Linea segue apostando na exportação que, em 2016, ajudou a limitar o impacto da menor demanda interna
Da Redação*
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A recessão do último ano não escolheu vítimas e espalhou seus
efeitos nefastos por todos os setores da economia brasileira. Mas Elio
Pavanato, diretor-geral da Linea Brasil, respira aliviado ao lembrar de
2016 – ano de desempenho negativo também para a indústria moveleira, que
sofreu diretamente os efeitos da crise do mercado imobiliário e da
restrição de crédito. O alívio tem justificativa: enquanto o setor
moveleiro paranaense amargou um déficit de 35,9% nas vendas, a Linea
registrou perda de apenas 5% no faturamento, encerrando o exercício com
resultado consolidado de R$ 120 milhões, acumulando um crescimento de
22% no último triênio.
Com sede em Arapongas (PR), um dos maiores
polos moveleiros do Brasil, a Linea trabalha exclusivamente com móveis
para sala de painéis seriados – racks, estantes, homes e complementos
produzidos em MDF ou MDP –, linha que responde por apenas 5% do total
das vendas em lojas de móveis no país. Apesar da queda na receita anual,
a Linea alcançou um recorde de 619 mil peças fabricadas, um aumento de
13% em relação à produção de 2015. “Foi um ano terrível, muito duro. Mas
enfrentamos as dificuldades, aumentamos a nossa participação de
mercado, ampliamos a base de distribuidores. Trabalhamos com estoques
baixos e margens de lucros mais apertadas”, expõe Pavanato.
O
desempenho da Linea no último exercício se deve, principalmente, à forte
atuação da empresa no mercado externo. As exportações foram
responsáveis por 19% do faturamento. Um alto índice, considerando que as
vendas externas representam em média 3% do mercado nacional de móveis.
Além disso, enquanto em 2016 o setor registrou queda de 5% nas operações
de exportação – somando US$ 493 milhões –, a Linea apresentou
crescimento de 7%.
Na análise de Cândida Cervieri, diretora
executiva da Associação Brasileira das Indústrias do Mobiliário
(Abimóvel), as empresas que exportam, mesmo com a crise, conseguiram
obter pequenos avanços. Mas, segundo Cervieri, essa não é a realidade da
indústria moveleira. Das 20,7 mil fábricas do país, somente 200 são
exportadoras. Nos anos anteriores, os incentivos governamentais para o
segmento e o aquecimento do ramo da construção civil incentivaram as
empresas a manter o foco no mercado interno. Por outro lado, existem
também as dificuldades em trabalhar com o mercado externo, que exige
escala, certificação e a manutenção de equipes específicas para atender a
essas operações. “O mercado externo é cativo, e reconquistar espaço é
muito mais difícil. Não é possível entrar hoje e voltar em três meses.
Exige uma relação de confiança, reposição de produtos e atendimento ao
consumidor”, explica Cândida.
Em sua carta de clientes no
exterior, composta por 27 países, a Linea exporta principalmente para a
América Latina – Peru, Argentina, Colômbia, Uruguai – , além de África e
Emirados Árabes, e projeta o desenvolvimento de produtos específicos
para investir no mercado do Estados Unidos. O faturamento próximo a R$
19 milhões por ano no mercado externo faz da empresa a maior exportadora
de móveis de painéis seriados para sala do Brasil, e a quinta maior no
ramo de móveis de painéis seriados como um todo no país. Porém, os
planos de Pavanato são mais audaciosos. “Há cinco anos, nossa exportação
não representava nem 7% do total. Há um mercado monstruoso lá fora, e
esse número ainda é insignificante”, considera.
A empresa
pretende aumentar em 10,5% o valor nominal de exportação, em 2017,
elevando a fatia para 21% a 22% do seu faturamento. A estratégia se
baseia na entrada em distribuidores com maior potencial de venda e em um
melhor aproveitamento dos clientes atuais. Na visão do diretor, por
trabalhar exclusivamente com racks e estantes, há um limite para o
crescimento no mercado nacional – diferentemente do potencial de
desenvolvimento do exterior, em mercados mais maduros e com maior
participação de móveis no varejo.
Para atender ao exigente mercado
externo, a Linea aposta na qualidade dos seus produtos. A
confiabilidade alcançada possibilitou o fim das vistorias de
pré-embarcação – prática comum de grandes players mundiais. A conquista
reflete os baixos índices de avaria e assistência técnica: somente 0,04%
dos seus produtos apresentam defeitos ou não conformidade, e apenas
0,2% necessitam de assistência após a instalação. Ano a ano, a empresa
vem derrubando ainda mais esses números. Pavanato aponta que isso é
consequência da produção verticalizada da linha, com o aprimoramento
constante dos processos internos.
O realinhamento de processos da
Linea tem um objetivo claro: melhorar a produtividade. A mão de obra
empregada e a estrutura industrial – uma planta fabril de 22,5 mil
metros quadrados e um centro de distribuição de 7,5 mil metros quadrados
– são suficientes para aumentar em 20% o volume de peças. A indústria
também mudou as suas práticas de recebimento de pedidos, programação de
produtos e faturamento, trabalhando com estoques inferiores aos de 2015.
No Brasil, a empresa tem o cuidado de trabalhar com a venda pulverizada
entre grandes distribuidores, como estratégia para não colocar em risco
seus resultados. Para ter ideia, seu maior cliente representa tão
somente cerca de 3,5% no faturamento. “O grande varejo pensa que é muito
mais saudável para uma empresa trabalhar com alguns grandes
distribuidores. Mas entendemos que, por conta de o mercado não ser tão
maduro, o mais seguro é essa capilarização”, defende Pavanato.
Otimismo cauteloso
Após
passar com certo fôlego pelas dificuldades econômicas do ano de 2016, e
até aumentar seu quadro de funcionários em 2,6%, a Linea planeja
retomar o crescimento em 2017, baseada nos sinais de recuperação
econômica do Brasil. No início do ano, a meta de planejamento
orçamentário da companhia era manter o resultado do exercício de 2016.
Porém, com os resultados positivos do primeiro quadrimestre indicando um
aumento nas vendas, a empresa prevê crescimento de 5%. “Essa é uma meta
conservadora para planejamento. Mas o nosso objetivo é mais arrojado:
aumentar em 10% o faturamento”, avisa Pavanato, estimando que o
resultado desses primeiros meses fique 4% acima do de mesmo período em
2016.
A companhia segue investindo em inovação. Tanto é que
participará da feira de Hannover, buscando tecnologia para o
desenvolvimento de novos produtos. “Estamos lançando uma coleção de
complemento de sala que mescla painel seriado com madeira, home e balcão
também com base em madeira maciça. Para um produto popular, é uma
inovação”, empolga-se Panavato. Este ano, a Linea está apostando em uma
política de lançamentos contínuos, com novas coleções a cada dois meses.
Outra novidade é a coleção de produtos Flex Collor, com duas opções de
cores no mesmo produto, dando ao consumidor a possibilidade de escolha
no momento da montagem.
O otimismo cauteloso da Linea converge com
as expectativas do setor – a não ser que o agravamento da crise
política contamine a retomada. A queda da inflação e a redução das taxas
de juros trouxeram um alento aos empresários moveleiros. Os dirigentes e
industriais do setor revelam que o primeiro quadrimestre de 2017 trouxe
indícios do início de uma recuperação lenta e gradual, com reação do
comércio varejista, e também nas exportações. A produção de móveis no
Brasil passou de 31 milhões de unidades em março de 2016 para 34, 9
milhões no mesmo período de 2017, um acréscimo de 12%, segundo dados
divulgados pela Abimóvel. Para este ano, em comparação com 2016, a
estimativa de crescimento é de 7,1% em valores nominais e 2% em volume
de peças produzidas. A região Sul deve puxar o crescimento do país com
9,1% de acréscimo em valores nominais, considerando que é responsável
por 50% da produção de móveis do país. Tal cenário é explicado por
Marcelo Prado, diretor do Instituto de Estudos e Marketing Industrial
(IEMI – Inteligência de Mercado). “O Sul tem foco em móveis seriados,
com forte posicionamento em grandes redes de varejo e em móveis
planejados. São dois setores que apontam para uma retomada mais rápida
do mercado. E as empresas são mais estruturadas, com produtos melhores e
com força de marca”, avalia.
Madeira maciça e painéis, os trunfos do Sul lá fora
A
indústria brasileira de móveis é maciçamente voltada ao mercado
interno, que absorve 97% de sua produção. Mas do pouco que é embarcado
para o exterior, 80% tem origem em fábricas instaladas no Paraná, em
Santa Catarina e no Rio Grande do Sul, além de São Paulo. Com foco em
produtos de madeira maciça voltados para os Estados Unidos e a Europa, o
polo catarinense de São Bento do Sul lidera a exportação de móveis da
região Sul. Na segunda posição se situa o polo da serra gaúcha, que tem
como ponto forte uma linha de móveis prontos de madeira, dirigidos
especialmente aos países da América do Sul.
O terceiro polo
moveleiro do Sul é o de Arapongas, no Paraná, que tem como especialidade
a produção de móveis de MDF e MDP, materiais classificados no jargão do
setor como “painéis seriados” – em oposição à madeira maciça. A região
de Arapongas exporta apenas 6% da produção, destinada em grande parte à
América Latina. De acordo com a Federação das Indústrias do Paraná
(Fiep), o polo de Arapongas é responsável por 9,9% do valor movimentado
pela indústria de móveis do país, e é também o maior consumidor de
painéis seriados (MDF e MDP), centrando-se em produtos de custo
econômico reduzido, direcionado às classes B, C e D. A cidade paranaense
abastece tanto grandes redes de varejo quanto pequenas lojas. “É um
polo diversificado, com linhas para todas as necessidades da residência.
A maior parte das indústrias são de móveis de painéis seriados, com
alta qualidade reconhecida no Brasil e no exterior”, atesta Irineu
Munhoz, que comanda o Conselho Moveleiro da Fiep e preside também o
Sindicato das Indústrias Moveleiras de Arapongas. Segundo o industrial,
após a segunda perda consecutiva de 4% em faturamento, em 2016, o polo
prevê crescimento entre 8% e 10% em 2017.
Na avaliação de Marcelo
Prado, diretor do Instituto de Estudos e Marketing Industrial (Iemi –
Inteligência de Mercado), o Sul tem uma vocação exportadora que se apoia
em vantagens competitivas, como a diversidade de produtos e a
disponibilidade de madeira. “O Sul se especializou e encontrou um nicho
importante lá fora, onde há pouca oferta desse tipo de produto. Poucas
nações têm móveis de madeira maciça para exportar. O mercado avançou
também para outras linhas, antes destinadas ao mercado doméstico, como
os móveis de painéis seriados”, analisa o diretor do Iemi, ressaltando
que 85% da exportação da indústria moveleira é de móveis de madeira. Com
o desaquecimento do mercado interno e a alta do dólar, as indústrias
procuram retomar os negócios internacionais, voltando a pauta para os
móveis de painéis seriados. A exportação já representou cerca de 8% a 9%
do mercado nacional, mas esta fatia foi encolhendo à medida que o real
passou por períodos de valorização, travando a competitividade
brasileira lá fora. A estimativa do Iemi é que a exportação, neste ano,
alcance um crescimento de 6,4% em relação a 2016, em valores nominais.
Apesar disso, o Sul deve apresentar uma retração de 10,1% na receita
das vendas internacionais de suas moveleiras.
*Com reportagem de Isadora Duarte.
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