a Eldorado foi envolvida nas investigações policiais foi em julho de 2016, quando a PF deflagrou a Operação Sépsis, que apura esquemas de corrupção envolvendo a Caixa Econômica. Foram apreendidos documentos e computadores na sede da Eldorado. Dois meses depois, foi deflagrada a Operação Greenfield, com medidas cautelares contra os irmãos Batista e Grubisich (os advogados de Grubisich argumentaram à Justiça que ele não estava no grupo na época do investimento dos fundos de pensão; foi presidente da geradora de energia ETH, do grupo Odebrecht, até 2012). Em janeiro, a Operação Cui Bono incluiu a empresa nas investigações sobre outras transações com a Caixa.

Endividamento


Além das pendências judiciais, a J&F tem um enrosco financeiro a resolver na Eldorado. A dívida da empresa é alta, de 8 bilhões de reais, equivalente a cinco vezes a geração de caixa. Além disso, 2 bilhões de reais vencem em até um ano, e a empresa tem cerca de 1 bilhão de reais em caixa. Ou seja, para pagar o que deve, precisaria captar recursos em bancos ou no mercado de capitais. Sem a ajuda dos amigos do passado, porém, analistas acreditam que as linhas de financiamento serão escassas e mais caras. A situação complicada levou a agência de classificação de risco Fitch a rebaixar a nota da Eldorado, já que pode ficar difícil honrar todos os pagamentos. Grubisich diz que a empresa só terá pagamentos relevantes a fazer a partir de setembro e que sua relação com os bancos continua boa, mantidas as linhas de crédito, inclusive do BNDES. “A Eldorado está no auge operacional e é a mais eficiente do setor”, diz ele, destacando a geração de caixa, que foi de 54% no ano passado (a geração de caixa da Fibria ficou em 43%, e a da Suzano, em 40%). Os números da Eldorado, no entanto, são rebatidos por especialistas ouvidos por EXAME. 

Fibria e Suzano provisionam créditos de ICMS que têm a receber — isso significa que consideram baixa a chance de receber de fato esses recursos e, por isso, não viram automaticamente receita ou lucro. Já a Eldorado inclui esses valores na geração de caixa. “O indicador Ebitda serve para medir a eficiência de uma empresa em produzir bem. Um crédito tributário não atenderia a esse propósito”, diz Ricardo Almeida, professor de finanças no Insper. O mesmo aconteceria com os “ativos biológicos”, como a madeira armazenada para produzir celulose. Esses ativos só terão um valor de mercado no futuro, quando a celulose for produzida e vendida, mas as empresas fazem estimativas de quanto valem hoje. A Eldorado também inclui esse valor em seu indicador de geração de caixa.

 “Como a geração de caixa não é um valor contábil, não é alvo das auditorias”, diz um analista. Se ela seguisse o padrão dos concorrentes, a margem seria mais parecida com a da Fibria e a da Suzano, de acordo com os especialistas. A Eldorado diz que “segue o conceito puro de Ebitda” e tem “números auditados e públicos no balanço”. 

Por que, então, há interessados em comprar a empresa? Ainda que haja questionamentos sobre o patamar de eficiência e sobre sua capacidade de se expandir, a Eldorado tem o menor custo do setor graças a investimentos em tecnologia e gestão. Além disso, cresceu mais do que o esperado: a meta inicial era que a primeira fase da fábrica produzisse 1,5 milhão de toneladas de celulose — chegou a 1,6 milhão de toneladas em 12 meses. A empresa conseguiu driblar uma das dificuldades iniciais, que era não ter florestas próprias em número suficiente para abastecer a produção ao firmar contratos de longo prazo de arrendamento nas proximidades da fábrica. EXAME apurou que os bancos que assessoram Arauco, Fibria e Suzano avaliam a Eldorado em até 11 bilhões de reais, incluindo a dívida de 8 bilhões de reais (as empresas não deram entrevista, mas confirmam em nota ao mercado seu interesse no negócio). O valor pedido inicialmente por Wesley Batista, irmão de Joesley e responsável por conduzir as negociações com os potenciais compradores, era de 13 bilhões de reais. No preço, os potenciais compradores incluem o risco de a venda ser embargada pela Justiça, como aconteceu com a tentativa da empresa de alimentos JBS, também controlada pela J&F, de vender ativos na América do Sul em junho. No caso da Eldorado, a expectativa é que compradores e vendedores cheguem a um acordo em 45 dias. Dessa vez, sem atalhos.

segunda-feira, 26 de junho de 2017

J&F negocia venda da Alpargatas para fundo Cambuhy


A J&F Investimentos afirmou que firmou um acordo de confidencialidade envolvendo uma possível venda da Alpargatas

 





São Paulo – A J&F, holding controladora da JBS, negocia a venda da Alpargatas para a gestora de recursos Cambuhy.

Em fato relevante divulgado hoje, 26, a Alpargatas afirmou que foi informada que a J&F Investimentos fechou um acordo de confidencialidade envolvendo uma possível aquisição, pela Cambuhy, da totalidade de ações da Alpargatas detidas pela J&F.

A dona das Havaianas foi comprada pela J&F em novembro de 2015. A Camargo Corrêa, que era a acionista majoritária de 2002 até então, vendeu a companhia por 2,667 bilhões de reais.

O fundo Cambuhy, que tem entre seus sócios a família Moreira Salles, era um dos concorrentes à compra da Alpargatas há dois anos e voltou à disputa.

Tanto a venda de 2015 quanto a atual negociação estão relacionadas à Operação Lava Jato, que investiga corrupção na Petrobras.

A Camargo Correa precisava levantar o dinheiro depois de ter sido envolvida na investigação. Ela tinha uma dívida bilionária e uma multa de 700 milhões de reais pela condenação por prática de cartel, fraude à licitação e corrupção.

Agora é a J&F que está envolvida nas investigações da operação da Polícia Federal. O grupo dos irmãos Batista terá de pagar uma multa de 10,3 bilhões de reais por crimes de corrupção, em acordo de leniência acertado com o Ministério Público Federal (MPF).

Para se recuperar, ela está em busca de instituições para vender as empresas Alpargatas, Eldorado e Vigor.

A JBS, dona das marcas Seara e Friboi, também tenta vender ativos. Em uma proposta bilionária de desinvestimentos, ela colocou à venda a fatia de 19,2% na Vigor Alimentos, sua participação acionária na Moy Park, a Five Rivers Cattle Feeding e fazendas.


Palocci é condenado a 12 anos por corrupção e lavagem de dinheiro


Juiz Sérgio Moro determinou a sentença na manhã desta segunda

 




São Paulo – O juiz Sérgio Moro condenou o ex-ministro Antonio Palocci a 12 anos e 2 meses de prisão pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, no âmbito da Operação Lava Jato. Ele já está preso em Curitiba desde o ano passado.

A princípio, segundo a determinação de Moro, a pena deve ser cumprida em regime fechado, e a progressão para o regime aberto vai depender da devolução do dinheiro dos crimes cometidos.

O processo apurava se Palocci recebeu propina para atuar em favor da Odebrecht, interferindo em decisões tomadas pelo governo quando era chefe da Casa Civil e membro do conselho de administração da Petrobras.

Segundo a denúncia, Palocci operava a favor da Odebrecht nos contratos da empresa com a Petrobras, especificamente para a construção de sondas.

Em uma primeira licitação para a construção de sete sondas, o Estaleiro Atlântico Sul teria apresentado a melhor proposta. A Odebrecht, então, teria oferecido propina para garantir a realização de um novo edital, para que a empresa pudesse ficar com o contrato.

Palocci teria, então, intercedido, usando sua posição na Casa Civil, e viabilizado a realização de um novo processo, desta vez beneficiando a Odebrecht.

Também eram réus no mesmo processo Renato Duque (quatro anos de prisão); Marcelo Odebrecht (doze anos de prisão); João Vaccari; o assessor especial de Palocci, Brasnilav Kontic; e outros nove réus.

 http://exame.abril.com.br/brasil/palocci-e-condenado-a-12-anos-por-corrupcao-e-lavagem-de-dinheiro/



Credores demoram 386 dias para aprovar plano de recuperação judicial em São Paulo


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Dos 194 pedidos de recuperação judicial distribuídos na capital paulista entre setembro de 2013 e junho de 2016, 60% foram aceitos no período, mas boa parte demorou mais de um ano para conseguir aprovação de credores. O prazo mediano (descontando as desproporções) foi de 386 dias, superando os 180 (stay period) que a Lei de Falências fixa para empresas em crise começarem os pagamentos. Enquanto esperavam a assembleia geral, 6% das companhias faliram.

É o que aponta a primeira fase do Observatório de Insolvência, projeto conduzido pela Associação Brasileira de Jurimetria (ABJ) e por professores da PUC-SP, com estudantes da instituição. O objetivo é produzir índices anualmente, auxiliando os meios jurídico e empresarial a avaliarem riscos, e estender a análise para processos do estado e para todo o país.

O estudo diz que cerca de 30% das empresas conseguiram prorrogar o chamado stay period, estendendo por mais tempo a suspensão de cobranças. Quase 80% tiveram o plano aprovado em assembleia geral e 8,47% por cramdown (por maioria de votos dos credores, seguindo requisitos da Lei de Falências). Ainda assim, 13% das empresas em recuperação fecharam as portas depois de conseguirem o sinal verde para agir.

Só uma teve o processo declarado concluído até junho de 2016. Esse número aparentemente baixo de sucesso num intervalo de quase três anos não surpreendeu os pesquisadores, já que a assembleia geral demora mais de um ano para votar as condições para melhorar o cenário no vermelho.


O longo tempo mostra que o prazo da lei é insuficiente, na avaliação do advogado Marcelo Guedes Nunes, presidente da ABJ e um dos coordenadores da pesquisa. Embora o estudo tenha como foco os números em si, e não a interpretação dos indicadores, ele afirma que o prazo de quase 400 dias pode ocorrer porque os processos são complexos e há dificuldades para os credores formarem maiorias.

Quando o plano passa pela assembleia, o prazo médio é de dez anos para encerrar o pagamento: 35,5% das empresas prometeram vender ou alugar ativos chamados de unidades produtivas isoladas (UPIs); 53,2% escolheram outros bens; e 29% anunciaram renúncia de direitos contra terceiros coobrigados — como uma alternativa não exclui a outra, a soma supera os 100%.

Para Nunes, a venda de ativos indica que as empresas são obrigadas a “amputar a própria carne”, diante da dificuldade de outros meios, como financiamentos.

Reprodução/Observatório de Insolvência
 
Fase prévia


De acordo com a pesquisa, a proporção de deferimentos de recuperações judiciais é 50% maior quando juízes determinam perícia antes de decidir se aceitam o pedido. O professor e advogado Fábio Ulhoa Coelho afirma que, antes do levantamento, imaginava-se o contrário: a nomeação de administradores judiciais antes do início controlaria com mais rigor as concessões.

Uma das explicações, segundo ele, é que os especialistas nomeados podem auxiliar as empresas a demonstrar seus argumentos à Justiça. Embora a prática seja adotada por juízes para verificar se as autoras têm condições mínimas de se recuperar no futuro, Ulhoa Coelho entende que cabe aos credores debater se existe ou não essa esperança.

O juiz e professor Marcelo Barbosa Sacramone, que atua na 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais da capital e também coordenou o estudo, aponta mais um argumento: como o administrador não recebe remuneração na fase de perícia prévia, tem interesse de ser nomeado caso o processo avance.

Ele avalia que esse tipo de medida deve ser excepcional, pois a lei atribui ao empresário reunir toda a documentação necessária e ao próprio juiz a obrigação de verificar se tudo foi atendido. “Como a lei não previu, não se poderia impor ao empresário o ônus de ter que arcar com uma perícia prévia não determinada por lei, o que poderia prolongar o período em que as ações e execuções contra o empresário não são suspensas”, afirma.

O grupo de pesquisa é coordenado ainda pelo professor Ivo Waisberg. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJ-SP.

 http://www.conjur.com.br/2017-jun-24/aprovacao-recuperacao-judicial-sao-paulo-demora-386-dias



sexta-feira, 23 de junho de 2017

Vexame internacional – Por Bernardo Mello Franco


 
Área desmatada na Amazônia, no Pará


 A viagem de Michel Temer à Europa produziu um vexame internacional. Enquanto o presidente passeava em Oslo, o governo da Noruega anunciou que cortará pela metade a ajuda ao Fundo Amazônia. O motivo é o fracasso do Brasil no combate ao desmatamento.

A devastação da floresta avançou 29% na última medição anual, divulgada em novembro. O país perdeu 7.989 quilômetros quadrados de mata tropical, o equivalente a sete vezes a área da cidade do Rio de Janeiro. Foi o pior resultado em oito anos.
 
A Noruega é a maior patrocinadora do Fundo Amazônia. Já doou R$ 2,8 bilhões para o Brasil proteger as árvores e reduzir a emissão de carbono. Isso equivale a 97% dos recursos do fundo, que também recebeu aportes da Alemanha e da Petrobras.
 
Às vésperas da chegada de Temer, os noruegueses repreenderam o governo brasileiro pelo desmantelamento da política ambiental. O ministro Vidar Helgesen criticou a aprovação de medidas provisórias que reduzem unidades de conservação.
 
A pressão internacional convenceu o presidente a vetar as MPs. No entanto, o governo prometeu aos ruralistas que vai enviar ao Congresso um projeto de lei com o mesmo teor.
 
Após o anúncio desta quinta, o Fundo Amazônia deve perder ao menos R$ 166 milhões em doações. "É uma decisão humilhante para os brasileiros. O país pediu dinheiro para reduzir o desmatamento, mas o que está acontecendo é o contrário", me disse Jaime Gesisky, da WWF.
 
O secretário-executivo do Observatório do Clima, Carlos Rittl, avalia que o retrocesso ainda pode se agravar. "A aliança de Temer com a bancada ruralista está saindo muito caro. O meio ambiente virou moeda de troca na negociação para barrar o impeachment", afirmou.
 
Em Oslo, onde desfilou com uma reluzente gravata verde, o ministro Sarney Filho foi questionado se o Brasil vai reduzir o desmatamento. Sua resposta foi outro vexame: "Só Deus pode garantir isso" 

(Folha de S.Paulo, 23/6/17)

Cabify se une à Easy contra 99 e Uber


Embora as startups divulguem que o acordo se trata de uma fusão, fontes confirmam a EXAME Hoje que a operação se tratou de uma aquisição

 




A tão esperada consolidação no mercado de aplicativos de transporte no Brasil finalmente começou. 

A startup espanhola Cabify e a brasileira Easy uniram as operações em uma negociação que se arrastou por mais de um ano — começou em abril de 2016 — e havia sido adiantada por EXAME 
Hoje em janeiro. Embora as startups estejam tratando a negociação como uma fusão entre os aplicativos, fontes próximas ao acordo afirmaram a EXAME Hoje que, na prática, a Cabify comprou a operação da Easy.

Ainda de acordo com essas fontes, o acordo foi benéfico aos acionistas da Easy, levando em conta o cenário de competição acirrada no setor e a descapitalização da companhia, que estava com dificuldades em competir no cenário de concorrência acirrada no Brasil. Não há confirmação, no entanto, sobre o valor total da transação, nem se ela se deu por meio de ações da companhia ou envolveu dinheiro.

Criada em 2012 e presente em 170 cidades de 12 países, a Easy levantou mais de 77 milhões de dólares desde então e tinha como principal acionista o fundo alemão Rocket Internet. Já a Cabify recebeu cerca de 250 milhões de dólares em investimento desde 2011, principalmente da empresa japonesa Rakuten, e está com uma rodada de investimentos em aberto na tentativa de captar mais 200 milhões de dólares.

“A operação era tão necessária para a Easy quanto para a Cabify, que está com dificuldades em levantar capital e precisa justificar o valor de mercado que diz ter”, diz um especialista no setor ouvido por EXAME Hoje. Segundo ele, o valor de mercado dos aplicativos de transporte é um múltiplo do ciclo financeiro gerado pelas corridas da plataforma. “A Cabify tem um múltiplo extremamente inflacionado e não consegue atrair investidores. Adicionar a Easy ao negócio é uma forma de tentar aproximar o valor de mercado estipulado do total das corridas feitas pelo app”, diz.

Ainda de acordo com o especialista, isso explica o fato de a Cabify anunciar que está com uma rodada de investimentos em aberto. “Ninguém faz isso no setor. As empresas captam e anunciam depois. A Cabify disse que estava investindo 200 milhões de dólares no Brasil, um mês depois anunciou que captou só 100 milhões e continua em busca de 200, para fechar a rodada de 300”, diz.

Segundo as empresas, os aplicativos operarão sob o comando do atual presidente e fundador da Cabify, Juan de Antonio, mas manterão as marcas e equipes próprias.

Procurada, a Easy negou que a operação tenha sido uma compra e os rumores de que os aplicativos se transformarão em breve em um só. “No futuro, a união de marcas pode acontecer, mas não vai ser no curto prazo. As duas marcas funcionam bem estando separadas e temos capital para manter isso”, diz Jorge Pilo, co-presidente da Easy. “A indústria de transporte por aplicativos está mudando e vai ser fundamental no futuro. Essa união nos coloca em uma boa posição para competir”. A Cabify se negou a comentar o assunto com EXAME Hoje. Os fluxos da internacionalização: O Mundo Corporativo te mostra que conexão é a palavra-chave da nova globalização 

Nem bem foi anunciada, a união de forças já começou a encontrar resistências por parte de taxistas, principalmente na Colombia, um dos principais mercados da Easy e onde, historicamente, o transporte feito por carros particulares sofre resistência devido à pressão das associações de taxistas. Uma nova legislação pode complicar ainda mais a situação no país.

O acordo veio em boa hora para a Easy. Recentemente, todas as concorrentes anunciaram grandes investimentos no Brasil. A Uber deve colocar 200 milhões de reais no mercado nacional, enquanto a 99 recebeu uma rodada de 200 milhões de dólares, dividida entre janeiro e abril, para investir na sua expansão pela América Latina, mas principalmente no crescimento das corridas por meio de carros particulares por aqui.

A Cabify anunciou em abril que estava se preparando para investir 200 milhões de dólares só no mercado brasileiro, que, em menos de um ano, se tornou o maior para a empresa que opera em 12 países. Nesse cenário, a Easy vinha enfrentando dificuldades para competir com as concorrentes.

Embora os negócios da startup continuassem atrativos aos investidores, principalmente pela força que demonstra em mercados importantes, como Peru e Colômbia (onde também é dona da Tapsy), muitos fundos se negavam a entrar em um mercado onde o capital é tão intensivo e com concorrência tão difícil. Pesavam como pontos negativos para a Easy o fato de apenas um dos fundadores ainda estar na operação, o que não é bem visto por novos investidores em startups, e também a dificuldade e agressividade que historicamente o fundo alemão Rocket Internet coloca em suas negociações.

O fortalecimento das concorrentes acontece em um cenário de grande competição. O Uber, que chegou a ter por volta de 65% do mercado de corridas por aplicativo brasileiro no final do ano passado, passa por uma crise internacional que culminou na renúncia do presidente da empresa, Travis Kalanick. Além de Travis, em menos de seis meses a empresa perdeu seis de seus principais executivos, incluindo seu presidente de operações, Jeff Jones, a chefe de comunicação, Rachel Whetsone, e diversos vice-presidentes.

No Brasil, as críticas aos serviços do aplicativo também cresceram exponencialmente e abriram espaço para os concorrentes, que vem tomando mercado. Executivos do setor e especialistas em tecnologia ouvidos por EXAME Hoje concordam que o mercado é grande, mas a tendência é que continue se consolidando. Assim, a união de forças entre Easy e Cabify deve acirrar ainda mais a competição, que está longe de acabar.

Tratados internacionais serviriam para impulsionar o comércio brasileiro



O comércio é tônica permanente desde a Antiguidade. Realizavam-no então, entre si, as circunscrições geográficas de poder e continuam os Estados modernos a fazer o mesmo, para equilibrar e buscar superávit em sua balança de pagamentos. Ao inaugurar o Reino Unido do Brasil, Portugal e Algarves, em 1808, Dom João VI abriu os portos brasileiros ao comércio internacional, abertura essa que se manteve quando da instauração do império brasileiro, em 1822.

Muitos são os prismas pelos quais pode, historicamente e na atualidade, ser estudado o comércio do Brasil. Entretanto, não se tem notícia de um exame sob a ótica dos tratados internacionais de comércio, que o Brasil tenha concluído, até a defesa da dissertação de mestrado denominada Brasil e as Normas dos Acordos Internacionais em Matéria Comercial, orientada pelo professor doutor Masato Ninomiya e defendida, há pouco, na Faculdade de Direito da USP, por Marcel Rodas Cezaretti[1].

Por ser trabalho científico, a primeira parte do trabalho é dedicada a sumariar os substratos teóricos que fundamentam a elaboração da pesquisa a ser feita: tratados internacionais; organizações internacionais, (Gatt/OMC, UNCTAD, Aladi e Mercosul); Direito do Comércio Internacional (acordos de comércio e contratos internacionais); e ministérios, comissões (Camex e Apex) e instituições brasileiras (CNI) relacionados ao comércio internacional.

A segunda parte da dissertação, dedicada ao fulcro do trabalho, reuniu cerca de 430 tratados de cunho comercial, concluídos pelo Brasil, desde 1822, com a finalidade de perquirir a função que eles cumpriram e vêm cumprindo no contexto do comércio internacional brasileiro. Cada um dos referidos tratados foram objeto de uma ficha, cujo preenchimento permitiu visão radiográfica de seus principais aspectos. O conjunto dos tratados foram divididos em cinco blocos: bilaterais; relativos à OMC; relacionados à Aladi; concernentes ao Mercosul; e principais tratados vigentes e em negociação. A conclusão de cada um desses blocos contém considerações técnico-jurídicas e político-econômicas. A formulação destas últimas encontraram subsídios, também, nas entrevistas feitas com autoridades da área.

As conclusões quanto aos tratados bilaterais, mostraram: (i) a grande utilização de acordos em forma simplificada, pois os tratados comerciais definidores das grandes regras são pactuados, geralmente, sob a forma solene; sendo suscetíveis de efetivação, por meio dos referidos acordos; (ii) no século XIX, os tratados eram majoritariamente em forma solene; (iii) no século XX, a minoria era em forma solene; certo número relegava à escolha das partes considerá-lo solene ou em forma simplificada; enquanto que grande maioria era em forma simplificada; (iv) no século XXI, vem sendo mantida a mesma tendência do século anterior. Relativamente à natureza das partes, no século XIX, todos os tratados foram concluídos entre Brasil e um Estado (nessa época ainda não havia organizações internacionais intergovernamentais); no século XX, 301 tratados foram concluídos entre Brasil e um Estado e 7 entre Brasil e organizações internacionais (esse número é pequeno, pois se trata apenas de tratados bilaterais); no século XXI, 32 entre Brasil e um Estado e 3 entre Brasil e organizações internacionais.

As partes - Estados e organizações - com as quais o Brasil concluiu tratados permitem medir a amplitude da diplomacia bilateral comercial brasileira[2]. No referente à finalidade, os tratados do século XIX consignam, mais genericamente a facilitação do comércio e a navegação; enquanto que nos sécs. XX e XXI, mais especificamente, estabelecem comissões mistas e cláusula da nação mais favorecida. Finalmente quanto ao status dos tratados, daqueles concluídos no século XIX, 6 encontram-se em tramitação, 3 são vigentes e 3 não vigentes; do século XX, 51 em tramitação, 114 vigentes e 145 não vigentes; enquanto que do século XXI, 3 em tramitação e 33 vigentes. Entre os tratados vigentes, contam-se tanto os que continuam operantes, quanto aqueles cujo cumprimento exaurem seu objetivo. Por seu turno, naqueles em tramitação, estão tanto os que aguardam formalidades para a sua entrada em vigor, quanto os que, no meio do caminho, foram abandonados pelas partes, atingidos pela “mortalidade infantil” dos tratados internacionais. São tidos como não vigentes, os que tiveram seus prazos expirados ou sofreram denúncia pelas partes.

Os tratados da OMC compõem-se de regras negociadas pelos respectivos Estados- Membros, denominados acordos, conhecido em seu conjunto como regras de comércio da OMC. São, geralmente, acordos guarda-chuva, receptáculos dos deveres e direitos dos partícipes da Organização, relativos ao comércio de bens, serviços propriedade intelectual, que liberalizam o comércio. Além dos acordos que acabam de ser descritos, há também na OMC, os acordos plurilaterais, versando determinado assunto e de que são partes somente os Estados-Membros que a eles aderirem. “O Gatt/OMC detém as rédeas formais das negociações que os Estados-membros fazem com o intuito de criar o marco multilateral do comércio mundial[3]”. Dessa maneira foram geradas as regras do Gatt/OMC, bem como persistem as negociações para sua atualização e implementação.

Vinte e oito tratados comerciais foram concluídos no contexto da Aladi, divididos entre acordos de alcance regional e de alcance parcial de complementação econômica. O Tratado de Montevidéu de 1980, instituidor da Aladi “estabeleceu como instrumento de ação, a realização de acordos de alcance regional e acordos de alcance parcial, com o intuito de, por meio deles, colocar em prática a multilateralização progressiva, que leva a convergência; bem como o tratamento diferenciado, segundo as característica econômico-estruturais dos Estados-Membros[4]”.

O referido Tratado de Montevidéu, tratado solene, além de constitutivo de organização internacional é também tratado guarda-chuva. Por essa razão, os tratados de alcance regional ou de alcance parcial, normalmente, são em forma simplificada, entrando em vigor pela assinatura. Tais acordos são sucintos e similares em sua redação. O que os diferenciam são as tabelas, que, por serem evolutivas, dão causa a grande número de anexos e protocolos adicionais. A ampla utilização, pelo Brasil, dos mecanismos criados pelo Tratado de Montevidéu de 1980 é comprovado pelo vultoso número de tratados que concluiu sob o patrocínio da Aladi. Um desses - o Acordo de Alcance Parcial 18 - validou o Mercosul, no plano das regras da OMC, possibilitando a criação do Mercosul.

Dos tratados firmados na esfera do Mercosul, 38 são de cunho comercial, podendo ser subdivididos em três espécies: (i) os que instituíram ou estruturaram o bloco econômico (exemplo: Tratado de Assunção de 1991); (ii) criaram legislação interna do bloco (Protocolo relativo ao Código Aduaneiro, de 1994); e (iii) acordos em matéria comercial com organizações internacionais e com Estados.

O Mercosul regula os assuntos importantes para o bloco por meio de tratado internacional e não por decisões de seus órgãos. No que respeita às tratativas do Mercosul com organizações internacionais, o Acordo Quadro Inter-regional de Cooperação entre o Mercado Comum do Sul e a Comunidade Europeia de 1995 - único com organização internacional de grande porte - não teve sequência prática, até o momento. Os muitos tratados concluídos entre Mercosul e Estados o foram com países em vias de desenvolvimento e de menor potencial comercial, excepcionados os com Cingapura, Israel e Coreia do Sul.

Os principais tratados recentes, em vigor e em aplicação são os Acordos de Cooperação e Facilitação de Investimentos (ACFIs), concluídos com Angola, Chile, Colômbia etc. e alguns tratados na estrutura plurilateral da Aladi, com o Suriname e Bolívia. Dentre os tratados em negociação figuram: ACFIs com a África do Sul, Argélia, Marrocos etc.; Acordo de Livre Comércio entre Mercosul e a União Europeia; e Acordo de Compras Governamentais com Chile e Colômbia. Além da baixa importância da maioria dos tratados em negociação, causa espécie o absentismo do Brasil em negociações do porte: Trans-Pacific Partnership (TPP) etc.

Ressaltem-se das conclusões gerais da dissertação os seguintes pontos. O Gatt/OMC, relevante na regulamentação liberalizante das trocas internacionais, na determinação das melhores práticas e na resolução dos conflitos, assiste a dissenção entre os Estados-Membros desenvolvidos, que preferem tratar de “novos temas” e os em desenvolvimento, que insistem no incremento da liberalização dos produtos agrícolas. Tal diferença de pontos de vista é responsável, em parte, pelo relativo insucesso da Rodada Doha; que, no entanto, tem apresentado pontos positivos, como a conclusão do Acordo de Facilitação de Comércio, prestes a entrar em vigor. O Transatlantic Trade and Investment Partnership (TTIP), o Transpacific Partnership (TPP) e o Regional Compreensive Economic Partnership (RCEP), são, em última análise, esquemas alternativos fruto da letargia do esquema tradicional de negociação no seio da OMC. O Brasil, partícipe do GATT (1947) e da OMC (1994) é reconhecido por seu apoio e protagonismo nas negociações, bem como na consolidação do sistema de solução de controvérsias.

O Brasil, seguindo o esquema da Aladi, tem concluído inúmeros acordos, quer individual, quer conjuntamente com o Mercosul, estando em andamento com Estados sul-amerianos cronogramas de desgravação tarifária, com o intuito de se estabelecer área virtual de livre comércio, até 2019.

Para o Brasil, o Meercosul mais do que projeto de integração econômica representa projeto de desenvolvimento nacional, buscando estabilidade e prosperidade regionais. Reavaliação recente demonstrou a necessidade de se revitalizar a integração econômica e comercial, com abertura tanto no mercado interno, quanto no internacional. Vários são as razões para o relativo marasmo do MERCOSUL: o fato de as decisões do bloco serem tomadas por unanimidade, crises econômicas e políticas frequentes nos Estados-Membros; existência da Resolução GMC 32/2000, pela qual os membros do Mercosul somente podem participar, em bloco, de negociações com outros países etc.

A “participação do Brasil no comércio internacional tem-se mantido marginal diante do tamanho de sua economia, fato comprovado pelos números sofríveis de seu comércio internacional”[5]. Também, em razão de pressões de entidades privadas, recentemente vem-se pretendendo incentivar o comércio exterior brasileiro por vários modos: plano nacional de exportações (2015 e 2016), portal único de comércio exterior; estabelecimento do Acordo de Cooperação e Facilitação de Investimentos (ACFIs); mudanças estruturais na Apex-Brasil e na Camex; diretrizes do Itamaraty, de 2017, majoritariamente dizendo respeito à política comercial; renovação do Mercosul, com eliminação das barreiras ainda altas dentro do bloco etc..

Apesar da pequena relevância, no conjunto, dos tratados concluídos pelo Brasil em matéria comercial, face ao “contexto atual, do perfil dos acordos já firmados (...) dos acordos em negociação (...) é possível identificar uma tendência de mudança no perfil do Brasil quanto à sua inserção no comércio internacional. Se por um lado, no cenário atual, o Brasil é signatário de uma rede de acordos concentrados na América Latina e com ênfase em acordos de natureza tarifária, é possível identificar uma estratégia do MRE e do MDIC, como resposta a pressões dos setores exportadores brasileiros, de estabelecer acordos com uma rede variada de países em termos geográficos, de perfil de desenvolvimento e de escopo (incluindo temas de investimentos, serviços, compras governamentais e propriedade intelectual)”[6].

Há espaço para que os tratados ajudem a impulsionar o comércio internacional brasileiro, falta potencializar a vontade política.
 
[1] Cezaretti, Marcel R.,“Brasil e as Normas dos Acordos Internacionais em Matéria Comercial”, São Paulo, s. c. p., 2017, 421 páginas.
[2] Op.cit. p. 274/275.
[3] Op. cit. p. 288.
[4] p. cit. p. 310.
[5] Op. cit. p. 352.
[6] Op. cit. p. 353.

 é professor titular da Faculdade de Direito da USP, presidente do Centro de Estudos de Direito Econômico e Social (CEDES) e sócio do escritório Grandino Rodas Advogados.
Revista Consultor Jurídico, 22 de junho de 2017.


 http://www.conjur.com.br/2017-jun-22/olhar-economico-tratados-internacionais-poderiam-impulsionar-comercio-brasileiro