Presidente Lula e presidente da Câmara, Arthur Lira, no Palácio do Planalto
Os últimos dias foram marcados por uma “guerra” entre o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A crise entre os dois poderes ficou explícita durante o discurso do alagoano, na segunda-feira, 5, para marcar o retorno aos trabalhos do Congresso Nacional. Na ocasião, ele cobrou a gestão petista por “respeito” e “cumprimento com a palavra dada”.
No decorrer do discurso, Lira destacou que o Orçamento não é exclusivo do Poder Executivo, em referência ao veto do presidente Lula, em dezembro de 2023, que cortou R$ 5,6 bilhões de emendas de comissão, aprovadas pelo Congresso em R$ 16,6 bilhões. Essas emendas são consideradas “herdeiras” do chamado “orçamento secreto”, que foi extinto pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em dezembro de 2022.
A discussão sobre o Orçamento de 2024 está ligada às eleições municipais, em outubro deste ano, pois os valores são direcionados para projetos que trazem apoio eleitoral para deputados e senadores.
Segundo a legislação eleitoral, a liberação dos recursos é proibida após julho, três meses antes do pleito. Há suspeita de que o governo tenha feito o corte por temer que as emendas sejam direcionadas principalmente aos aliados do chamado “Centrão”, uma coalizão informal composta por partidos de centro e centro-direita que tem como representante Arthur Lira.
“(O Orçamento) não é e nem pode ser de autoria exclusiva do Executivo e muito menos de uma burocracia técnica, que apesar do seu preparo não foi eleita para escolher as prioridades da nação e não gasta a sola do sapato percorrendo os pequenos municípios brasileiros como nós senadores e deputados”, disse o presidente da Câmara dos Deputados, durante o discurso.
Convívio difícil com a Câmara
O presidente Lula não participou da cerimônia de abertura dos trabalhos do Congresso Nacional, mas enviou uma mensagem, lida pelo deputado federal Luciano Bivar (União-PE), na qual disse ser necessário diálogo para superar as “filiações partidárias”.
“O diálogo é condição necessária para a democracia. Diálogo que supera filiações partidárias. Que ultrapassa preferências políticas ou disputas eleitorais. Que é, antes de tudo, uma obrigação republicana que todos nós, representantes eleitos pelo povo, temos que cumprir”, completou.
O presidente ainda destacou que teria o “maior prazer” em explicar sobre o veto no Orçamento de 2024 aos parlamentares. “Negocio com o Congresso sempre. Ontem tive de vetar R$ 5,6 bilhões em emendas. Tenho o maior prazer de juntar lideranças e explicar por que foi vetado. Na questão das emendas é importante lembrar que o ex-presidente (Bolsonaro) não tinha governança. Vou repetir: ele não tinha governança. Quem governava era o Congresso. Ele não tinha sequer capacidade de discutir o orçamento, porque não queria ou não fazia parte da lógica dele. Queria que os parlamentares fizessem o que quisessem”, acrescentou.
Relação ruim entre Lira e Haddad
Outro ponto dessa crise entre o Legislativo e o Executivo é a relação ruim entre Lira e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), após o petista ter levantado a suspeita de lavagem de dinheiro, superfaturamento e atividades ilícitas no Perse (Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos), instituído por meio da Lei n° 14.148/21 para estabelecer ações emergenciais e temporárias para o setor durante a pandemia de Covid-19.
No discurso de segunda-feira, Arthur Lira citou Perse como uma “conquista essencial para que milhões de empregos de um setor devastado pela pandemia se sustentassem”, que “não pode retroceder sem ampla discussão com este Parlamento”.
Os supostos indícios de irregularidades no programa são investigados pela Receita Federal. O Congresso Nacional prorrogou o Perse até 2026 por meio de um Projeto de Lei de Conversão. Depois, uma MP editada pelo governo, estabeleceu o seu encerramento assim que o recurso de R$ 20 bilhões previstos chegarem ao fim.
Segundo o jornal “Estadão”, o ministro da Fazenda teve uma reunião com a Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes) na qual teria dito que as declarações já estariam indicando o custo de quase R$ 17 bilhões e que a projeção indicava um rombo de até R$ 100 bilhões se nada for corrigido.
O autor do programa, o deputado federal Felipe Carreras (PSB-PE), disse que não entende o tamanho da renúncia de R$ 17 bilhões. “Se alguém teve o benefício sem ter o direito, a culpa não é do programa nem do Parlamento nem dos setores no eixo do Perse. É preciso negociar e fazer ajustes”, completou.
O ruído na relação entre Lira e Haddad também teria impactado uma reunião que o ministro teria com os parlamentares. O encontro acabou sendo cancelado para evitar um “climão” após as declarações de Lira.
Mesmo assim , Haddad se reuniu apenas com senadores e disse que levará ao presidente Lula a proposta de apresentar um projeto de lei para discutir a reoneração da folha de pagamento de 17 setores da economia de forma separada da MP do Perse.
Outra crise
Na segunda-feira, 5, o presidente da Câmara protocolou um RIC (Requerimento de Informações) no Ministério da Saúde para questionar a ministra Nísia Trindade Lima sobre os critérios utilizados na distribuição das transferências da pasta aos estados e municípios.
Dentre os sete questionamentos enviados, Lira pede detalhes a respeito das regras, se valem para emendas e transferências. Além disso, é cobrado se os tetos para emendas para casos de atenção primária, média e alta complexidade, são os mesmo para as rubricas.
*Com informações do Estadão Conteúdo